A gestão da sala de aula na Formação Inicial: uma revisão de literatura

Classroom management in Inicial Training: a literature review

La gestión del aula en la Formación Inicial: una revisión de la literatura

 

Ariadene Santos Souza ( ariadenesantossousa@gmail.com)

Secretaria de Estado da Educação-Amazonas, SEDUC-Amazonas, Brasil

https://orcid.org/0000-0002-7264-5321

 

Cinara Calvi Anic (cinara.anic@ifam.edu.br)

Instituto Federal de Educação, Ciências e Tecnologia. Amazonas, Brasil

https://orcid.org/0000-0002-1580-2271

 

 

Resumo

Este estudo é parte de uma pesquisa de mestrado profissional em andamento cuja temática versa sobre a gestão da sala de aula na formação inicial de professores. A gestão da sala de aula compreende um conjunto de ações tomadas pelo professor para viabilizar o ensino e a aprendizagem dos alunos. Entretanto, a literatura mostra que este é um tema pouco abordado na formação inicial, o que contribui para que os professores, sobretudo aqueles em início de carreira, tenham dificuldades na prática pedagógica. Diante dessa problemática, e com o intuito de conhecermos publicações recentes sobre o tema, realizamos uma revisão de literatura segundo a metodologia DataCon. Como resultados, observamos temas variados relacionados à gestão da sala de aula, como indisciplina, dificuldades no planejamento pedagógico, dentre outras. Também foi possível identificamos os autores frequentemente usados como base teórica nessas pesquisas. Entendemos que a revisão de literatura é crucial para que o pesquisador faça escolhas mais assertivas e fundamentadas no desenvolvimento de seu estudo, e a gestão da sala de aula deve ser um tema discutido amplamente e com ações de intervenção na formação inicial, relacionando a teoria à prática e subsidiando os alunos em seu futuro trabalho docente de forma mais segura.

Palavras-chave: Formação inicial de professores; Gestão da sala de aula.

 

Abstract

This study is part of an ongoing professional master's degree research whose theme deals with classroom management in initial teacher training. Classroom management comprises a set of actions taken by the teacher to facilitate teaching and student learning. However, the literature shows that this is a topic little discussed in initial training, which contributes to teachers, especially those at the beginning of their careers, experiencing difficulties in pedagogical practice. Faced with this problem, and in order to learn about recent publications on the topic, we carried out a literature review according to the DataCon methodology. As results, we observed varied themes related to classroom management, such as indiscipline, difficulties in pedagogical planning, among others. It was also possible to identify the authors frequently used as a theoretical basis in these researches. We understand that the literature review is crucial for the researcher to make more assertive and well-founded choices in the development of his study, and classroom management must be a topic discussed widely and with intervention actions in initial training, relating theory to practice and supporting students in their future teaching work in a more secure way.

Keywords: Initial teacher training; Classroom management.

 

Resumen

Este estudio forma parte de una investigación en curso de maestría profesional cuyo tema aborda la gestión del aula en la formación inicial docente. La gestión del aula comprende un conjunto de acciones que realiza el docente para facilitar la enseñanza y el aprendizaje de los estudiantes. Sin embargo, la literatura muestra que este es un tema poco discutido en la formación inicial, lo que contribuye a que los docentes, especialmente aquellos que inician su carrera, experimenten dificultades en la práctica pedagógica. Ante esta problemática, y con el fin de conocer publicaciones recientes sobre el tema, realizamos una revisión de la literatura según la metodología DataCon. Como resultados observamos temáticas variadas relacionadas con el manejo del aula, como indisciplinas, dificultades en la planificación pedagógica, entre otras. También fue posible identificar los autores utilizados frecuentemente como base teórica en estas investigaciones. Entendemos que la revisión de la literatura es crucial para que el investigador tome decisiones más asertivas y fundamentadas en el desarrollo de su estudio, y la gestión del aula debe ser un tema ampliamente discutido y con acciones de intervención en la formación inicial, relacionando la teoría con la práctica y apoyando los estudiantes en su futura labor docente de una forma más segura.

Palabras-clave: Formación inicial docente; La gestión del aula.

 

 

INTRODUÇÃO

Este estudo é parte de uma pesquisa de mestrado profissional em desenvolvimento cuja temática versa sobre a gestão da sala de aula na formação inicial de professores. A gestão da classe, ou gestão da sala de aula, refere-se às estratégias utilizadas para manutenção da ordem em sala de aula, de modo que se tenha um ambiente favorável à aprendizagem, assim como ao planejamento das medidas disciplinares, regras procedimentos gerais em sala de aula (Arruda; Lima; Passos, 2011).

Já a gestão do conteúdo compreende as operações que o professor faz para que os alunos possam aprender o que lhes é ensinado, incluindo a elaboração de testes, uso de jogos, experimentos etc.

Concordamos com Coutinho e Miranda (2019) quando pontuam que a formação docente deve ser crítica e pautada em uma perspectiva prática reflexiva, a qual ser materializa pela investigação para que seja possível compreender a educação como prática social concreta. Também Souza, Silva e Bedin (2020), apoiam-se em Isabel Alarcão para argumentar que a formação do professor precisa capacitá-los e instigá-los à reflexão sobre suas ações.

Nesse contexto, é preciso considerar as condições objetivas e subjetivas das práticas docentes, de natureza complexa, e a construção de diversos saberes (Tardif, 2014), incluindo-se os conhecimentos específicos, pedagógicos e experienciais. Baccon e Arruda (2015) nos lembram que, ao se tornar professor, espera-se desse sujeito que ele saiba o conteúdo, e que domine a sala de aula no sentido de “ter controle” sobre a turma da qual está responsável.

Nesse cenário, os cursos de licenciatura se configuram como espaços para o fomento de saberes e conhecimentos que proporcionem ao professor em formação inicial subsídios que, com segurança, lhes serão úteis em seu fazer. É o espaço para discutir meios e caminhos para o alcance dos objetivos da educação, não somente com a apresentação de respostas, mas potencialmente, como um espaço para levantar questionamentos e inquietudes.

Diante do exposto e com o intuito de iniciarmos nossa pesquisa de mestrado com um olhar mais ampliado e consistente sobre a temática estudada, fizemos uma revisão de literatura (RL) a qual Creswell e Creswell (2021) pontuam que deve ser o primeiro momento do desenvolvimento de uma pesquisa científica haja vista que a realização desta nos permiti reconhecer se o tema proposto é, de fato, exequível e interessante do ponto de vista científico, além de auxiliar na definição da forma mais assertiva de organizar o escopo da pesquisa.

A RL foi executada conforme a metodologia DataCon, defendida por Coelho (2022), a qual se processa em 5 etapas, as quais incluem definição da pergunta de pesquisa, seleção de estratégias de pesquisa, exploração e análise de dados. 

Os resultados da RL apontaram muitos estudos que tratam de temas diversos relacionados à gestão da sala de aula, como planejamento pedagógico, indisciplina dos alunos, seleção e uso de metodologias diversas. Ademais, foi possível conhecermos autores que se constituem como base teórica dos conceitos centrais de nossa pesquisa, o que nos auxilia no desenvolvimento desta de uma forma mais assertiva.

Este estudo está organizado da seguinte forma: iniciamos com uma breve discussão sobre o conceito de gestão da sala de aula, considerando-se esta como uma necessidade formativa. Em seguida discutimos a importância de se abordar a gestão da sala de aula na formação inicial de professores. Apresentamos o percurso metodológico seguido para a revisão da literatura e, na sequência, descrevemos os resultados e discussões.

Esperamos que este estudo possa subsidiar outros estudos, reflexões e propostas formativas que discutam e mostrem caminhos, estratégias para a gestão da sala de aula, sobretudo na formação inicial, de modo que o futuro professor possa ter mais segurança no trabalho docente, potencializando-se assim a aprendizagem dos alunos.

 

GESTÃO DA SALA DE AULA COMO UMA NECESSIDADE FORMATIVA

O termo “gestão da sala de aula” pode nos levar a pensar nessa atividade como ações tomadas pelo professor para contornar a indisciplina. Essa confusão pode acontecer, segundo Coelho (2019), porque o professor, logo no início do seu trabalho em sala de aula, deve estabelecer como esta irá funcionar; só depois disso espera-se o bom comportamento dos alunos. Prado (2017), com base em Weinstein e Novodvorsky (2005) apontam, como características do espaço da sala de aula a imprevisibilidade, a falta de privacidade e o imediatismo, dentre outros pontos. Nesse cenário, o docente deve desenvolver mecanismos para gerir sua sala de aula. A gestão da sala de aula, na concepção de Prado (2017), refere-se a um conjunto de ações interligadas, que envolvem todos os atores da escola e também os sociais, e se utilizam de métodos práticos próprios para possibilitar o ensino e aprendizagem

Gauthier et al. (2006) considera que a gestão da classe implica o estabelecimento de regras e ações para a manutenção de relações favoráveis entre o professor e os alunos, uma vez que isso pode ser considerado uma estratégia preventiva para intervenções disciplinares, por exemplo. 

A gestão da sala de aula incorpora duas grandes dimensões: o relacionamento interpessoal e a organização da coletividade de sala de aula. O relacionamento interpessoal diz respeito à capacidade do professor se aproximar de forma mais profunda com o aluno, seja em termos de aprendizagem ou de disciplina. Implica, segundo o autor, em um olhar respeitoso, pautado em uma crença sincera na sua capacidade de aprender e de melhorar. Já a organização da coletividade refere-se ao clima de organização, interação e comunicação em sala de aula (Vasconcellos, 2017).

Assim, gerir uma sala de aula implica na definição de ações desenvolvidas pelo professor para criar um ambiente propício ao ensino e aprendizagem, onde os docentes desenvolvem mecanismos de organização, mecanismos para se relacionar com os alunos de modo a criar um ambiente que seja favorável ao ensino e aprendizagem (Ribeiro, 2020).

Entendemos que a gestão da sala de aula constitua uma necessidade formativa. A literatura traz várias definições para o termo necessidade formativa, conforme observaram Silva, Lopes e Santos Silva (2024). Porém, há alguns pontos relativos especialmente em relação ao termo necessidade que os autores destacam: necessidade seria uma lacuna entre um estado real e um ideal. Poderia também ser compreendida como “um conjunto de atividades fundamentais para o desenvolvimento profissional” (Silva, Lopes; Santos Silva, 2024, p. 140), ou ainda uma condição imprescindível para que um indivíduo ou um grupo atinja um objetivo pré-determinado.

Sousa et. al. (2020) fizeram uma revisão de literatura acerca deste conceito que é bastante polissêmico, concluindo que necessidades formativas compreendem operações e construções mentais de caráter objetivo e subjetivo que são manifestadas pelos professores sobre elementos que podem melhorar suas práticas e contribuir com seu desenvolvimento profissional.

Carvalho e Gil-Pérez  (2011), ao  tratarem da formação  de  professores  de Ciências  destacam oito necessidades formativas: 1) conhecer a matéria a ser ensinada; 2) questionar as ideias docentes de senso comum; 3)adquirir conhecimentos teóricos sobre a aprendizagem  em  Ciências;  4) saber  analisar  criticamente  o  ensino  tradicional; 5) saber preparar atividades capazes de gerar uma aprendizagem efetiva; 6) saber dirigir o trabalho dos alunos; 7) saber avaliar; 8) adquirir a formação necessária para associar ensino e pesquisa didática. Portanto, saber avaliar, dirigir o trabalho dos alunos, constituem-se como elementos da gestão da sala de aula.

No que se refere à gestão da sala de aula na formação inicial, Silva e Jesus (2023), em um estudo que buscou identificar a presença de noções de gestão da sala de aula em cursos de licenciatura de uma universidade pública, constataram que são rasas as noções dos estudantes sobre o tema, demonstrando que a formação docente não tem creditado a devida atenção a esta que é uma necessidade fundamental do trabalho do professor.

Por isso, pontuamos ser de suma importância o desenvolvimento de iniciativas que promovam essa discussão na formação inicial, a qual Imbernón (2011) ressalta que deve ser focada na potencialização de rupturas de contextos já perpetuados, sendo este profissional em formação preparado para uma ação-reflexão de sua prática considerando-se, além do contexto no qual está inserido e as mudanças constantes pelas quais esse contexto é submetido. 

 

GESTÃO DA SALA DE AULA, FORMAÇÃO INICIAL E O INÍCIO DA DOCÊNCIA

De acordo com Garcia (2006), vivemos tempos de mudanças não somente na educação como em diversas áreas e cenários. Tais mudanças refletem diretamente no contexto educacional, sendo necessário que professores, pesquisadores em Educação e demais partícipes desse contexto também se atualizem e busquem um equilíbrio em seu fazer.  Do ponto de vista legal, no Brasil a formação de professores ocorre por via dos Cursos de Licenciatura, ofertados pelas Instituições de Ensino Superior - IES, responsáveis pela formação de profissionais para a atuação na docência da Educação Básica.

Mesquita (2010) pondera que, na formação inicial, deve haver um equilíbrio entre as questões técnicas e as finalidades sociais da educação e do ensino. Nesse cenário, a autora destaca a importância da formação inicial como lócus do “preparo” do futuro professor, além do fato do licenciando já trazer consigo uma imagem consolidada tanto do que é ser aluno como do que é ser professor. Arcadinho, Folque e Costa (2020) acrescentam que a formação inicial dever ser orientada para a preparação pedagógica do professor como um profissional investigador e reflexivo, que possa buscar novos significados, construir e reconstruir saberes para as suas ações de modo que tenham condições de responder aos desafios e exigências da profissão docente.

Além da postura reflexiva, faz-se necessário pensarmos nos saberes, ou conhecimentos necessários para a docência. Muitas discussões acerca da formação de professores evidenciam a importância de investigações sobre os saberes necessários à docência, tema este que vivenciou o aflorar nas pesquisas especialmente a partir da década de 1990, com os estudos de Clemont Gauthier, Maurice Tardif, Lee Shulman, Selma Pimenta, dentre outros. Souza, Silva e Bedin (2020) lembram também dos estudos de Shulman (2014), que descreveu alguns conhecimentos necessários para que o professor possa promover a compreensão do conteúdo pelos alunos, os quais incluem conhecimentos do conteúdo, do currículo, dos alunos e suas características, dentre outros.

Os saberes do professor são imbuídos tanto das características pessoais quanto profissionais, pois como afirma Tardif (2014, p. 13) “o que um professor sabe depende também daquilo que ele não sabe, daquilo que se supõe que ele não sabia, daquilo que outros sabem em seu lugar [...] ”. Dentre esses saberes há os conhecimentos relativos à organização da aula, ou gestão da classe (Shulman, 2014), como a gestão do tempo, definição de conteúdo, planejamento de atividades, além das relações que ali se estabelecem.

Os futuros professores atuarão em classes da educação básica e, como nos apresenta Tardif (2014), precisarão lidar com os condicionantes, sendo necessário estar preparados para agir, tomar decisões, fazer intervenções e garantir um ambiente propício ao aprendizado, ou seja, deverão saber gerir sua sala de aula.  A gestão da sala de aula inclui todas as ações executadas com o intuito de construir e manter um ambiente de aprendizagem significativa, as quais incluem estabelecimento de regras, disciplina, organização do espaço, controle do tempo, domínio do conteúdo, dentre outras (Reina e Silva (2020). 

Com a conclusão da formação inicial tem-se o início da docência, período de muitos desafios e conflitos, como nos lembra Huberman (2007), ao discutir o ciclo de vida profissional dos professores. A fase inicial é a mais difícil pois, ao deparar-se com a realidade da sala de aula, muitas vezes é quando este profissional recém-formado chega a desesperar-se diante da verdade de seu local de trabalho, vivenciando o que comumente se chama “choque da realidade”.

Uma das dificuldades vivenciadas pelos professores nesse período referem-se, justamente, às questões relativas à gestão da sala de aula. Silva e Jesus (2023) reforçam o fato de que muitos dos problemas da formação docente são consequência do distanciamento entre a teoria/prática, entre o que se aborda na academia e a realidade da escola, num cenário onde as instituições de formação docente supervalorizam a teoria em detrimento da prática.  Nóvoa (2007) corrobora afirmando que a formação do professor é, algumas vezes, excessivamente centrada na teoria, ou ainda nas questões metodológicas, ficando a prática em um segundo plano. Por isso, o autor defende que a formação deve estar centrada nas práticas e na análise e reflexão dessas práticas.

Isto posto, consideramos que a melhoria da formação docente perpassa pela necessidade e criação de oportunidades que privilegiem a articulação da teoria e a prática, de modo que possam ser construídos outros saberes que vão além do saber disciplinar, ou conhecer a matéria a ser ensinada, mas saberes experienciais, no aprendizado com os pares, com professores mais experientes, saberes pedagógicos, saberes curriculares (Tardif, 2014).

Corroborando, LePage, Darling-Harmond e Akar (2019) argumentam sobre a importância de os professores mais experientes ajudarem os novatos a administrar com êxito suas salas de aula, o que pode ser experenciado nos momentos de intervenção dos estágios supervisionados previstos nos cursos de Licenciatura. Esses novatos, segundo as autoras, precisam da experiência prática para trabalhar com alunos sob a orientação dos professores mais experientes, os quais devem ser referências para uma boa gestão da classe.

Por isso, é importante que sejam discutidas estratégias de gestão da sala de aula logo na formação inicial, ou seja, ações e criação de condições necessárias para a criação de um ambiente favorável ao ensino e à aprendizagem (Silva e Jesus, 2023). Para essas autoras, um dos elementos da ação docente que contribuiria para articular teoria e prática seria a introdução, na formação docente, de discussões pertinentes aos saberes relacionados à gestão da sala de aula.

 

METODOLOGIA

Como afirmado anteriormente, este estudo pautou-se em uma revisão de literatura a qual foi realizada seguindo a metodologia DataCon proposta por Coelho (2022). Tal metodologia permite, segundo a autora, otimizar o tempo com a ampliação das possibilidades de construção do conhecimento, bem como com o uso de estratégias diversas para auxiliar o processo analítico.

O processo metodológico inicia com a definição da questão problema que, neste estudo, foi identificar o que tem sido publicado sobre gestão da sala de aula na formação inicial de professores nos últimos 5 anos.

Na próxima etapa são definidos os descritores, buscando-se manter uma relação direta com a questão problema proposta: O que tem sido publicado nos últimos 05 anos sobre gestão da sala de aula na formação inicial de professores? Assim, foram definidos os seguintes descritores: formação inicial de professores, educação básica e gestão da sala de aula. A base de dados para a busca foi o Google Acadêmico. Em seguida, definimos os operadores booleanos (AND), e foi construída uma string de busca da seguinte forma: “formação inicial de professores “ AND “educação básica “ AND “gestão da sala de aula”, combinando-se os descritores grafados entre aspas com o operador booleano AND. Operadores booleanos são expressões de busca que, em conjunto aos descritores definidos, direcionam as estratégias avançadas de busca no repositório definido (Coelho, 2022).

Devemos lembrar que a aplicação da estratégia de busca avançada pode trazer resultados que não se alinham exatamente ao que se espera, além de ser possível alcançar um elevado número de trabalhos sobre o tema pesquisado, tornando a análise inexequível, ou pelo menos extremamente demorada. Por isso, é muito importante que a string de busca seja elaborada com foco no que realmente se espera encontrar.

Na etapa seguinte (etapa 3) foram definidos os critérios de inclusão (trabalhos em Língua Portuguesa, artigos, teses e dissertações) e exclusão (trabalhos que não se alinham ao tema da pesquisa, Monografias, trabalhos duplicados e capítulos de livro) para a compilação do corpus da pesquisa definindo-se estratégias de seleção, armazenamento e organização dos trabalhos e suporte para o rastreio dos arquivos. A organização dos trabalhos foi realizada atribuindo-se um código para os arquivos, os quais foram armazenados no formato off-line.

Ainda nesta etapa é realizada a compilação dos trabalhos relacionados. Para tanto, inicialmente foi realizada uma leitura flutuante dos títulos e, a depender do título, caso atendesse aos critérios de inclusão, eram feitas as leituras dos resumos, onde mais uma vez foram aplicados os critérios de inclusão e exclusão. Nessa etapa a leitura foi acompanhada de uma análise crítica para garantir a qualidade dos trabalhos selecionados.

Conforme Ferreira (2002), “[...] alguns pesquisadores do “estado da arte” [...] se propõem a fazer da produção acadêmica a partir dos resumos [...] e há ainda aqueles que, vão em busca dos trabalhos na íntegra (Ferreira, 2002, p. 266)”. Em nosso trabalho, a partir da utilização das etapas da Metodologia DataCon, além da leitura dos resumos, também buscamos as contribuições das produções na íntegra, utilizando um ferramental para nos auxiliar nessa etapa.

Os trabalhos selecionados foram organizados em pasta off-line e, posteriormente, arquivados na nuvem, objetivando “torná-los utilizáveis por terceiros” (Coelho, 2022, p. 7), pois com a possibilidade de rastreio e acesso remoto, o corpus compilado para nossa pesquisa poderá auxiliar pesquisas futuras, por nós ou por outros que se interessarem.

Após a codificação de todos os trabalhos, salvos em PDF na pasta off-line, eles foram transformados em arquivos sem formatação conhecidos como arquivos TXT. Para realização dessa ação fizemos uso do site https://pdftotext.com/pt/ de acesso livre e gratuito na internet.

Sequencialmente, chegamos à Etapa 4 da Metodologia DataCon, que consiste, dentre outras ações, em gerenciar o corpus construído para a análise, fragmentando os textos em partes menores para facilitar a apropriação do conteúdo na busca de possíveis descobertas, além de destacar a frequência de abordagens dos temas de interesse considerando os trabalhos selecionados.

Objetivando otimizar o tempo, fizemos uso de um ferramental, pois como corrobora conosco Coelho (2022), os “[...] softwares [...] facilitam a análise e a interpretação de dados qualitativos, visando ao aumento do alcance e da profundidade dessas análises (Coelho, 2022, p. 9)”. Para contextualizar toda essa informação, a partir do corpus da pesquisa utilizamos o ferramental (software) AntConc criado para auxiliar na análise t A partir do ferramental, fizemos uma busca por descobertas a partir da análise da frequência de temas, expressões, teóricos, assuntos, temáticas abordadas e a relação com nosso problema de pesquisa.

A compilação do corpus proporcionou conhecer outros autores que estão estudando, pesquisando e publicando trabalhos relacionados ao nosso tema de interesse, além de conhecermos as temáticas que mais vem sendo abordadas nos estudos relacionados, respondendo o problema elaborado na Etapa 1 da Metodologia DataCon para análise textual da linguística de corpus a qual, segundo Coelho (2022, p.6), corresponde a uma “metodologia robusta para auxiliar nas demandas das investigações científicas”.

Isto posto, consideramos que a revisão de literatura é uma etapa crucial da pesquisa, pois confere segurança na tomada de decisão sobre qual caminho podemos percorrer pesquisa vislumbrando a construção de um trabalho consistente e que represente a real necessidade do público que se quer alcançar.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A análise dos trabalhos selecionados nos mostrou estudos que convergem com os objetivos de nossa pesquisa no que diz respeito à entrada de professores na carreira e a importância da discussão e orientação acerca da gestão da sala de aula logo na formação inicial (Carvalho, Moura; Bento, 2021).

Pensamos como Souza (2021), quando afirma que a “construção de uma base teórica forte, que realmente sustenta sua práxis é um dos objetivos da formação inicial de professores para a educação básica” (Souza, 2021, p. 16).

O estudo de Carvalho, Moura e Bento (2021) evidencia a relevância do contato com o ambiente escolar e, em especial, com a sala de aula desde a licenciatura, para que estes professores em formação construam suas identidades profissionais e amadureçam sua práxis.

Araújo (2019), apresenta um estudo onde discute a importância do suporte aos professores iniciantes para que estes consigam desenvolver com mais segurança “[...] a rotina, seguido de orientações acerca da gestão da sala de aula e do cotidiano escolar. (Araújo, 2019, p. 99)”. O autor supracitado também discute a questão da indisciplina dos alunos como um fator complicador para o sucesso na atuação de professores iniciantes, quando em sua pesquisa destaca que “os professores recém-ingressos ainda não dispõem de experiência [...], para agir e solucionar as diferentes situações que se apresentam diariamente em sua sala de aula (Araújo, 2019, p. 84)”. 

Essa afirmação de Araújo (2019), nos remete ao que fala Tardif (2014) sobre os condicionantes e como os professores devem desenvolver-se para lidar com estes na sala de aula. Nessa mesma linha de raciocínio, Vasconcellos (2019) discute a indispensável mediação da relação entre professores e alunos. Quanto a indisciplina, Araújo (2019) apresenta em sua pesquisa relatos de professores que principalmente nos primeiros anos de docência chegavam a chorar por não saber o que fazer para gerenciar suas salas e conseguirem conduzir suas aulas; em contrapartida, também apresenta relatos de professores que permaneceram e insistiram em permanecer na profissão por acreditar na educação e na escolha que fizeram. Porém, pensar na gestão da sala de aula vai para além da questão (in) disciplinar e tem íntima relação com as questões qualitativas de gerenciamento da turma em parceria com os alunos, pois abrange tanto o tempo e domínio dos objetos do conhecimento a serem trabalhados em sala como as metodologias que serão utilizadas (Imbernón, 2011; Tardif, 2014; Vasconcellos, 2019).

Silvano (2019), em sua tese, aponta o grande desafio enfrentado pelas licenciaturas em subsidiar os profissionais iniciantes para uma construção de saberes que impactem em sua prática, afirmando que “existem muitas lacunas na formação inicial de professores” (Silvano, 2019, p. 23). Sobre essas lacunas, Rosa (2017) apresenta em sua pesquisa intitulada “Professores iniciantes de Geografia: processos de recontextualização da formação inicial no contexto da prática pedagógica”, questões que podem estar relacionadas ao modo “como foram ensinados e não no fato de como foram ensinados a ensinar (Rosa, 2017, p. 90)”.

Dentre os estudos encontrados na RL sobre a gestão da sala de aula na formação inicial, observamos com frequência estudos que tratam das dificuldades de construir o  planejamento pedagógico, assim como a importância de estratégias metodológicas para sala de aula, a indisciplina como implicativo para o sucesso da gestão de professores iniciantes, a experiência e inexperiência de professores de profissão frente aos desafios da sala de aula, a necessidade de inovar as práticas docentes, além da necessidade de reformulação dos cursos de formação inicial de professores para que estes promovam mais experiências práticas, fomentando a articulação entre teoria e prática.

Levando em conta a especificidade e a complexidade da docência, constatamos que a gestão da sala de aula corresponde a um aspecto importante do trabalho docente, pois é neste espaço que as relações entre professor e alunos se estabelecem; é onde se materializam e se constroem e reconstroem os saberes.

Como corrobora Saviani (2009), a formação de professores implica na definição de objetivos e competências a serem alcançadas, e é através da gestão da sala de aula - que pode ser em espaço fechado ou aberto - que se efetiva o processo de ensino e de aprendizagem. Vale ressaltar que, especialmente na atualidade, não é tarefa fácil garantir que os objetivos e ações propostos para tal ambiente se concretizem. Faz-se necessário que o professor adentre esse espaço não somente com a segurança do conhecimento acadêmico e científico aprendido na sua formação inicial, mas principalmente que acesse esse ambiente preparado para lidar com os condicionantes (Tardif, 2014).

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A literatura nos mostra que saber gerir a sala de aula é um dos saberes necessários para que o professor possa desenvolver seu trabalho docente com êxito. Acreditamos que quando o professor, em sua formação inicial, tem oportunidades de discutir, conhecer e aprender estratégias para gerir sua sala de aula, minimizam-se entraves que possam causar desconforto e insegurança no professor, especialmente naqueles que estão no início da carreira, haja vista ser esse um período de vários desafios. Tais entraves podem comprometer o aprendizado dos alunos.

Assim, entendemos que a formação inicial se constitui como um espaço fértil para a discussão de ações, procedimentos e estratégias relativas à organização do espaço físico da sala de aula, da organização e estruturação da aula em si, dos acordos e relações que vão se estabelecer entre o professor e os alunos para minimizar conflitos, criando-se um cenário propício à aprendizagem. No entanto, esse tema vem sendo pouco abordado na formação inicial, o que nos motivou a desenvolver uma pesquisa de mestrado profissional cujo produto educacional pretende ser uma proposta formativa para discutir e intervir nessas questões supracitadas, subsidiando o futuro docente a gerir sua sala de aula.

A revisão de literatura é uma etapa crucial da pesquisa, especialmente no início desta, pois auxilia na tomada de decisões sobre os caminhos a percorrer na construção de um trabalho consistente, consciente e que represente a real necessidade do público que se quer alcançar.

Com a RL realizada, podemos afirmar que apesar de termos encontrado uma alta frequência de trabalhos abordando a necessidade e importância de reformulação da formação inicial, não encontramos nenhuma proposta interventiva sobre o tema gestão da sala de aula para essa etapa formativa, o que se caracteriza como uma lacuna no conhecimento sendo, portanto, foco de nossa pesquisa, a qual exige a produção de um produto educacional.

Ademais, a RL nos permitiu conhecer os teóricos que podem sustentar nossa pesquisa, contribuindo-se assim para o rigor necessário às pesquisas científicas. Além disso, também constatamos os temais mais discutidos na literatura sobre a gestão da sala de aula, dentre os quais as dificuldades dos professores em controlar os conflitos entre os alunos, a indisciplina e a construção do planejamento pedagógico.

Esperamos que este estudo possa subsidiar e inspirar novos estudos que tratem da gestão da sala de aula como um importante saber a ser construído e refletido logo na formação inicial, minimizando temores e desconfortos aos futuros professores e potencializando a aprendizagem a partir da construção de uma sala de aula amigável, empática e favorável à construção e reconstrução de saberes e descobertas, tanto por parte dos professores como dos alunos.

 

Recebido em: 25/07/2024

Aceito em: 12/08/2024

 

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