O Processo Metacognitivo na utilização da tecnologia educacional pós-pandemia da Covid-19

The Metacognitive process in the use of educational technology post-covid-19 pandemic

El proceso metacognitivo en la utilización de la tecnología educativa post pandemia de covid-19

 

Christopher Ramos Sfeir (chrissfeir@gmail.com)

Instituto Federal do Paraná, IFPR, Brasil

Orcid: https://orcid.org/0009-0002-5055-7918

 

Nancy Nazareth Gatzke Corrêa (nancyngatzke@gmail.com)

SEED, Brasil

Orcid: http://orcid.org/0000-0002-8160-1849

 

Hugo Emmanuel da Rosa Corrêa  (hugo.correa@ifpr.edu.br)

Instituto Federal do Paraná, IFPR, Brasil)

Orcid: http://orcid.org/0000-0002-2231-257X

 

Resumo:

Diante dos desafios apresentados pela aprendizagem de Cálculo, no Ensino Superior, este artigo investiga e analisa os processos metacognitivos envolvidos na escolha de estratégias de aprendizagem e utilização das tecnologias educacionais por dez estudantes de Cálculo I, do curso de Engenharia de Controle e Automação de um Instituto Federal do Paraná. Para isso apresentamos os conceitos sobre tecnologias educacionais e metacognição, necessários para a análise dos dados, que foram coletados por meio de questionário/formulário on-line, e analisados utilizando a Análise Textual Discursiva, buscando as percepções, acerca do processo de aprendizagem em Cálculo destes estudantes, desta análise emergiram as categorias: tecnologias educacionais, resolução de exercícios, estudando, não aprendeu, revisando, explicação do professor e anotações. Com essa investigação foi possível evidenciar a presença de processos metacognitivos na percepção e na escolha da estratégia de aprendizagem, em especial ao complementar as explicações do professor realizadas em sala de aula, por explicações em ambientes digitais externos à instituição de ensino, estratégia amplamente utilizadas no período da pandemia, que foram mantidas pelos estudantes, o que deduzimos ser um comportamento de um aprendiz metacognitivo incitados pelos novos modelos de aquisição de informação.

Palavras-chave: tecnologias; tecnologias educacionais; metacognição.

 

Abstract:

Faced with the challenges presented by learning Calculus in Higher Education, this article investigates and analyzes the metacognitive processes involved in the choice of learning strategies and use of educational technologies by ten students of Calculus I, from the Control and Automation Engineering course of a Federal Institute of Paraná. To this end, we present the concepts of educational technologies and metacognition, necessary for the analysis of data, which were collected through an online questionnaire/form, and analyzed using Discursive Textual Analysis, seeking perceptions about the learning process in Calculus From these students, the categories emerged from this analysis: educational technologies, solving exercises, studying, not learning, reviewing, teacher's explanation and notes. With this investigation it was possible to highlight the presence of metacognitive processes in the perception and choice of learning strategy, especially when complementing the teacher's explanations carried out in the classroom, with explanations in digital environments external to the educational institution, a strategy widely used in period of the pandemic, which were maintained by students, which we deduce to be the behavior of a metacognitive learner encouraged by new models of information acquisition.

Keywords: technologies; educational technologies; metacognition.

 

Resumen:

Frente a los desafíos que presenta el aprendizaje de Cálculo en la Educación Superior, este artículo investiga y analiza los procesos metacognitivos involucrados en la elección de estrategias de aprendizaje y uso de tecnologías educativas por parte de diez estudiantes de Cálculo I, de la carrera de Ingeniería en Control y Automatización de un Instituto Federal. de Paraná. Para ello, presentamos los conceptos de tecnologías educativas y metacognición, necesarios para el análisis de datos, los cuales fueron recolectados a través de un cuestionario/formulario en línea, y analizados mediante Análisis Textual Discursivo, buscando percepciones sobre el proceso de aprendizaje en Cálculo de estos estudiantes. De este análisis surgieron las categorías: tecnologías educativas, resolución de ejercicios, estudiar, no aprender, repasar, explicación del profesor y apuntes. Con esta investigación se logró resaltar la presencia de procesos metacognitivos en la percepción y elección de la estrategia de aprendizaje, especialmente al complementar las explicaciones del docente realizadas en el aula, con explicaciones en ambientes digitales externos a la institución educativa, estrategia ampliamente utilizada en periodo de la pandemia, que fueron mantenidos por los estudiantes, lo que deducimos que es el comportamiento de un aprendiz metacognitivo alentado por nuevos modelos de adquisición de información.

Palabras clave: tecnologías; tecnologías educativas; metacognición.

 

 

 

INTRODUÇÃO

O ensino de Cálculo é um desafio recorrente no Ensino Superior, essa disciplina frequentemente apresenta altos índices de reprovação e evasão. Neste contexto, surge a motivação para realizar uma investigação a respeito das declarações dos estudantes sobre seu processo de aprendizagem em cálculo e como as tecnologias educacionais impactam sua aprendizagem, buscando, por meio de questionários metacognitivos, insights que possam orientar práticas pedagógicas mais eficazes.

Este artigo busca identificar os processos metacognitivos envolvidos nas escolhas de estratégias de aprendizagem e na utilização de tecnologias educacionais da aprendizagem de Cálculo, declarados por dez estudantes de um curso de Engenharia de Controle e Automação de um Instituto Federal do Paraná, ao responder a questões sobre seu processo de aprendizagem, pós-pandemia da Covid-19. Para isso, inicia-se trilhando um caminho conceitual sobre técnica, tecnologia, tecnologias contemporâneas, tecnologias educacionais e metacognição, para então apresentar os dados e respectivas análises.

 

TÉCNICA E TECNOLOGIA

A criação da primeira roupa, o uso de pelagem animal para se refugiar do frio e a utilização de pedras afiadas para caça foram os primeiros registros do uso da tecnologia por seres humanos. Para Lemos (2004), desde a criação das sociedades até a formação de cidades pós-industriais foram criadas diversas significações para o termo “tecnologia”.

A presença da tecnologia nas sociedades foi responsável por grandes transformações de cunhos social, urbanístico, produtivo, cultural etc. De acordo com Castells (2005), o domínio da tecnologia permeou a transformação das sociedades, sendo fundamental para a sua compreensão.

O domínio de ferramentas, com o tempo, fez com que estas se tornassem extensões do corpo humano, garantindo a sobrevivência e o desenvolvimento da espécie humana, mas também tornando-se vinculadas à nossa existência.

Não é tarefa simples definir tecnologia. Lemos (2004) sinaliza a confusão entre os termos técnica e tecnologia, mostrando como muitas vezes são usadas como sinônimos, mas são conceitualmente distintas. Pode-se afirmar que a tecnologia faz utilização de métodos de investigação semelhantes aos da ciência, todavia não se limita apenas à subordinação à ciência (Veraszto et al., 2009). Desse modo, a tecnologia não deve ser compreendida em um modelo hierárquico (como na concepção intelectualista), subordinada às ciências como uma aplicação da atitude científica por meio da atividade prática. Em alguns casos, a ciência surgiu para explicar a tecnologia que havia surgido primeiro, como foi o caso das máquinas a vapor durante a revolução industrial. Assim, ciência e tecnologia se complementam, sem, contudo, haver domínio de uma sobre a outra.

Lemos (2004) explica que, a partir da modernidade, ocorre a substituição da razão substantiva pela razão instrumental, uma transformação radical resultando na independência e institucionalização das esferas da ciência, da moral, da religião e da arte. A técnica passa a ser, irreversivelmente, responsável pelo desenvolvimento das forças econômicas e sinônimo de progresso.

 

TECNOLOGIAS NA CONTEMPORANEIDADE

Considerando a premissa de que a tecnologia transforma a sociedade, na contemporaneidade as tecnologias de informação e comunicação são dotadas deste potencial, ilustrando toda esta potencialidade. Considerando as intensas mudanças tecnológicas, e por consequências sociais, dos últimos setenta anos, Santaella (2003) salienta a importância da criação de novos métodos de análise, com o intuito de compreender as complexidades contidas nessa realidade em mutação.

Com novas práticas sociais e culturais de comunicação, a partir das tecnologias digitais, Lemos (2005) cunha o termo “re-mixagem”, que parte da abundância de informações, passando pelos processos de composição, combinação, colagem, bricolagem, destas informações, apresentando traços de uma nova configuração cultural chamada de “ciber-cultura-remix”.

Como resultante do alcance e da grande quantidade de informações disponíveis ao acesso, nasceu o consumo individualizado que, de acordo com Santaella (2003), foi o responsável pelo surgimento de uma nova cultura, chamada de cultura do acesso, na qual a própria informação passa da posse para o acesso, ou seja, não pode ser conservada, mas sim partilhada, sendo que o responsável pela transmissão da informação não deixa de tê-la ao partilhá-la (Santaella, 2003).

Desta forma, compreende-se que o cenário contemporâneo é uma amálgama técnica, tecnológica, científica e comunicacional, em constante transformação, que abriga em seu bojo, entre tantas outras, mudanças nas formas, mecanismos, padrões e alcance da comunicação. É impensável de esta ciber-cultura-remix, na qual estamos imersos, não afetaria o campo educacional.

 

TECNOLOGIA EDUCACIONAL

A tecnologia educacional parte da premissa da utilização de recursos tecnológicos para auxiliar ou transmitir diretamente conteúdos pedagógicos. Para o entendimento dos conceitos de tecnologia educacional, faz-se necessário o entendimento da teoria ator-rede (TAR) de Bruno Latour. A ideia que rege a TAR é a sintetização da polaridade e tensão existentes entre indivíduo (ator social) e sociedade (sistema social) (Santaella, 2015), ou ainda, entre homem e natureza e entre sujeito e objetos.

No que diz respeito a esta relação entre humanos e objetos (não humanos), Santaella (2015) afirma que a diferença entre humano e não humano é irrelevante do ponto de vista social, uma vez que os não humanos também têm potencial de ação. Isso pode ser notado a partir da percepção da capacidade que os dispositivos da cultura digital possuem de alertar, autorizar ou desautorizar, validar ou invalidar a ação humana.

Isso posto, como consequência das transformações tecnológicas, Santaella (2013) apresenta diferentes modelos de aquisição de conhecimento: processos baseados na tecnologia do livro; a educação a distância; aprendizagem em ambientes virtuais; aprendizagem móvel e aprendizagem ubíqua, sendo esta última caracterizada pelo leitor ubíquo, dotado da capacidade de se orientar por entre os nós da multimídia sem se perder em relação ao espaço físico em que se situa (Santaella, 2013).

Durante a pandemia da Covid-19 foram feitas adaptações, por parte das instituições, nos modelos de ensino baseados na tecnologia educacional. A lousa e giz foram substituídos por videoaulas, ambientes virtuais, aprendizagem móvel e ubíqua. Qual o impacto associado aos estudantes com a aplicação desse novo modelo de ensino? Para Santaella (2013), o perfil cognitivo desse novo tipo de leitor deve ser traçado considerando a constante evolução da internet e das redes sociais. É importante ressaltar que o surgimento de novos tipos de leitores não resulta no desaparecimento de outros. Cada um deles contribui para a formação de leitores com habilidades cognitivas cada vez mais ricas (Santaella, 2013).

A exigência mais evidente na pandemia da Covid-19 foi o distanciamento social. Para Lemos (2021), considerando tal distanciamento, torna-se necessário o desenvolvimento de processos maduros para o uso dos dispositivos tecnológicos. De acordo com o autor, deve ocorrer uma potencialização nas práticas pedagógicas com os professores cumprindo a função de instrutor na busca de informações boas em meio à abundância informacional. Os questionamentos sobre o tema em discussão devem ser potencializados, os alunos capazes de formular respostas e sustentar seus posicionamentos (Lemos, 2021).

Schmitt e Rocha (2022) apresentam um estudo sobre as características, dinâmicas e escolhas utilizadas nas aulas on-line de matemática, que possibilitam a aprendizagem e o sucesso das aulas, visando compreender as várias maneiras de ensino que utilizam ferramentas tecnológicas, porém evidenciando que a interação entre professor e aluno estimula e promove a aprendizagem.

 

METACOGNIÇÃO

A reflexão sobre a própria reflexão, o pensamento sobre o próprio pensamento, a cognição sobre a própria cognição, são algumas definições encontradas para a metacognição, a partir das pesquisas de Flavell (1979). A metacognição pode ser entendida como o conhecimento dos próprios produtos cognitivos, isto é, o conhecimento que o sujeito tem sobre seu próprio conhecimento, habilidades e processos necessários para adquirir novos conhecimentos que envolvem variáveis “pessoa, tarefa e estratégia”.

As interações entre indivíduos e ambientes possibilitam o processo de aprendizagem. Acco e Rosa (2021, p. 348) apontam que “quanto maior o arcabouço metacognitivo do sujeito, maior sua propensão à aquisição dos conhecimentos”, demonstrando que a metacognição é um fator imprescindível para o sucesso da aprendizagem.

A partir do modelo criado por Illeris (2013) para os processos fundamentais para a aprendizagem, o qual propõe que a interação de um sujeito com o ambiente resulta na aprendizagem (ou aquisição), e em Charlot (2000), que entende a aprendizagem como uma relação com o saber, Correa et al. (2021) faz uma analogia, propondo um modelo de metacognição em que a reflexão é feita sobre o processo cognitivo, resultando na metacognição, a reflexão sobre a própria reflexão.

Segundo Corrêa (2023), a aprendizagem cognitiva pode ser entendida como o resultado da interação do indivíduo com o mundo, com o outro e consigo próprio, ao transformar essas experiências em um repertório de conhecimentos disponíveis para próximas interações.

E quando se avança por processos reflexivos mais profundos de conhecimentos explícitos/implícitos, estrutural/semântico, de recordações e reconstruções de informações e processos, envolvendo as experiências de desenvolvimento das aprendizagens e realização de tarefas, a partir do conhecimento conhecido/desconhecido das estratégias, habilidades e processos, então o que está ocorrendo é uma aprendizagem metacognitiva (Corrêa, 2023).

O pensamento metacognitivo promove benefícios educacionais como tomada de consciência sobre os processos cognitivos e capacidade de autorregulação do aprendizado. Peixoto et al. (2007) apresentam benefícios relacionados ao uso da metacognição na educação, como o aumento da capacidade de resolução de problemas, melhora na compreensão de conteúdos e possibilidade de aproximação de conceitos similares ou que tenham conexões, além da evolução da execução de tarefas concretas.

O estudante metacognitivo é capaz de promover o automonitoramento e desenvolver o comportamento cognitivo, que é o responsável pelo aprimoramento da aprendizagem (Correa et al., 2018). A partir destas características buscamos entender o processo metacognitivo dos estudantes no período pós-pandemia e analisar a utilização das tecnologias educacionais em seu processo de aprendizagem.

 

METODOLOGIA

Esta seção é reservada à apresentação dos encaminhamentos metodológicos baseados na ATD, responsáveis pelos resultados e análises dos dados que serão apresentados.

A ATD, inserida no movimento da pesquisa qualitativa, não pretende testar hipóteses para comprová-las ou refutá-las ao final da pesquisa, a intenção é a compreensão, a reconstrução de conhecimentos existentes sobre os temas investigados (Moraes; Galiazzi, 2020, p. 33).

A pesquisa exposta neste artigo foi realizada com estudantes de um curso de Engenharia de Controle e Automação Industrial, de um Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia, os quais foram submetidos à resolução de um questionário metacognitivo, disponibilizado via plataforma Google Docs. As perguntas do questionário buscavam obter dados referentes à capacidade metacognitiva dos estudantes e investigar estratégias adotadas para a aprendizagem no período pós-pandemia da Covid-19.

O que trazemos neste trabalho é uma análise das respostas dos estudantes em cinco questões, onde houve incidência da utilização de termos vinculados à tecnologia educacional. Para organizar a análise foi realizada a transcrição das respostas coletadas no questionário, seguida da busca de palavras relacionadas à tecnologia educacional para a elaboração do corpus. As respostas selecionadas foram codificadas de acordo com os exemplos do Quadro 1.

Quadro 1 – Exemplos da codificação utilizada

Código

Descrição

1NB

resposta da questão 1, do(a) estudante NB;

4C

resposta da questão 4, do(a) estudante C;

3Ma

resposta da questão 3, do(a) estudante Ma;

Fonte: os autores.

Para estruturar a análise foi retomado o processo e estabelecido vínculos para identificar as categorias emergentes, de modo a capturar a percepção e reflexão dos estudantes sobre seus processos de aprendizagem utilizando tecnologias e comportamentos metacognitivos.

 

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Esta seção é reservada à apresentação das respostas obtidas no questionário, sua respectiva categorização e análise pautadas na ATD. Para Moraes e Galiazzi (2020), a categorização envolve a construção de relações de elementos unitários na formação de conjuntos, resultando nos sistemas de categorias.

A Figura 1, apresentada abaixo, demonstra um fragmento da planilha do Excel, de modo a exemplificar como organizamos e realizamos a categorização a partir das categorias emergentes e dos dados coletados.

Texto

Descrição gerada automaticamente com confiança média

Fonte: os autores.

Figura 1 – Fragmento da planilha de análise de dados

 

Na sequência trazemos o Quadro 2, que agrupa respostas de todas as questões pela categoria “Tecnologias Educacionais”, definida pela utilização de recursos tecnológicos para auxiliar nos processos de aprendizagem.

Quadro 2 – Categorização das Tecnologias Educacionais.

Categoria

Descrição

Tecnologias           Educacionais

1M – Assistindo vídeos e com explicação do professor

1W – Videoaula e refazendo exercícios

1K – Tento aprender com as aulas e em casa assistindo videoaulas

2M – Assistir vídeos no YouTube

2Ma – Procurar tirar minhas dúvidas com vídeos no YouTube

2K – Buscando assistir videoaulas em casa

3IH – Assistir aulas, exercícios, resumo, revisão

3C – Fazer vários exercícios, prestar atenção as explicações e ver videoaula

3W – Resolução de exercícios e videoaulas

4M – Assistir vídeos no YouTube

4W – Videoaula e refazer exercícios

5IH – ...utilizo ferramentas digitais para estudar e fazer anotações.

Fonte: os autores.

Na sequência, apresentamos os gráficos e possíveis interpretações resultantes da categorização da primeira questão: “De que forma você aprende Cálculo?”

Fonte: os autores.

Gráfico 1 – Identificação das formas de aprender Cálculo

 

Foi possível verificar maior incidência na categoria “resolução de exercícios” (36%), sinalizando que estes estudantes identificam a percepção da aprendizagem na resolução de exercícios, um sinalizador da estratégia utilizada devido a especificidade da disciplina de Cálculo, vinculada a variável tarefa de Flavell (1979). Também intensamente indicado a categoria “assistindo vídeos” (22%), como uma busca por completar tanto o momento da aula como o momento de resolução de exercícios, devido ao teor dos vídeos, vinculada a variável pessoa na constatação da aprendizagem de Flavell (1979), e sinalizando as transformações tecnológicas ocorridas e constatando os diferentes modelos de aquisição de conhecimento afirmado por Santaella (2013).

Poucos indicaram “anotações”, sinalizando que esta prática possa não acontecer ou não ser importante para a aprendizagem destes depoentes. Já a indicação “não aprendeu” é relevante no sentido da metacognição, visto que tal constatação indica que o sujeito passou por um processo autoavaliativo e identificou a não aprendizagem.

Pudemos observar palavras como “estudando” que, devido à sua característica genérica, demonstra uma declaração não reflexiva, pois não apresenta especificidades sobre como se estuda; com a mesma porcentagem a indicação “explicação do professor”, indicando o momento da aula como momento de aprendizagem.

Após o estudante classificar suas estratégias para o aprendizado da disciplina e Cálculo, perguntamos: “Quais as ações que realiza para aprender Cálculo?”, na perspectiva de entendermos se ele realiza, com consciência, ações que declarou que o auxiliam a aprender Cálculo, para posteriormente questionar qual das ações que realiza; que melhor auxilia no seu processo de aprendizagem e questões que buscam declarações de processos metacognitivos de aprendizagem.

 

Fonte: os autores.

Gráfico 2 – Ações realizadas buscando aprender Cálculo.

 

Assim como na primeira questão, a ação de maior incidência foi a “resolução de exercícios” (37%), característica marcante da disciplina de Cálculo, entendida como uma estratégia metacognitiva específica da natureza da aprendizagem compreendendo a variável tarefa, seguida por “estudando ou revisando” (25%), generalização que sinaliza pouca atividade metacognitiva.

As indicações ”vídeo” e “assistir aula” (13%) são percepções mais específicas, indicando que buscam o mesmo perfil da aula nos vídeos (alguém explicando o conteúdo ou a resolução do exercício), pois percebem que sua aprendizagem acontece nesses momentos; a ação “resumo” (6%) mostra uma especificação do estudo, indicando que percebem que ao produzir o resumo aprendem, características da variável pessoa, referindo-se à forma como percebe, concebe ou entende a respeito do que sabe; e “nenhuma” (6%) pode sinalizar que o estudante não percebe como aprende, pois ele esteve presente em aulas e possivelmente realizou exercícios durante as aulas ou nas atividades propostas, mas considera que não estuda.

Foi evidenciado nas respostas dadas à terceira questão: “Das ações listadas anteriormente, quais considera mais significativas para sua aprendizagem? Justifique.”, que apenas 60% dos respondentes realizaram o formulário de forma reflexiva, pois 40% não relacionaram sua resposta (do que considera mais significativo) com as ações listadas na questão 2. Fizeram utilização de palavras como: estudando, revisando, não demonstrando ações específicas que possibilitariam elencar as mais significativas, ou seja, demonstrando neste momento a ausência da metacognição.

A Figura 2, a seguir, exibe um fragmento da planilha do Excel em que apresentamos, à esquerda: respostas da segunda questão e à direita: respostas da terceira questão.

 

Interface gráfica do usuário, Texto, Aplicativo

Descrição gerada automaticamente

Fonte: os autores.

Figura 2 – Fragmento da planilha de comparação das respostas às questões 2 e 3.

 

A quarta questão procurou investigar o que os estudantes planejam fazer a respeito dos conceitos não aprendidos, visto que alguns sinalizaram na primeira questão que não aprenderam. Essa indagação ocorreu por meio da pergunta: “O que pretende fazer a respeito dos conceitos não aprendidos?”. O Gráfico 3 apresenta a categorização das respostas dadas pelos estudantes.

 

Fonte: os autores.

Gráfico 3 – Estratégias para resolver a não aprendizagem em Cálculo

 

Pudemos observar, nesta quarta questão, um equilíbrio entre a incidência de categorias: “vídeo”, “estudar” e “revisão” com 30% das respostas, e a categoria “melhorar” com 10%. Para a indicação “vídeo” pode-se entender que estes estudantes procuram complementar as aulas com vídeos, como descrito nos excertos: 4Ma – “Procurar tirar minhas dúvidas com vídeos no YouTube”; 4K – “Buscando assistir videoaulas em casa”; 4M – “Assistir vídeos no YouTube”; possivelmente percebem que outras pessoas explicando o mesmo conteúdo (que o professor explicou) pode ser útil para sua aprendizagem, porém não apresentaram esta alegação, demonstrando que a percepção existe, mas ainda não está muito clara para estes estudantes. Enquanto a “revisão” ou “estudar” sinaliza a percepção de que é necessário mais tempo ou mais aprofundamento pessoal com o conteúdo, como nos excertos: 4C – “Fazer até aprender” e 4W – “revisar o conteúdo”.

A quinta questão analisada neste artigo possui como mote a investigação das alterações do ritmo de estudos antes e pós-pandemia, por meio da questão: Seu ritmo de estudo é semelhante ao que tinha antes da pandemia?

 

Fonte: os autores.

Gráfico 4 – Alterações no ritmo de estudo antes e pós-pandemia

 

Foi evidenciado que 42% dos respondentes não realizaram a questão de forma reflexiva, apresentando respostas aleatórias como: 5NB – “sim”; 5J – “não”. Das respostas coerentes com a pergunta, apontaram ter perdido o ritmo dos estudos decorrentes da pandemia ou ao tempo de afastamento do ambiente escolar. Também sinalizaram o uso de ferramentas digitais para o estudo e anotações, como na resposta “5IH”, em que um estudante ressaltou a importância da utilização de ferramentas digitais no estudo e em suas anotações: “Estou estudando muito, utilizo ferramentas digitais para estudar e fazer anotações”.

Tendo como referência o período da pandemia da Covid-19, os estudantes não informaram grandes alterações nas rotinas de estudo, sinalizaram a perda de ritmo e a importância da utilização das tecnologias educacionais como estratégia de estudo no período pós-pandêmico, ou seja, ocorreu o que Lemos (2005) chamou de “ciber-cultura-remix”, uma nova configuração cultural com novas práticas de estudo a partir da utilização das tecnologias digitais, inferimos ainda, a partir de Santaella (2003), que este processo possibilitou e potencializou o nascimento do consumo individualizado de ferramentas digitais, promovendo uma aprendizagem móvel e ubíqua.

Após a análise individual das cinco questões, foi possível categorizar os excertos relacionados às estratégias utilizadas, pelos estudantes, na aprendizagem do conteúdo da disciplina de Cálculo I. Para isso, as categorias estabelecidas anteriormente foram reagrupadas em conjuntos maiores, por exemplo: os termos “videoaula”, “vídeos no YouTube” e “ferramentas digitais” foram reagrupados em “tecnologias educacionais”, os estudantes que não apresentaram comportamento reflexivo nas respostas ou não aprenderam o conteúdo, na categoria “não aprendeu/não reflexivo”. O Gráfico 5, exibe o novo agrupamento das categorias.

Foram quantificados 45 excertos, sendo maior a incidência da categoria relacionada ao uso das tecnologias educacionais (12), seguidas da resolução de exercícios (11), estudando (7), não aprendeu/não reflexivo (7), revisando (5), explicação do professor (2) e anotações (1).

 

Fonte: os autores.

Gráfico 5 – Resultado das estratégias utilizadas para aprender Cálculo.

 

É possível evidenciar a presença marcante das tecnologias educacionais mencionadas, referenciando os vídeos, que se contrapõem às anotações e explicação do professor. Estes estudantes sinalizam perceber a explicação como relevante para o processo de aprendizagem e, portanto, buscam, além da aula, outros sujeitos que possam fazer o papel do professor. Também podemos inferir que esta estratégia foi aprendida ou potencializada no período da pandemia, e incorporada pelos estudantes por identificarem sua importância no processo de aprendizagem, sendo essa escolha uma estratégia metacognitiva, que segundo Corrêa (2023) envolve processos reflexivos mais profundos utilizando das experiências ocorridas durante o processo de aprendizagem (no período da pandemia) e realização de tarefas (pós pandemia), caracterizando-se por uma aprendizagem metacognitiva.

A resolução de exercícios foi intensamente sinalizada como uma estratégia útil ao processo de aprendizagem, ou seja, uma escolha metacognitiva, entendida por Peixoto et al. (2007) como uma capacidade de autorregulação do aprendizado, pois o estudante percebe que aprende ao resolver exercícios e utiliza dessa estratégia.

De maneira genérica, o “estudar” ou “revisar” como sendo formas de aprender, palavras que não sinalizam um processo metacognitivo propriamente consolidado, pois, devido à superficialidade do termo, não é possível entender qual estratégia de estudo foi utilizada, esses termos nos orientam na análise das declarações do sujeito sobre seu processo metacognitivo.

É possível inferir, a partir das categorias emergentes, que a aprendizagem foi percebida como tendo uma grande importância do sujeito que ensina “explica”, quer seja o professor no momento da aula ou nos vídeos, e o sujeito que aprende “estuda”, seja por meio da resolução de exercícios, fazendo revisões ou estudando, sendo capaz de promover o automonitoramento e desenvolver o comportamento cognitivo, que é o responsável pelo aprimoramento da aprendizagem, características de um estudante metacognitivo como afirma Correa et al. (2018).

 

CONCLUSÃO

A natureza abstrata e complexa do cálculo exige estratégias cognitivas específicas, como a “resolução de exercícios”, citada com maior intensidade pelos estudantes quando questionados sobre a ação realizada para aprender Cálculo. Compreender como os estudantes enfrentam os desafios na aprendizagem do Cálculo envolve investigar como a metacognição pode auxiliar na identificação dos fatores que contribuem para o sucesso ou insucesso no processo de aprendizagem, para assim propor intervenções eficazes, que possibilitem o desenvolvimento de habilidades metacognitivas permitindo que os estudantes se tornem autônomos e capazes de gerenciar seu próprio aprendizado.

Por meio deste estudo foi possível observar a utilização das tecnologias educacionais como uma ferramenta metacognitiva intensamente declarada como útil para a aprendizagem de Cálculo. Das questões analisadas neste artigo, emergiram as categorias: tecnologias educacionais, resolução de exercícios, estudando, não aprendeu, revisando, explicação do professor e anotações, que representam as estratégias para aprender cálculo declaradas pelos estudantes. Porém obtivemos cinco respostas não reflexivas ou não coerentes com a pergunta, sinalizando por parte de alguns estudantes a ausência de comportamento metacognitivo.

A explicação do professor em sala de aula e a realização de anotações foram pouco mencionadas como percepção da aprendizagem, já a resolução de exercícios e a utilização de tecnologias educacionais, que incluem a explicação por meio de vídeos, foram bastante citadas, declarações que estão em consonância com as variáveis apresentadas por Flavell (1979), a variável pessoa relacionada a intuição ou crença de como se percebe, concebe ou entende a aprendizagem, assim como a variável da tarefa relacionada a natureza e exigência pertinente a complexidade e característica particular de uma atividade.

Porém, a partir dos dados expostos, a baixa menção do momento da aula se complementou pela utilização dos recursos digitais na utilização de vídeos, o que demonstra não somente a utilização da estratégia de estudo, mas a percepção do processo de aprendizagem, referenciados majoritariamente, a partir da utilização de tecnologias educacionais, como videoaulas, sinalizando como diz Corrêa et al. (2018) a identificação da estratégia e o reconhecimento de que é necessário utilizá-la, envolvendo um pensamento metacognitivo, uma reflexão acerca do processo, da estrutura que deverá ser envolvida para que a aprendizagem aconteça.

Consideramos que os estudantes, ao perceberem que aprendem com determinadas ações, são capazes de promover ajustes no seu comportamento cognitivo visando alcançar a aprendizagem, podemos inferir, a partir das análises realizadas, que os estudantes no período pós-pandemia passaram a utilizar as tecnologias educacionais em seu processo de aprendizagem, por entender que estas complementam o período de sala de aula e favorecem seu processo de aprendizagem, ou seja, passaram a utilizar as ferramentas de aprendizagem utilizadas na pandemia, no período posterior, por considerá-
-las relevantes, tendo, portanto, o comportamento de um aprendiz metacognitivo como afirma Corrêa (2023).

Esse movimento mencionado como “tecnologias educacionais” demonstra a utilização das ferramentas digitais para complementação das explicações em sala realizadas pelo professor, sendo esta, uma constatação dos conceitos apresentados por Lemos (2005) com a “ciber-cultura-remix”, uma nova configuração cultural, e por Santaella (2003), com o consumo individualizado que ocorre com a “cultura do acesso”, e ainda, que essa nova configuração de aprendizagem envolveu o que Santaella (2015) chama de relação entre humanos (estudante) e não humanos (tecnologias educacionais).

Por fim, a partir do exposto neste estudo, foi possível compreender que os processos metacognitivos se fazem presentes, em alguns momentos, na percepção da aprendizagem, e em outros, na escolha da estratégia, ficando evidenciado a busca por complementar o processo de aprendizagem em ambientes digitais externos à instituição de ensino, demonstrando os diferentes modelos de aquisição de conhecimento mencionado por Santaella (2013), estratégias que alimentam o processo de aprendizagem metacognitiva.

Este estudo possibilita o entendimento a respeito dos processos metacognitivos de aprendizagem que envolvem a utilização de tecnologias educacionais, que foram intensificados durante a Pandemia da Covid-19, porém que seguem sendo utilizados mesmo sem a exigência das instituições, o que deduzimos ser um processo resultante de uma reflexão a respeito das estratégias de aprendizagem, a partir das transformações tecnológicas educacionais ocorridas pelas relações entre humanos e não humanos.

Entendemos que novos estudos devem ser realizados para ampliar a compreensão da autonomia dos estudantes no uso de tecnologias educacionais e no desenvolvimento de práticas pedagógicas mais eficazes, incluindo estratégias de ensino metacognitivas por meio de ações pedagógicas capazes de potencializar a autoconsciência dos estudantes, promovendo uma aprendizagem autorregulada.

 

Recebido em: 08/02/2024

Aceito em: 01/08/2024

 

REFERÊNCIAS

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