DOI: 10.36661/2595-4520.2025v8n1.14295
Recebido em: 15/03/2024
Aceito em: 13/11/2025
Oficina Conexões Botânicas: Uma Experiência de Estágio Supervisionado com Estudantes do Ensino Médio
Botanical Connections Workshop: A Supervised Internship Experience with High School Students
Taller de Conexiones Botánicas: Una Experiencia de Pasantía Supervisada con Estudiantes de Secundaria
Laura Ingrid da Silva Gomes (laura.ingridg@ufrpe.br)
Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Campus Recife, Brasil
https://orcid.org/0009-0008-3355-783X
Erinaldo Andrade da Silva (erinaldo.asilva@ufrpe.br)
Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Campus Recife, Brasil
https://orcid.org/0009-0006-9256-7785
Kaline da Silveira Amorim (kaline.amorim@ufrpe.br)
Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Campus Recife, Brasil
https://orcid.org/0009-0000-1060-6442
Irenilda de Souza Lima (irenilda.lima@ufrpe.br)
Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Campus Recife, Brasil
https://orcid.org/0000-0002-0449-0735
Resumo
A formação inicial de professores é caracterizada por um processo de constante reflexão, visando à aplicação prática da teoria e o desenvolvimento de estratégias de ensino e aprendizagem que possibilitem a integração colaborativa dos estudantes ao conhecimento. Nesse contexto, as oficinas pedagógicas surgem como uma relevante estratégia didática para promover a aproximação e interação dos sujeitos na sala de aula. Desse modo, este trabalho tem como objetivo relatar a experiência de graduandos do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas de uma, Universidade Federal no Nordeste brasileiro durante a disciplina de Estágio Supervisionado Obrigatório II. Deste modo, a pesquisa possui natureza básica de abordagem qualitativa caracterizada por ser um Relato de experiência por seu caráter descritivo. Sendo assim, a proposta de intervenção, consistiu na realização da oficina Conexões Botânicas, inserida no evento "Biologia em Ação", organizado pelos estagiários e residentes em uma instituição de ensino na região metropolitana do Recife voltada para estudantes do Ensino Médio. Com base na observação e das indagações feitas aos estudantes por meio de um breve questionário, foi constatado a participação ativa e o estímulo à formação crítico-reflexiva dos discentes no que tange as relações existentes entre a Botânica, história, arte e cultura.
Palavras-chave: Ensino de Botânica; Oficina pedagógica; Ensino de Biologia.
Abstract
The initial training of teachers is characterized by a process of constant reflection, aiming at the practical application of theory and the development of teaching and learning strategies that enable students' collaborative integration into knowledge. In this context, pedagogical workshops emerge as a relevant didactic strategy to promote engagement and interaction among participants in the classroom. Thus, this study aims to report the experience of undergraduate students from the Bachelor's Degree in Biological Sciences program at a Federal University in the Brazilian Northeast during the Supervised Mandatory Internship II course. Therefore, the research has a basic qualitative approach, characterized as an experience report due to its descriptive nature. The intervention proposal consisted of conducting the Botanical Connections workshop, included in the "Biology in Action" event, organized by interns and resident teachers at an educational institution in the metropolitan region of Recife, targeting high school students. Based on observations and student responses from a brief questionnaire, active participation and the stimulation of critical-reflective thinking among students were noted, particularly regarding the relationships between Botany, history, art, and culture.
Keywords: Botany Teaching; Pedagogical Workshop; Biology Teaching.
Resumen
La formación inicial de docentes se caracteriza por un proceso de reflexión constante, orientado a la aplicación práctica de la teoría y al desarrollo de estrategias de enseñanza y aprendizaje que faciliten la integración colaborativa de los estudiantes en el conocimiento. En este contexto, los talleres pedagógicos surgen como una estrategia didáctica relevante para fomentar la aproximación e interacción entre los participantes en el aula. De este modo, este trabajo tiene como objetivo relatar la experiencia de estudiantes de la Licenciatura en Ciencias Biológicas de una Universidad Federal en el Noreste de Brasil durante la asignatura de Práctica Supervisada Obligatoria II. Por lo tanto, la investigación tiene un enfoque cualitativo de carácter básico, definido como un relato de experiencia por su naturaleza descriptiva. La propuesta de intervención consistió en la realización del taller Conexiones Botánicas, incluido en el evento "Biología en Acción", organizado por pasantes y docentes residentes en una institución educativa de la región metropolitana de Recife, dirigido a estudiantes de secundaria. A partir de observaciones y las respuestas de los estudiantes en un breve cuestionario, se evidenció una participación activa y el estímulo del pensamiento crítico-reflexivo en los alumnos, especialmente en lo que respecta a las relaciones entre la Botánica, la historia, el arte y la cultura.
Palabras-clave: Enseñanza de la botánica; Taller pedagógico; Enseñanza de la Biología.
INTRODUÇÃO
O estágio tem um papel fundamental na formação inicial de professores, um tema que tem sido amplamente investigado por pesquisadores na área de Ensino de Ciências, sua importância persiste, pois representa um aspecto essencial no desenvolvimento de competências pedagógicas. De acordo com Assai, Broietti e Arruda (2018) a relevância do estágio vai muito além do que geralmente se imagina, com frequência, o estágio é visto simplesmente como uma etapa a ser cumprida para obtenção do diploma ou como a aplicação prática dos conhecimentos adquiridos durante o curso de formação. Contudo, as pesquisas nesta área nos levam a uma compreensão mais profunda do estágio como um verdadeiro "instrumento pedagógico" na construção do ser professor.
Ao integrar teoria, prática e pesquisa, o estágio supervisionado capacita os professores em formação a refletir e agir diante da diversidade de realidades que perpassam a sociedade, seja no aspecto histórico, cultural ou até mesmo econômico para compreender a dinâmica educacional. Logo, isso implica que os futuros professores precisam estar preparados para enfrentar diferentes desafios e contextos no exercício da profissão (Rocha; Paranhos; Moraes, 2011).
É importante considerar que, segundo Freire (1979), em sua obra "Educação e Mudança", a formação de professores deve ser um processo de diálogo constante entre teoria e prática. "A educação não transforma o mundo; educação muda as pessoas. Pessoas transformam o mundo" (Freire, 1979, p. 84) . Nesse sentido, o estágio não deve ser encarado apenas como uma mera observação do ambiente escolar, mas sim como uma oportunidade para os futuros educadores refletirem criticamente sobre suas experiências, contextualizando-as em fundamentos teóricos sólidos.
A respeito do ensino de Biologia por ser uma matéria mais densa e teórica, muitos acabam desmotivados com a vasta nomenclatura, além disso há uma grande dificuldade por parte dos docentes quanto a diversificação de suas metodologias para fugir de um ensino mais tradicional (Alves; Silva; Reis, 2020).
Nesse contexto, a Botânica ou também chamada Biologia vegetal é um tema que recorrentemente apresenta relatos de dificuldades tanto para professores, quanto estudantes por ser uma área que tem uma diversidade grande de termos e conteúdo, ainda é lecionado de forma mecânica e desinteressante (Costa; Duarte; Gama, 2019). Tendo como consequência manutenção de muito casos do fenômeno ‘’Cegueira Botânica’’ (Wandersee; Schussler, 2001) ou impercepção Botânica (Ursi; Salatino, 2022), como apresentados na literatura (Oliveira; Liesenfeld, 2020; Junior et. al, 2022; Neves, Bundchen; Lisboa, 2019).
Como uma das possibilidades de aprendizagem, podemos listar a elaboração de oficinas pedagógicas, as quais tem como objetivo promover uma maior interação e participação dos estudantes, fazendo jus a dialogicidade defendida por Freire (1987), ademais é feito a interdisciplinaridade que pode existir entre diferentes conteúdos, estimulando um aprendizado crítico e significativo (Mastelari; Zômpero, 2017).
Ao analisarmos a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para a área de Ciências da Natureza no Ensino Médio, observa-se uma valorização da resolução de situações-problema do cotidiano e da compreensão das teorias científicas em interface com aspectos sociais, culturais e ambientais. No entanto, estudos como os de Noal, Pires, Rosa e Ceschini (2022); Leite e Meirelles (2023) evidenciam um processo de apagamento dos conteúdos de Botânica nesse documento normativo. Segundo os autores, a abordagem transversal proposta pela BNCC, embora promova certa interdisciplinaridade, acaba por diluir e enfraquecer o espaço dedicado ao ensino sistemático das plantas, tornando essa área ainda mais negligenciada no contexto escolar.
Diante desse cenário, cabe ao professor buscar e adotar métodos e estratégias que possam colaborar para tal desenvolvimento intelectual e holístico dos estudantes (Galvão; Casimiro, 2023) já que outro ponto importante é reconhecer e incluir os conhecimentos tradicionais e do cotidiano, a fim de explorar a relação do homem com a natureza de maneira mais integrada, promovendo um ensino contextualizado como bem destaca Ursi, Barbosa, Sano e Berchez (2018) acerca dos conhecimentos botânicos.
Em síntese, discutir e propor metodologias que favoreçam o ensino de Botânica constitui uma mobilização fundamental para o fortalecimento do Ensino de Ciências e da Educação Ambiental. Apesar da importância desse campo para a compreensão dos processos ecológicos e para a valorização da biodiversidade, a Botânica ainda ocupa um espaço reduzido na produção científica voltada ao ensino, com baixa representatividade nos principais periódicos da área (Leopoldo; Bastos, 2019). Tendo isso em vista, ao criarmos oportunidades nas quais os estudantes atribuam sentido e significado ao conteúdo estudado contribui não apenas para o engajamento na aprendizagem, mas também para o desenvolvimento de uma consciência crítica diante das problemáticas ambientais contemporâneas.
Nesse enfoque, este artigo tem como objetivo relatar a experiência de uma oficina realizada como parte do componente curricular Estágio Supervisionado Obrigatório II (ESO II) do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas de uma Universidade Federal no Nordeste brasileiro com estudantes de diferentes anos do Ensino Médio. A atividade mencionada teve como tema a interseção entre arte, história e plantas, visando proporcionar uma abordagem diversificada que explorasse a morfologia básica dos grupos de plantas e estimulasse uma reflexão crítica sobre as relações étnico-raciais, arte e Botânica.
A presente pesquisa possui natureza básica e abordagem qualitativa, caracterizando-se como um estudo descritivo do tipo relato de experiência (Gil, 2008). De acordo com Daltro e De Faria (2019), essa modalidade de estudo permite que os autores, imersos em determinado contexto, compartilhem suas vivências a partir de sua própria perspectiva, ancoradas em uma fundamentação teórica que assegura o rigor científico da narrativa.
A experiência apresenta relevância significativa para docentes atuantes no ensino de Ciências e Biologia, especialmente àqueles interessados na área da Botânica. O objetivo central deste estudo foi aprofundar, à luz da teoria, uma prática pedagógica desenvolvida em ambiente escolar, surgida de forma espontânea a partir de demandas do contexto educativo. Ressalta-se que a investigação não envolveu coleta de dados que permitissem a identificação dos participantes, estando, portanto, em conformidade com o Art. 1º, parágrafo único, item VII da Resolução nº 510, de 07 de abril de 2016, que regulamenta pesquisas nas áreas de Ciências Humanas e Sociais. Nesses casos, os procedimentos metodológicos não exigem registro ou apreciação pelo sistema CEP/CONEP (Resolução n° 510 /2016).
A oficina pedagógica intitulada “Conexões Botânicas: Plantas, História e Arte” foi realizada em uma escola de Ensino Médio que dispõe de ampla infraestrutura voltada à formação técnica profissional, oferecendo salas de aula diversificadas, laboratórios multidisciplinares e um amplo espaço verde. Nesse espaço foi proposto uma oficina foi direcionada à Botânica, área de grande afinidade para os autores, além disso a escolha foi também motivada pela escassez de práticas relacionadas ao seu ensino.
A divulgação da oficina ocorreu por meio de um formulário de inscrição no Google Forms, resultando em 26 participantes inscritos para a data proposta. Não houve delimitação por série, uma vez que os conteúdos e atividades foram planejados de forma acessível a todos os níveis do Ensino Médio. A oficina teve duração de quatro horas e foi previamente discutida com o professor supervisor da instituição, que incentivou a participação dos estudantes e autorizou a atribuição de pontos extras na nota da unidade como forma de valorização do envolvimento dos estudantes.
Para fins de análise da percepção dos participantes, foi disponibilizado ao final da oficina um questionário elaborado na plataforma Google Forms, contendo quatro questões. Embora 26 estudantes tenham participado da atividade, apenas 21 responderam ao questionário, cujas respostas foram utilizadas para reflexão sobre os impactos e contribuições da experiência vivenciada. Assim, nosso relato está organizado em duas seções: 1) A oficina como estratégia para aproximar os estudantes da Botânica e 2) Percepção dos estudantes sobre a oficina e a integração entre Botânica e saberes culturais.
A OFICINA COMO ESTRATÉGIA PARA APROXIMAR OS ESTUDANTES DA BOTÂNICA
Como caracterizam Schelb e Lopes (2024), oficinas pedagógicas configuram-se como estratégias potentes no ensino de Botânica, uma vez que permitem a construção do conhecimento de forma contextualizada e dialógica. Ao promoverem a articulação entre os conteúdos escolares e as vivências cotidianas dos estudantes, essas práticas favorecem o desenvolvimento de uma aprendizagem mais significativa, na medida em que despertam o interesse, a curiosidade e o reconhecimento da Ciência como algo presente em suas realidades.
Essa resposta positiva dos estudantes, especialmente no momento em que se reconheciam nas representações culturais associadas às plantas, reforça o que apontam Ursi, Barbosa, Sano e Berchez (2018), ao destacarem que estratégias que integram o ensino de Botânica e elementos culturais podem favorecer o encantamento com o mundo natural. Na oficina, esse encantamento se manifestou na curiosidade crescente dos discentes e no envolvimento progressivo com os temas trabalhados, o que sugere que a presença de conteúdos culturais ampliou o interesse e contribuiu para uma abordagem mais apreciável da Botânica.
Após essa etapa, exploramos o aspecto histórico da cultura botânica, discutindo o uso das plantas por povos indígenas e compartilhando lendas relacionadas, como a do açaí que, surpreendentemente, nenhum dos participantes afirmou conhecer. Em seguida, os estudantes foram convidados a compartilhar suas próprias experiências e memórias relacionadas às plantas, incluindo referências da mídia que se tornaram mais perceptíveis após essa abordagem.
Nessa direção, Salatino e Buckeridge (2016) ressaltam que lendas e mitos sobre a origem das plantas, amplamente difundidos entre populações indígenas, podem atuar como poderosos recursos didáticos, despertando a curiosidade e o interesse dos estudantes não apenas pelas plantas em si, mas também pelos aspectos culturais, simbólicos e morfológicos que elas carregam.
Aproveitando essa interação, procuramos manter o foco dos estudantes durante toda a oficina, para evitar que o ritmo da atividade fosse perdido, concedemos um intervalo de 10 minutos antes de iniciarmos a segunda parte. Em seguida, para avaliar a absorção do conteúdo de forma dinâmica, organizamos um jogo rápido, no qual os discentes foram divididos em quatro grupos para identificar e completar as partes de uma flor monoica. Os grupos que acertassem mais e concluíssem a tarefa mais rapidamente seriam premiados com um brinde, a maioria dos grupos teve sucesso, embora alguns tenham encontrado dificuldades em lembrar das estruturas femininas e masculinas.
Posteriormente, saímos do laboratório para coletar algumas plantas para observação em lupa, a fim de detalhar e visualizar suas estruturas. Durante essa atividade, os estudantes demonstraram interesse e fizeram perguntas sobre várias estruturas observadas, como a cor da parte abaxial das folhas de Tradescantia spathacea e os pontos marrons nas samambaias que também ficam inferiormente em suas folhas. Ao final da oficina, muitos discentes expressaram ter gostado da experiência de observar de perto estruturas que não seriam visíveis a olho nu, como o pólen da flor do hibisco. Considerando tal fato concluímos que essa interação proporcionou um momento enriquecedor em nossa prática pedagógica, pois foi um momento enriquecedor não apenas pelo engajamento dos estudantes, mas também pela possibilidade de experimentar uma abordagem mais dinâmica e sensível para o ensino de Botânica algo que, muitas vezes, é tratado de forma excessivamente teórica.
A PERCEPÇÃO DOS ESTUDANTES SOBRE A OFICINA E A INTEGRAÇÃO ENTRE BOTÂNICA E SABERES CULTURAIS
A fim de compreender os impactos da oficina e as percepções construídas pelos estudantes, foi aplicado um questionário ao final das atividades. A primeira pergunta teve como objetivo investigar se eles já haviam tido contato com o conceito de "cegueira ou impercepção botânica", definido por Wandersee e Schussler (2001). Como mostra o Gráfico 1, a maioria dos participantes relatou desconhecer o termo.

Fonte: Autores, (2024)
Essa ausência de familiaridade com o conceito reforça o argumento de Salatino e Buckeridge (2016), que apontam como a invisibilidade das plantas na vida cotidiana é um reflexo tanto de práticas pedagógicas pouco atrativas quanto de um imaginário social que privilegia o estudo de animais. Ao inserir discussões sobre cultura, arte e saberes tradicionais, a oficina buscou ampliar essa percepção, promovendo uma experiência sensível e contextualizada, como também defendem Ursi, Barbosa, Sano e Berchez (2018).
Além disso, um dos momentos de maior engajamento foi a observação em lupa de estruturas como soros de samambaias e pólen de hibisco. Segundo Silva e Ghilardi-Lopes (2014), o contato direto com os vegetais em atividades práticas contribui significativamente para a construção de conhecimentos botânicos. Isso se confirmou quando, ao final, muitos estudantes relataram encantamento com os detalhes observados, geralmente imperceptíveis a olho nu.
Outro aspecto relevante da oficina foi a integração entre o conhecimento científico e os saberes tradicionais e culturais sobre as plantas, especialmente no que se refere às práticas de povos indígenas e afro-brasileiros. Questionou-se se os estudantes já haviam tido contato com os temas tratados:

Fonte: Autores, (2024)
Esse dado revela a ausência de abordagens interdisciplinares no ensino formal, apesar das diretrizes da BNCC indicarem a necessidade de considerar contextos sociais, culturais e ambientais no processo de ensino e de aprendizagem. De acordo com Panteleão e Batitucci (2022), o ensino de Ciências deve incluir saberes marginalizados pela ciência moderna, reconhecendo a contribuição de diferentes povos no uso e conhecimento das plantas.
O gráfico a seguir mostra que os estudantes avaliaram positivamente a discussão cultural proposta na oficina, o que aponta a potência dessa abordagem para enriquecer o ensino de Botânica.

Fonte: Autores, (2024)
E a última pergunta deixamos o espaço aberto para os estudantes falarem sobre suas considerações sobre a discussão da temática da oficina. Dado o seguinte questionamento: ‘’Na discussão sobre relações étnico-raciais e a Botânica, que aspecto você considera mais relevante ou impactante?’’ As falas destacadas a seguir ilustram a profundidade das percepções construídas durante a atividade:
E1:‘’ A relação entre o ser humano e o ser humano e a natureza; já que achamos que somos donos do mundo e podemos fazer o que bem entenderemos; mas não é exatamente assim. achei muito coerente e bem pontuado isso durante a oficina.’’
E2: ‘’ As comunidades indígenas tem forte ligação com a Botânica, eles são responsáveis por inúmeros conhecimentos das plantas medicinais, culinárias etc., eles são e foram importantes para a distribuição desse conhecimento’’
E3: ‘’ O que mais me interessou foram as relações étnico-raciais que se conectam, o uso das plantas pelos povos africanos e afro-brasileiros, que têm um conhecimento ancestral e tradicional sobre as propriedades e os usos das plantas, tanto para fins terapêuticos, como para rituais religiosos, como o candomblé e a umbanda. Informações essas que pouco eram de meu conhecimento.’’
E4: ‘’ O que eu considero mais relevante é a importância de integrar o conhecimento tradicional das comunidades étnicas sobre plantas na pesquisa Botânica, visando preservar a biodiversidade, promover a saúde e garantir uma colaboração inclusiva e ética entre a ciência e os saberes ancestrais.’’
Essas respostas demonstram que os estudantes não apenas compreenderam os conteúdos, mas também desenvolveram uma consciência crítica sobre a relação entre cultura, história e modo de vida que entrelaçam com o conhecimento científico. Como evidenciam Crepalde, Klepa, Halley e Sousa (2021) de fato, ao valorizar o diálogo entre diferentes formas de saber, o ensino se torna mais inclusivo, reflexivo e contextualizado.
Essas colocações demonstram que os estudantes passaram a valorizar não só o conteúdo aprendido, mas também a importância de sua contextualização social e cultural. Assim, entende-se que propostas didáticas que integrem os saberes tradicionais ao ensino de Botânica contribuem para a formação de sujeitos mais críticos, éticos e conscientes de seu papel na sociedade. Essa experiência, portanto, sinaliza caminhos promissores para práticas futuras mais dialógicas, interdisciplinares e sensíveis no ensino de Botânica.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente experiência reforça a importância de se repensar o ensino de Botânica no contexto da Educação em Ciências e da Educação Ambiental. As plantas, embora muitas vezes invisibilizadas no cotidiano, estão presentes em diversos aspectos da vida humana desde a alimentação e os produtos utilizados diariamente até as dinâmicas culturais e sociais associadas ao seu uso. Dessa maneira, ensinar e aprender Botânica, contribui para a formação de uma consciência crítica diante de problemáticas atuais, como a destruição dos ecossistemas, a escassez de alimentos e as mudanças climáticas.
Durante o planejamento e a aplicação da oficina, percebemos o quanto é possível tornar o ensino de Botânica mais acessível e atrativo quando se considera a realidade e os saberes dos estudantes. Embora não tenhamos enfrentado grandes dificuldades na execução, lidamos com limitações relacionadas aos recursos financeiros, o que nos levou a adaptar algumas propostas iniciais, como a ideia de extração de tintas naturais de flores e frutos. Porém, esse redirecionamento exigiu flexibilidade e nos ensinou sobre a importância de manter o foco nos objetivos principais da intervenção, que foram plenamente alcançados mesmo com atividades mais simples.
Os resultados obtidos evidenciaram que a tentativa de contextualizar o ensino de Botânica por meio de elementos culturais e artísticos foi bem-sucedida, as falas dos estudantes destacaram a relevância do tema e o valor do formato da oficina como uma abordagem diferenciada. Para nós, foi especialmente gratificante perceber como a proposta favoreceu esse diálogo e o quanto ainda pode-se ampliar esse tema com outras metodologias e recursos.
Portanto, diante dessa vivência, reafirmamos o quanto o estágio supervisionado representa uma etapa fundamental na formação docente. Mais do que um espaço de aplicação de conteúdos, ele se constitui como uma oportunidade para experimentar, criar e refletir sobre práticas pedagógicas que desejamos levar para nossas futuras atuações como professores. Assim, esperamos que docentes e licenciandos sintam-se inspirados a pensar nessas interconexões com outras áreas da Biologia com assuntos sociais e culturais visando uma integração de saberes formativos na construção de sujeitos protagonistas.
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