Necessidades formativas para o ensino de Ciências na Educação do Campo: um estudo a partir de seminários internacionais

Training needs for Science teaching in rural education: a study from international seminars

Necesidades de formación para la docencia de las ciencias en la educación del campo: un estudio de seminarios Internacionales

 

 

Sara Jane Lima da Silva (sarahlima05134.sl@gmail.com, Universidade Federal do Piauí – UFPI), https://orcid.org/0000-0002-6906-8834

Suzana Gomes Lopes (sglopes@ufpi.edu.br, Universidade Federal do Piauí – UFPI), https://orcid.org/0000-0001-9071-9585

Alexandre Leite dos Santos Silva (alexandreleite@ufpi.edu.br, Universidade Federal do Piauí – UFPI), http://orcid.org/0000-0002-8239-9240

 

Resumo

As necessidades formativas podem ser definidas como saberes percebidos ou não pelos professores, que são demandados no processo de ensino. A sua identificação pode contribuir para reflexões e discussões sobre os processos de formação inicial e continuada de professores, bem como para a formulação de políticas educativas. O objetivo deste trabalho é compreender as necessidades formativas dos professores de Ciências para o ensino dentro da realidade camponesa. Para isso, foi realizada a Revisão Sistemática de Literatura dos trabalhos publicados nas edições do Seminário Internacional e Fórum de Educação do Campo, por este ser um evento de projeção nacional e internacional com foco nas discussões sobre a Educação do Campo. A análise seguiu as etapas da Análise Textual Discursiva. Os resultados apontaram necessidades formativas, destacando-se a de saber contextualizar o ensino e a adoção de metodologias alternativas.

 

Palavras-chave: Educação no Campo; Formação de professores; Educação em Ciências.

 

Abstract

Training needs can be defined as knowledge perceived or not by teachers, which is required in the teaching process. Their identification can contribute to reflections and discussions on the processes of initial and continuing teacher training, as well as to the formulation of educational policies. The objective of this work is to understand the training needs of Science teachers for teaching within the rural context. To this end, a Systematic Literature Review of the works published in the editions of the International Seminar and Rural Education Forum was carried out, as this is an event of national and international importance focusing on discussions about Rural Education. The analysis followed the steps of Discursive Textual Analysis. The results highlighted training needs, highlighting the need to contextualize teaching and the adoption of alternative methodologies.

Keywords: Rural Education; Teacher training; Science Education.

 

Resumen:

Las necesidades de formación pueden definirse como los conocimientos percibidos o no por los docentes, que se requieren en el proceso de enseñanza. Su identificación puede contribuir a reflexiones y discusiones sobre los procesos de formación inicial y continua de docentes, así como a la formulación de políticas educativas. El objetivo de este trabajo es comprender las necesidades de formación de docentes de Ciencias para la enseñanza dentro de la realidad campesina. Para ello, se realizó una Revisión Sistemática de la Literatura de los trabajos publicados en las ediciones del Seminario Internacional y Foro de Educación Rural, por ser este un evento de importancia nacional e internacional centrado en las discusiones sobre Educación Rural. El análisis siguió los pasos del Análisis Textual Discursivo. Los resultados resaltaron las necesidades de capacitación, destacando la necesidad de contextualizar la enseñanza y la adopción de metodologías alternativas.

 

Palabras clave: Educación Rural; Formación de profesores; Enseñanza de las ciencias.

 

INTRODUÇÃO

A análise das necessidades formativas teve início na década de 1960 nos Estados Unidos da América e desde então contribuem para a formulação de políticas educativas (Fernandez, 1991). Podem ser definidas como saberes percebidos ou não pelos professores, que são demandados no processo de ensino (Carvalho; Gil-Pérez, 2011). A identificação e compreensão delas é imprescindível para direcionar reflexões e discussões sobre os processos de formação inicial e continuada de professores (Maknamara, 2020).

Na confluência entre as áreas de Ensino de Ciências e Educação do Campo, o estudo das necessidades formativas docentes é relevante devido à exiguidade da produção (Silva; Lopes; Takahashi, 2021). Esse tipo de estudo pode contribuir para encaminhamentos com efeitos na educação científica de uma parcela significativa da população, composta por agricultores familiares, indígenas, quilombolas, ribeirinhos, trabalhadores rurais assalariados etc. Estima-se que a população camponesa seja composta por cerca de 30 milhões de pessoas no Brasil (IBGE, 2011).

Diante desse quadro, ensejamos, com este artigo, compreender as necessidades formativas dos professores de Ciências para o ensino dentro da realidade camponesa a partir da análise de trabalhos publicados em edições do Seminário Internacional e Fórum de Educação do Campo – SIFEDOC, por este ser um evento de projeção nacional e internacional com foco nas discussões sobre a Educação do Campo. Embora tenha-se encontrado algumas revisões de literatura sobre o ensino de Ciências no contexto camponês (Halmenschlager et al., 2017; Silva et al., 2019), elas não eram voltadas de forma específica para a identificação de necessidades formativas e não contemplavam o SIFEDOC como fonte de dados.

Assim sendo, este trabalho se ocupou com o problema: quais as necessidades formativas docentes para o ensino de Ciências no contexto da Educação do Campo? Para respondê-lo, este texto está sequenciado da seguinte forma, após a introdução: Educação do Campo e do SIFEDOC, situando a sua importância para esta pesquisa; considerações teóricas quanto aos estudos sobre necessidades formativas; aspectos metodológicos adotados neste trabalho; resultados e discussões; e, por fim, considerações finais.

 

FUNDAMENTOS DA EDUCAÇÃO DO CAMPO

A Educação do Campo refere-se a uma modalidade de ensino voltada para a formação de crianças, jovens e adultos que vivem no campo. Trata-se também de um paradigma que atua na luta para que milhares de pessoas que vivem fora das áreas urbanas tenham direito à educação de qualidade (Brasil, 2006). Ela é amparada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Brasil, 1996), pelas Diretrizes Operacionais para a Educação Básica das Escolas do Campo (Brasil, 2002), pelo Decreto n.º 7.352, de 04 de novembro de 2010 (Brasil, 2010), e pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica (Brasil, 2013). A alusão à educação para o camponês nesses documentos normativos é o resultado de lutas em reação ao processo de exclusão social a que este foi submetido no seu direito à educação. Resultam de reivindicações por políticas públicas que garantem não apenas o acesso à escola, mas o direito a uma educação no/do campo, isto é, que contemple os interesses e necessidades dos trabalhadores do campo.

Nessa direção, a Educação do Campo contém princípios (Brasil, 2004) que podem nortear os modos de ser e fazer nas escolas do campo. Eles apontam para um ensino que dialoga com os saberes e as vivências da população camponesa, considerando as suas peculiaridades locais e regionais (Ferreira; München, 2020).

Além de princípios, a Educação do Campo também é caracterizada por seus referenciais como a pedagogia socialista, a pedagogia do movimento e a pedagogia do oprimido (Caldart, 2012). Outro referencial pedagógico é a pedagogia da alternância, adotada pelos Centros Familiares de Formação por Alternância – CEFFAs e Cursos de Licenciatura em Educação do Campo – LEdoCs. A pedagogia da alternância “articula a vida cotidiana dos estudantes e suas famílias com a teoria e a prática, alternando tempos e espaços educativos” (Conte, 2022, p. 3). Comumente, esses tempos e espaços são representados pelo tempo-escola – com aulas e atividades realizadas na instituição em regime de internato – e pelo tempo-comunidade – com atividades realizadas na propriedade familiar/comunitária ou no ambiente socioprofissional.

 

NECESSIDADES FORMATIVAS DOCENTES

Existem diversas definições para as necessidades formativas: a lacuna entre um estado real e um ideal; os desejos e carências percebidos pelos próprios sujeitos da formação; um conjunto de atividades fundamentais para o desenvolvimento profissional; e, por fim, uma condição não satisfeita e imprescindível para que um indivíduo, grupo ou sistema atinjam determinado objetivo (Lopez, 2017). Essas diferentes definições têm relação com as concepções dos pesquisadores quanto ao conceito “necessidade”. Assim, podem ser associadas tanto a saberes como a recursos para o estabelecimento de certas condições.

A tipologia das necessidades formativas é vasta (Rodrigues; Esteves, 1993), mas gostaríamos de destacar a de D’Hainaut (1979) devido ao seu caráter dialético. Para o autor, existem necessidades das pessoas e dos sistemas, particulares e coletivas, conscientes e inconscientes, atuais e potenciais. As necessidades também podem ser de determinado campo, como o familiar, o político, o social, o cultural, o profissional, o desportivo etc.

Carvalho e Gil-Pérez (2011), ao estudarem sobre a formação de professores de Ciências no contexto ibero-americano, com base em resultados da pesquisa didática, identificaram oito necessidades formativas. São elas: conhecer a matéria a ser ensinada; questionar as ideias docentes de senso comum; adquirir conhecimentos teóricos sobre a aprendizagem em Ciências; saber analisar criticamente o ensino tradicional; saber preparar atividades capazes de gerar uma aprendizagem efetiva; saber dirigir o trabalho dos alunos; saber avaliar; adquirir a formação necessária para associar ensino e pesquisa didática. Contudo, essas necessidades não foram elencadas com o objetivo de considerar as especificidades e os pressupostos da Educação do Campo.

Silva, Lopes e Takahashi (2021), em um estudo na perspectiva dialética sobre as necessidades formativas de educadores do campo para o ensino de Ciências, destacaram as exigências de saberes sobre a Educação do Campo e de contextualização do ensino. Chegaram a essa conclusão com base na análise documental e em entrevistas, questionários e formulários aplicados a diversos grupos de sujeitos interessados no ensino de Ciências em escolas do campo da rede pública de um município nordestino.

Não existe uma fórmula única para a análise das necessidades formativas docentes. Assim, na literatura encontramos diversos modelos, geralmente estruturados nas etapas de diagnóstico, análise e avaliação (López, 2017). Além de modelos, as análises também podem variar quanto às abordagens, que dependem de quem expressa as necessidades formativas, como os próprios professores, especialistas em Educação, informantes-chave, membros de determinada comunidade ou por levantamentos mais amplos (Rodrigues; Esteves, 1993).

Quanto às técnicas de análise, também há variedade. São comumente utilizadas a observação, a entrevista, o questionário, a pesquisa bibliográfica e a pesquisa documental – registros e relatos (Steadham, 1980). Segundo Rodrigues e Esteves (1993), ao pontuarem como técnica o uso de materiais impressos – muitos disponíveis no formato digital –, referenciam, também, a inclusão de trabalhos de especialistas. Nesse sentido, Carvalho e Gil-Pérez (2011) usaram resultados de pesquisas para traçar um conjunto de necessidades formativas para professores de Ciências.

 

METODOLOGIA

Nessa seção, trataremos das fontes, da coleta e da análise dos dados.

Os seminários internacionais como fonte de dados

Os Seminários Internacionais e Fóruns de Educação do Campo – SIFEDOCs[1] emergiram há mais de dez anos. A primeira edição do SIFEDOC foi em novembro de 2012 em Pelotas (RS), coordenada pela Universidade Federal de Pelotas – UFPel. A segunda edição foi realizada em outubro de 2014, em Santa Maria (RS), coordenada pela Universidade Federal de Santa Maria – UFSM. A terceira edição ocorreu em março de 2017 em Erechim (RS), coordenada pela Universidade Federal de Fronteira do Sul – UFFS. Esses seminários internacionais foram precedidos por seminários regionais, ocorridos na região Sul do Brasil. O evento é relevante, pois tem projeção nacional e internacional e focaliza as discussões sobre a Educação do Campo (SIFEDOC, 2012).

O evento se caracteriza “como um espaço permanente de produção teórica e de análise da atualidade e de práticas sobre a Educação do Campo, visando qualificar os processos educativos na direção de uma educação que vá ao encontro dos interesses dos trabalhadores, quer aconteça na escola pública ou nos espaços não formais” (SIFEDOC, 2014, p. 7). Dito isso, os trabalhos publicados no SIFEDOC assumem um papel representativo em nível nacional e internacional na exposição de práticas de ensino e pesquisas no âmbito da Educação do Campo. Por isso, os anais das edições desse evento foram escolhidos como base de dados desta investigação.

Coleta dos dados

A pesquisa constituiu-se em uma revisão sistemática de literatura – RSL, que “se refere ao processo de reunião, avaliação crítica e sintética de resultados de múltiplos estudos” (Costa; Zoltowski, 2014, p. 53). Com esse método, pretende-se otimizar o potencial de busca e de organização dos resultados de várias pesquisas, e realizar um trabalho crítico-reflexivo e menos enviesado do material levantado. A RSL “é crucial, pois nos ajuda a organizar, analisar criticamente e levantar evidências mais sólidas, ou seja, integrar o número cada vez maior de peças do complexo quebra-cabeça da produção científica” (Costa; Zoltowski, 2014, p. 65). Essa metodologia foi adotada por ser um tipo de pesquisa bibliográfica, técnica já utilizada nas análises das necessidades formativas (Steadham, 1980).

A RSL pode ser realizada por meio das seguintes etapas, na coleta de dados: (i) delimitação do problema de pesquisa; (ii) escolha das fontes de dados; (iii) eleição das palavras-chave para a busca; (iv) busca e armazenamento dos resultados; (v) seleção de artigos de acordo com critérios de inclusão e exclusão (Costa; Zoltowski, 2014).

O quadro a seguir sintetiza como essas etapas foram definidas neste trabalho:

 

Quadro 1 – Detalhamento das etapas da RSL

1

Definição do problema

Quais as necessidades formativas dos professores de Ciências no contexto campesino?

2

Escolha das fontes dos dados

Anais das três edições do SIFEDOC em arquivos digitais.

3

Seleção das palavras-chave

Ciências, Ensino de Ciências, Ciência da Natureza.

4

Busca e armazenamento

A busca foi realizada primeiramente por meio da leitura dos títulos, resumos e palavras-chave dos trabalhos, com arquivos digitais armazenados em disco rígido.

5

Seleção dos artigos

Foram selecionados os trabalhos que tratassem em suas conclusões de saberes e conhecimentos dos professores de Ciências e/ou para o ensino de Ciências.

Fonte: Dados da pesquisa (2020).

 

A pesquisa, realizada em agosto de 2020, envolveu as seguintes estratégias de busca nos anais das três edições do evento: (i) nos anais on-line da primeira edição do evento (Sifedoc, 2012), foram procuradas as palavras-chave “Ciências”, “Ensino de Ciências”, “Ciência da Natureza” nos títulos, resumos e palavras-chave dos trabalhos, assim selecionados; (ii) nos anais em arquivos em Portable Document Format – PDF da segunda e terceira edições do evento (Sifedoc, 2014; 2017), as palavras-chave foram inseridas na ferramenta de busca – com o uso do atalho CTRL+F – para a identificação e seleção dos trabalhos.

Após a seleção dos trabalhos que continham as palavras-chave, estes foram submetidos a uma leitura flutuante. Buscou-se aqueles que tratassem de saberes necessários para os professores de Ciências e/ou para o ensino de Ciências. Nessa etapa, apenas os trabalhos que explicitam tais saberes em suas conclusões foram incluídos (Quadro 02).

 

Quadro 2 – Trabalhos selecionados e avaliados (continua)

Código

Trabalho

T1

SILVA, A. F. et al. A produção leiteira em Passos Maia como tema gerador de um projeto comunitário. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL E FÓRUM DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, 2, 2014, Santa Maria, RS. Anais [...] Santa Maria, RS: UFSM, 2014. p. 1086-1099.

T2

PEREIRA, E. L. Metodologia do ensino de ciências em uma escola do campo em Barracão. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL E FÓRUM DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, 2, 2014, Santa Maria, RS. Anais [...] Santa Maria, RS: UFSM, 2014. p. 2276-2295.

T3

BIERHALZ, C. D. K.; RIGON, A.; SEMINOTTI, J. J. Análise da concepção metodológica da Licenciatura em Educação do Campo: Unipampa - Dom Pedrito. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL E FÓRUM DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, 2, 2014, Santa Maria, RS. Anais [...] Santa Maria, RS: UFSM, 2014. p. 2692-2703.

T4

BRICK, E. M.; BRITTO, N. S. Q. Investigação temática freireana no contexto da Licenciatura em Educação do Campo da UFSC: transposições preliminares. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL E FÓRUM DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, 2, 2014, Santa Maria, RS. Anais [...] Santa Maria, RS: UFSM, 2014. p. 2704-2713.

T5

FERREIRA, D. F. et al. O ensino de ciências no contexto de comunidades tradicionais na Ilha dos Marinheiros: uma análise sobre os saberes de mundo aplicados no ensino de ciências na educação de jovens e adultos. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL E FÓRUM DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, 2, 2014, Santa Maria, RS. Anais [...] Santa Maria, RS: UFSM, 2014. p. 3359-3373.

T6

PIOTROWSKI, C. L.; PRSYBYCIEM, M. M.; OLIVEIRA, R. P. As percepções de um professor de Ciências em uma escola do campo: formação inicial e construção do currículo escolar. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL E FÓRUM DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, 3, 2017, Erechim, RS. Anais [...] Erechim, RS: UFFS, 2017. p. 812-821.

T7

CAVALHEIRO, D. M.; RODRIGUES, E. B.; DUSO, L. A escola do campo como espaço emancipatório: diálogos em construção. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL E FÓRUM DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, 3, 2017, Erechim, RS. Anais [...] Erechim, RS: UFFS, 2017. p. 971-977.

T8

CEOLIN, T.; GOMES, A. T. Análise de produções textuais de licenciandos em Educação do Campo acerca dos princípios metodológicos no ensino de Ciências. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL E FÓRUM DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, 3, 2017, Erechim, RS. Anais [...] Erechim, RS: UFFS, 2017. p. 1047-1057.

T9

CHAGAS, C.; SANTOS, CELINA. Educação do campo e a elaboração de situações problema – Reflexões a partir do componente curricular “Leis Físicas do Movimento”. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL E FÓRUM DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, 3, 2017, Erechim, RS. Anais [...] Erechim, RS: UFFS, 2017. p. 1111-1120.

T10

OLIVEIRA, H. J.; FREITAS, E. C.; CRUZ, B. C. Currículo de Ciências e Educação do Campo: desafios encontrados nas práticas docentes. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL E FÓRUM DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, 3, 2017, Erechim, RS. Anais [...] Erechim, RS: UFFS, 2017. p. 1121-1130.

T11

MISZEWSKI, C.; DARTORA, V. Uma experiência interdisciplinar no ensino de Ciências em escola do campo. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL E FÓRUM DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, 3, 2017, Erechim, RS. Anais [...] Erechim, RS: UFFS, 2017. p. 1199-1206.

T12

FAENELLO, P.; MISZEWSKI, C. Aedes aegypti no contexto de uma comunidade do campo: experiência da primeira intervenção no estágio. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL E FÓRUM DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, 3, 2017, Erechim, RS. Anais [...] Erechim, RS: UFFS, 2017. p. 1207-1215.

T13

SANTOS, K. F.; LOCATELLI, A. O ensino de química dos repelentes naturais por meio de uma unidade de ensino potencialmente significativa com abordagem CTSA. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL E FÓRUM DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, 3, 2017, Erechim, RS. Anais [...] Erechim, RS: UFFS, 2017. p. 1643-1652.

T14

SOLIGO, S. C.; COAN, C. M. Aprendendo sobre as cadeias alimentares na escola do campo e o ser humano como agente transformador do ambiente. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL E FÓRUM DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, 3, 2017, Erechim, RS. Anais [...] Erechim, RS: UFFS, 2017. p. 1672-1682.

T15

FOLLADOR, E. F. H. O ciclo da água na natureza enquanto temática da prática docente. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL E FÓRUM DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, 3, 2017, Erechim, RS. Anais [...] Erechim, RS: UFFS, 2017. p. 1682-1688.

T16

GAIA, M. C. M. Agroecologia na Licenciatura em Educação do Campo da UFSC. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL E FÓRUM DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, 3, 2017, Erechim, RS. Anais [...] Erechim, RS: UFFS, 2017. p. 1689-1695.

T17

CARCAIOLI, G. F. Planejamento, interdisciplinaridade e leitura da realidade: uma experiência no ensino de química na Licenciatura em Educação do Campo – UFSC. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL E FÓRUM DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, 3, 2017, Erechim, RS. Anais [...] Erechim, RS: UFFS, 2017. p. 1696-1704.

T18

LIMA, R. C. R. O ensino de Ciências nas escolas públicas do campo: propondo alternativas metodológicas a partir do estudo de plantas medicinais. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL E FÓRUM DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, 3, 2017, Erechim, RS. Anais [...] Erechim, RS: UFFS, 2017. p. 1713-1720.

T19

MELLO, J. L. A experiência do estágio na Educação do Campo: estratégias para o ensino de Ciências da Natureza. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL E FÓRUM DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, 3, 2017, Erechim, RS. Anais [...] Erechim, RS: UFFS, 2017. p. 1732-1739.

T20

MARCELINO, L. V.; CEOLIN, T. O campo e as tecnologias digitais no ensino de química: análise de materiais do curso de especialização em educação na cultura digital. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL E FÓRUM DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, 3, 2017, Erechim, RS. Anais [...] Erechim, RS: UFFS, 2017. p. 1740-1749.

T21

OLIVEIRA, G. C. Experiências na Escola e na Universidade: um olhar acerca da minha caminhada formativa. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL E FÓRUM DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, 3, 2017, Erechim, RS. Anais [...] Erechim, RS: UFFS, 2017. p. 1750-1756.

T22

MÜLLER, A. C.; VIEIRA, T. C. L. O ensino de Ciências e a agroecologia nas escolas públicas do campo: o desafio da especialização em Educação do Campo na produção de material didático. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL E FÓRUM DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, 3, 2017, Erechim, RS. Anais [...] Erechim, RS: UFFS, 2017. p. 1813-1817.

T23

RODRIGUES, N. R.; PEREIRA, E. O estudo da produção de chorume a partir do descarte do lixo – o problema que não vemos. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL E FÓRUM DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, 3, 2017, Erechim, RS. Anais [...] Erechim, RS: UFFS, 2017. p. 2016-2020.

Fonte: Dados da pesquisa (2020).

 

Esses 23 trabalhos constituíram o nosso corpus de análise.

Análise dos dados

Inicialmente, foi realizada uma síntese da produção com o objetivo de identificar as suas características mais destacadas. Para isso, foi feita a leitura integral dos textos e construído um quadro analítico para classificar os trabalhos quanto a regiões, afiliações dos autores, níveis de ensino, técnicas de pesquisa e correntes teóricas. Compreender as características da produção possibilitou a familiarização com os trabalhos, o que contribuiu para a etapa seguinte de análise.

Após a síntese, foi realizada a Análise Textual Discursiva – ATD, composta por três etapas, com o objetivo de prover subsídios rigorosos para a identificação e interpretação das necessidades formativas. A primeira etapa é a unitarização – desconstrução – com o texto dividido em unidades de análise. A segunda etapa é a categorização, que envolve reduzir e comparar elementos unitários, cujo resultado consiste no conjunto de elementos que têm algo em comum. Essa categorização – inicial, intermediária e final –, geralmente é indutiva, mas pode ocorrer de maneira dedutiva, na qual as categorias se originam a priori – quando definimos antes de se fazer a pesquisa. As categorias emergentes ficam mais complexas à medida que as refinamos com a conclusão da análise. A última etapa é o metatexto (texto analítico), onde é possibilitado ao pesquisador o exercício da escrita. O metatexto deve ser frequentemente aperfeiçoado e reorganizado (Moraes; Galiazzi, 2016).

Feita a seleção do material inicial, foi realizada a unitarização dos textos, lidos várias vezes. Nessa etapa, buscamos compreender as necessidades de formação dos professores expressas de forma direta ou indireta nas conclusões dos trabalhos, delimitando e organizando os excertos a elas referentes como unidades de análise. A restrição à seção de conclusão foi adotada pela necessidade de se fazer um recorte na quantidade dessas unidades. Além disso, entendemos que a conclusão de um texto geralmente explicita as suas contribuições e um resumo sintetizado da argumentação desenvolvida no corpo do trabalho, fundamentados nos resultados obtidos (Tafner; Tafner; Fischer, 1999). Realizado o processo de unitarização, passamos para a categorização na qual agrupamos as unidades de análise com temas comuns. Esse processo passou por um afunilamento em categorias iniciais, intermediárias e finais, até obtermos uma síntese das categorias principais, representativas do todo. Com a compreensão dos dados categorizados, frente aos nossos objetivos de pesquisa e ao referencial teórico assumido, foi possível elencar as necessidades formativas.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Inicialmente, foi feita uma relação entre a quantidade total de trabalhos, a quantidade voltada para o ensino de Ciências da Natureza, e os trabalhos que apontaram necessidades formativas (Tabela 1).

Tabela 1 – Quantidade de trabalhos analisados sobre ensino de Ciências e que apontaram necessidades formativas em suas conclusões

Edição

Ano

Quantidade total de trabalhos

Quantidade de trabalhos em ensino de Ciências

Quantidade de trabalhos que apontaram necessidades formativas

(corpus)

2012

201

00

00

2014

284

08

05

2017

205

28

18

Fonte: Dados da pesquisa (2020).

 

Embora 36 trabalhos tratassem do ensino de Ciências na Educação do Campo, apenas em 23 foram encontradas referências diretas ou indiretas sobre as necessidades formativas de professores, constituindo o corpus de análise. A quantidade de estudos voltados para o ensino de Ciências da Natureza cresceu de forma significativa na última edição do evento, especialmente devido às contribuições dos cursos de Licenciatura em Educação do Campo. Fica evidente que as bases de dados em eventos da área da Educação do Campo apresentam um quadro promissor referente ao quantitativo de pesquisas e relatos de experiências na confluência entre o ensino de Ciências e a Educação do Campo.

A compilação dos trabalhos supracitados e a ATD resultou no apontamento das seguintes necessidades formativas: de saber contextualizar o ensino; de adotar metodologias alternativas; de formação adequada, que contemple saberes específicos e sobre a Educação do Campo; necessidade de comprometimento; de fazer parcerias; de avaliação coletiva e de relacionar teoria e prática. Apresentamos (Tabela 2) a seguir a quantidade de unidades de análise encontradas referentes a essas necessidades.

 

Tabela 2 – Quantidade de unidades de análise por necessidades formativas nos trabalhos analisados

Necessidades Formativas

Trabalhos

Quantidade de unidades de análise encontradas

Saber contextualizar o ensino

T5, T10, T11, T12, T14, T18, T21, T23

10

Adotar metodologias alternativas

T2, T8, T13, T14, T16, T18, T19, T20

10

Formação adequada

T3, T6, T15, T19

04

Comprometimento

T7, T21, T22

03

Relacionar teoria e prática

T9, T17

02

Avaliação coletiva

T4

02

Fazer parcerias

T1

01

Fonte: Dados da pesquisa (2020).

 

Oito deles fizeram alguma referência à necessidade do professor saber contextualizar o ensino de Ciências. Incluímos nessa categoria o apelo às atividades contextualizadoras, a importância de atividades escolares de pesquisas para o desenvolvimento local e da sensibilidade e interesse do professor nos alunos, quanto aos seus problemas, sua realidade, seus saberes e seus estilos de aprendizagem. Também oito trabalhos fizeram alusão à necessidade de adotar metodologias alternativas e destacaram a importância da criatividade, de romper com ensino tradicional, de promover a investigação e interação na sala de aula, da interdisciplinaridade e do uso das novas tecnologias digitais. Quatro estudos fizeram menção ao caráter indispensável de uma adequada formação inicial e/ou continuada, no sentido de contemplar saberes específicos sobre Ciências e saberes sobre os fundamentos teóricos e metodológicos da Educação do Campo. Três mencionaram o comprometimento do professor com a aprendizagem dos alunos, com a instituição, com a classe trabalhadora e com a sociedade, como um fator premente. Três salientaram a articulação entre teoria e prática, por parte do professor, em seu trabalho, como elemento necessário. Um deles apontou a exigência de avaliação coletiva entre professores sobre o seu trabalho e, outro, indicou sobre a necessidade de o professor e a escola fazerem parcerias com instituições e organizações comunitárias.

Discutiremos a seguir sobre as necessidades formativas mais destacadas na pesquisa: saber contextualizar o ensino e saber usar metodologias alternativas.

Necessidade formativa de saber contextualizar o ensino

Segundo Ferreira e München (2020, p. 385) contextualizar o ensino “é buscar no contexto, na realidade, no convívio onde os educandos estão inseridos, aspectos que sejam importantes, significativos, e transformar essas informações em dados, culturais, artísticos, históricos, trabalhando-os articulados ao conteúdo”. Essa necessidade formativa pode ser representada pelos seguintes excertos:

Precisamos enfrentar as dificuldades de se trabalhar a partir de temas que aproximem a realidade dos alunos (Miszewski; Dartora, 2017, p. 1205).

Para que ocorra aprendizagem é preciso que os temas abordados sejam tratados de forma menos arbitrária. [...] Percebe-se a necessidade de resgatar mais intimamente as práticas e as histórias que permeiam esta comunidade (Faenello; Miszewski, 2017, p. 1215).

Os excertos supracitados dialogam com o dever de contextualizar o ensino de Ciências. Miszewski e Dartora (2017) apontam que é preciso superar a barreira de trabalhar a partir de temas que aproximam os conteúdos da realidade dos alunos. Faenello e Miszewski (2017) explicitam que para ocorrer a aprendizagem é preciso escolher temas e abordá-los de forma significativa, para que o aluno reflita sobre as questões de sua comunidade.

Conforme Kato e Kawasaki (2011, p. 36), “a necessidade da contextualização surgiu em um momento no qual os conteúdos escolares eram apresentados de forma fragmentada e isolada, afastados de seus contextos de produção científica, educacional e social”. Ou seja, os saberes repassados não tinham significado para o aluno, encontrando-se isolados no processo de construção.

Desse modo, contextualizar vai além de exemplificar, ou seja, inserir elementos do cotidiano na introdução dos conteúdos escolares. A contextualização pode ser histórica (González, 2004), ensinando sobre a natureza da Ciência e como determinado conceito ou teoria científica foram desenvolvidos ao longo do tempo, facilitando assim a sua compreensão. Envolve também vislumbrar como o conhecimento científico pode contribuir para a transformação da realidade do educando à medida que são ressaltadas as suas aplicações e implicações, conforme explicitado nos princípios pedagógicos da Educação do Campo (Brasil, 2004). Assim, “[...] a contextualização, mais que um ponto de partida, deve possibilitar o desenvolvimento de atividades sociais, culturais e produtivas no meio rural, junto com a reflexão crítica e a aplicação do saber sistematizado a problemas locais para neles intervir” (Silva; Lopes; Takahashi, 2021, p. 11).

Nesse sentido, a contextualização pode concorrer para um ensino de Ciências reflexivo e crítico. Para isso é importante o investimento em pesquisas voltadas para o ensino de Ciências no contexto camponês e sensibilidade dos docentes para perceberem como personalizar o ensino ao seu alunado, como indicaram T10, T18 e T21:

É necessário desenvolver investigações que contribuam para o contexto escolar do campo (Oliveira; Freitas; Cruz, 2017, p. 1129).

Destaca-se nesse artigo alternativas metodológicas que propiciem o reconhecimento dos saberes dos sujeitos do campo (Lima, 2017, p. 1719).

É preciso ser sensível e entender diferentes situações enfrentadas de aluno para aluno (Oliveira, 2017, p. 1754).

Conforme Lima (2017), a contextualização é uma necessidade formativa que deve ter impacto nas metodologias de ensino. Requer do professor tanto o domínio dos conteúdos de Ciências que ensina como o interesse em se familiarizar com os conhecimentos prévios, com a realidade e com os problemas dos educandos. Um ensino nessa direção é importante para o sujeito do campo, pois a “[...] teoria-prática contextualizada os faz sujeitos mais críticos e, quiçá, cidadãos que poderão intervir na sociedade desde agora – não somente no futuro” (Conte, 2022, p. 17).

A necessidade formativa docente de contextualização do ensino de Ciências nas escolas do campo vai ao encontro de resultados de pesquisas recentes de caráter empírico (Ferreira; München, 2020; Silva; Lopes; Takahashi, 2021). Contudo, entendemos que essa demanda envolve mais que conhecimentos conceituais. Envolve, também, procedimentos e atitudes, pois para contextualizar o professor deve se colocar na situação do trabalhador do campo e direcionar ações para que o conhecimento escolar de Ciências tenha significado para ele, contribuindo para a sua leitura e transformação da realidade.

Necessidade formativa de saber utilizar metodologias alternativas

A análise dos trabalhos mostrou que uma das necessidades formativas docentes mais apontadas para o ensino de Ciências foi a da adoção de metodologias alternativas ou não convencionais. Alguns excertos expressam isso da seguinte forma:

Todavia, com um olhar próspero, sinto que falta criatividade, ausência de novas perspectivas nas aulas de ciências por parte dela (Pereira, 2014, p. 2294).

A tarefa mais difícil para o professor é romper a barreira do ensino tradicional (Santos; Locatelli, 2017, p. 1651).

É necessário encontrar métodos que envolvam cada um dos alunos, cada um tem um jeito de aprender e o professor precisa estar atento a isso, sem falar que para ser um bom educador é necessário estar sempre estudando, se atualizando e sempre pesquisando (Mello, 2017, p. 1736).

Promover o uso pedagógico das tecnologias de informação (Marcelino; Ceolin, 2017, p. 1748).

Pereira (2014) chamou a atenção para metodologias alternativas, indicando a falta de criatividade no ensino de Ciências em uma escola do campo. Santos e Locatelli (2017) indicaram essa demanda mencionando que é preciso romper com o ensino tradicional. Mello (2017) afirma que é preciso encontrar métodos de ensino que atendam às diferentes necessidades dos alunos. Marcelino e Ceolin (2017) assinalam o papel das tecnologias de informação, que podem ser conjugadas a metodologias alternativas.

Segundo Almeida et al. (2021) as metodologias alternativas de ensino

[...] são práticas pedagógicas que colocam o aluno como sujeito ativo no processo de aprendizagem. Práticas dessa natureza, promovem a participação, interesse e a curiosidade pelo conteúdo abordado. O aluno é o próprio responsável por sua aprendizagem, o professor atua como mediador desse processo. Modelos de ensino que usam essas estratégias contrapõem o ensino tradicional, pautado na figura do professor como transmissor de conhecimentos, e os educandos como apenas receptáculos de informações (Almeida et al., 2021, p. 386).

As metodologias alternativas facilitam a aprendizagem (Silva et al., 2020), e podem incluir atividades lúdicas, como jogos e desenhos, modelos didáticos, atividades práticas e experimentais. Essas atividades podem também ser mediadas com o uso de tecnologias da informação e envolver, por exemplo, o uso de vídeos e músicas (Silva; Sales; Silva, 2017). Enfim, trata-se de diferenciar o ensino em relação à abordagem tradicional, na direção das necessidades formativas, apontadas por Carvalho e Gil-Pérez (2011), de analisar criticamente o ensino tradicional, saber preparar atividades capazes de a aprendizagem e adquirir a formação necessária para associar ensino e pesquisa no campo da didática das Ciências.

Essa necessidade também foi constatada em outro estudo:

Metodologias de ensino não convencionais foram comentadas pelos informantes-chave e pelos professores de Ciências como as que vão além de aulas expositivas, como o ensino com projetos interdisciplinares, o ensino com pesquisa, a aprendizagem baseada em problemas, o ensino por investigação, o uso de novas tecnologias digitais da informação e comunicação, os jogos didáticos, as dinâmicas de grupo e aulas práticas, sobretudo experimentos de Ciências (Silva; Lopes; Takahashi, 2021, p. 9).

A importância dessas metodologias para as escolas do campo também é encontrada nos princípios da Educação do Campo:

A Educação do Campo ocorre tanto em espaços escolares quanto fora deles. Envolve saberes, métodos, tempos e espaços físicos diferenciados. Realiza-se na organização das comunidades e dos seus territórios, que se distanciam de uma lógica meramente produtivista da terra e do seu próprio trabalho (Brasil, 2004, p.38).

Nesse sentido, a pedagogia da alternância pode prover muitas oportunidades de experimentar novas metodologias devido à sua abertura a espaços e tempos diferenciados de aprendizagem. Contudo, ela não tem sido comum, com seus instrumentos e a ênfase na contextualização do ensino, na maioria das escolas do campo (Conte, 2022).

Apesar do reconhecimento da importância das metodologias alternativas, a sua adoção esbarra na resistência de professores que, com elas, se veem fora da sua zona de conforto. Essa dificuldade pode ser explicada por inúmeros fatores, que vão da formação às condições de trabalho, fazendo com que professores se sintam inseguros em adotar métodos de ensino fora do convencional (Almeida et al., 2021). Diante desse quadro, é preciso que haja investimentos em processos formativos que atualizem e deem subsídios aos professores quanto ao conhecimento e aplicação de metodologias alternativas. Nessa direção, um dos trabalhos expressa:

Constatou-se que a atualização constante do professor é de suma importância, pois assim permitiremos que nossos alunos sejam agraciados com outras formas de aprendizagem (Oliveira, 2017, p.1688).

O trabalho indica a necessidade de atualização metodológica, que pode ser alcançada por meio da formação continuada e, especialmente, em serviço. Contudo, a proposição de metodologias alternativas para o ensino de Ciências nas escolas do campo deve ir além de cursos de atualização e da mera familiarização com modismos pedagógicos. É preciso que esse tipo de conhecimento procedimental seja acompanhado, no sentido da práxis, do conhecimento das finalidades e dos fundamentos da Educação do Campo. Também é preciso proximidade com a prática social dos trabalhadores do campo.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa mostrou que os professores de Ciências de escolas do campo necessitam de formação adequada, que contemple saberes específicos e sobre a Educação do Campo; comprometimento com a aprendizagem dos educandos, com a classe trabalhadora, com a instituição escolar e com a sociedade; fazer parcerias com instituições e organizações comunitárias; fazer a avaliação coletiva do trabalho docente relacionando teoria e prática. Destacamos neste texto as necessidades de saber contextualizar o ensino de Ciências e de adotar metodologias alternativas.

Este trabalho contribui para a pesquisa educacional na área de formação de professores. É singular quanto às fontes a que recorreu – os seminários internacionais, que são representativos no que se refere à produção de conhecimentos sobre a Educação do Campo nas mais diversas áreas, entre elas, a formação docente para o ensino de Ciências. Outra característica importante deste trabalho foi a adoção da Análise Textual Discursiva, ainda não utilizada nas pesquisas encontradas sobre necessidades formativas para o ensino de Ciências nas escolas do campo.

Um dado interessante é que não foram encontrados trabalhos no I Seminário Internacional e Fórum de Educação do Campo sobre o ensino de Ciências, mas identificamos um número considerável nos seminários seguintes. Esse crescimento indica a importância e a necessidade da produção de conhecimentos na área de ensino de Ciências na modalidade de Educação do Campo. O crescimento também sublinha a contribuição da implementação dos Cursos de Licenciatura em Educação do Campo.

Como esta investigação ficou limitada ao estudo bibliográfico, isto é, uma revisão de literatura, recomenda-se que sejam desenvolvidos estudos também de caráter empírico. Professores, alunos, líderes comunitários e de movimentos sociais precisam ser ouvidos em diferentes regiões do país e nos diversos grupos que compõem o espectro da população campesina quanto às necessidades formativas para o ensino de Ciências nas escolas do campo.

O conhecimento dessas necessidades tem desdobramentos para a prática de ensino. O professor de Ciências de escolas do campo precisa adotar estratégias de ensino que levem em conta os saberes cotidianos dos educandos e de suas comunidades. Para isso, ele precisa ter interesse e sensibilidade para se familiarizar com a sua realidade, seus problemas, suas tradições e seus diferentes estilos de aprendizagem. O ensino de Ciências na Educação do Campo deve inovar quanto ao uso de metodologias. Nesse sentido, as metodologias alternativas, além de contextualizadoras, têm que explorar as atividades investigativas, as interações, a interdisciplinaridade e, dentro do possível, as novas tecnologias digitais.

As políticas de formação inicial e continuada de professores de Ciências para as escolas do campo precisam contemplar os saberes sobre a Educação do Campo: sua história, fundamentos, princípios, referenciais pedagógicos etc. Os movimentos sociais podem contribuir para esse processo, o que pode resultar em um ensino de Ciências que atenda aos interesses das comunidades campesinas.

 

Recebido em: 16/10/2023

Aceito em: 05/04/2024

 

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[1] Enquanto os seminários foram internacionais, os fóruns que os acompanharam foram regionais, sendo o I Fórum da região Sul, o II Fórum das regiões Centro e Sul e o III Fórum da região Norte, do Rio Grande do Sul.