Perspectivas e práticas sobre a inclusão de alunos com autismo no ensino de Física

Perspectives and practices about the inclusion of students with autism in Physics teaching

Perspectivas y prácticas sobre la inclusión de estudiantes con autismo en la enseñanza de Física

 

Julia Medeiros (julia.medeiros@grad.ufsc.br)

Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil

Orcid: https://orcid.org/0009-0002-4853-5162

 

Karine Raquiel Halmenschlager (karine.h@ufsc.br)

Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil

Orcid: https://orcid.org/0000-0003-2747-3601

 

 

Resumo

A escola é um importante espaço para o desenvolvimento de competências sociais e cognitivas dos alunos com autismo. Nesse contexto, este trabalho verificou as perspectivas e práticas em relação ao ensino de Física de estagiários que acompanham alunos autistas, objetivando a discussão sobre a inclusão no processo de ensino e aprendizagem. A metodologia adotada está ancorada em uma pesquisa bibliográfica que dá suporte ao estudo descritivo com abordagem qualitativa. O instrumento de investigação utilizado foi um questionário semiestruturado, aplicado a dois estagiários estudantes de licenciatura que acompanham alunos autistas no ensino regular, desenvolvido com foco nas aulas de Física. A análise interpretativa dos dados coletados evidenciou a necessidade de cursos de capacitação docente, da adaptação de conteúdo e utilização de diferentes estratégias pedagógicas para que a socialização do conhecimento alcance todos os alunos durante a aula.

Palavras-chave: inclusão; autismo; ensino de física; ensino e aprendizagem.

 

Abstract

The school is an important space for the development of social and cognitive skills of students with autism. In this context, this work verified the perspectives and practices in relation to the teaching of Physics of interns who accompany autistic students, aiming at the discussion about inclusion in the teaching and learning process. The methodology adopted is anchored in bibliographical research that supports the descriptive study with a qualitative approach. The research instrument used was a semi-structured, questionnaire applied to two interns undergraduate students who accompany autistic students in regular education, developed with a focus on Physics classes. The interpretative analysis of the collected data showed the need for teacher training courses, content adaptation and use of different pedagogical strategies so that the socialization of knowledge reaches all students during class.

Keywords: inclusion; autism; physics teaching; teaching and learning.

 

Resumen:

La escuela es un espacio importante para el desarrollo de habilidades sociales y cognitivas de los estudiantes con autismo. En ese contexto, este trabajo verificó las perspectivas y prácticas en relación a la enseñanza de la Física de los pasantes que acompañan a los estudiantes autistas, visando la discusión sobre la inclusión en el proceso de enseñanza y aprendizaje. La metodología adoptada está anclada en una investigación bibliográfica que sustenta el estudio descriptivo con abordaje cualitativo. El instrumento de investigación utilizado fue un cuestionario semiestructurado, aplicado a dos internos estudiantes de pregrado que acompañan a alumnos autistas en la educación regular, desarrollado con foco en las clases de Física. El análisis interpretativo de los datos recolectados mostró la necesidad de cursos de formación docente, adecuación de contenidos y uso de diferentes estrategias pedagógicas para que la socialización del conocimiento llegue a todos los estudiantes durante la clase.

Palabras-clave: inclusión; autismo; enseñanza de la física; enseñando y aprendiendo.

 

 

INTRODUÇÃO

Nos campos da Educação Especial (EE) e da Psicologia Educacional, a inclusão escolar do estudante autista é um tópico de recorrentes discussões (Souza; Cavalcante, 2020). Muitas vezes os alunos autistas não são recebidos de forma adequada, evidenciando a necessidade de que ocorram transformações tanto na estrutura física quanto das atitudes dos membros da escola. A escola excludente pode ser caracterizada por uma série de fatores, dentre os quais, nela o estudante autista é apontado como um problema e é responsabilizado pelo fracasso e insucesso escolar (Orrú, 2016).

Para que tenhamos condições reais de inclusão de alunos público-alvo da EE, além de garantir a presença desses estudantes, a partir da promoção do ingresso e condições para permanência, deve-se haver a manutenção da equidade, reconhecendo que as necessidades dos estudantes são diferentes e que por fatores históricos, sociais e econômicos, não se encontram em situação de igualdade (Brasil, 2018). Segundo Pacheco (2016, p. 24) tratando todos os alunos como se fossem “iguais” ou “em pé de igualdade”, como comumente ocorre, estamos mantendo a desigualdade e fornecendo condições para que aumente. Logo, muitas vezes as ações pedagógicas realizadas nas escolas, públicas e particulares, são excludentes e reduzem o potencial de aprendizado dos estudantes com deficiência ou não.

Oferecer condições para o acesso e permanência na escola é um dos desafios dos profissionais da educação. A Educação Inclusiva (EI) corresponde a uma parcela da EE e tem como propósito transformar a escola em um espaço de convivência e construção de saberes para todos (Borges, 2021). Considerando o princípio de que o aluno é agente ativo da sua formação, por meio do desenvolvimento do seu interesse pelo aprendizado e conhecimento. A Física, como disciplina fundamental nos currículos da Educação Básica, pode promover melhor entendimento sobre o mundo, suas transformações, bem como sobre o cotidiano do aluno, certamente motivando o estudo desse conteúdo. Utilizando os conhecimentos de natureza científica e tecnológica aos quais são contemplados por conceitos da Física, o estudante realizará o pleno exercício da sua cidadania (Borges, 2021).

Nesse contexto, podemos analisar o recorte do ensino de Física a alunos com autismo, considerando os princípios da EI. O artigo de Peixe e Leonel (2020) se incumbe de tratar aspectos relacionados justamente a essa temática, trazendo reflexões acerca da interação entre os professores de Física e os professores da Educação Especial. Partindo do pressuposto de que os esforços para a formação de professores capacitados a trabalharem com o público-alvo da EE ainda são insuficientes, o que é reforçado pela análise dos resultados obtidos na pesquisa. 

Diante disso, abrangendo a pesquisa a outros profissionais da educação que trabalham na presença de alunos com necessidades específicas, o presente estudo busca identificar e discutir as perspectivas e práticas de estagiários, que atuam como agentes da EI, acerca da inclusão do estudante com autismo nas aulas de Física no Ensino Médio.

 

A EDUCAÇÃO INCLUSIVA NO BRASIL E O ENSINO DE FÍSICA NA EDUCAÇÃO BÁSICA

No Brasil, respeito às diferenças e o atendimento de todos os alunos na rede regular de ensino são premissas contidas nos documentos que regulamentam as políticas para a EE nas últimas décadas. Visando os mesmos objetivos estipulados constitucionalmente para a Educação Básica: propiciar o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e a sua qualificação para o trabalho (Brasil, 1988, Art. 205). Para isso, considerando as limitações individuais de cada aluno e suas necessidades educacionais especiais.

Contudo, somente em 2003, foram implementadas políticas públicas para a EI, quando a pessoa com deficiência passou a frequentar o ensino regular. Com o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (FUNDEB) foram distribuídos recursos para os equipamentos necessários aos alunos com deficiência e capacitação docente (Kassar, 2011). Em 2004, a Resolução do Conselho Nacional de Educação CNE/CEB nº 4 cria as Diretrizes Operacionais para o Atendimento Educacional Especializado, que determina à escola e seus membros o dever de conhecer o aluno com necessidades específicas, suas limitações e seu processo de desenvolvimento (Silva, 2021). Ainda segundo as Diretrizes:

Art. 12 (...) Os profissionais que atuam no Atendimento Educacional Especializado (AEE), devem ser capacitados, pois são suporte para o desenvolvimento do aluno e do docente do ensino regular, podendo assim juntamente com os cursos ofertados, gestão escolar, recepcionar esse discente de forma includente (Brasil, 2009, p. 17).

Logo, o ambiente favorável para o desenvolvimento do aluno com deficiência será criado a partir da devida capacitação dos profissionais da educação. Tornando a inclusão nas atividades escolares efetiva, propondo metas e objetivos de aprendizagem a serem alcançados e aprimorando o processo de ensino e aprendizagem a partir da observação do desenvolvimento individual do estudante (Silva, 2021).

Em 2012, a Lei 12.764 estabeleceu que o cidadão com autismo é considerado uma pessoa com deficiência para todos os efeitos legais no país. A partir do DSM-V (quinta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Doenças Mentais), lançado em 2013, o autismo é especificado por único espectro com distintos graus de severidade, denominado Transtorno do Espectro Autista (TEA) (Souza; Cavalcante, 2020). Ao longo dos anos, as leis de acesso à educação formal sofreram inúmeras alterações que buscavam promover a inclusão escolar. Para garantir os princípios da EI é papel da escola estipular metas educacionais que estejam de acordo com as necessidades dos educandos com TEA. A associação do espaço escolar apenas à socialização do aluno incluído é comum e limitante ao ensino e aprendizagem desse aluno. Um caminho para superar isso é o estabelecimento de vínculos professor-aluno.

No contexto em que esta investigação foi realizada, nos casos de ausência do professor especialista para a EE em sala de aula, tem-se um estagiário habilitado trabalhando como agente da EI. A atuação do estagiário restringe-se a contribuir para a melhoria da qualidade do atendimento direcionado ao aluno com necessidades específicas, não podendo assumir qualquer responsabilidade pedagógica, que fica a cargo do professor da disciplina e do professor da EE, quando há o último (Aplicação, 2014).

O aprendizado no ensino de Física proporciona a descoberta das interações que envolvem o ser humano e o meio em que vive, pois, a disciplina se faz presente em várias áreas da nossa sociedade, como: nas Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC), na engenharia e na medicina. Nesse sentido, o letramento científico, capacidade desenvolvida por meio do ensino de Física enquanto ciência, é caracterizado pela compreensão do conhecimento científico e oportuniza a ampliação do repertório sociocultural dos alunos (Ledur; Nobre, 2021).

Porém, compreender a Física no Ensino Médio é um desafio tanto para os estudantes típicos quanto para os estudantes com necessidades educacionais diversas, caso dos alunos autistas, por exemplo. Segundo Orrú (2016, p. 167) a escola tradicional

(...) está acostumada a pautar conteúdos disciplinares predeterminados para seus alunos estudarem. No entanto, na sociedade atual, as novas gerações de crianças demandam outras formas de aprender e aprender mais do que é imposto pela escola. Elas precisam aprender a articular saberes, a conhecer domínios que recobrem as esferas de conhecimentos, uma teia de saberes que se conectam.

A educação em ciências tem como propósito aproximar os alunos do conhecimento científico para ampliar sua visão de mundo (Brasil, 2018). Elucidando os desafios da transposição da linguagem científica, do excesso de definições e conteúdo, para que o aluno se torne protagonista da própria aprendizagem (Benite; Benite; Ribeiro, 2015).

Desse modo, é necessário que as abordagens didáticas alinhadas ao ensino de Física sejam elaboradas pensando na adaptação que melhor comporte as necessidades de todos os alunos. Transpondo para o contexto da disciplina de Física, nas alternativas apresentadas por Junior (2021) ao tratar das adequações curriculares necessárias para o ensino de Matemática à alunos autistas, vê-se como possibilidade o uso de elementos que promovam a experiência perceptiva concreta, como os recursos visuais ou manipuláveis, recorrendo estrategicamente a imagens, livros ilustrados, jogos didáticos, entre outros, tendo em vista o elevado grau de acuidade visual desses alunos.

 

ABORDAGEM METODOLÓGICA

A pesquisa realizada neste trabalho é de caráter qualitativo (Lüdke; Andre, 1986). Como instrumento de pesquisa elaborou-se um questionário adaptado da publicação de Silva (2021), com perguntas de natureza subjetiva. O questionário aplicado foi estruturado de modo a dividir as perguntas abrangendo os assuntos: formação, escola e inclusão de alunos autistas. Os sujeitos entrevistados foram dois estagiários, alunos de licenciatura, que acompanham alunos autistas em uma escola da rede Federal de ensino. O método de análise dos resultados é do tipo interpretativo, onde o pesquisador propõe reflexões e interpretações a partir da retomada do referencial teórico.

 

APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

Inicialmente, buscou-se saber se os sujeitos da pesquisa já haviam participado de algum curso específico que os orientassem a trabalhar com a inclusão de alunos com necessidades especiais, como os alunos autistas, no curso de licenciatura. Ambos os estagiários relataram que não tiveram a oportunidade. Um deles complementa que essa carência é percebida durante os estágios obrigatórios, quando os alunos das licenciaturas exercem a regência, exigindo a realização individual de um estudo introdutório sobre o assunto. Como pode-se verificar na resposta “Nunca participei de curso específico para trabalhar a inclusão escolar e isso faz muita falta sim, agora no estágio obrigatório preciso me desenvolver do zero sobre o assunto.”. Entretanto, no Brasil, a Lei nº 12.764 de 2012 estabelece que, se tratando da efetivação do direito à educação, deve-se haver “(...) o incentivo à formação e à capacitação dos profissionais especializados no atendimento à pessoa com transtorno do espectro autista” (Brasil, 2012, n.p).

Para Bergano (2009, p. 61): “A formação dos profissionais é essencial para a melhoria do processo de ensino e para o enfrentamento das diferentes situações que a tarefa de ensinar implica.”. Em vista disso, os estagiários quando questionados se recebem orientação e preparação, por meio de espaços de formação e supervisão, para atuar na promoção da acessibilidade de alunos com autismo, responderam afirmativamente. Logo, têm se indícios que a escola se preocupa em promover esse debate. Contudo, segundo um dos estagiários essas ações são insuficientes, pois acontecem poucas vezes ao ano e possuem carga horária pequena, acrescentando que, as pedagogas responsáveis não têm disponibilidade de tempo para atender a todos. Nas próprias palavras do sujeito

(...) as orientações que recebemos são poucas pois as pedagogas responsáveis pela educação especial estão sempre sobrecarregadas e acabamos com uma função apenas de cuidador dos alunos na maior parte do tempo, fazer companhia, ajudar na ida ao banheiro, se alimentar.

No Brasil, a elaboração da Política Nacional de Educação Especial em 2008, passou a assegurar aos sistemas de ensino uma série de elementos que poderiam favorecer aos estudantes melhores condições de permanência na escola, destacando-se os cursos de formação continuada aos profissionais da educação (Aplicação, 2014). Entretanto, levando em conta a resposta dos estagiários, a escola como um todo deve estar mobilizada a repensar as concepções acerca dos processos inclusivos, trazendo à tona a necessidade de se redimensionar as práticas e reconstruir pontos de vista em relação ao diferente. O caminho para a inclusão exige que a escola incentive e se comprometa com essa pauta. Sendo essencial a capacitação dos profissionais, para que conheçam os meios de inclusão dos alunos público-alvo da EE em suas aulas e nas demais atividades escolares, e para que possam acolhê-los e compreendê-los.

Sobre como ocorre o processo de adaptação das aulas de Física para que atendam às necessidades do aluno autista e se há alguma diferença nesse aspecto em relação às demais disciplinas, os estagiários responderam que quase não acontece nas aulas de Física (foi mencionado uma única vez no ano letivo), sendo um fato comum às disciplinas caracterizadas como de exatas ao contrário do que ocorre naquelas de humanas, citando como exemplo História, Geografia e Sociologia, onde haviam esforços por parte dos professores em promoverem a inclusão dos alunos, pelo menos no que diz respeito a esse tópico. Os apontamentos dos participantes da pesquisa sugerem que o professor, particularmente o de Física, apresenta dificuldades imediatas, que podem estar relacionadas com a falta de formação continuada; falta de professores auxiliares ou de comunicação entre os professores para a produção de materiais de apoio; dificuldades em relação à especificidade do TEA. O que demonstra a não efetividade de uma EI dos alunos. Em adesão, o estudo de Rodrigues e Cruz (2019) destaca que os professores de Ciências apresentam dificuldades e se sentem despreparados para conduzir os processos de ensino e aprendizagem de alunos com TEA e essas dificuldades são muitas vezes superadas quando o professor apresenta formação especializada. Sendo a Física uma disciplina incluída nas Ciências, vale a mesma ideia.

Quanto as considerações dos estagiários a respeito dos desafios, questões, dificuldades, anseios e dúvidas em relação ao trabalho como agente de inclusão de alunos com autismo na escola regular, os estagiários reafirmaram a necessidade de ser haver materiais adaptados para a aula, mas também comentaram sobre a realização de estímulos para a participação desses alunos.

A proposição de aulas mais atrativas ao aluno autista, trazendo metodologias diferentes e assuntos que despertem seu interesse pode contribuir para uma maior atenção na aula. Uma série de estratégias de ensino podem ser adotadas por diferentes profissionais da educação no trabalho com alunos autistas (Junior, 2021). O professor deve identificar as potencialidades do aluno para assim promover aquelas estratégias mais significativas, baseadas nas habilidades preservadas, considerando a abrangência do espectro do autismo e, portanto, as singularidades de cada aluno com TEA. A socialização entre os colegas é outro aspecto essencial a ser considerado. É preciso repensar as estratégias de ensino que são exploradas, especialmente no ensino de Física, cujos conteúdos exigem certo grau de abstração. Destarte, a atividade pedagógica deve ser criativamente modificada, através de um planejamento flexível, suscetível a novas adaptações ao longo das aulas.

Outrossim, para um dos estagiários tem-se

(...) um grande desafio na adaptação e estabelecimento da relação de confiança com o aluno, pois isso pode se tornar um impedimento de qualquer ação por parte do agente de inclusão, impossibilitando toda e qualquer tentativa de mediação subsequente.

No que concerne o estabelecimento da relação de confiança do professor ou do estagiário com o aluno autista, Sousa (2019) revela que o uso de materiais lúdicos durante as aulas são uma excelente estratégia, com potencial para o desenvolvimento das habilidades físicas, cognitivas, afetivas, emocionais, sociais e morais.

Por fim, buscou-se saber as considerações que podem ser feitas relativamente à inclusão de alunos com autismo na escola regular, a partir das suas próprias experiências. Um dos estagiários diz que

(...) muitos dos esforços que se tem feito com o objetivo de incluir esses alunos, acaba sendo direcionado em (...) educar as pessoas a compreender e aceitar a neurodiversidade (...) uma vez superada essa pauta seria possível muito mais foco nos aspectos mais minuciosos como didáticas e outras questões pedagógicas.

Já na percepção do outro “Falta preparo por parte dos professores, principalmente em entender que eles são professores de todos os alunos e não apenas de alguns que ele mesmo escolhe (...)”.

Entende-se que as pessoas são diferentes umas das outras, caracterizando a identidade de cada um, logo, nenhum tipo de discriminação deve ser tolerado tão pouco uma política de exclusão das diferenças, pois este é um fator comum a todos (Silva, 2000). Quando há possibilidade para compreensão, diminui-se o espaço para a discriminação, portanto, alunos e professores são incumbidos da tarefa de desenvolver a inclusão em sala de aula (Silva, 2021). O professor precisa considerar as diferenças entre seus estudantes: estilos de aprendizagem, experiências, reações, entre outros fatores que afetam o ensino e aprendizagem. Como apontado pelos estagiários, é fundamental que o docente da disciplina exerça à docência pensando em todos os alunos, compreendendo a neurodiversidade de cada indivíduo, caso contrário a inclusão do aluno será apenas aparente e não efetiva.

Vale ressaltar a atribuição da Física na promoção do letramento científico na educação inclusiva, um dos objetivos propostos pela BNCC (Brasil, 2018). É essencial que o trabalho docente esteja em consonância com o documento norteador da Educação Básica brasileira. O ensino de Física deve estar relacionado à formação científico-cultural dos estudantes e à formação do indivíduo mediada pelo debate de valores (Santos, 2007). Isto posto, o letramento científico corresponde a uma parcela essencial no ensino de Física, estando alinhada com a evolução do aluno como cidadão capaz de transformar o mundo a sua volta, tendo como base, os conhecimentos adquiridos ao longo do percurso escolar (Ledur; Nobre, 2021).

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo do estudo foi identificar e discutir as perspectivas e práticas de dois estagiários em relação à inclusão de alunos com TEA no ensino de Física. Com base nos resultados colhidos, foi possível constatar que ainda há lacunas nos cursos de licenciatura quanto à formação adequada a respeito dos princípios da EI e dos procedimentos necessários ao trabalho com alunos público-alvo da EE. De maneira consoante aos resultados da pesquisa de Peixe e Leonel (2020), no âmbito de como acontece à docência compartilhada entre o professor de Física e o professor da EE. No que concerne à prática pedagógica, foram identificados vários aspectos que apontam o não estabelecimento de um ambiente de inclusão para com o aluno com necessidades específicas. Os estagiários demonstraram em suas respostas estarem cientes dos problemas que acabam culminando no ensino não inclusivo, exemplificando o desinteresse por parte docente em se promover práticas pedagógicas inclusivas. Apesar das dificuldades encontradas, o estudo evidenciou a partir da fundamentação teórica apropriada, possibilidades para que fosse estabelecido um contexto de inclusão efetiva.

A pesquisa contribui para o conhecimento sobre a área, proporcionando maior entendimento acerca da inclusão de alunos com TEA no ensino regular no contexto do ensino de Física. As questões elaboradas permitiram verificar a necessidade de cursos de capacitação docente, da adaptação de conteúdo e utilização de diferentes estratégias pedagógicas para que a socialização do conhecimento alcance todos os alunos nas aulas de Física. E ainda, possibilitaram ampliar o olhar frente a realidade da escola, a qual desejamos, através de uma prática pedagógica reflexiva, tornar um espaço preparado para proporcionar o ensino e aprendizagem inclusivos às pessoas autistas, como lhe é de direito.

Atualmente, estudos cujo foco é a discussão sobre a educação inclusiva são ainda mais relevantes, pois viabilizam a reflexão sobre as práticas pedagógicas que auxiliam no desenvolvimento do aluno público-alvo da EE. Sendo assim, acredita-se que a determinação das percepções e práticas dos estagiários, bem como suas análises contribuem para o avanço das discussões acerca de como a inclusão do aluno com autismo é compreendida. Sugere-se então, que mais estudos dentro da temática sejam realizados, investigando as concepções dos demais responsáveis pela garantia da acessibilidade que compõem a equipe pedagógica.

 

Recebido em: 22/08/2023

Aceito em: 17/05/2024

 

REFERÊNCIAS

APLICAÇÃO, C., (org.). Proposta pedagógica de inclusão educacional do Colégio de Aplicação/UFSC. Florianópolis, 2014.

BENITE, A. M. C.; BENITE, C. R. M.; RIBEIRO E. B. V. Educação inclusiva, ensino de Ciências e linguagem científica: possíveis relações. Revista Educação Especial, Santa Maria, v. 28, n. 51, p. 81-89, jan./abr. 2015.

BERGANO, R. B. Pesquisa e prática profissional: educação especial. Curitiba: Ibpex, 2009.

BORGES, A. A. D. Ensino de Física e Autismo: Articulações no Ensino Médio. 2021. Dissertação (Mestre em Educação) - Universidade Federal de Uberlândia.

BRASIL. Lei nº 12.764, de 27 de dezembro de 2012. Institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista; e altera o § 3º do art. 98 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990. 27 dez. 2012.

BRASIL. M. E. Resolução nº 4, de 2 de outubro de 2009. Diretrizes Operacionais para o Atendimento Educacional Especializado na Educação Básica, modalidade Educação Especial. Brasília: MEC, 2009.

BRASIL. M.E. Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Brasília, DF: MEC, 2018.

GOMES, C. G. S.; MENDES, E. G. Escolarização inclusiva de alunos com autismo na rede municipal de ensino de Belo Horizonte. Revista Brasileira de Educação Especial, 16(3), 375-396, 2010.

JUNIOR, H. A. Adequações curriculares para alunos com autismo: o que é? Como fazer?. Revista Insignare Scientia, v. 4, n. 2, p. 122-134, 20 jul. 2021. Disponível em: https://periodicos.uffs.edu.br/index.php/RIS/article/view/12079/7763. Acesso em: 12 jul. 2023.

KASSAR, M. C. M. Educação especial na perspectiva da educação inclusiva: desafios da implantação de uma política nacional. Educar em revista, n. 41, p. 61-79, 2011.

LEDUR, H. C.; NOBRE, S. B. O Transtorno do Espectro Autista (TEA) e o ensino de Ciências: concepções e possibilidades didático-pedagógicas. Licencia&acturas, p. 7-22, 2 dez. 2021. Disponível em: https://ws2.institutoivoti.com.br/ojs/index.php/licenciaeacturas/article/view/198/206. Acesso em: 10 jun. 2023.

LÜDKE, M.; ANDRE, M. E. D. A. Pesquisa em Educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986.

MARTINS, M. R. R. Inclusão de alunos autistas no ensino regular: concepções e práticas pedagógicas de professores regentes. Dissertação de mestrado, Universidade Católica de Brasília, Brasília, DF, Brasil, 2007.

ORRÚ, S. E. Aprendizes com autismo: aprendizagem por eixos de interesse em espaços não excludentes. Petrópolis: Vozes, 2016.

PACHECO, J. Berços da desigualdade. In: GOMES, Márcio (org.). Construindo as trilhas para a inclusão. 2ª ed. Petrópolis: Vozes, 2016.

PEIXE, A.; LEONEL, A. A. Ensino de Física e Educação Especial: análise da interação entre professores de Física e professores da Educação Especial. Revista Insignare Scientia, p. 64-84, 2020. Disponível em: https://periodicos.uffs.edu.br/index.php/RIS/article/view/11173/7463. Acesso em: 12 jul. 2023.

RODRIGUES, A. S.; CRUZ, L. H. C. Desafios da inclusão de alunos com transtorno do espectro autista (TEA) no ensino de Ciências e Biologia. Rev. Eletrônica Pesquiseduca, Santos, v. 11, n. 25, p. 413-425, set./dez. 2019.

SANTOS, W. L. P. Educação Científica na perspectiva de letramento como prática social: funções, princípios e desafios. Revista Brasileira de Educação, Brasília, v. 6, n. 36, p. 474- 550, set./dez. 2007

SILVA, G. F. O ensino de Física na perspectiva inclusiva e o espectro autista: possibilidades didáticas no Ensino Médio. Monografia (Licenciatura em Física) - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Rio Grande do Norte, 2021.

SILVA, T. T. Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais. Petrópolis: Vozes, 2000.

SOUSA, I. O ensino de ciências na educação inclusiva: práticas pedagógicas que favorecem a inclusão. 2019. 61 f. Monografia (Licenciatura em Ciências Biológicas) - Feevale, Novo Hamburgo, RS, 2019.

SOUZA, J.; CAVALCANTE, V. C. Reflexões sobre o ensino de Ciências para o estudante autista na perspectiva da alfabetização científica. Anais do XIV Colóquio Internacional "Educação e Contemporaneidade", p. 1-13, 2 set. 2020. Disponível em: https://ri.ufs.br/bitstream/riufs/13787/23/22. Acesso em: 10 jun. 2023.