História Pública e questões socialmente vivas: uma reflexão sobre as potencialidades da temática do integralismo brasileiro na divulgação histórica
Public History and questions socialementvives: a reflection on the potential of the theme of Brazilian integralism in historical dissemination
Leandro Pereira Gonçalves[1]
Tatyana de Amaral Maia[2]
Gabriela Santi Pacheco[3]
Pedro I. D. Tanagino[4]
Resumo
O objetivo deste artigo é promover uma reflexão sobre a importância da História Pública no tratamento das chamadas “questões socialmente vivas” no Brasil do Tempo Presente, a partir da experiência do integralismo, a maior organização fascista fora da Europa durante o período entreguerras. O movimento da História Pública no Brasil tem se caracterizado pela adoção de uma agenda de defesa da democracia e da cidadania, com destaque para a promoção de práticas que favoreçam à emergência de sujeitos tradicionalmente invizibilizados. Nesse sentido, acreditamos que a temática do integralismo merece destaque na compreensão da cultura política autoritária brasileira e suas especificidades em meados do século XX, assim como as conexões transnacionais com movimentos como os fascismos europeus. A compreensão da trajetória histórica das direitas e extremas direitas é um caminho importante para a ampliação das consciências históricas e valorização da democracia, haja vista que é possível identificar traços autoritários que permanecem na sociedade brasileira atual.
Palavras-chave: História Pública;Integralismo brasileiro;Questões socialmente vivas.
Abstract
The aim of this article is to promote a reflection on the importance of Public History in dealing with the so-called “questions socialementvives” or “socially acute questions” in Brazil at the present time, based on the experience of integralism, the largest fascist organization outside Europe during the interwar period. The Public History movement in Brazil has been characterized by the adoption of an agenda to defend democracy and citizenship, with an emphasis on promoting practices that encourage the emergence of traditionally invisible subjects. In this sense, we believe that the theme of integralism deserves to be highlighted in order to understand Brazilian authoritarian political culture and its specificities in the mid-20th century, as well as the transnational connections with movements such as European fascism. Understanding the historical trajectory of the right and extreme right is an important way of broadening historical awareness and valuing democracy, since it is possible to identify authoritarian traits that remain in Brazilian society today.
Keywords: PublicHistory;Brazilianintegralism;Questionssocialement vives.
A emergência da extrema direita em diversos países do Ocidente nesse início do século XXI e, no caso brasileiro, a eleição de Jair Bolsonaro à presidência da República em 2018, cujo mandato foi marcado por discursos, ações e políticas de caráter autoritário, mobilizaram os historiadores a ampliar suas reflexões sobre a urgência do tratamento das questões socialmente vivas nas salas de aula em todos os níveis de formação. No Brasil, movimentos, como o Movimento Brasil Livre e o Escola Sem Partido, exigem o silenciamento e a interdição de narrativas sensíveis nas escolas, consideradas um “perigo” para a formação de jovens cidadãos. Soma-se a este quadro, ataques efetivos contra professores que vão desde inúmeros anteprojetos de lei enviados aos legislativos federal e estaduais para adoção de medidas censórias à liberdade de cátedra ao denuncismo viral promovido pelas redes sociais com gravações não-autorizadas e editadas de aulas ministradas sobre questões socialmente vivas. A atividade de professor se tornou alvo da atuação de grupos de extrema direita, que sob o signo da “guerra cultural” têm buscado silenciar o espaço do contraditório nas salas de aula, nos espaços de pesquisa e na divulgação científica.
Mas, o que significa falar em temas socialmente vivos ou sensíveis? Trata-se de temáticas sobre as quais não há consenso social, havendo inúmeras disputas narrativas na abordagem de tais questões. Tais disputas extrapolam os espaços institucionalizados de conhecimento (escolas, museus, universidades), se difundindo por todo tecido social, com implicações nos debates sobre democracia, usos do passado, liberdade de expressão e limites entre o público e o privado. No caso brasileiro, os temas socialmente vivos se referem às questões étnico-raciais; aos debates de gênero; à ditadura civil-militar e ao genocídio indígena. Os grupos de extrema direita defendem que o manto do silêncio e do esquecimento prevaleça sobre tais temáticas, mantendo imagens otimistas tradicionalmente circulantes sobre a construção da sociedade brasileira: povo ordeiro, pacífico, acolhedor, democrático, entre outros.
E qual a função da História Pública (HP) no tratamento dos temas socialmente sensíveis? É essa reflexão que propomos para este artigo, compreendendo que um dos eixos da História Pública no Brasil é seu engajamento político em defesa da democracia e da cidadania. Diante do avanço da extrema direita nas duas últimas décadas, compreendemos que a História Pública poderá contribuir para divulgação do conhecimento e produção de novas narrativas sobre a cultura política autoritária brasileira, que tem no integralismo um de seus principais expoentes. Afinal, é a compreensão desses movimentos autoritários e sua força na sociedade brasileira, assim como suas reminiscências, que possibilitam visualizarmos as ameaças reais que a extrema direita impõe à democracia, sem minimizarmos suas ações ou acreditarmos que a existência do sistema democrático brasileiro está imune aos empreendimentos desses agentes.
Inicialmente, a História Pública foi definida como um conjunto de práticas não-acadêmicas de produção da História para grandes audiências, elaboradas por historiadores (Kelley, 1977) ou “entusiasmados praticantes comuns” (Liddington, 2011) através de diversos produtos consumíveis (documentários, novelas, filmes, jogos, eventos culturais, festivais temáticos, romances). O interesse de um público cada vez maior no consumo de produtos históricos mobilizou inúmeros historiadores na compreensão de como as sociedades “consumiam” o passado e como construíam representações populares sobre os fenômenos históricos (De Groot, 2009). A dimensão pública da História passou a ser investigada e valorizada, incluindo desde a análise dos seus impactos na vida coletiva até a necessidade de atuação nesse espaço público em disputa pelas narrativas circulantes.
No Brasil, a História Pública se constituiu como um movimento flexível, dialógico e multifacetado. O movimento não se limitou apenas a investigar as dimensões públicas da História, mas propôs um giro ético-político para a atuação do historiador no espaço público. Os historiadores brasileiros reconheceram a importância da popularização do conhecimento histórico para amplas e heterogêneas audiências e propuseram requalificar a relação entre os historiadores e os seus públicos, refletindo sobre a função ética e política da História (Albuquerque Júnior 2019; Mattos, 2018; Rovai, 2018; Santhiago, 2018). É a partir da experiência trazida pela História Oral que os historiadores brasileiros irão propor uma História Pública feita de maneira colaborativa através de uma dimensão mais dialógica na produção do conhecimento e na sua circulação, indo além das formas tradicionais de divulgação científica. Hoje, temos a possibilidade de construir um saber histórico mediado com o público, ainda que seja de responsabilidade do historiador a sistematização e a crítica na elaboração da narrativa (Gomes, 2020). O processo de divulgação histórica, parte importante da relação entre ciência e sociedade, compõe a HP desde que comprometida com o giro ético e político proposto pelo movimento. A HP propõe uma nova forma de diálogo com suas audiências, mobilizando-as também no processo de construção do próprio conhecimento histórico, através do compartilhamento de experiências produzida por uma escuta qualificada por parte dos historiadores (Rovai, 2018). Por outro lado, a HP não deve ser resumida ao uso da História Oral ou da História do Tempo Presente. Nem toda a História Pública será realizada através do uso de entrevistas ou de forma colaborativa com outros saberes. Trata-se de um movimento multifacetado, cuja centralidade está no engajamento não-hierarquizado dos historiadores em defesa de valores como direitos humanos, democracia e justiça social.
O movimento da HP no Brasil propõe um compromisso de democratização da história disciplinar e dos usos do passado pelo presente, reconhecendo a alteridade, as diferenças e os dissensos como parte integrante de sociedades plurais e heterogêneas como as nossas. Neste sentido, o engajamento político da História Pública é uma de suas características estruturantes. Tal engajamento pressupõe o reconhecimento de múltiplas narrativas, projetos políticos (desde que comprometidos com a democracia), com a manutenção dos princípios éticos e metodológicos de busca da verdade. Essa perspectiva mais ampliada da HP, incorporando princípios éticos e políticos, é resultado das demandas do Tempo Presente, incluindo as lutas dos movimentos sociais no Brasil pela manutenção e ampliação dos seus direitos e a crise da democracia brasileira, com a emergência da extrema-direita e dos negacionismos históricos.
A História do Tempo Presente possibilitou aos historiadores uma importante renovação no campo historiográfico ao considerar aspectos como: a subjetividade na construção do conhecimento histórico; o papel das testemunhas vivas tanto como objeto quanto como observador qualificado por terem vivido os acontecimentos aos quais nos dedicamos e, no geral, não vivenciamos; a desfatalização das experiências analisadas, muitas vezes ainda em curso, reforçando as possibilidades de escolhas disponíveis aos sujeitos históricos, evitando qualquer determinismo; e a percepção da transitoriedade do conhecimento produzido; a requalificação da relação memória e História, não mais consideradas radicalmente separadas; o entendimento da memória como matriz da História disciplinar; reconhecimento da subjetividade que acompanha a virada historiográfica da disciplina História (Rousso, 2016; Delacroix, 2018).
Os historiadores brasileiros ampliaram o debate sobre a HP, propondo questões sobre a função social e política da História e dos historiadores na defesa da democracia e dos Direitos Humanos. Recentemente, Hebe Mattos (2018) e Durval Albuquerque Júnior (2019) se questionaram sobre a necessidade da História atuar em favor dos princípios democráticos e do historiador se posicionar como um ator político. Em texto recente, Hebe Mattos faz ampla defesa da função ética e política da História disciplinar, em especial, diante da ameaça dos fascismos. A historiadora recorda a ação política de Marc Bloch citando seu clássico “Apologia da História”. Marc Bloch insistia que o historiador estudava os homens no tempo, não o tempo passado. E estudava os homens no tempo a partir das questões trazidas pelo presente (Mattos, 2018). Neste momento, nosso presente é marcado pelo avanço da extrema-direita, pelos neofascismos, pelo ataque ao Outro, pela negação do Direito à diferença e a pluralidade. Em questionamento semelhante, Durval Albuquerque Júnior propõe que o historiador atue como um agente político disposto a assumir a posição daqueles que tiveram suas trajetórias interditadas pelo avanço dos autoritarismos e do uso discricionário do poder (AlbuquerqueJunior, 2019).
Nas duas últimas décadas, a História Pública trouxe novas possibilidades de escrita, incluindo um fazer histórico que adquira dimensões públicas a partir de perspectivas colaborativas e descentralizadas na produção do conhecimento. Dentre as inúmeras temáticas que envolvem a História Pública, podemos destacar aquelas dedicadas à defesa da democracia, o que se desdobra também nas análises sobre a atuação da extrema-direita, dos movimentos golpistas e da tradição autoritária de segmentos da sociedade brasileira. Como afirmam Ana Paula Texeira e Bruno Leal Carvalho sobre o movimento da HP no Brasil:
Embora não se resuma a uma resposta política, ele reage aos dilemas que tanto do campo historiográfico como a sociedade têm enfrentado: o anti-intelctualismo, o anticientificismo, o conspiracionismo, os ataques dirigidos ao meio acadêmico, sobretudo às universidades públicas no Brasil, os preconceituosos orgulhosos dos seus preconceitos, a defesa da ditadura militar e o negacionismo do Holocausto (Teixeira; Carvalho, 2019).
É nessa perspectiva de uma História Pública engajada na defesa da democracia e de uma “resposta política” que esse artigo propõe fazer uma leitura sobre as bases do integralismo no país, sua conformação como parte de uma cultura política autoritária com reminiscências junto a extrema-direita atual. Trata-se, portanto, de um ensaio sobre a possibilidade de divulgação científica dentro da perspectiva de engajamento ético político proposto pela História Pública. E essa é a diferença crucial entre a divulgação científica tradicional para uma divulgação científica como parte da História Pública.
Um dos fenômenos mais marcantes na história política da República brasileira é a ascensão da Ação Integralista Brasileira (AIB), que se destacou como a maior organização fascista fora da Europa durante a década de 1930 (Pinto, 1994). O vigor da AIB e o fervor mobilizado por sua principal figura, Plínio Salgado (1895-1975), evidenciam que o autoritarismo encontrou terreno fértil no Brasil, consolidando uma cultura política autoritária que, ao longo da história republicana, competiu por influência política na construção do Brasil moderno.
O integralismo expõe uma face que precisa ser trabalhada no espaço público na busca por uma cultura histórica democrática: a construção na longa duração de experiências autoritárias, cujos ressentimentos permanecem nos subterrâneos do tecido social e aguardam momentos de crise política e econômica para florescer. De tempos em tempos, acreditamos no potencial democrático da sociedade brasileira – que de fato existe. Mas, se há movimentos em direção à expansão da democracia, também não faltam setores sociais dispostos a revirar a caixa de pandora em busca de novos alvos. Uma saída seria trocar o esquecimento pelo enfrentamento de nossas experiências autoritárias, expurgando seus legados. Trabalho coletivo, no qual a História ensinada dos temas socialmente sensíveis pode dar sua contribuição.
Neste sentido, este artigo busca refletir sobre a história e a historiografia do integralismo, reconhecendo nele uma temática socialmente viva importante na compreensão da cultura política autoritária no país. Ao mesmo tempo, procuramos avaliar sobre como é possível ampliar tal debate na esfera pública e na divulgação histórica, evitando que a temática seja considerada coadjuvante na História do Brasil e eclipsada por outros eventos igualmente importantes, porém que minimizam a dimensão da experiência da história do fascismo no país. Afinal, como é possível promover uma História Pública dedicada a experiências e movimentos autoritários que favoreça o combate à desinformação e aos negacionismos? Se pretendemos expulsar os legados pretéritos e atuais, é preciso primeiro retirar o véu que encobre nossas experiências autoritárias, promovendo um trabalho de memória – conforme propõe Paul Ricouer (2008) – que evite a obsessão pelo passado e produza uma justa memória. Apoiando-se na psicanálise, Ricouer propõe que a função do historiador dedicado aos temas socialmente vivos é contribuir para um trabalho de memória que possa exercer uma visão crítica e distanciada do passado, favorecendo um processo de luto coletivo que evite a neurotização.
Nesse momento, propomos uma reflexão, de caráter ensaístico, sobre a importância de ampliarmos a circulação de reflexões críticas sobre as experiências autoritárias no Brasil, com o objetivo de contribuirmos na formação do pensamento histórico de um público amplo e cada vez mais acossado por desinformações que embaralham o discurso histórico e ameaçam a democracia. Utilizamos um debate historiográfico sobre as temáticas referentes ao integralismo e à História Pública como fontes para nosso ensaio.
O fascismo no Brasil dos anos 1930: história e historiografia
O fascismo constituiu-se como um fenômeno mundial e transnacional, que apresentou diversas variantes nacionais e intepretações políticas não só no continente europeu, como também em América Latina e outras regiões extraeuropeias[5]. O estabelecimento de organizações fascistas extraeuropeias tem sido objeto de inúmeros debates.Stanley Payne (2014), por exemplo, sugere a inexistência do fenômeno fora da Europa, enquanto outros investigadores, como Roger Griffin (2018), consideram a presença em outros continentes[6].
Essa última perspectiva compreende que houve diversas inter-relações transnacionais entre ditaduras e movimentos fascistas, que geraram um amplo campo de circulação de ideias e práticas. Nesse sentido, entende-se que a era do fascismo não foi essencialmente europeia. Pelo contrário, as redes de relações econômicas, culturais, intelectuais e políticas, sobretudo entre países da Europa e da América Latina, foram profundas, o que impactou até mesmo a “essência” do fenômeno fascista.
A fundação do movimento, em 7 de outubro de 1932 na cidade de São Paulo, marcou o ponto de partida do integralismo brasileiro, um grupo cujo objetivo era estabelecer um amplo movimento nacional. Os seus fundamentos estão descritos no documento fundacional, o Manifesto de Outubro de 1932, baseando-se em preceitos nacionalistas, antiliberais, anticomunistas e de cunho autoritário, a fim de difundir um ideal salvacionista em torno da implementação do “Estado Integral” (Pacheco, 2021).
No contexto de formação do fascismo brasileiro, a questão da modernização – sobretudo relacionada à questão nacional e à questão social – constituía o cerne dos debates e das disputas políticas no Brasil, que eram guiados pelo drama do “atraso” e dos efeitos desastrosos do capitalismo de mercado nos países latino-americanos, espoliados por caudilhos e empresas internacionais. Nesse sentido, havia uma disputa entre projetos modernizadores nas arenas intelectuais e políticas. Assim, os integralistas apontavam como seus maiores rivais os liberais e os comunistas (Tanagino, 2018, p. 17).
O antiliberalismo da AIB baseava-se na ideia de uma suposta incongruência entre as instituições liberais fundadas pela Constituição Federal de 1891 e a realidade nacional heterogênea do país, retomando críticas apontadas pelas obras de Alberto Torres, Euclides da Cunha, Azevedo Amaral e Oliveira Vianna. Já a posição anticomunista expressava-se nas visões de que o socialismo e o liberalismo seriam frutos diferentes de uma mesma raiz filosófica: o materialismo da civilização burguesa. Com esse discurso, o integralismo apresentava-se como alternativa de terceira via para solucionar os problemas do Brasil, inserindo-se no rol dos fascismos transnacionais (Trindade, 1979).
O projeto integralista teve suas bases iniciais pensadas pelo líder, Plínio Salgado. Como “chefe nacional” da AIB, ele era detentor do maior posto da hierarquia integralista e apresentava-se por meio do caráter doutrinário católico, defendendo a revolução espiritual e agindo no compromisso de revigorar a alma brasileira e resgatar as raízes nacionais, o que aconteceria por meio da implantação do “Estado Integral”. Nesse sentido, a partir do lema “Deus, pátria e família”, a proposta do líder tinha como fundamento central a aproximação do discurso integralista com o discurso católico em direção à constituição de um regime autoritário, nacionalista e corporativista, baseado na ideia de relação direta entre o líder carismático e as massas.
Os seus principais símbolos eram a letra grega sigma (∑), que designava o distintivo do movimento, a palavra Anauê, usada nas saudações, e a camisa verde, seu uniforme. O sigma, por exemplo, foi o símbolo escolhido para representar o movimento integralista, assim como o fasciolittorio no fascismo italiano e a swastika no nazismo. Com ele, os integralistas buscavam representar a ideia de integração de todas as forças sociais do país em torno da ideia de “suprema expressão da nacionalidade”, que se daria com a implementação do “Estado Integral”, seu modelo de ditadura e de Estado autoritário. Por sua vez, sua saudação e grito de guerra, “Anauê!”, inspirada na língua tupi e cujo significado alegado seria “Você é meu parente” ou “Você é meu amigo”, exprimia o ideal de que o integralismo seria uma grande família e um movimento nacionalista de sentido heroico. Já a camisa verde colocava-se com um símbolo sagrado e era entendida como um elemento de supressão de qualquer diferença, agrupando todos os membros num bloco ordenado e homogêneo (Tanagino, 2018, p. 72-73).
Houve, portanto, o emprego de um conjunto de símbolos, práticas e rituais, que envolvia o uso criterioso e regulado de uniformes, insígnias, honras, regalias, hinos, eventos esportivos, culturais e políticos, que formavam uma reunião de aparatos necessários à moderna política de massas. Aliado a isso, a imprensa foi utilizada sobremaneira pela AIB como meio de difusão e expansão, representando um dos principais mecanismos de doutrinação integralista. Em torno dessa proposta, o integralismo brasileiro empreendeu o Sigma-Jornais Reunidos, um consórcio jornalístico cujo objetivo era padronizar a orientação doutrinária (Tanagino, 2018, p. 19).
Por meio de diversos mecanismos doutrinários, que eram associados a um simbolismo muito bem-preparado, o fascismo brasileiro experimentou, desde a sua fundação em 1932, um rápido crescimento, expandindo-se por todas as regiões do país – até o momento em que foi posto na ilegalidade, com o advento do Estado Novo de Getúlio Vargas, em novembro de 1937. Entretanto, o fechamento da AIB não significou o fim do integralismo. Por meio de um discurso enraizado no cristianismo, as atividades políticas persistiram durante o período de clandestinidade, o que ocorreu tanto no Brasil como em Portugal, onde Salgado viveu exilado (1939-1946). Em 1945, com o fim da ditadura estado-novista no Brasil, o líder do integralismo organizou um novo projeto, em que buscou adaptar o fascismo brasileiro para atuar em um ambiente democrático por meio do Partido de Representação Popular (PRP) (Gonçalves, 2017).
Com a “reconfiguração” do integralismo e o retorno do chefe – que se tornou presidente do PRP – ao Brasil, os integralistas buscaram estabelecer várias alianças partidárias, que, apesar de efetivas, não acarretaram o mesmo impacto alcançado durante o período entreguerras com a AIB. Do mesmo modo, apoiaram a ditadura civil-militar iniciada em 1964. Após a morte do líder, em 1975, muitos defensores do movimento procuram mantê-lo ativo por meio de ações que perduram até os dias atuais com os neointegralistas (Gonçalves; Caldeira Neto, 2022).
Apesar da importância política da AIB para a história brasileira, o movimento tornou-se objeto de pesquisas acadêmicas de forma mais relevante apenas na década de 1970. Entende-se que esse silenciamento em torno das investigações foi um dos elementos para a ausência de um espaço representativo nos livros didáticos, uma vez que no momento da consolidação crítica da história, a temática era não apenas ignorada pelos olhares acadêmicos, mas desencorajada de ser estuda. Florestan Fernandes, por exemplo, ao prefaciar o Ideologia curupira: análise do discurso integralista, de Gilberto Vasconcellos (1979), afirmava ser penosa a tarefa de escrever sobre o tema, mesmo ressaltando a qualidade da obra. “O que me põe de quarentena é o assunto. Hoje está na moda dizer-se que se deve estudar o integralismo. Não compartilho dessa opinião”, dizia o sociólogo em 1978.
Ao lado de Vasconcellos, tem-se Hélgio Trindade (1979 [1974]), José Chasin (1978) e Marilena Chauí (1978) como os pioneiros pesquisadores que se voltaram para a temática. Nas décadas subsequentes, houve uma maior abertura nos estudos com Gertz (1987) e Araújo (1988). Desde então, ampliando o ângulo analítico dirigido ao integralismo, entre as novas pesquisas, pode-se citar aquelas que se dedicaram à observação da memória integralista, de sua estrutura de imprensa, de seu antissemitismo e de seu racismo, da participação feminina em suas hostes, bem como as abordagens biográficas, as análises de trajetórias e as voltadas para um novo modelo que o integralismo assumiu no período posterior à Segunda Guerra Mundial na condição de PRP, além das atuações no contexto da ditadura civil-militar e após a morte de Plínio Salgado, quando passou a existir, a partir de 1975, a organização do movimento neointegralista. Entre esses estudos mais recentes, destacam-se os trabalhos de Cavalari (1999), Calil (2005), Caldeira Neto (2014), Gonçalves (2017), Oliveira (2019), Bertonha (2020) e Gonçalves e Caldeira Neto (2022), bem como coletâneas em que estão reunidos estudos decorrentes de dissertações e teses produzidas sobre a temática, como Silva (2007) e Gonçalves e Simões (2017; 2018; 2019)[7].
Na última década, tornou-se central a reflexão na historiografia, nas ciências sociais e nas ciências políticas sobre o recrudescimento de movimentos, ideias e culturas políticas antidemocráticas ancoradas no campo político das extremas direitas em várias partes do mundo, como Europa, Estados Unidos e, notadamente, na América Latina, de um modo que não se verificava desde o período entre as duas Guerras Mundiais (1918-1939). Essa nova onda extremista, marcada pela ascensão dos neofascismos como parte da base social e política na construção de partidos e governos com cariz político autoritário, conservador, nacionalista e religioso, invoca valores e atitudes que foram consolidados nos fascismos do século XX e aponta para a gravidade de produzirem riscos e danos semelhantes aos do passado sobre o Estado Democrático de Direito e aos direitos humanos.
História Pública com temas socialmente vivos: um desafio do Tempo Presente
A História disciplinar, fruto da construção epistemológica do conhecimento na modernidade, se encontra hoje envolvida numa trincheira em favor da democracia, da ciência, dos direitos humanos, da qual é caudatária. No caso brasileiro, o anti-intelectualismo, a emergência da extrema direita e a crise política da atual democracia têm contribuído para eclosão de discursos negacionistas, incluindo o negacionismo histórico. Diante desse desafio, qual a função da História disciplinar e dos historiadores nos tempos atuais? De que forma a História Pública praticada no Brasil poderia propor ações para que o tratamento de temáticas socialmente vivas pudesse contribuir com o avanço da democracia, diante do nosso cenário atual?
Os chamados temas socialmente vivos estão ligados às temáticas dolorosas e diretamente vinculados às questões de direitos humanos. Os horrores do holocausto levaram à criação de compromissos e acordos transnacionais que promovessem os princípios básicos de respeito à vida e à liberdade individual, consolidando os direitos humanos como um dos objetivos da educação de crianças e jovens.
No caso da História Pública no Brasil, a temática dos direitos humanos surge fortemente associada à luta por direitos de diferentes grupos sociais que emergiram na transição da ditadura civil-militar (1964-1985) para a democracia. A partir de metade da década de 1970, a emergência de uma nova esquerda possibilitou a ampliação da luta por direitos, incluindo as questões raciais, ambientais e de gênero no debate público. Os movimentos negro, LGBT+ e feminista se tornaram atores políticos importantes na reconstrução da democracia, exigindo uma cidadania que reconhecesse o protagonismo de sujeitos históricos até então invisibilizados. A questão dos direitos humanos passou a incorporar as chamadas pautas identitárias, incluindo a necessidade de requalificação do lugar desses atores nos mais diversos espaços constitutivos da sociedade (mercado de trabalho, sistema educacional, administração pública, espaços políticos). A partir de então, a História teria uma função fundamental possibilitando a emergência do protagonismo de mulheres, indígenas, negros, grupos LGBT+, que exerceram papéis de relevância e contribuíram com a trajetória histórica da sociedade brasileira.
Em reação à emergência desses grupos minoritários, que pressionavam por políticas públicas que garantissem o acesso à sua história, memória e, sobretudo, aos espaços de poder socialmente disponíveis, observa-se o fortalecimento de políticos e grupos de extrema direita. Tais grupos irão agregar desde setores mais conservadores, que se sentem ressentidos pela perda do controle de seus espaços de poder, até grupos neofascistas que pregam abertamente doutrinas de superioridade racial e promovem discursos de ódio contra negros, indígenas, homossexuais e mulheres. Eles também se apropriam de experiências e movimentos autoritários que atravessaram a República no Brasil, através da manipulação da História e do negacionismo.
A temática do fascismo brasileiro deve ocupar um espaço efetivo na compreensão da nossa trajetória histórica e revela a capilaridade que discursos e movimentos autoritários encontram entre segmentos expressivos da sociedade brasileira. O objetivo deste tópico não é funcionar como um manual hermético sobre o tema, mas indicar possibilidades de reflexão acerca de processos de transposição dos temas socialmente vivos trabalhados nas universidades para o espaço público, em especial, quando se trata de movimentos de extrema direita em tempos de crise política como ainda vivemos.
É a partir da emergência da História Pública no Brasil, entendida como um movimento que reúne práticas heterogêneas de divulgação histórica e de construção de narrativas históricas para, pelo e com o público, que historiadoras e historiadores brasileiros propõem ações de intervenção no espaço público que mobilizem diversos públicos sobre a importância da História na construção de uma sociedade democrática e socialmente justa. O movimento da História Pública compreende a elaboração de uma narrativa histórica específica, ainda que em profundo diálogo com a História disciplinar produzida nas universidades e instituições de pesquisa (Santhiago, 2018). Não se trata de uma simplificação da narrativa histórica, mas de uma elaboração narrativa que seja amplamente compreendida por não-especialistas, aliando informação, conhecimento e escrita colaborativa. Tais narrativas seriam vinculadas às demandas coletivas locais, nacionais e globais. Essa utilidade, no entanto, não desconsidera a necessidade do desenvolvimento de habilidades específicas como capacidade de abstração, conceituação e orientação temporal e espacial (Rovai, 2018).
Umas das chaves teóricas mais relevantes foi produzida por JörnRüsen, que se empenhou em qualificar o conceito de consciência histórica, considerando-o fundamental no processo de desenvolvimento da cultura histórica das sociedades contemporâneas. A proposta de consciência histórica em Rüsen se apropria da concepção de tempo histórico desenvolvida por ReinhartKoselleck, tornando-a estruturante na construção de sua discussão sobre a orientação temporal na vida cotidiana (Rüsen, 2001, 2007, 2010). Para Koselleck, o tempo histórico é forjado pela relação tensionada entre os três tempos. O espaço de experiência e o horizonte de expectativas se encontram no presente. A perspectiva de tempo histórico elaborada por Koselleck possibilita reintroduzir a autoria dos sujeitos históricos nas relações sociais e sua capacidade de atuação como agentes na promoção de mudanças históricas, sem desconhecer a importância do passado e de seus condicionamentos na orientação das escolhas futuras (Koselleck, 2006). Em diálogo com JörnRüsen, Peter Lee (2011) propõe que o conhecimento histórico tem como função favorecer a compreensão das experiências vividas, produzindo sentidos sobre tais experiências e contribuindo para o desenvolvimento da consciência histórica.
É através das narrativas sobre o mundo social que mulheres e homens se organizam temporalmente, elaboram sentidos sobre suas experiências individuais e coletivas e articulam os múltiplos acessos à informação que possuem. Com o crescimento das atividades digitais, a produção e circulação de conteúdos ganhou dimensões inimagináveis. A ação dos algoritmos na hierarquização dos conteúdos visualizados, a rápida circulação de informações (verdadeiras ou não), as redes sociais provocaram uma revolução na autoridade e legitimidade na produção das narrativas. Se o exercício da escrita da História nunca foi exclusividade de historiadores, participando dessa escrita jornalistas, memorialistas, literatos, a internet possibilitou que outros atores participassem da mobilização das narrativas históricas, promovendo diferentes usos do passado, inclusive, produzindo narrativas negacionistas. Os chamados “entusiasmados praticantes comuns” (Liddington, 2011) se tornaram cada vez mais ativos, propondo discutir diferentes temáticas caras ao ofício do historiador, a partir do tripé entretenimento, informação e conhecimento (muitas vezes priorizando o entretenimento e desconsiderando a importância do conhecimento na compreensão dos processos históricos retratados). Assim, surgiram dezenas de influenciadores dedicados a falar de assuntos históricos diversos, com milhares de centenas de visualizações. Ao mesmo tempo, o fenômeno da extrema direita ocupou a rede mundial de computadores na produção de narrativas que manipulavam negativamente o passado, negando as pesquisas científicas e o conhecimento produzido em favor de projetos autoritários de poder (Bauer; Maia, 2023).
O integralismo é um tema de relevância para trabalhar diversas temáticas sobre o comportamento coletivo na modernidade: o uso da propaganda, a psicologia coletiva, a manipulação das informações, a estratégia de construção de identidades e pertencimento, o papel da liderança e o personalismo político. Todas essas questões atravessam as práticas dos movimentos fascistas. Aliás, diante da popularização do conceito de fascismo, torna-se urgente a construção de narrativas históricas voltadas para o grande público.
A aprendizagem histórica dos temas socialmente sensíveis: as potencialidades da História Pública
A História Pública tem se consolidado como um processo, um movimento autorreflexivo capaz de favorecer o desenvolvimento da atividade historiadora, de ensino e pesquisa, em especial com as demandas do Tempo Presente (Santhiago, 2018). É nesta perspectiva de processo, como uma prática de aprendizagem reflexiva que os historiadores brasileiros vêm requalificando a dimensão da produção e circulação do conhecimento histórico, sua função social e seu papel no espaço público.
Diante dessa especificidade, é fundamental refletirmos sobre a contribuição da História Pública para a aprendizagem histórica e seus usos públicos, assim como a relação entre os historiadores e seus públicos. Aqui, é preciso considerar que a escrita e a aprendizagem da História hoje ocorrem num tempo marcado pela emergência da extrema direita no Ocidente, em um contexto de questionamentos sobre a democracia no âmbito em que ocorre a consolidação de um espaço público virtual com forte intervenção sobre a vida coletiva.
Ademais, é necessário compreender as transformações das demandas sociais em relação à aprendizagem da História dentro do boom de memória ocorrido nas últimas décadas do século XX. Sem dúvida, a explosão das memórias e a sua valorização no Tempo Presente têm sido favorecidas pelo uso do digital na circulação dessas memórias.
No Brasil, o movimento da História Pública nasceu a partir da ideia de engajamento dos historiadores nas demandas do Tempo Presente. A redemocratização no Brasil (1974-1985) possibilitou a emergência de novas pautas, fazendo com que grupos sociais até então invisibilizados passassem a ocupar espaços políticos importantes, interferindo inclusive na estruturação do texto da Constituição de 1988, a partir da ideia de construção de um conjunto plural e diverso de direitos. O engajamento proposto pela geração historiadora brasileira no pós-democracia considera a participação dos sujeitos envolvidos nos processos históricos analisados como atores ativos na elaboração de sentidos da História narrada. Os historiadores a partir de então atuariam como mediadores especializados entre a construção do conhecimento e os sujeitos produtores das experiências que se pretende narrar.
Essa guinada metodológica propôs uma relação mais verticalizada entre o conhecimento científico e os saberes produzidos pelas memórias e vivências concretas. No caso da História do Tempo Presente, em que os atores que vivenciariam determinada experiência se encontram vivos e a construção das memórias se encontra em disputa, esse processo mais horizontal e participativo pode auxiliar na compreensão da História ensinada como uma disciplina de fundamental importância para o acesso à cidadania e defesa da democracia.
Os usos públicos do passado implodiram qualquer crença no monopólio do discurso sobre o passado do historiador – o que de fato nunca existiu – e propiciaram o aparecimento em larga escala de múltiplos autores com legitimidades distintas sobre a produção sobre esse discurso. A legitimidade dos conteúdos que circulam na internet se dá pelos algoritmos que medem a quantidade de acessos, compartilhamentos e likes, garantido que determinando conteúdo seja projetado amplamente e visualizado mais facilmente nas plataformas de buscas e redes sociais.
Essa transformação operada nos últimos 30 anos, acelerada ainda mais em tempos da pandemia da COVID-19, em que o espaço público esteve muitas vezes confinado ao virtual, provocou um questionamento acerca do sentido da história como disciplina acadêmica e do papel social do historiador. Afinal, quem é o historiador no Tempo Presente? Qual a função social da História? Quem é o seu público? Ao longo do século XIX e grande parte do século XX, a preocupação na construção e consolidação da História como ciência impulsionou o desenvolvimento de uma escrita da História acadêmica, voltada para os pares e distanciada do processo de vulgarização do saber histórico – restrito ao processo de ensino de História na educação básica, que, como sabemos, não é uma simplificação, mas vive uma transposição didática a partir dos diferentes objetivos da educação básica em cada período histórico.
No contexto em questão, a radicalização e a violência passaram a ter uma espécie de chancela do estado, nomeadamente com o governo de Jair Bolsonaro (2019-2022):
Com a posse de Jair Bolsonaro, surgiu um novo capítulo para a extrema direita brasileira: agora ela está no poder. Uma das figuras políticas recentes mais próximas ao fascismo histórico foi eleita à Presidência, e os grupos neofascistas disputam influência, espaço político e cobertura midiática. Alguns traços unem o governo Bolsonaro e o fascismo histórico: o conservadorismo, o anticomunismo, o uso das teorias de conspirações e a visão de mundo baseada na diferenciação entre amigos e inimigos. Por essas razões, por mais que os neofascistas se julguem representados, eles procuram ampliar a presença das suas bandeiras no governo brasileiro. Os neointegralistas não fariam diferente disso (Gonçalves; Caldeira Neto, 2022, p. 193-194).
Nesse sentido, entende-se que movimentos neofascistas, como o neointegralismo, apresentam importantes elementos para a análise da contemporaneidade brasileira, sendo um fenômeno que, para além de constituir-se como movimento, carrega uma concepção simbólica, pois congrega os defensores do espólio da principal organização fascista da história do Brasil. Para mais, há um histórico de relações de Jair Bolsonaro com organizações radicais, como neointegralistas e grupos skinheads neonazistas.
A compreensão de que o integralismo ocupa um espaço na conjuntura brasileira – passada e presente, entretanto, foi impulsionada por um episódio que marcou a mudança do olhar não apenas da historiografia, mas da sociedade e da política sobre o movimento. No dia 24 de dezembro de 2019, poucos meses antes do início do confinamento imposto pela pandemia de COVID-19, ocorreu um crime organizado por homens encapuzados em reação ao lançamento do especial de Natal A Primeira Tentação de Cristo, produzido pela Porta dos Fundos, uma produtora idealizada por alguns dos principais nomes do humor brasileiro, como Fábio Porchat e Gregório Duvivier, e conhecida por seus conteúdos veiculados na internet. A produção transmitia, através de uma sátira, a ideia de que Jesus Cristo era gay. Como reação, na noite de Natal, um atentado com coquetéis molotov atingiu a sede da produtora no Rio de Janeiro. Horas depois, um vídeo foi divulgado, em que três pessoas, que usavam capuzes nas cabeças e vestiam as camisas verdes do integralismo, reivindicavam o atentado em nome do Comando de Insurgência Popular Nacionalista, da Família Integralista Brasileira (CIPN)[8].
Esse acontecimento gerou grande repercussão e levantou diversas questões por parte da polícia, da imprensa e de outros interessados, como “quem são esses camisas verdes?”, “o que é integralismo?”, “por que Jair Bolsonaro utiliza o mesmo lema desse grupo – ‘Deus, pátria e família’?”. Nesse sentido, o assunto passou a ganhar espaço em noticiários, o que impulsionou a participação de pesquisadores a fim de auxiliar na compreensão do fascismo histórico (e presente) brasileiro. Como exemplo, tem-se as seguintes reportagens: “Porta dos Fundos: ‘Integralismo se fragmentou em pequenos grupos neofascistas’” (Senra, 2019), “Ataque ao Porta dos Fundos: ‘Com Bolsonaro, extrema-direita se sente autorizada a radicalizar’” (Coelho, 2019) e “Integralismo, milícia, Rússia e zouk: quem é o homem apontado como autor do ataque ao Porta dos Fundos” (Baloussier, 2020).
Ao mesmo tempo, os integrantes do Porta dos Fundos, em tom sarcástico, fizeram vários comentários sobre o episódio, com destaque para críticas à inoperância das investigações. Outros, como AntonioTabet, adotaram uma postura mais severa, afirmando em fevereiro de 2021 que, enquanto o tema não fosse resolvido, continuaria sendo debatido pelo grupo:
Segundo a polícia, eram cinco suspeitos. Só um foi preso e está na Rússia. Os outros quatro estão por aí. Cadê a polícia pra falar disso? Cadê a imprensa para lembrar? O ministro Sergio Moro, na época da Justiça e da Segurança Pública, não citou o primeiro ataque terrorista depois da redemocratização do país. Na época do atentado, o retorno que nós recebemos das autoridades era de que ‘isso aí são amadores, vão aparecer rápido’. Já passou um ano e três meses, e só um foi preso. E a polícia não conseguiu encontrar esses, entre aspas, amadores. O que está acontecendo? Será que alguém os protege? Será que tem alguém impedindo que isso vá para frente? A gente não sabe (Tabet, 2021).
Em busca de uma contribuição às reflexões sobre as audiências e os públicos da História, Leandro Pereira Gonçalves e Odilon Caldeira Neto, investigadores que têm se dedicado ao tema há décadas, publicaram o livro O fascismo em camisas verdes: do integralismo ao neointegralismo[9], lançado em 14 de julho de 2020. A obra fomentou interesse da imprensa, sendo prefaciada pelo jornalista e comentarista da GloboNews, Octavio Guedes. Além disso, foi indicada como um dos melhores livros de política de 2020, pelo jornal Folha de São Paulo e pela revista Veja (Traumann, 2020).
No mesmo ano, o tema foi objeto de outro livro de grande circulação. Escrito pelo jornalista Pedro Doria, o livro Fascismo à brasileira: Como o integralismo, maior movimento de extrema-direita da história do país, se formou e o que ele ilumina sobre o bolsonarismo foi lançado e aponta que a ideologia integralista sobrevive no bolsonarismo (Gabriel, 2020). Nessa esfera, o jornalista Carlos Andreazza afirma, em O integralismo no poder:
Culto à personalidade. Estímulo à compreensão messiânica da liderança. Forja de inimigos artificiais. Discurso autocrático, antiliberal e anticomunista, de fé nacionalista, embocadura cristã e musculatura miliciana para o confronto. Fetiche com a projeção fálica de uma intervenção militar. Constituição de uma máquina panfletária para difundir teorias conspiratórias. Críticas doutrinárias à democracia, propositalmente confundida com o (criminalizado) establishment e entendida mesmo como empecilho; sendo necessário — em nome de uma nova política — destruir os padrões viciados da atividade político-partidária. A que me refiro? Estarei incorrendo em repetição, mais uma vez esmiuçando o caráter da revolução reacionária bolsonarista? Sim e não (Andreazza, 2020).
Nesse contexto, portanto, passou a existir uma série de análises sobre o tema, principalmente no sentido de compreender as relações teóricas e práticas entre o fascismo brasileiro e as ações negacionistas e radicais do então governo presidencial: “Como ideias fascistas da década de 1930 permanecem vivas na era Bolsonaro. Para autores do novo livro, princípios do integralismo se enraizaram no imaginário político do país”, divulgou a seção Ilustríssima da Folha de São Paulo (Sombini, 2020).
Mesmo que exista pouco destaque do tema nos livros didáticos[10], a circulação temática apresentada, aliada ao momento político, auxiliou na difusão do assunto, que passou a fazer parte das salas de aula. Assim, destacam-se os resultados dos trabalhos vindos das ações da História Pública, congregados com o esforço e o papel central de professores, que utilizam o tema para fomentar reflexões e análises da conjuntura política brasileira. Esse processo auxilia, em certa medida, a criticar, impedir ou bloquear produções digitais negacionistas ou conspiratórias.
A História Pública nos últimos anos vem sendo impelida a refletir sobre os usos das redes sociais e da divulgação e popularização do conhecimento como alternativa às manipulações do passado fartamente encontrada em vários meios digitais. A circulação de narrativas no espaço virtual impacta decisivamente o processo de aprendizagem histórica e muito rotineiramente nos vemos confrontados por tais narrativas. A presença dos historiadores nas plataformas de conteúdo através do movimento da História Pública possibilita a produção de narrativas históricas em outros formatos para além da escrita; a compreensão da divulgação do conhecimento como parte importante na formação da consciência histórica e a possibilidade de impactar a cultura histórica, em nome da democracia e dos direitos humanos.
Considerações finais
A força com que a extrema direita emergiu nos últimos anos, não só no cenário nacional como de forma global, aliada ao crescimento do negacionismo histórico, evidencia a urgência de refletir-se sobre temas sensíveis, em que não há consenso social e que englobam questões de raça, gênero, etnia, entre outros. Esse recente processo de ascensão da extrema direita, que se disfarçou política e ideologicamente com novas roupagens, utiliza massivamente as novas tecnologias como forma de difusão, impulsionando a sua circulação, além de abrir portas para manipulações narrativas, o que representa uma ameaça iminente para a democracia que se pretende plural, igualitária e participativa (Rosas, 2024). Diante desse cenário, historiadores e professores passam a desempenhar um significativo papel na promoção da democracia e na conscientização crítica de jovens, de modo que surge como demanda a busca por abordagens pedagógicas que, além de explorarem questões socialmente vivas, impulsionem os indivíduos a organizarem o seu pensamento histórico.
As dimensões públicas do passado se tornaram também um espaço fundamental de análise e de atuação crítica do historiador. Esse texto, de caráter ensaístico, propõe uma ampliação do papel da divulgação científica pela História Pública, que no Brasil adquiriu uma dimensão ético-política em defesa da democracia, dos direitos humanos e da justiça social. Ainda que o movimento da HP tenha surgido a partir do amadurecimento de debates da História Oral, propondo um contínuo compartilhamento de saberes entre os historiadores e seus públicos, também incorporou perspectivas de divulgação histórica cujo traço principal é o engajamento dos historiadores com as demandas no Tempo Presente. Nesse sentido, nosso debate foi um chamamento aos historiadores para incorporarem às suas práticas a análise e a divulgação do integralismo, reconhecendo-o como parte importante de uma cultura anti-democrática cujas reminiscências são observadas com o avanço da extrema direita nos dias atuais.
Nesse sentido, o estudo do integralismo brasileiro revela-se relevante, considerando o papel que desempenhou na construção de uma cultura política autoritária no país. A análise da sua história – seja no ambiente acadêmico, na sala de aula ou no espaço público – não contribui apenas para a compreensão de aspectos autoritários do passado, marcados pela defesa de ideias fascistas, mas também abre espaço para discutir dinâmicas políticas e sociais contemporâneas. Isso se torna ainda mais significativo diante da visibilidade que o tema adquiriu com a ascensão do bolsonarismo, movimento que, segundo Odilon Caldeira Neto (2021), tem o fascismo em sua raiz.
O crescente interesse acerca do fascismo que se estabeleceu no Brasil – explicitado com o surgimento de uma nova geração de pesquisadores e pelo destaque em noticiários, emerge como um contributo para a reflexão sobre a possibilidade (e a necessidade) de ampliação do debate em sala de aula, tanto sobre o tema quanto a respeito de outros tópicos que envolvem questões socialmente vivas. A abordagem dessas temáticas, que trazem ponderações ligadas aos direitos humanos e à memória de grupos historicamente marginalizados, no âmbito da educação histórica, pode contribuir de forma significativa para o desenvolvimento da consciência histórica.
Nesse quadro, é preciso ir além do potencial cognitivo da História, articulando à produção do conhecimento uma dimensão ética e política diante desses passados sensíveis que mobilizam inúmeras demandas sociais e batalhas de memória. Para a formação do pensamento histórico, recursos que considerem os níveis de complexidade narrativa, a capacidade de orientação temporal e o domínio conceitual são essenciais. Assim, dinâmicas focusgroup, bem como contato com bibliografia e fontes documentais, permitem a participação ativa dos alunos na construção do conhecimento histórico, o que contribui para a reflexão coletiva sobre questões sensíveis. Uma abordagem multidimensional, portanto, enriquece a construção da cultura histórica e promove um maior engajamento crítico dos usuários da rede mundial de computadores em torno de narrativas históricas.
Para mais, o fomento em torno da História Pública, no campo acadêmico e como um movimento engajado com demandas contemporâneas, auxilia na circulação do conhecimento histórico e contribui para a ampliação da consciência histórica, promovendo uma interrelação entre o conhecimento científico e os saberes produzidos pelas memórias e vivências coletivas. Isso porque essas iniciativas ampliam o debate público e democratizam o acesso à História, sobretudo pelos meios digitais.
Da mesma forma que as redes sociais favoreceram a emergência de novos protagonistas e atores até então invizibilizados, elas possibilitaram a eclosão de negacionismos, autoritarismos e manipulações das memórias (Eiroa, 2018). Em vista disso, é fundamental que, em tempos de internet, a História auxilie na construção de uma ordem discursiva ao caos das memórias digitais (Noiret, 2013), o que demonstra a centralidade que os historiadores ocupam em torno de contribuições ao campo metodológico e à crítica às narrativas produzidas sobre o passado.
Os historiadores podem atuar como mediadores entre a avalanche de memórias produzidas pelos inúmeros protagonistas da História e pelas suas comunidades e a elaboração de narrativas que considerem os contextos de sua produção e vivências, evitando os abusos da memória e procedendo a uma operação crítica capaz de contribuir com a construção de narrativas acerca do vivido. Essa dinâmica auxilia no que Rosenzweig (2011) indicou como compromisso da História: a construção de uma História democrática, que inclua as diversas vozes do passado e do presente e que impulsione aqueles que queiram narrar sua própria história numa escrita colaborativa, alcançando múltiplas audiências.
Sendo assim, os temas socialmente sensíveis apresentam-se como uma ótima oportunidade de construção da cidadania, reconhecendo a importância da defesa constante da democracia. Nesse sentido, o ensino das Humanidades e, em especial, da História coloca-se como elemento imprescindível, apesar das inúmeras ameaças sofridas pela emergência da extrema direita. Isso porque a História configura-se como disciplina que pode oferecer uma alternativa à concepção temporal presentista na qual estamos mergulhados, ao favorecer a compreensão da dinâmica dos tempos, das rupturas e continuidades que organiza as sociedades.
Agradecimentos
O texto possui apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq, Brasil), da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG, Brasil) e da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT, Portugal – 2023.00597.BD).
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Aceito em 17/01/2025.
[1]Doutor em História; professor adjunto do Departamento de História e do PPGH da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Bolsista Produtividade CNPQ. Brasil. E-mail: leandro.goncalves@ufjf.br | https://orcid.org/https://orcid.org/0000-0002-9233-1098
[2]Doutora em História, professora adjunta do Departamento de História da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Bolsista Produtividade CNPQ. Brasil. E-mail: tatyanamaia@yahoo.com.br | https://orcid.org/0000-0002-1558-2192
[3]Doutoranda em Estudos Contemporâneos no Centro de Estudos Interdisciplinares da Universidade de Coimbra (CEIS20-UC) e Doutoranda em História no Programa de Pós-graduação em História da Universidade Federal de Juiz de Fora (PPGH/UFJF). Portugal e Brasil. E-mail: gabriela.pacheco@uc.pt | https://orcid.org/0000-0002-8778-245X
[4] Pesquisador em Estágio de Pós-Doutoramento com a Bolsa PDJ-CNPq-FAPEMIG (Processo N.: BPD-00899-22). Doutor em História pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).Brasil. E-mail: pidtanagino@gmail.com | https://orcid.org/0000-0003-1121-5472
[5] Em Fascismos: para além de Hitler e Mussolini, Carlos Martins (2022) demonstra a amplitude alcançada pelas ideias fascistas ao apresentar a história de cinco movimentos e/ou partidos que se estruturaram no período para além dos regimes institucionalizados em Alemanha e Itália: British Union ofFascists (1932-1940), Nacional-Sindicalismo português (1932-1934), Guarda de Ferro romena (1927-1941), RassemblementNationalPopulaire(1941-1944) e AIB (1932-1937). Para mais, apresenta um glossário de variantes do fascismo pelo mundo, contemplando países desde a América até a Oceania.
[6] As discussões historiográficas no que se refere aos fascismos, seja de forma local seja no âmbito transnacional, são vastas. Após os primeiros estudos que possuíam um menor distanciamento em relação ao tema, emergem as interpretações do pós-guerra, com autores como Ernst Nolte (1966); Renzo de Felice (1976); Stanley Payne (1980); George L. Mosse (1981); Pierre Milza (1985); ZeevSternhell, Mario Sznajder e Maia Ashéri (1989), entre outros. É, entretanto, a partir da década de 1990 que novas perspectivas ganham maior desenvolvimento, principalmente com Roger Griffin (1991). Surge, nesse momento, outras chaves interpretativas do fenômeno, como Michael Mann (2004), Robert O. Paxton (2004), entre outros. Por fim, nos últimos 20 anos, diversas abordagens têm sido apresentadas, contribuindo com a ampliação do campo investigativo, sobretudo a partir do viés transnacional, como ArndBauerkämper e GrzegorzRossolinski-Liebe (2017); Federico Finchelstein (2017); António Costa Pinto (2021); Gabriela de Lima Grecco e Leandro Pereira Gonçalves (2022); Toni Morant, Julián Sanz e Ismael Saz (2024), entre outros.
[7] Os trabalhos de Bertonha (2014) e Gonçalves (2017) detalham o desenvolvimento dos estudos sobre integralismo, sendo importantes referências para a compreensão da historiografia do tema.
[8] “O CIPN surgiu pela primeira vez em um vídeo divulgado no YouTube, gravado em tons amadores, quando onze homens, que se apresentavam como integralistas e vinculados a uma “família integralista brasileira”, roubavam e queimavam três faixas antifascistas afixadas na Unirio. No vídeo, os integrantes vestiam camisetas pretas com uma pequena bandeira do Brasil ao lado esquerdo do peito. Os rostos não eram mostrados, pois eles vestiam capuzes e, ao fundo, havia duas bandeiras, uma integralista com o Sigma e a bandeira nacional” (Gonçalves; Caldeira Neto, 2020, p. 192).
[9] Em 2022, o mesmo livro foi traduzido e publicado em inglês “Fascism in Brazil: FromIntegralismtoBolsonarism”, com prefácio do historiador Federico Finchelstein.
[10] Sobre o integralismo e os livros didáticos, cf. Victor (2005).