Estado e desenvolvimento capitalista: o caso dos frigoríficos no Oeste catarinense
State and capitalist development: the case of meatpacking plants in the west of Santa Catarina
José Carlos Radin[1]
Luciano Adilio Alves[2]
Resumo
O artigo analisa o paradoxo neoliberal de construção e defesa do chamado Estado mínimo e a histórica relação com o Estado brasileiro, principal agente financiador de boa parte das grandes corporações empresariais. Reflete ainda sobre as percepções de Estado mínimo e Estado planejador e o papel deste para o fortalecimento do setor privado, ilustrado por frigoríficos instalados no Oeste de Santa Catarina. Essas indústrias surgiram a partir dos anos 1940 e foram favorecidas com dinheiro público, tornando-se, a partir dos anos 1960, os principais pilares de sustentação econômica da região. Os recursos públicos foram obtidos em bancos oficiais, com destaque para financiamentos milionários via BNDES, que se constituíram na mola propulsora para o crescimento e o desenvolvimento dessas empresas. O estudo aborda o período dos anos 1940 a 1990, quando novos ideais neoliberais refutam ainda mais a presença estatal na economia e promovem um processo de desestatização de empresas públicas. O artigo ancora-se em bibliografia, artigos de jornais, revistas, dissertações, teses e processo judicial.
Palavras-chave: Financiamento público; Frigoríficos; Oeste de Santa Catarina.
Abstract
The article analyzes the neoliberal paradox of construction and defense of the so-called minimum State and the historical relationship with the Brazilian State, the main financing agent for many large business corporations. It also reflects on the perceptions of the minimum State and the planning State and its role in strengthening the private sector, illustrated by meatpacking plants installed in the West of Santa Catarina. These industries emerged in the 1940s and were supported with public money, becoming, from the 1960s onwards, the main pillars of economic support for the region. Public resources were obtained from official banks, with emphasis on millionaire financing via BNDES, which constituted the driving force for the growth and development of these companies.The study covers the period from the 1940s to the 1990s, when new neoliberal ideals further refuted the state presence in the economy and promoted a process of privatization of public companies. The article is based on bibliography, newspaper articles, magazines, dissertations, theses and judicial proceedings.
Keywords: Publicfinancing;Refrigerators; West of Santa Catarina.
Estado mínimo versus Estado planejador
A queda do muro de Berlim, em 1989, é considerada o marco do fim da chamada “Cortina de Ferro” que se refletia em barreiras sociais, políticas e econômicas entre o Oriente e o Ocidente e contrapunha distintos projetos de desenvolvimento. Com a reunificação da Alemanha, os embates envolvendo o princípio político do “Estado mínimo” e, por outro lado, o do “Estado planejador” foram redimensionados, provocando diferentes efeitos ao redor do mundo.
A disputa entre esses ideários, ligada ao papel do Estado, assim como a estreita relação entre o setor privado e o poder público, tem sido uma constante na história do capitalismo. Ao longo desse processo, grosso modo, registraram-se ondas em que o Estado foi mais protagonista no sentido de impulsionar o crescimento, sobretudo por meio de investimentos em fomento e em infraestrutura. Em outras, especialmente nas últimas décadas, o mercado, como genericamente se convencionou chamar o grande capital ou o capital especulativo, produz retórica em que menospreza e não reconhece o papel exercido pelo Estado, além de se definir como ator principal que impulsiona o crescimento.
Não raro vemos investidas retóricas desse mercado contra o “peso do Estado”, colocado como símbolo do atraso e dificultador do crescimento. Difunde-se no senso comum que as ações do Estado seriam um empecilho para o crescimento, o que mostraria a necessidade de desestatizar e de privatizar. No entanto, esse mesmo mercado não renuncia aos favores públicos, seja pelo acesso direto a recursos ou pela definição de regramentos que o proteja e favoreça.
Mas qual é, de fato, o papel do Estado? John Maynard Keynes, um dos mais conhecidos e respeitados economistas em todo o mundo, já dizia, no início do século XX, que “o importante para o governo não é fazer coisas que os indivíduos já estão fazendo, e fazê-las um pouco melhor ou um pouco pior, mas fazer aquelas coisas que no momento não são feitas de forma alguma” (Keynes, 1983).
No clássico “Os Donos do Poder”, Raymundo Faoro (1989) ressalta como o patrimonialismo, enquanto prática política em que o governante imiscui interesses públicos aos privados, constituiu-se em ideia estruturante na mentalidade político-econômica brasileira. O “Estado patrimonial”, ancorado no estamento burocrático, historicamente gestou relações autoritárias dos segmentos favorecidos sobre os desfavorecidos, fazendo com que grandes proprietários ou corporações considerem natural se favorecer do poder do Estado. Essa relação dificulta, sobremaneira, o desenvolvimento autônomo do país, pois os detentores do poder usam o Estado a seu favor e em desfavor da sociedade.
Em outra perspectiva desse debate, na coletânea organizada por Gilberto Maringoni (2021), diversos autores abordam tal controvérsia e, em diferentes capítulos da obra, evidenciam o papel desempenhado pelo Estado, enquanto agente fundamental para o desenvolvimento, em especial quando busca inserir mais pessoas, enquanto cidadãs. Mostram que os períodos de maior crescimento econômico registram estreita relação com o papel proativo do Estado, colocando-se o recente caso chinês como exemplo mais emblemático. Observam que tais períodos são aqueles em que há planejamento, investimento e fomentos públicos. Além disso, sinalizam que a própria sobrevivência do capitalismo só seria garantida se o Estado fosse capaz de controlar, ser um organizador social e garantir direitos econômicos e sociais. Maringoni cita Nico Poulantzas (p. 37) para destacar que “o papel do Estado em relação à economia modifica-se não somente no decorrer dos modos de produção, mas também segundo os estágios e fases do próprio capitalismo”.
A história recente mostra que a redução da participação do Estado nos investimentos públicos afetou a economia e o próprio crescimento do Brasil na década de 1990. Essa mudança na participação estatal foi configurada por severos ajustes fiscais acompanhados dos diversos processos de privatizações que incluíram estatais dos setores de telecomunicações, mineração, energia elétrica e transportes. Os gastos do setor público em infraestrutura, que eram de 2,7% do Produto Interno Bruto (PIB) entre 1995 e 1997, diminuíram continuamente até 1,1% do PIB em 2003 (Montes; Reis, 2011).
Poucas vezes na história do Brasil se difundiu a ideia e se falou tanto sobre o chamado Estado mínimo como nesses últimos anos. Esse cenário teve como pano de fundo o impeachmentda presidente Dilma Rousseff, sob a alegação de “pedaladas fiscais”, e a eleição presidencial, em 2018. Abertamente liberal, o governo Bolsonaro nunca escondeu o desejo constante de “enxugar a máquina pública”, tida como um grande e pesado paquiderme, que engessaria o crescimento e o desenvolvimento econômico nacional.
Evidências desse processo de enxugamento podem ser facilmente percebidas no fato de que o governo brasileiro trabalhou fortemente pela privatização de inúmeras estatais. Em apenas três anos e meio, 36% das empresas públicas foram vendidas. Em 2019, a União controlava 209 estatais e, em 2022, esse controle caiu para apenas 133. Na lista das estatais privatizadas aparecem importantes empresas como a Eletrobras, a BR Distribuidora, além de outras que eram importantes braços da poderosa Petrobras (Konchinski, 2022).
Se por um lado o Governo Federal não mediu esforços para promover a venda de empresas públicas, por outro concedeu pacotes milionários de ajuda a empresas privadas em crise ou inadimplentes com a União. Se enquadra aqui, como exemplo, o refinanciamento ou até mesmo o perdão de dívidas tributárias anunciadas pelo governo. Entre esses casos, a loja de departamentos Havan, uma das gigantes do setor do varejo nacional, foi uma das empresas beneficiadas com a benevolência estatal.
Em 1999, uma ação de busca e apreensão, determinada pela Procuradoria da República em Blumenau, resultou na autuação da Havan em R$ 117 milhões pela Receita Federal e em R$ 10 milhões pelo INSS. Mesmo sendo a maior autuação da Receita na ocasião, a empresa fez um Refis (programa de refinanciamento de dívida) para pagar a dívida em suaves prestações. A Procuradoria protestou e, em 2004, fez um cálculo que mostrava que caso fosse mantido o refinanciamento, o débito de R$ 168 milhões só seria quitado após 115 anos (Forum, 2019).
Mas as dívidas milionárias com os cofres públicos parecem não preocupar e nem assustar os devedores. No ano de 2019, o empresário catarinense e dono da Havan, Luciano Hang, posou para fotos ao lado de um jatinho que havia comprado na época. A aeronave com capacidade para 17 ocupantes aparecia no topo da lista dos jatos executivos mais caros entre os cinco modelos mais vendidos no mundo. Hang foi um dos tantos empresários brasileiros que engrossaram as fileiras na campanha presidencial e depois serviram como base de apoio e sustentação ao Governo Federal eleito em 2018.
Em perspectiva bastante diferente desse quadro nefasto está o fomento estatal presente nos governos politicamente situados à esquerda. Em junho de 2023, menos de seis meses após assumir a Presidência da República pela terceira vez, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou a liberação de R$ 364,22 bilhões para o Plano Safra 2023/2024, um montante 27% superior ao da safra anterior. O dinheiro público foi disponibilizado para financiar a atividade agropecuária de médios e grandes produtores (Folha de São Paulo, 2023). A agricultura familiar foi beneficiada com outros R$ 77,7 bilhões. Destes, R$ 71,6 bilhões foram liberados por meio de crédito rural via Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), um crescimento de 34% na comparação com o período anterior e o maior montante financeiro da série histórica (Moliterno, 2023).
Mas, quando o assunto em questão é o fomento estatal, nada se compara ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Retomado pelo Governo Lula em 2023, o programa pretende investir R$ 1,7 trilhão até 2026 e R$ 400 bilhões após o ano de 2026, nas chamadas obras estruturantes em todos os estados (Brasil, 2024). Para se ter ideia do que esse montante financeiro representa, podemos comparar que, no ano de 2022, o PIBdo Brasil totalizou R$ 9,9 trilhões após um crescimento de 2,9% na comparação com o ano anterior.
O dinheiro do PAC vai impactar em diferentes frentes. Serão obras em diversos eixos, incluindo os setores de educação, transporte, habitação, geração de energia, telecomunicações, entre outros. Somente em Santa Catarina foram anunciadas 520 grandes ações em dezenas de municípios de todas as regiões. O PAC é apontado como um dos maiores exemplos da intervenção estatal direta e objetiva, no sentido de fomentar a economia por meio de grandes obras que geram, principalmente, emprego, renda e melhorias no nível de qualidade de vida da população brasileira (Brasil, 2024).
Mesmo que em determinados períodos volumosos recursos públicos tenham sido investidos ou disponibilizados pelo Estado para fomentar a produção, em geral, ao longo da história do capitalismo, os liberais defenderam e defendem a não interferência do Estado. No entanto, nesse processo, nas situações de crises econômicas, invariavelmente, recorrem a ele para enfrentá-las, evidenciando que se movem pela assertiva de “socializar os prejuízos”, mas, nos tempos de bonança, “privatizam os lucros”.
Adam Smith, considerado o pai da economia moderna, nasceu na Escócia, em pleno Iluminismo europeu. Ele entendia que a oferta e a demanda definiriam os preços e o volume de produção. Esse mecanismo funcionaria por meio da plena garantia de competição e do livre mercado, e que o Estado não deveria intervir ou ter baixa participação nesse ambiente econômico. Aliás, em sua obra mais célebre, “A Riqueza das Nações”, Smith defende que o desequilíbrio econômico surge quando o Estado favorece ou beneficia determinados segmentos (Smith, 1983).
Ao longo do processo histórico, vários pensadores, economistas e geopolíticos, notabilizaram-se na proposição e na defesa dos ideais liberais e neoliberais que, de modo genérico, resumem-se na defesa da ideia de “Estado mínimo”. Entre os formuladores e defensores dos pressupostos dessa perspectiva figuram autores como Friedrich August von Hayek, Karl Raimund Popper e Milton Friedman, sobretudo no período pós-segunda guerra. No entender de tais autores, o Estado atrapalha mais do que ajuda quando estabelece regras por meio de diferentes e complexas leis econômicas. Por conseguinte, essa perspectiva assevera que quanto menor a interferência estatal, maiores seriam as chances de sucesso na busca pelo crescimento econômico.
A história, no entanto, mostra que essa lógica nem sempre trouxe bons resultados. Ao seguir esses preceitos neoliberais, por diversas vezes, os Estados Unidos (e o mundo) experimentaram terríveis consequências da falta da presença estatal mais efetiva e eficaz na busca do equilíbrio da economia.
Por ocasião da crise de 1929, o governo e o banco central (Fed) americanos, alegando que se tratava de um problema do setor privado, não agiram a tempo de socorrer o sistema bancário, cujas instituições eram quase todas emprestadoras de dinheiro para os especuladores comprarem ações, geralmente exigindo em garantia essas próprias ações. Resultado: nada menos do que nove mil bancos americanos faliram, sendo que sete bilhões de dólares simplesmente viraram fumaça, valor equivalente a US$ 160 bilhões nos dias de hoje. Ou seja, a crise não se restringiu aos investidores e especuladores em ações. Gente que jamais investira um centavo na Bolsa, perdeu todas as economias. Não foi à toa que a crise originada em Wall Street se espalhou pelo mundo, dando origem à Grande Depressão, ao ressurgimento do nazismo (que se começara no início dos Anos Vinte mas perdera grande parte de sua força) e à eclosão da Segunda Guerra Mundial, com um saldo macabro de mais de 50 milhões de mortos, entre civis e militares (Sant’Anna, 2023).
No livro “O Valor de Tudo: Produção e Apropriação na Economia Global”, Mariana Mazzucato (2019) discute, entre outros pontos, o papel do Estado na economia e as teorias de criação e de extração de valor. A autora salienta que algumas corporações americanas se apresentam como criadoras de valor, quando na verdade são exatamente o oposto.
[...] ao se apresentarem como heróis modernos e justificarem seus lucros recordes e suas montanhas de dinheiro, a Apple e outras empresas ignoram, muito convenientemente, o papel pioneiro desempenhado pelo Estado no desenvolvimento de novas tecnologias. A Apple, descaradamente, declarou que sua contribuição para a sociedade não deveria vir de impostos, mas do reconhecimento dos seus aparelhos incríveis. Mas de onde vem a tecnologia inteligente por trás desses aparelhos? De recursos públicos. Internet, GPS, tela sensível ao toque, Siri e o algoritmo por trás do Google – tudo isso foi financiado por instituições públicas. Assim, os contribuintes não deveriam receber alguma coisa de volta, além de uma série de dispositivos que são, sem dúvida, brilhantes? Todavia apenas apresentar essa questão realça como precisamos de um tipo de narrativa radicalmente diferente acerca de quem criou riqueza originariamente – e de quem, na sequência, a extraiu (Mazzucato, 2019, p. 19-20).
O paradoxo que envolve essa teoria de Estado mínimo se mostrou ainda mais evidente no decorrer dos anos. Por diversas vezes, os defensores desse viés capitalista recorreram ao Estado para financiar empreendimentos privados. Em outras oportunidades, esse mesmo Estado, tão criticado, deu guarida socorrendo financeiramente grandes empresas à beira do abismo. Um dos casos mais célebres envolveu a General Motors, que se avizinhou da falência em 2009 e só conseguiu se reerguer com a ajuda do governo americano. Na prática, exemplos assim evidenciam que o dinheiro público foi largamente usado em favor do setor privado e, em muitos casos, sem a respectiva restituição aos cofres públicos.
Um dos marcos significativos dessa presença estatal na economia brasileira é observado nos anos 1930, quando o Governo Federal adotou medidas para restringir as importações de diversos produtos, com o objetivo central de estimular a produção nacional. Nesse mesmo período, o governo brasileiro fez grandes investimentos para a criação de importantes empresas estatais, como foi o caso da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), da Petrobras e da Eletrobras, entre outras. Tais empresas foram de suma importância para criar as condições e dar o suporte ao desenvolvimento nacional.
Assim, as políticas de perspectiva nacionalista, adotadas com o intuito de promover um crescimento mais autônomo, direta ou indiretamente, condicionaram o processo de industrialização do Brasil no último século. O surgimento dessas empresas foi concomitante ao processo de urbanização brasileira e, por conseguinte, na imediata elevação da demanda por outros produtos, incluindo os de origem rural, direcionados para a alimentação humana, bem como para o uso diverso na indústria.
Em paralelo a esse cenário mais favorável ao crescimento, logo surgiram as primeiras políticas agrícolas, com o oferecimento de linhas de crédito rural e políticas públicas de estímulo à adoção de pacotes tecnológicos, uso de maquinário e produtos químicos para a modernização da agricultura nos moldes da chamada Revolução Verde (Pertile, 2008).
Para crescer e se modernizar, a economia brasileira demandava cada vez mais fomento financeiro. A partir dessa demanda, o governo passou a disponibilizar crédito público barato e com prazos elásticos para o seu ressarcimento. Nesse contexto, em 1952, foi criado o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). No início, a principal função do banco era financiar a indústria de insumos básicos e a infraestrutura necessária para produzir em maior escala e para facilitar o escoamento dessa produção. Os governos de viés nacionalista entendiam que o Brasil necessitava de pesados investimentos, sobretudo em tecnologia produtiva, em comunicação e na implantação de novos modais de transporte. Isso permitiria superar a histórica perspectiva agrária da economia.
Com a instauração do regime militar, em 1964, o BNDES passou a financiar a indústria de base e o socorro financeiro às empresas em situação de falência. Em 1985, no fim do período ditatorial, a nova missão do banco passou a ser o financiamento das exportações e as iniciativas voltadas à privatização. Já a partir do Governo Lula, em 2003, o foco do banco passou a ser o financiamento para a retomada do crescimento sustentado por ciclo de investimento, bem como de atuação contra a crise. Em síntese, a história desse banco de desenvolvimento pode ser analisada a partir de duas perspectivas: desenvolvimentista, na sua fase inicial, e neoliberal, após a ditadura militar (Alves, 2021).
Durante a década de 1990, sob o novo modelo neoliberal, o BNDES destacou-se como o condutor do Programa Nacional de Desestatização (PND). Após 1994, houve certo resgate do BNDES como fonte de crédito para empresas, porém, sem qualquer vinculação maior com alguma estratégia de desenvolvimento dirigida pelo Estado brasileiro. [...] Durante a década de 1990, quando a prioridade absoluta em termos de política econômica esteve focada na política de estabilização da inflação, houve a redefinição do papel exercido pelo BNDES. Com a defesa de políticas de abertura comercial e financeira, desregulamentação e privatizações, a consequência foi que o Banco passou a exercer a função de principal instituição articuladora, promotora e defensora da desestatização. Alguns impasses políticos determinaram o compasso dos avanços e os métodos da implantação do processo de privatização em si (Torres Filho; Costa, 2012, p. 984-986).
Na primeira década do século XXI, o BNDES passou a ser elogiado e reconhecido internacionalmente por seus resultados obtidos ao oferecer empréstimos contracíclicos, ou seja, aqueles que contrariam o atual ciclo econômico, com a finalidade de obter a sonhada estabilização econômica. E mais, esse financiamento público muitas vezes foi e é direcionado para áreas novas e cheias de incertezas, das quais os bancos privados e os investidores capitalistas não têm interesse por apresentarem potenciais riscos.
[…] O banco hoje tem recordes de retorno em investimentos produtivos, em vez de puramente especulativos: em 2010, o retorno sobre seu patrimônio líquido foi de espantosos 21,2% (reinvestidos pelo Tesouro brasileiro em áreas como saúde e educação), enquanto o de organização equivalente do Banco Mundial, do Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (Bird), não foi sequer positivo (-2,3%) (Mazzucato, 2014, p. 28).
Assim, destaca-se que, no processo de desenvolvimento econômico, de diferentes formas, o Estado, tanto na esfera estadual quanto federal, em grande medida foi um facilitador e fomentador do sistema produtivo. Isso também pode ser observado no âmbito regional, no Oeste catarinense, sobretudo a partir da segunda metade do século passado,especialmente a partir dos anos 1940, quando da fundação dos primeiros frigoríficos. Esse apoio estatal continuou marcante até os anos 1990, quando o setor passou por um processo de reestruturação, motivado, em grande parte, pela emergência de um novo discurso neoliberal mais intenso no qual o Estado não deveria interferir na economia. Apesar dessas investidas, o papel do Estado como agente fomentador ainda é marcante até o tempo presente. Os aspectos aqui apontados têm o desígnio de dar o suporte para a melhor compreensão do desenvolvimento capitalista no Oeste catarinense, em especial a partir da emergência da indústria frigorífica nesse território, conforme se verá a seguir.
Investimentos públicos e a indústria frigorífica no Oeste catarinense
A marcante presença e a participação do setor agroindustrial na economia catarinense podem ser facilmente verificadas por dados estatísticos econômicos. Conforme a Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina (Fiesc), durante o ano de 2023, Santa Catarina faturou US$ 11,6 bilhões com exportações de produtos diversos. As vendas de carnes de aves e suínos se destacaram no período. Naquele ano, o estado abateu 16,9 milhões de suínos, o que representou 29,5% do total nacional, perfazendo um aumento de 3,9% em comparação com o ano de 2022. Os frigoríficos catarinenses exportaram 603,7 mil toneladas de carne suína, 55,5% das exportações brasileiras nesse segmento.
O desempenho do segmento de carne de aves foi igualmente expressivo. Em 2023, Santa Catarina abateu 841,5 milhões de cabeças de frangos (aumento de 5,1%) e exportou 966,8 mil toneladas de carne in natura (crescimento de 8,9% na comparação com o ano anterior), respondendo, assim, por 20,4% do total exportado pelo Brasil no período. Para atingir esses números, as empresas investiram na expansão produtiva e no quadro funcional. Juntos, os frigoríficos empregam diretamente mais de 60 mil trabalhadores e outros 480 mil indiretamente (Fiesc, 2023).
Esse patamar de destaque foi construído ao longo de décadas de investimentos em tecnologia, logística, comunicação e preparo das empresas para aumentar a produtividade, com qualidade, visando ampliar a competitividade em um segmento de mercado bastante exigente. Mas essa posição confortável tem um ator muito relevante que desempenhou e desempenha significativo papel, que é a atuação do Estado enquanto fomentador da produção.
Em Santa Catarina, sobretudo a partir do acordo interestadual de limites (1916) e da criação dos municípios de Cruzeiro e Chapecó (1917), a presença estatal no processo de crescimento e desenvolvimento econômico foi marcante e, não raro, decisiva. No território recém-incorporado ao Estado, a colonização foi beneficiada por políticas públicas que priorizaram a reocupação do território por colonos descendentes de europeus, favorecidos no acesso à propriedade da terra, em detrimento das populações indígenas e caboclas, que foram marginalizadas. Foi também nesse cenário que se construiu a grande obra pública, a ferrovia São Paulo-Rio Grande, que permitia o fácil e rápido escoamento da produção, em especial ao centro do país.
A ferrovia e o avanço do processo de colonização também significaram a intensificação do extrativismo madeireiro. Essa atividade permitiu geração de capital, parte reinvestido no comércio e/ou na industrialização, mas provocou significativa devastação ambiental. Nesse processo também foram realizados diversos investimentos públicos, sejam ligados à infraestrutura ou concessão de crédito, entre outros, que pavimentavam o caminho para a instalação e consolidação das principais agroindústrias, as quais se especializaram no abate de suínos e aves, condicionando a matriz produtiva regional.
Outras ações do governo estadual na região, também significativas para o crescimento, incluíram a instalação da Secretaria dos Negócios do Oeste, um órgão público criado para favorecer a abertura e pavimentação de estradas, transmissão de energia elétrica, instalação de redes de telefonia e outros serviços públicos (Scheffer, 2019). Nesse sentido, outro marco histórico para os agricultores foi a criação da Associação de Crédito e Assistência Rural do Estado de Santa Catarina (Acaresc), em 1957. Essas iniciativas estavam intimamente ligadas à emergente indústria frigorífica.
É inegável que a ação estatal no Oeste de Santa Catarina, assim como em outras regiões do Brasil e do mundo, favoreceu amplamente o caminho para o chamado “progresso”. Como evidencia Mazzucato:
[…] a maioria das inovações radicais, revolucionárias, que alimentaram a dinâmica do capitalismo – das ferrovias à internet, até a nanotecnologia e farmacêutica modernas – aponta para o Estado na origem dos investimentos “empreendedores mais corajosos, incipientes e de capital mais intensivo. […] Tais investimentos radicais – que embutiam uma grande incerteza – não aconteceram graças a investidores capitalistas ou “gênios de fundo de quintal”. Foi a mão visível do Estado que fez essas inovações acontecerem. Inovações que não teriam ocorrido se ficássemos esperando que o “mercado” e o setor comercial fizessem isso sozinhos – ou que o governo simplesmente ficasse de lado e fornecesse o básico (Mazzucato, 2014, p. 26).
A partir dos anos 1970, as agroindústrias se tornaram hegemônicas na economia regional e ainda permaneceram no topo até a atualidade. Sua hegemonia econômica é tão grande e evidente que atinge até outros segmentos, incluindo a própria educação formal. Nesse sentido, conforme afirma Skrzypczak (2020), os trabalhadores dos frigoríficos são formados e capacitados para atender à lógica do capital ao qual estão ligados, aceitam receber salários baixos e cumprem longas jornadas semanais de trabalho, em um processo dialético marcado por uma relação de exploração de sua força de trabalho.
A gênese da formação agroindustrial do Oeste de Santa Catarina é marcada pela combinação de diversos fatores, entre eles a exploração madeireira é apontada como um dos pilares do processo de acumulação de capital necessário para a instalação dos primeiros frigoríficos na região.
Em 1941, durante o governo de Getúlio Vargas, foi criado o Instituto Nacional do Pinho (INP), um órgão ligado ao Ministério do Trabalho, cujo objetivo central seria disciplinar as atividades extrativistas madeireiras nos três estados do Sul do Brasil. Na prática, a missão do INP não era exatamente a proteção e preservação ambiental das florestas de araucárias. Pelo contrário, o objetivo era fomentar, por meio da exploração tida como racional, o segmento econômico que representava uma grande fatia das riquezas produzidas na região. No ano de 1949, estavam cadastradas, somente em Chapecó, 112 serrarias especializadas no processamento de madeiras nobres (Radin; Salini, 2015, p.13).
Pelo menos cinco personagens que inicialmente atuaram no ramo madeireiro fundaram ou ajudaram a fundar frigoríficos de grande porte no Oeste de Santa Catarina. É o caso de André Lunardi, (Frigorífico Diadema, em Xaxim, em 1939), AttilioSaullePagnoncelli (Comércio e Indústria SaullePagnoncelli, em Herval d’Oeste, em 1942), Plínio Arlindo de Nês (Sociedade Anônima Indústria e Comércio Chapecó - SAIC, em Chapecó, em 1952), Biágio Aurélio Paludo (Seara, em Seara, em 1956) e Orlando Jacob Cella (Aurora, em Chapecó, em 1969), entre outros (Alves, 2021).
O capital gerado pela exploração madeireira foi potencializado pelas exportações aos países vizinhos. Madeiras de espécies nobres, como cedro, imbuia e araucária, eram levadas para o Uruguai e para a Argentina por meio de balsas, nas ocasiões de enchentes do Rio Uruguai. Essa prática impulsionou e intensificou o extrativismo madeireiro, provocando, conforme já citado anteriormente, o surgimento de novas empresas especializadas no ramo.
A desenfreada derrubada das matas nativas para possibilitar a abertura de estradas, implantação de lavouras e construção de moradias, além do extrativismo comercial, chegou ao limite e provocou a escassez de madeira, já nos anos 1970 (Moretto, 2021). Mas o declínio da indústria madeireira já era visível antes, no período pós-Segunda Guerra Mundial, inclusive em Chapecó, o maior município do Oeste de Santa Catarina, onde uma série de acontecimentos sociais (como o linchamento de 1950), políticos e econômicos motivou a projeção de uma nova matriz produtiva baseada na instalação de um frigorífico. Promovida pelas elites locais, essa articulação de um projeto político visando o desenvolvimento econômico local ocorreu nos moldes dos ideais de progresso e da colonização iniciada nas primeiras décadas do século XX (Silva; Hass, 2017).
Assim, a geração de recursos a partir do extrativismo permitiu o investimento em abatedouros de animais, impulsionando um novo e próspero segmento econômico. A região denotava um conjunto de situações que favoreceram o desenvolvimento da atividade, pois já contava com um grande plantel de suínos, considerando que tal criação fazia parte da cultura dos colonizadores. Os frigoríficos se consolidaram inicialmente a partir da suinocultura, até a década de 1960 e, posteriormente, emergiu a avicultura, mas com um crescimento exponencial ano após ano.
Os rebanhos de suínos e aves formam os chamados circuitos produtivos que existem em quase todos os municípios da mesorregião Oeste de Santa Catarina, especialmente naqueles onde existem frigoríficos instalados. São mais de dez unidades de abate e processamento de aves, na faixa compreendida entre Chapecó a Capinzal-Ouro, e destes a Videira-Rio das Antas, além de alguns municípios a Oeste (Serra Alta, Sul Brasil, Palmitos, Iporã do Oeste e Itapiranga). O circuito espacial produtivo da suinocultura ocorre praticamente nos mesmos espaços em que ocorre a avicultura (Mapa 1). Concórdia, Videira e Seara abrigam os maiores rebanhos de suínos (Nascimento et al., 2021).
Mapa 1: Perfil da produção agropecuária na Mesorregião Oeste Catarinense
Fonte: Nascimento et al., 2024, p.61.
Além da exploração madeireira, Frattini (2023) destaca que outros fatores contribuíram para o desenvolvimento comercial e industrial do Oeste. Salienta que a forma como se reocupou o território com a colonização, a partir da pequena propriedade agrícola, fez com que a produção dos colonos impulsionasse o pequeno comércio e, em especial, a indústria moageira e frigorífica. A indústria frigorífica já começa a despontar ainda nos anos 1940, pela emergência de abatedouros e de pequenas indústrias. O fenômeno é facilmente observado em praticamente todo o território do Oeste, em que prevaleceu a colonização, especialmente na parte mais próxima da ferrovia São Paulo-Rio Grande.
Ao conjunto de fatores que estão na gênese dos frigoríficos de suínos e aves é necessário acrescentar o apoio do poder público, também em âmbito econômico e financeiro. Por meio de investimentos públicos, sobretudo em infraestrutura, essas empresas privadas tiveram condições favoráveis para a sua consolidação, em especial pela possibilidade para escoar a produção, além de incentivos fiscais em determinados períodos e auxílios financeiros gigantescos nas épocas de crise.
Em nível estadual, um conjunto de ações e planos se destacam a partir dos anos 1950, em diferentes fases e modelos de governo:
[…] de 1951 a 1956 (governo de Irineu Bornhausen), foi criado o Plano de Obras e Equipamentos (POE) que visava destinar recursos públicos aos investimentos em estradas de rodagem, energia elétrica, educação, saúde e agricultura. Em 1953, Bornhausen criou a Secretaria da Agricultura, desvinculando esse órgão da Secretaria de Viação e Obras Públicas. Em sua gestão, foram construídos ainda silos e pontos de vacinação de suínos. Os governos seguintes (Jorge Lacerda e HeribertoHülse) promoveram a interligação do oeste catarinense ao litoral.Em 61, foi realizado um Seminário Sócio-Econômico, formado por duassubcomissões, tratando dos seguintes temas: educação, energia elétrica, crédito, agricultura, transporte, mão-de-obra, saúde pública, carvão, mate, madeira, pesca, integração do oeste, turismo e planejamento regional. Esse seminário resultou no Plano de Metas do Governo (Plameg) sob a administração de Celso Ramos. O Plameg consistia em formular uma política global de desenvolvimento em Santa Catarina. Foram criados o Besc (Banco do Estado de Santa Catarina), a Celesc (Centrais Elétricas de Santa Catarina), a Secretaria dos Negócios do Oeste. Vale destacar que o governo federal criou, em 1961, o Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul, cujos objetivos gerais visavam o desenvolvimento dos trêsestados integrantes da região Sul(Giese, 1991, p. 68 apudEspíndola, 1996, p. 69-70).
O aparato estatal em prol da agropecuária e das agroindústrias brasileiras também ocorreu de forma expressiva em nível nacional com uma série de ações desenvolvidas especialmente a partir da ditadura militar, implantada em 1964, período em que foi criado
[..] o Plano de Ação Econômica do Governo (PAEG) o Sistema Nacional de Crédito Rural, o Fundo Geral para a Indústria e Agricultura (Funagri), que reunia o Fundo de Democratização do Capital (Fundece), o Fundo de Financiamento à Importação de Bens de Produção (Fibep) e o Fundo Nacional de Refinanciamento Rural (FNRR). O Funagri agregava recursos provenientes de entidades nacionais e internacionais, mobilizados pelo Banco Central, e saldos remanescentes das contas selecionadas. Administrado pelo Banco Central, esse fundo passa a ter uma conta própria junto às autoridades monetárias e, em 1967, vincula-se ao Sistema Nacional de Crédito Rural, a mola mestra da modernização da agricultura brasileira. […] a partir de 1967 foram criados vários outros fundos e programas específicos, como o Fundo para o Desenvolvimento da Pecuária (Fundepe), Fundo Especial de Desenvolvimento Agrícola (Fundag), Programa Nacional do Álcool (Proalcool), Programa Agroindústria (Pagri), Programa Nacional de Armazenagem (Pronazem) e o Programa de Corredores de Exportação (Corex)[…]Em 66, o governo brasileiro implanta o Finex, que atuou como mecanismo de financiamento de capital de giro às empresas exportadoras, adiantando receitas de vendas. Esse fundo recebeu a complementação do draw-back e o Befiex (Benefícios Fiscais à Exportação), criado em 1972, que concedia reduções de imposto de renda, isenções de IPI e ICM, crédito-prêmio e outros incentivos no seio do I Plano Nacional de Desenvolvimento. É nesse contexto mais geral que se insere a política de modernização da agricultura catarinense e de apoio às agroindústrias (Giese, 1991, p. 54 apud Espindola, 1996, p.70-71).
Ao longo dos anos os frigoríficos continuaram recebendo importantes aportes estatais em razão da grande participação que representam na economia catarinense. A SAIC é um exemplo típico dessa forte presença do Estado enquanto agente financiador do capital privado. Fundada em 1952, a empresa teve, entre seus fundadores, diversas personalidades políticas. No rol de acionistas aparecem o próprio prefeito de Chapecó na época, José de Miranda Ramos, e o futuro prefeito, João Destri. Há também os nomes do governador de Santa Catarina, Irineu Bornhausen, além de Aderbal Ramos da Silva, que havia governado o Estado um ano antes. O apoio público foi fundamental para o crescimento e desenvolvimento da empresa que, até o início dos anos 2000, ocupava papel de destaque no mercado nacional e internacional de carnes e derivados.
Entre as décadas de 1960 e 1970, o crédito público foi o principal instrumento financiador tanto para a promoção da modernização da agricultura brasileira, garantindo assim, insumos e matéria-prima, quanto para a expansão das agroindústrias. Logo no início dos anos 1980 a crise da dívida externa do Brasil reduziu os investimentos em financiamento agrícola e agroindustrial. Uma das maneiras de se obter dinheiro no período foi a venda de ações ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O Grupo Chapecó, com a venda de ações, capitalizou US$ 4,1 milhões (Belik, 1992 apudSerpa, 2014, p. 68).
O amparo governamental se tornou ainda mais evidente a partir dos anos 1970 e 1980. Alguns frigoríficos instalados na região Oeste catarinense passaram a contratar crédito diretamente com bancos oficiais mantidos pelo Governo Federal. Conforme Serpa (2014), a Sadia (hoje marca pertencente à gigante BRF) recebeu US$ 28,9 milhões do BNDES no ano de 1985. No mesmo ano, o Grupo Chapecó (SAIC) obteve outros US$ 2,1 milhões. O dinheiro foi usado para diferentes finalidades, incluindo pesados investimentos em projetos relacionados à expansão da estrutura das atividades e internacionalização dessas empresas.
As injeções de recursos públicos continuaram ao longo dos anos. Uma das mais célebres participações do financiamento estatal ocorreu em 2009, quando o BNDES injetou R$ 400 milhões para viabilizar a fusão da Sadia com a Perdigão, o que originou a BRF, uma das maiores empresas de alimentos do mundo. O dinheiro foi aplicado a título de integralização de capital, com as compras das ações ordinárias, o banco público se tornou um dos maiores acionistas da companhia alimentícia. Antes da fusão, a Perdigão Agroindustrial havia sido beneficiada com 27 operações de crédito via BNDES. A última injeção de recursos, no ano de 2008, totalizou R$ 334 milhões e serviu para financiar o plano de investimento da empresa no período 2006-2009 (BNDES, 2023).
Entre os anos de 2009 e 2013, a Marfrig realizou 40 aquisições de empresas com o intuito de crescer rapidamente no segmento frigorífico. Uma dessas aquisições ocorreu em 2009 e envolveu a compra da Seara, que pertencia à americana Cargill. O valor da transação foi de US$ 700 milhões. Uma parte desse processo de expansão só foi possível graças a financiamentos do BNDES. No ano de 2010, o banco público comprou R$ 2,5 bilhões em debêntures emitidas pela Marfrig em uma tentativa de transformar a empresa em uma gigante global no setor de alimentos (Época Negócios, 2013).
O papel desempenhado pelo Estado, assim como a participação direta de lideranças políticas nas iniciativas empresariais privadas, é observado quando se verifica o perfil de alguns personagens-chave do segmento. Boa parte dos empreendedores, de alguma forma beneficiados com dinheiro público, participou ativamente do meio político, muitas vezes exercendo cargos públicos, eletivos ou não.
Outros casos que podem ser usados como exemplos são osde Atílio Fontana (Sadia) e do próprio Plínio De Nês. Ambos foram prefeitos em suas cidades. Fontana também foi deputado federal por dois mandatos, entre os anos de 1955 a 1959 e de 1959 a 1963, e senador (1963-1967 e 1967-1970). Coincidência ou não, pertenceram às mesmas fileiras políticas: Partido Social Democrático (PSD) e Aliança Renovadora Nacional (Arena).
Com estreita relação com o poder político e econômico, os dois personagens mais emblemáticos ligados ao setor, Fontana e De Nês, utilizaram de sua influência política para melhorar as estradas na região ou abrir novas, além de uma série de outras obras de infraestrutura que, de diferentes formas, beneficiaram o crescimento de suas empresas. Foi assim, também, com a implantação de sistemas telefônicos, escolas, centros de formação educacional e com a contínua busca por tecnologias mais avançadas para melhorar e modernizar o processamento de carnes e derivados de aves e suínos. Essas ações, amparadas sempre pelo governo estadual, foram fundamentais para a ascensão das empresas ligadas ao ramo frigorífico.
Giese (1991) confirma esse apoio estatal, reitera a presença e influência dos empresários no campo político e afirma que as ações desses dirigentes industriais provocaram outros efeitos, inclusive no mercado de carnes.
Tudo indica que estes empresários atuaram estrategicamente de forma conjunta, principalmente ao longo das décadas de ´60 e ´70. Além de dividir territórios de integraçãoe de estabelecer preços – ação intermediada pelos sindicatos de carne, com sede nas próprias instalações da Sadia em Concórdia, foram desenvolvidas estratégias de ocupação de postos-chaves na administração pública através dos próprios empresários ou por intermédio de funcionários identificados com a idéia de que a modernização conservadora constituía o único caminho viável para o desenvolvimento. (Giese, 1991, p.63-64).
Mesmo com todo esse aparato, algumas empresas tiveram dificuldades financeiras e não sobreviveram. A SAIC passou por várias transformações ao longo de quase cinco décadas. Mas, após experimentar crescimentos vertiginosos nos anos 1970 a 1990, a empresa entrou em crise em meados dos anos 1990, período em que a família De Nês, que controlava todo o conglomerado, afastou-se. Nessa época, a SAIC e a sua subsidiária, a Chapecó Alimentos, acumulavam dezenas de financiamentos bancários, muitos deles com bancos públicos, contraídos no intuito de equilibrar as finanças. O BNDES aparece com destaque em transações financeiras milionárias que beneficiaram diretamente o frigorífico.
Em 1997, o Frigorífico Chapecó, ainda considerado naquele momento como a “terceira marca” do ramo agroindustrial do Brasil, atrás apenas de Sadia e Perdigão, via seu controle ser assumido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A mudança de comando teve o apoio do Banco do Brasil e do extinto Banco Bozano Simonsen, incorporado em 2000 pelo Banco Santander. A razão era a dívida da empresa, que em 1999, quando a Chapecó foi vendida por Plínio David de Nês (Maninho) para o grupo Macri, da Argentina, já chegava a US$ 285 milhões da época, mas foi reduzida a US$ 147 milhões após um acordo com o BNDES no mesmo ano. Esta mudança foi possível graças a uma concordata aberta em outubro de 1998, com período de dois anos. O acordo não ficou isento de problemas jurídicos, e em agosto de 2000, o Ministério Público Federal conseguiu a quebra do sigilo bancário de duas contas da empresa. Foi descoberto que o frigorífico recebeu empréstimos entre abril de 1997 e janeiro de 1998 no valor de R$ 54 milhões (R$ 237 milhões em valor atualizado), feitos pelo BNDES para socorro imediato ao frigorífico e a título de financiamento de exportações. No entanto, os procuradores federais afirmaram que as exportações nunca aconteceram (Lazzari, 2022).
Outro imbróglio, ainda não totalmente esclarecido, envolveu o próprio BNDES e ocorreu durante as várias tentativas de reerguer a empresa. Com o aval do Governo Federal, o então prefeito de Chapecó, Pedro Uczai, e a ex-deputada federal Luci Choinacki, ambos do PT, trabalharam nas negociações visando agilizar a venda da empresa a um grupo francês (Alves, 2021). O objetivo foi reduzir os efeitos da crise e evitar um colapso econômico principalmente nos pequenos municípios, como o foi o caso de Xaxim. A transação internacional não vingou conforme o esperado e, mais uma vez, o ônus foi repassado a um banco público.
Para reiniciar as atividades produtivas da agroindústria Chapecó Companhia Industrial de Alimentos, o BNDES aceitou receber apenas 3,2% do total da dívida de R$ 560 milhões, ou seja, cerca de R$ 18 milhões. Isso vai ao encontro do fato de que, na prática, o Estado representa um importante aliado do capital, constituindo-se em um verdadeiro financiador da burguesia, pois serve de forma generosa ao capital, resolve momentaneamente a crise produzida no seio do próprio sistema capitalista e lhe garante continuidade (Skrzypczak, 2020, p. 81).
A derrocada da Chapecó Alimentos ocorreu em 2005, quando a Justiça decretou a falência da empresa. Uma perícia judicial realizada na época apontou que a dívida global chegava a R$ 1 bilhão, um valor muito superior ao divulgado pelos controladores da empresa. Desse montante, R$ 560 milhões eram devidos ao BNDES. A perícia apontou a existência de, pelo menos, quatro mil credores, incluindo outras instituições financeiras públicas, como a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil.
Ao decretar a falência, a então juíza da 3ª Vara Cível de Chapecó, Rosane Portella Wolff, teceu duras críticas ao modelo de gestão da empresa. Escreveu que a tentativa de recuperar as finanças da empresa por meio de concordata era uma grande farsa, uma tentativa de camuflar as reais dívidas, pois já não havia mais o que recuperar diante do grave quadro de crise. No mesmo despacho, a magistrada também teceu duras críticas ao BNDES por ter ficado “apático e ausente” antes e após a concessão dos vários aportes financeiros milionários com dinheiro público (Poder Judiciário de Santa Catarina, Autos n. 018.04.000288-5, 2005).
Após anos de arrendamento, em julho de 2015, a Aurora comprou a unidade de suínos da Chapecó Alimentos, em Chapecó, pelo valor de R$ 235 milhões. A fonte dos recursos foi um financiamento de 12 anos, junto ao BNDES, Banco ABC, Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE) e Banco do Brasil (Globo Rural, 2015). Em outubro de 2020, a Aurora anunciou a compra da planta industrial de Xaxim. O valor da transação foi de R$ 173,85 milhões, sendo a metade à vista e o restante em cinco parcelas mensais. Não foram divulgadas as origens dos recursos financeiros (Alves, 2021).
Grande parte da dívida da Chapecó Alimentos, inclusive envolvendo o BNDES, continua sendo cobrada em um processo que tramita no Judiciário Catarinense há mais de 18 anos, o qual soma mais de 32 mil páginas. Pelo menos um financiamento do BNDES junto à Chapecó Alimentos, no valor de quase R$ 46 milhões, continuava ativo até outubro de 2023. Trata-se de um crédito concedido em maio de 2002 a título de apoio para exportações dos produtos da empresa. Já os reflexos dos problemas socioeconômicos causados pela crise da empresa continuavam em Xaxim, no Oeste de Santa Catarina, onde a SAIC mantinha um frigorífico de aves. O pequeno município sofreu com o desemprego, a inadimplência no comércio, a queda de arrecadação tributária, entre outros problemas.
Tudo isso mostra que não foi pequeno o montante de dinheiro público usado para socorrer e financiar o longo processo de expansão de diferentes iniciativas empresariais, incluindo o setor industrial. Também no Oeste de Santa Catarina, a Aurora Coop (antiga Coopercentral Aurora) aparece em destaque entre as agroindústrias que cresceram exponencialmente nos últimos anos graças ao fortalecimento financeiro obtido junto a bancos estatais como o BNDES. No ano de 2019, a Aurora projetava um faturamento anual de R$ 10 bilhões e já figurava entre os três maiores frigoríficos de aves e suínos do Brasil, atrás somente da BRF e JBS (Estigarribia, 2019).
No sítio eletrônico do BNDES (www.bndes.gov.br) existiam, em outubro de 2023, 132 operações de crédito em nome da Cooperativa Central Aurora Alimentos. Grande parte dessas operações aparecem liquidadas. Somados, os financiamentos ativos do frigorífico totalizavam quase R$ 922 milhões. Boa parte desse dinheiro foi usado para patrocinar aquisições de plantas industriais de marcas diversas que estavam instaladas em Santa Catarina, no Paraná e Rio Grande do Sul e amargavam momentos de forte crise.
Em setembro de 2012, a Aurora anunciou arrendar o frigorífico de frangos da Bondio Alimentos, em Guatambu, no Oeste de Santa Catarina. Sem divulgar os valores da transação, mantidos em sigilo por questões contratuais, o presidente da Aurora, Mário Lanznaster, explicou que o aumento dos custos de aquisição de milho, ingrediente indispensável na fabricação de ração animal, e a falta de socorro governamental eram os motivos apontados para uma crise que assolava o setor agroindustrial naquele momento.
Atualmente buscamos milho no Mato Grosso. Daqui a alguns dias teremos que ir ao Piauí ou ao Maranhão para trazer para Santa Catarina. Isso é desindustrialização. […] Nós queremos trabalhar e produzir. Quem precisa se agilizar é o governo, que espera tudo chegar ao extremo para tomar decisões […] (Diário do Iguaçu, 2012).
A posição manifestada pelo dirigente da Aurora na época é no mínimo paradoxal, pois mesmo diante da crítica a uma suposta inércia dos governos, o dinheiro público continuava sendo liberado periodicamente para financiar a expansão do capital agroindustrial. Prova disso é que meses depois do arrendamento, a Aurora obteve recursos públicos para adquirir as unidades da Bondio. No sítio eletrônico do BNDES aparecem mais dois financiamentos concedidos para a aquisição do frigorífico e de uma fábrica de rações, em Guatambu, e um incubatório no município de Xaxim, todos pertencentes à Bondio. Os contratos, assinados em junho de 2013, têm valores de R$ 41,9 milhões cada.
O financiamento público para grandes corporações privadas não foi privilégio apenas dos frigoríficos, também ocorreu com frequência e beneficiou empresas de diversas regiões e segmentos econômicos em Santa Catarina. Um caso emblemático ocorreu em Joinville, no Norte do estado, quando, em setembro de 2012, a Justiça decretou a falência da Busscar. A empresa, com mais de 60 anos de atuação na fabricação e exportação de carrocerias para ônibus, tinha uma dívida estimada em R$ 1,3 bilhão, sendo R$ 500 milhões em impostos e outros R$ 800 milhões para sócios, fornecedores e bancos, incluindo o BNDES. Por diversas vezes, o banco público socorreu a empresa. Em agosto de 2003, o BNDES injetou R$ 29 milhões para financiar a produção da empresa. O financiamento previa pagamento em 48 meses, mas no sítio eletrônico do BNDES (www.bndes.gov.br) o contrato permanecia ativo em outubro de 2023, ou seja, a dívida ainda existia, mesmo depois de 20 anos.
A exemplo da manifestação do dirigente da Aurora, as críticas ao aparelho estatal brasileiro se tornaram corriqueiras e, não raro, envolveram empresários de diferentes segmentos econômicos. Entre eles está Luciano Hang, dono da Havan, uma rede de lojas de comércio varejista, que adotou uma espécie de “mantra” ao afirmar, repetidas vezes, que “ser empreendedor no Brasil é ser herói”, numa clara alusão de contrariedade à atual carga tributária brasileira que, segundo ele, atrapalha o crescimento e o desenvolvimento econômico do país. Nas redes sociais, Hang adota roupas nas cores verde e amarela e se apresenta como um patriota que luta pelo Brasil.
O empresário só não se veste de patriota quando o assunto é o retorno que os impostos podem proporcionar ao país. Uma investigação feita pelo EL PAÍS e outros veículos brasileiros nos arquivos do Pandora Papers revelou que o empresário manteve por quase vinte anos uma empresa em um paraíso fiscal, no valor de 112,6 milhões de dólares, conforme constava em um extrato de outubro de 2018 (cerca de 416 milhões de reais na época). Por todo esse tempo, Hang não comunicou ao Governo brasileiro sobre a existência de sua empresa, o que configura crime de sonegação fiscal (El País, 2021),
As críticas e pressão que o capital exerce sobre o Estado muitas vezes atravessam fronteiras. Nesse sentido está o caso emblemático ocorrido nos anos 1940, quando o poderoso Nelson Rockefeller recorreu ao governo americano para pressionar o Brasil a aceitar a entrada de empresas estrangeiras no setor de petróleo. O objetivo era beneficiar uma empresa estadunidense. O governo brasileiro não cedeu e o desfecho do caso foi diferente.
A Esso ficou insatisfeita com o resultado da lei de 1953, que criava a Petrobrás, exigindo inclusive que o governo norte-americano realizasse retaliações ao Brasil por conta da criação do monopólio estatal nos setores de produção, transporte e refino do petróleo no país. Vê-se aí como havia no período uma intensa atuação de uma multinacional norte-americana junto às agências estatais norte-americanas, no caso o Departamento de Estado(Moura, 1986 p. 13-29, 76-90 apudCampos, 2014, p. 121).
Casos assim nos levam a concluir que a dubitável supremacia que o capital procura exercer sobre o Estado lembra a húbris demonstrada pelos capitalistas do agronegócio ao alardear que o poderio econômico, manifestado no uso de foguetes e de alta tecnologia para combater o granizo e outras intempéries climáticas, era uma prova de que o homem havia vencido a natureza em uma batalha imaginária que envolveu o complexo sistema de produção de maçãs no Oeste de Santa Catarina nos anos 1980 (Klanovicz, 2012).
Considerações finais
A contradição é o fator mais nítido que aparece ao analisarmos as plataformas de campanha e as políticas públicas implementadas por governos neoliberais. Há, ao mesmo tempo, condenação do Estado, acusado de ser uma instituição que atrapalharia o andamento natural da economia, e, por outro lado, a constante busca dos cofres estatais para financiar e auxiliar o capital privado nos momentos de investimento para crescer ou de socorrê-lo nos momentos de forte crise.
Ao se olhar mais atentamente para o caso dos frigoríficos do Oeste de Santa Catarina, percebe-se como são exemplos desse processo contraditório, pois se estabeleceram sob a proteção constante do Estado, cresceram e se desenvolveram mediante financiamento público, seja direto ou indireto, mesmo que continuem defendendo ideais neoliberais sintetizados no Estado mínimo. Algumas das maiores agroindústrias da região, como a Chapecó e a Aurora, figuram com destaque no ranking das empresas do setor que mais obtiveram benefícios financeiros junto aos bancos estatais, sobretudo do BNDES.
Nesse sentido, procurou-se evidenciar essa incoerência que permeia o ideal neoliberal tão perceptível em nosso tempo, de que o Estado deve ser mínimo, interferir o mínimo possível na economia e, no entanto, por outro prisma, sempre que o setor privado necessitar de amparo, que ele seja acionado para socorrê-lo. Grosso modo, a disputa política dos últimos tempos, no Brasil e no mundo, vem se dando ancorada na perspectiva neoliberal e, por outro prisma, pelo entendimento de que o Estado tem papel de planejador, articulador, apoiador e fomentador do desenvolvimento, permitindo que esse seja mais equitativo.
Com isso, não se pretende fazer apologia ao estatismo ou mesmo achar que o Estado seja a panaceia para todos os problemas, mas evidenciar que ele pode ter papel decisivo, enquanto ator voltado para a promoção do crescimento ou desenvolvimento econômico, social, ambiental e humano. Mesmo com suas inúmeras limitações, contradições e condutas tendenciosas, na defesa dos mais poderosos e de estar mais a serviço dele, o Estado é a instituição que tem condições de direcionar, regrar ou impor limites aos complexos mecanismos de funcionamento da economia e da sociedade. É a instituição capaz de criar políticas que produzam melhor equilíbrio e justiça social. Essas duas facetas do Estado aparecem claramente, ou de forma velada, nos debates políticos e no processo histórico. São perceptíveis em diferentes momentos da nossa história brasileira e, de forma emblemática, pelo caso chinês, sobretudo no último meio século.
No caso do Oeste catarinense, o Estado foi o grande agente promotor do crescimento, seja por meio de políticas públicas direcionadas a alguns setores, ou simplesmente pelo financiamento de iniciativas empresariais privadas, que fizeram uso de grande volume de dinheiro público. Assim, o crescimento atingido na região não é apenas fruto da “capacidade de trabalho” dos colonizadores, como com frequência se difunde, ou, ainda, da iniciativa dos que se denominam empreendedores, mas, em grande medida, também resultante de políticas e da possibilidade de obtenção de recursos públicos.
Também não é nosso entendimento que todo o investimento público teve finalidade social ou que resultou na maior socialização da riqueza produzida. Como se evidenciou, bancos públicos emprestaram montantes significativos, que dificilmente serão ressarcidos, como no caso da falência da SAIC. Esse é um exemplo típico da socialização dos prejuízos. Por isso, é necessário que as instituições públicas também sejam criteriosas e que, na concessão de recursos de caráter público, tenham também a exigência da contrapartida do retorno social.
Assim, pretende-se que o presente estudo provoque novas reflexões acerca do protagonismo do Estado na promoção de um desenvolvimento mais equilibrado e sustentável, que enfrente as desigualdades por meio de uma apropriação mais justa da riqueza produzida. Fica como questionamento final: qual seria o papel do Estado na reorganização do atual sistema produtivo? A história registra modelos com algum grau de êxito, seja do passado ou do presente. O desafio que se propõe é o de compreendê-los e ver em que sentido tais experiências podem servir ao nosso tempo.
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Aceito em 10/12/2024.
[1]Doutor em História. Docente na Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS). Brasil. E-mail: radin@uffs.edu.br| https://orcid.org/0000-0003-2674-2478
[2]Mestre em História. Técnico na Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS). Brasil. E-mail: luciano.alves@uffs.edu.br | https://orcid.org/0009-0005-6720-3405