Saara Ocidental, a última colônia africana: reconhecimento internacional, etnicidade e os aspectos de uma guerra invisível

Western Sahara, the last African colony: international recognition, ethnicity and the aspects of an Invisible War

                                                Edmar Avelar de Sena[1]

Nicole Horta de Freitas[2]

 


Resumo

Este artigo aborda o conflito no Sahara Ocidental, com foco na reivindicação de autodeterminação do povo saharauí. Apresentamos os aspectos históricos do conflito, analisando mudanças territoriais e conceitos de etnicidade. A abordagem inclui uma confrontação desses elementos com as limitações do direito internacional e as dinâmicas de poder que contribuem para a persistência do impasse em relação ao direito de soberania no território. O estudo inicia-se com uma análise detalhada da evolução histórica do conflito, destacando eventos-chave que moldaram a situação atual no Sahara Ocidental. Posteriormente, investiga as mudanças territoriais ao longo do tempo e como essas transformações influenciam as reivindicações territoriais das partes envolvidas. Além disso, o trabalho examina os conceitos de etnicidade e como eles desempenham um papel crucial na compreensão das dinâmicas sociais no Sahara Ocidental. A pesquisa adota a abordagem construtivista de Wendt para analisar a formação e transformação das identidades étnicas na região, destacando como esses elementos são construídos socialmente e podem ser fundamentais para a compreensão das demandas de autodeterminação. Ao confrontar esses elementos com as limitações impostas pelo direito internacional e as dinâmicas de poder em jogo, o trabalho busca identificar os obstáculos que contribuem para a manutenção do impasse no território.

Palavras-chave: Sahara Ocidental; Autodeterminação; Povo Saharauí; Etnicidade; Dinâmicas de Poder.

Abstract

This papper addresses the intricate conflict in Western Sahara, focusing on the self-determination claim of the Sahrawi people. The research explores the historical aspects of the conflict, analyzing territorial changes and concepts of ethnicity. The approach involves a confrontation of these elements with the limitations of international law and power dynamics contributing to the persistence of the impasse regarding sovereignty rights in the region. The study begins with a detailed analysis of the historical evolution of the conflict, highlighting key events that have shaped the current situation in Western Sahara. Subsequently, it investigates territorial changes over time and how these transformations influence the territorial claims of the involved parties. Furthermore, the thesis examines the concepts of ethnicity and how they play a crucial role in understanding social dynamics in Western Sahara. The research adopts Wendt's constructivist approach to analyze the formation and transformation of ethnic identities in the region, emphasizing how these elements are socially constructed and can be fundamental to understanding self-determination demands. By confronting these elements with the limitations imposed by international law and the power dynamics at play, the thesis seeks to identify the obstacles contributing to the maintenance of the impasse in the territory.

Keywords: Western Sahara; Self-determination; Sahrawi people; Ethnicity; Power Dynamics.


 

 

O contexto colonial e os aspectos étnicos do Saara Ocidental

A região do atual Saara Ocidental é palco de um contexto de refúgio, conhecido como um dos mais prolongados da história. A gênese desse conflito se localiza historicamente desde o processo global de descolonização iniciado no século XX. As fronteiras estabelecidas neste território nem sempre assumiram a forma como o Sistema Internacional delimita atualmente. A região, que passou a ter um controle administrativo conjunto entre Marrocos e Mauritânia (1975) quando a Organização das Nações Unidas solicitou a descolonização espanhola, torna-se palco de uma nova disputa que perdura os dias atuais e é responsável pelo êxodo de milhares de pessoas (Auti, s.d.).

A relação dos povos estabelecidas sob a ótica de configuração que existiu desde os séculos passados é parte estruturante do entendimento acerca das atuais reivindicações por autodeterminação e reconhecimento territorial da República Árabe Saharaui Democrática (RASD). A RASD teve seu primeiro governo em 1976, percebido como o resultado da luta da comunidade saarauí por emancipação. Apesar do reconhecimento de mais de 80 países e de constituir a União Africana (UA), a República controla uma pequena porção do território, que em sua maioria é ocupado por Marrocos. Em 1984, a UA buscou atender os objetivos de integridade e desenvolvimento do continente, aceitou a RASD como país membro, em face disso o reino do Marrocos deixou a Organização por 33 anos. Atualmente o governo Saharaui encontra-se exilado na Argélia (Tindouf) e conta com uma estrutura de governo presidencialista e uma constituição, estabelecida em 1976, que exalta a existência de um povo organizado: árabe, africano e mulçumano (Bontems, 1987).

 

Origens étnicas da população Saharaui e sua relação com o território

A população autóctone, conhecida como “povo Saharaui”, povoou, historicamente, o território do atual Saara Ocidental. A descendência desse povo origina-se do grupo nômade de berberes, que ocupava essa região desértica por volta do século V d.C., e não só influenciou o comércio regional, que neste contexto era dominante do povo Sanhajas, mas também foi influenciado pelo processo de arabização e islamização do território. Estes contatos, mais especificamente a incorporação do Islã aos povos berberes e aos Sanhajas, propiciaram a adoção do dialeto hassanya para ambos os povos e a adoção de costumes comuns que perduram até os dias atuais, delimitando assim uma unidade étnica (Estrada, 2014).

 

Em termos geográficos, no que diz respeito ao entendimento institucionalizado de fronteira política, pode-se afirmar que para as tribos o que havia era uma concepção de espaços, fronteiras e, consequentemente, o sentimento de pertença, a partir de suas movimentações (Estrada, 2014). O que se estima à época, são estas orientações a partir de desenhos feitos por geógrafos e antropólogos que retratam o contexto, conforme o Mapa 1 abaixo:

Mapa 1: Orientações regionais da população Saharauí

Fonte: Serrano; Estebán (2017).

 

Segundo Barth (apud Poutignat; Streiff-Fernart, 1997), etnicidade é uma forma de organização social baseada na atribuição categorial que classifica as pessoas em função de sua origem suposta que se acha validada na interação social pela ativação de signos culturais socialmente diferenciadores. Em outros termos, a construção da etnicidade está muito baseada na (i) categorização pelos não membros deste grupo e na (ii) identificação com um grupo étnico particular. Nesse sentido, o contexto histórico da população em questão e sua formação étnica se fazem relevantes para a discussão à medida em que tornam possível a percepção de descentralização de poder destes povos, tendo em vista que estes assumiram uma configuração nômade-pastoril na região, subdividida em tribos autônomas e seus conflitos regulavam-se por meio de representantes tribais (Estrada, 2014).

De acordo com Guibernau e Rex (1997, p. 1), no reader intitulado “The Ethinicty: nationalism, multiculturalism and migration”, o termo etnia tornou-se cada vez mais crucial nas ciências sociais nos anos 1960, um período marcado pela consolidação do processo de descolonização na África e na Ásia, com a criação de numerosos novos Estados-nação[3]. Considera-se que os argumentos anticoloniais e antirracistas também contribuíram para o vocabulário em que o termo “etnicidade” passou a ser utilizado por sociólogos e outros (Guibernau; Rex, 1997) a reconhecer “os sentimentos positivos de pertença a um grupo cultural” (Spoonley, [1988] 1993 apud Guibernau; Rex, 1997, p. 1, tradução nossa[4]).

Em contraponto, a partir do colapso dos regimes comunistas,

[...] aspectos mais negativos da etnia vieram à tona. A noção de limpeza étnica na antiga Iugoslávia trouxe a ideia da etnicidade em descrédito político. Por mais que compartilhassem a ideia positiva de sentimentos de pertença a um grupo, isto parecia implicar total hostilidade e genocídio com o grupo vizinho. Uma razão adicional para o uso cada vez maior do termo etnicidade era a vinda para o norte da Europa de imigrantes de sociedades pós-coloniais e de economias dependentes. Isso porque, essa presença na União Europeia foi vista por muitos como constituintes de problemas políticos, culturais e de identidade (Guibernau; Rex, 1997, p. 1, tradução nossa[5]).

 

A reflexão sobre etnicidade no processo de colonização do Saara Ocidental expressa a complexidade do conflito entre Marrocos e o povo Saharaui, já que a legitimação e prestígio das tribos estavam vinculados ao que se pode intitular como chef[6]. A importância de entender os aspectos étnicos pode ser exemplificada com o evento ocorrido no ano de 1900, em que tal legitimidade estava ligada ao Ma el Ainín. Isso porque este chef recebeu uma proposta do então sultão do Marrocos para que fosse estabelecida uma aliança de submissão ao reino, mas a tentativa do reino marroquino foi negada, uma vez que isso significaria submeter-se a outro povo e soberania. A possibilidade de submissão a outro povo culminou em uma declaração de guerra, em 1904, à população francesa que habitava a região que hoje é conhecida como Mauritânia (Suzin; Daudén, 2011).

Nesse sentido, a possibilidade de submissão ao reino marroquino ilustra, em termos étnicos, a relação histórica da imposição exógena cultural a este grupo, uma vez que este está constantemente exposto a imposições externas – organismos, aparelho governamental do Estado e/ou administração colonial – a tentativa de apagamento, por intitulação como minorias ou comunidades não reconhecidas por diretriz do poder exercido por grupos dominantes. É desta origem que se pode perceber a tenuidade do reconhecimento, pois a etnicidade diria respeito aos membros que se autodefinem e não a quem os atribui determinado rótulo, mas o modo como estes se definem só tem sentido a partir da referência e reconhecimento da exo-definição (Poutignat; Streiff-Fernart, 1997).

 

O processo de colonização do Saara Ocidental

Em paralelo às tensões regionais iniciadas pela proposta Marroquina e Mauritana, se pode apontar como significativa mudança, para a relação destes povos com a pertença a seu território, a ocasião da Conferência de Berlim, ocorrida entre os anos 1884 e 1885, em que “quatorze potências europeias estabeleceram as regras de como o continente africano deveria ser dividido, abrindo caminho para que os países assinassem acordos entre si, delimitando fronteiras” (Suzin; Daudén, 2011, p. 49). Por conseguinte, no ano de 1904, houve o estabelecimento de um tratado que iniciou a delimitação de fronteiras políticas para a região do Saara Ocidental, e especificamente, em 1906, a França estabeleceu um acordo com a Inglaterra que tornou a região do Marrocos seu protetorado[7] (Suzin; Daudén, 2011).

O Saara Ocidental foi colônia da Espanha no período de 1884 a 1976, dado o reconhecimento concedido pela Conferência de Berlim, em 1885, que conferiu à região um status de protetorado (Fiddian-Qasmiyeh, 2011). Durante este período, importantes movimentos em prol da libertação emergiram na região e culminaram na inclusão do Saara Espanhol na lista dos territórios que deveriam passar pelo processo de descolonização, determinada pela Organização das Nações Unidas (ONU). No ano de 1963, um homem chamado Bassiri ingressou na cidade de Smara em fuga do Marrocos, dado seu posicionamento e relevância para articulação para emergir o nacionalismo Saharaui. O marco de sua fuga foi chave para o reforço do movimento de libertação, em defesa do argumento de que o Saara pertencia aos saharauis, e sua influência e reivindicações ganharam significativa popularização na região, o que culminou, em 1973, na criação da organização nacionalista de Bassiri (Suzin; Daudén, 2011). A representatividade de Bassiri no processo de maturidade e emancipação do povo Saharaui foi decisiva para as estruturas ideológicas e capacidade estratégica do movimento. Isso porque atuou como responsável de contatos com a administração dos países envolvidos na colonização do território sem garantias legais de proteção como cidadão ou qualquer organização política reconhecendo o movimento inicialmente. O movimento iniciado por ele, culminou no primeiro posicionamento claramente nacionalista Saharaui, o manifesto foi estratégico e marcou um momento importante em que a administração colonial dos países vizinhos se autoproclamaram porta-vozes Saharauis no intuito de que estes não pudessem manifestar sua intenção de independência (Ahmed Adbalahe, 2015).

Cabe salientar que o movimento iniciado por Bassiri surge em meio à pressão da ONU pela descolonização do Saara Ocidental e durante o processo em que a Espanha pretendia convocar uma manifestação que demonstrasse a ligação dos Saharauis com a soberania espanhola na região. A pressão externa também decorria dos movimentos em prol da retirada estrangeira do território, defendida pelo Marrocos e pela Mauritânia neste contexto. Este cenário envolvendo a emergência das frentes pela descolonização, aliados à pressão internacional, também estiveram marcados pelo surgimento da Frente Popular de Libertação de Seguia El Hamra e Rio de Oro, a Frente Polisário (Suzin; Daudén, 2011).

Em 1974, em atendimento à demanda da ONU, a Espanha realizou um censo que visava avaliar a percepção da população em favor do referendo que possibilitaria a autodeterminação da população Saharaui. No entanto, além de o pleito não ter ocorrido, a possibilidade de independência do Saara Ocidental levou ao reino do Marrocos e a Mauritânia a solicitar à Corte Internacional de Justiça (CIJ) um parecer quanto ao pertencimento do território. A resolução da CIJ foi publicada em 1975, afirmando que o Saara Ocidental não pertencia ao Marrocos tampouco à Mauritânia, o que levou novamente a convocação do referendo pela autodeterminação do povo Saharaui (Suzin; Daudén, 2011).

Em completa divergência à normativa internacional, duas movimentações emergiram diante do parecer da CIJ: (i) o surgimento da Marcha Verde em busca de uma intitulada “reconquista do Grande Marrocos[8]”, pelo rei marroquino Hassan II, e (ii) a assinatura secreta de um acordo entre Marrocos, Mauritânia e Espanha estruturando “uma administração transitória tripartida do território até que esta última se retirasse, em 1976, e, em seguida, a administração fosse transferida aos outros dois países” (Estrada, 2014, p. 128). Por conseguinte, como forma de angariamento de legitimidade internacional e em busca de soberania do território, a Frente Polisário proclamou em 27 de fevereiro de 1976 a República Árabe Saharaui Democrática (RASD). A República funciona de forma sui generis[9] por sua administração e estrutura atuarem sob um território semi-autônomo concedido pela Argélia, além disso, mantém relações diplomáticas com os Estados que concederam reconhecimento e legitimação (Estrada, 2014). A unicidade da RASD se dá, portanto, por se tratar de um Estado criado e administrado sob uma situação de exílio[10], ou seja, uma situação que “reflete uma lógica de exclusão e deslocamento de cidadãos e residentes para fora do território e das esferas públicas de um Estado” (Roniger apud Quadrat, 2011, p. 31). Neste contexto, a população parte da República está sob territórios e modelos de vida que se diferenciam das de sua origem enquanto sociedade, como resultado de tensões prévias e processos de aculturação envolvidos na ocupação do Saara Ocidental (Roniger apud Quadrat, 2011).

A complexidade dessa configuração é reforçada “à medida em que ‘disjunções’ nos vínculos entre espaço, lugar, cidadania e nacionalidade levam a várias implicações de longo alcance” (Appadurai, 1997, p. 38). As concepções de território e territorialidade, em uma configuração de Estado-nação, servem como base lógica e crítica para a legitimação do poder do Estado. Em contraponto, a percepção de pertença e afiliação estão mais atreladas à concepção de nação. Nesse sentido, para o reforço da legitimidade do aparato estatal a integridade territorial é base continuamente atrelada à ideia de soberania (Appadurai, 1997).

O território do Saara Ocidental atualmente assume uma configuração que é fruto da invasão marroquina e da escalada do conflito em 1981, quando rei Hassan II “ordenou a construção de um muro com cerca de 2.500 km de extensão, cortando todo o Saara Ocidental e dividindo o território entre a parte ocupada por Marrocos (85%) e as “zonas liberadas” (15%) sob controle da Polisário” (Estrada, 2014, p. 138). É possível identificar as mudanças supracitadas, no Mapa 2 abaixo:

Mapa 2: Organização territorial após Marcha Verde

Uma imagem contendo Mapa

Descrição gerada automaticamente

Fonte: Tavares (2018).

 

É importante perceber que, em situações de dominação, como a que ocorre historicamente na região do Saara, as definições de pertença pelos membros e por aqueles exógenos ao grupo tendem a reforçar sua mútua pertinência. No entanto, em situações de dominação o que temos como resultado deste impasse são desníveis e desacordos entre os membros do grupo e aqueles que estão externos e lhes conferem a identidade. Estes desníveis, por sua vez, estão intrinsecamente relacionados a índices perceptivos de julgamento da pertença destes povos à medida que os fatos históricos são colocados à questionamento constante quanto a quem deve ser reconhecido como ator de direito a este território. No entanto, deve-se considerar que as divisões culturais elaboradas culturalmente pelo mundo social não são e tampouco devem ser incorporadas como dados naturais (Poutignat; Streiff-Fernart, 1997).

A escalada desde conflito, por sua vez, está ancorada nos problemas relacionados a discussão quanto a pertença e a diferenciação destes grupos étnicos, mas é também reforçada pela noção de ethnic boundary[11]. Isso porque distinguir-se por definição e forma de conquistar tal distinção significa estipular um princípio de fechamento e determinar uma fronteira entre o grupo e “outros” a partir de um determinado conjunto de traços culturais. Nesse sentido, para que se possa avaliar este caso de estudo é necessário que se avalie a elucidação dos fenômenos e condições de estabelecimento, manutenção e transformação de fronteiras entre os grupos envolvidos (Poutignat; Streiff-Fernart, 1997).

Pode-se compreender que, para discutir a questão do Saara Ocidental é essencial que as relações estabelecidas naquele território também sejam consideradas como parte da reivindicação Saharauí por autodeterminação. Isso porque, para além dos fatores atrelados aos conflitos que se iniciaram pela Conferência de Berlim, ou seja, pelo processo de colonização, as práticas dessa população desde suas origens étnicas e da forma como as regras e concessão de legitimidade ocorriam, foram e permanecem sendo proferidos, durante todas as reivindicações do Reino de Marrocos e da Mauritânia, como elementos para a construção de uma narrativa de soberania sobre o território.

Por conseguinte, ao analisar o processo de divisão territorial pós Conferência de Berlim, sob a ótica das decisões de direito internacional versus a capacidade de agência dos Estados que propiciaram a invasão do Saara Ocidental, é possível perceber que existe uma lacuna entre aquilo que as normas e responsabilidades internacionais demandam dos Estados e os problemas que ainda permeiam o processo de autodeterminação daqueles que, entre os atores com maior poder, talvez não possuam capacidade de transformar as estruturas normativas reificadas e costumeiras que possibilitariam sua afirmação como um Estado.

 

Influência Internacional: implicações das normas internacionais para o impasse do conflito Marroquino com a República Árabe Saharaui Democrática (RASD)

Os elementos que possibilitam o compartilhamento e legitimação das normas e regras em âmbito internacional estão atrelados à capacidade de agência dos atores internacionais. Para que um Estado seja reconhecido como sujeito, neste contexto, há de se considerar as discussões que tratam sobre a natureza deste reconhecimento, assim como dos elementos constitutivos que possibilitam essa estrutura. O impasse existente entre o Reino do Marrocos e a RASD, em parte, é resultado de uma contradição entre aquilo que está definido pelo direito internacional como decisão acerca da soberania e a falta dos elementos que possibilitariam maior solidez à Frente Polisário. Nesse sentido, ao observar o histórico que iniciou o conflito, existem fatores jurídicos e envolvendo as dinâmicas do Sistema internacional que precisam ser consideradas no processo que desencadeia este impasse.

 

Os elementos constitutivos de um Estado e o problema da natureza jurídica declaratória para o reconhecimento

A possibilidade de existência de um Estado está condicionada, do ponto de vista constitutivo, à alguns fatores essenciais para que este seja reconhecido como sujeito em âmbito internacional. São elementos essenciais: Povo, território, governo, capacidade de estabelecer Relações Exteriores e soberania. É importante pontuar que, no que diz respeito à “povo” considera-se “a totalidade dos indivíduos realmente residentes no território do Estado: como uma multiplicidade em si diferenciada, mista, constituída em grupos, mas organizada de forma igualitária e não-discriminatória” (Müller, 1998, p. 109 apud Fabriz; Ferreira, 2001).

No que diz respeito ao reconhecimento do Estado, a declaração de reconhecimento exerce uma função jurídica significativa para a possibilidade de formação ou validação de novas regras do direito internacional costumeiro, assim como para a interpretação dos princípios consagrados na Carta da ONU. Discute-se o caráter deste ato entre aqueles que sustentam o reconhecimento como um ato decisivo “[...] para o surgimento da personalidade internacional do novo Estado e dos direitos e deveres normalmente a ela associados” (Cançado Trindade, 2017, p. 101) e aqueles que defendem o caráter declaratório do ato de reconhecimento, em que este “[...] é tão somente um ato político, formal, que normalmente precede o estabelecimento de relações diplomáticas com um Estado, que já existe como tal” (Cançado Trindade, 2017, p. 101).

Assim, a despeito da controvertida discussão, há de se perceber que ainda que o Estado não seja reconhecido pela totalidade dos atores internacionais, espera-se e está implicada sobre este a responsabilidade internacional, inclusive a possibilidade de realização de acordos e negociações conduzidas ainda que exista o não reconhecimento. A Teoria Constitutiva do Estado (statehood) está vinculada de forma estreita ao ato unilateral do reconhecimento, independente do ato jurídico do reconhecimento, em função da teoria e a das práticas modernas quanto ao status e competência das unidades territoriais governamentais, e isso se dá mesmo que ainda não esteja estabelecida uma definição jurídica sólida de statehood (Cançado Trindade, 2017).

Em termos de Soberania, embora tenha surgido conceitualmente no século XVI, é possível identificá-la em séculos anteriores a partir de termos correlatos, à exemplo de supremacia, proeminência e hierarquias estabelecidas. A narrativa de significação moderna, passa a ser apresentada como conceito jurídico como um dos elementos que constituem um Estado (sujeito de direito), e representa o poder deste ator “[...] que se sobrepõe ou está acima de qualquer outro poder, não admitindo limitações, exceto quando dispostas voluntariamente por ele” (Fabriz; Ferreira, 2001, p. 121).

No estudo de caso acerca do processo de independência da RASD, que em 1976 proclama sua independência, evidenciam-se os pontos colocados em discussão sobre o caráter de reconhecimento do Estado e o fato deste apresentar limites quanto à soberania deste ator, essencialmente quando se trata de um ato declaratório. Isso porque, a RASD apesar de ser reconhecida por mais de 70 países e ser membro da UA, pode ser considerada como um ator não-estatal. Sua configuração sui generis, resultado dos processos de colonização e invasão do território a impedem de garantir os elementos constitutivos do Estado em sua totalidade e em mesma medida conflitam com o que até então as decisões internacionais determinaram como diretriz acerca da soberania do povo Saharauí.

Extrapolando as definições de direito internacional e correlacionando-as quanto às questões étnicas atreladas às fronteiras territoriais, há também de se reforçar aqui o problema da atribuição categorial vinculada à etnicidade, pois os atores neste caso identificam-se e são identificados por outros e quando somadas à questão fronteiriça são base para uma dicotomização “nós/eles”. Evidencia-se que ao decorrer do tempo, fronteiras étnicas podem ser mantidas, reforçadas ou até mesmo desaparecer. Tornam-se mais flexíveis ou rígidas. Quando há o reforço da fronteira étnica, o fenômeno geralmente está relacionado às identidades étnicas fortemente estruturadas e vinculadas a um sistema de estratificação socioeconômica (Poutignat; Streiff-Fernart, 1997).

As fontes normativas do direito internacional, neste sentido, também precisam ser colocadas em paralelo a forma como estes atores dão estrutura e promovem espaços de agência, legitimação, assim como a forma como estes mantém as normas e regras que por eles são constantemente construídas. Sendo assim, analisar os limites das definições de direito que garantiriam ou não autodeterminação da população Saharauí de forma isolada não possibilita que a forma como observamos as ações até então tomadas para a resolução deste conflito seja esclarecida.

Segundo a definição de 1956, proposta à Comissão de Direito Internacional da ONU, uma Organização Internacional consiste em “uma coletividade de Estados estabelecida por um tratado, com uma constituição e órgãos comuns, possuindo uma personalidade distinta da de seus Estados-membros, e sendo um sujeito de direito internacional com capacidade para concluir acordos” (Cançado Trindade, 2017, p. 105). Nesse sentido, ainda que a crença anterior às OI’s estabelecesse que somente órgãos estatais possuíam capacidade de formação de costume por suas práticas internacionais, o estabelecimento de tal coletividade em formato de organização passa a ter um papel essencial neste processo. Assim,

A atuação dos organismos internacionais, em setores os mais diversos, se externaliza habitualmente através de resoluções, de relevância e significação variáveis: algumas servem de instrumento de exortação, outras enunciam princípios gerais, e outras requerem determinado tipo de ação visando resultados específicos (Cançado Trindade, 2017, p. 106).

 

O reconhecimento do direito de autodeterminação dos povos e da soberania precisam ser apresentados como um processo que ocorre de forma contínua no tempo e que possibilita o mantimento do status quo de determinadas regras e/ou possibilita a revisão destas (Cançado Trindade, 2017).

 

Implicações resultantes da Corte Internacional de Justiça e da atuação da Organização das Nações Unidas

A governança internacional funciona como uma estrutura na qual os atores concordam intersubjetivamente, essencialmente por meio de instituições, e estas “[...] implicam a presença de princípios de autoridade, de normas, de regras e de procedimentos [...]” (Czempiel; Rosenau, 2000, p. 22). No Sistema Internacional (S.I.), a concordância entre os atores ocorre de acordo com o espelhamento de seus interesses compartilhados, para o estabelecimento da cooperação e da legitimação quanto ao que os diferencia e dá legitimidade a seus regimes. Valendo-se dessa afirmativa, pode-se perceber que a medida em que não há um consenso dos atores quanto à legitimidade e soberania do território do Saara Ocidental, possibilita-se que haja uma diferenciação entre os atores e, através da interação destas ideias, viabiliza-se que as forças materiais provoquem efeitos na política internacional (Wendt, 2003). Sendo assim, fronteiras étnicas são produzidas e reproduzidas no decorrer das interações sociais dos diferentes atores do sistema e a manutenção das mesmas é dependente e resultado direto da cooperação destes atores, de forma que para que haja o movimento de reforço e reconhecimento de fato, a cooperação de atores chave seria uma condição necessária para que a soberania RASD seja parte e reconhecida dentro do universo de membros do S.I. (Barth, 1997).

A contribuição quanto às forças materiais e seus efeitos na política internacional se fazem especialmente relevantes, à medida em que, para o construtivismo de Wendt, as capacidades materiais dos Estados estão condicionadas ao que os atores fazem dela. Ou seja, para que as capacidades materiais sejam utilizadas ou desenvolvidas depende-se do que os atores querem e acreditam (Wendt, 2003). Segundo Wendt (2003, p. 110, tradução nossa)[12], “na ausência de uma vontade de usar essas capacidades, esses efeitos não seriam ativados, não modificando o fato de que, quando ativados por um propósito humano, a distribuição de capacidades tem efeitos sobre os resultados”. A contribuição reflexiva do construtivismo estrutural propicia o entendimento acerca dos fatores que permitiram não só a Marcha Verde, ocorrida no Saara Ocidental, mas também os fatores que mantém a extensão do muro de areia que divide o território em um campo minado e uma série de violações dos Direitos Humanos que ocorrem na região até os dias atuais.

A ordem internacional constitui-se como “[...] um conjunto de entendimentos mantidos dentro de um contexto amplo para reger as atividades de todos (ou quase todos) os membros da sociedade internacional em largo espectro de temas específicos” (Czempiel; Rosenau, 2000, p. 21-22). Dessa forma, o S.I., essencialmente sob a forma de Organizações Internacionais (OI’s), é capaz de promover uma modificação no que os Estados querem, através da criação de novos interesses e valores e essas modificações implicam na alteração da ação dos Estados e de suas preferências (Finnemore, 1996). Para o conflito do Saara Ocidental, o entendimento deste processo é de extrema importância, já que o CSNU, que “detém a responsabilidade e a capacidade de tomada de decisões que envolvam a proteção e manutenção da paz mundial” (Alencar, 2015, p. 15), atua, de forma significativa, como uma fonte deste impasse e as principais potências concedem reconhecimento e legitimidade ao Reino do Marrocos. Em outros termos, o conjunto de normas que compõem o internacional, impactam nos interesses dos Estados, no que tange a tomada de decisão acerca do que é bom ou apropriado. A redefinição de interesses, portanto, é tratada como algo que está sendo moldado pelas normas e valores, sendo estes fatores os que estruturam o internacional e que dão sentido à vida política internacional (Finnemore, 1996).

A forma como o processo supracitado, de condicionamento e molde de normas, materializa-se a partir da agência dos Estados, e pode ser percebida, neste estudo de caso, com o estabelecimento da resolução 690 (1991) do Conselho de Segurança da ONU (CSNU). Isso porque, diante do impasse quanto a legitimação da soberania do território sarauí, os atores que compõe o CSNU estabeleceram uma Missão das Nações Unidas para o Referendo no Saara Ocidental (MINURSO), objetivando que o Saara Ocidental optasse entre sua independência ou a integração com o reino do Marrocos (MINURSO, [s.d]). A autoridade da instituição neste caso busca intermediar o conflito, de forma a propiciar que os atores concordem intersubjetivamente, ou seja, ainda que em termos de Direito Internacional as resoluções já estejam postas, a capacidade de agência dos Estados demanda que a presença desta instituição implicitamente mantenha “[...] a presença de princípios de autoridade, de normas, de regras e de procedimentos [...] que viabilizam o impasse” (Czempiel; Rosenau, 2000).

O mandato da MINURSO esteve em vigor até o dia 31 de outubro de 2023 e foi recomendado que seja estendido até outubro de 2024. Em seu relatório publicado no dia 03 de outubro de 2023, descreve a situação do referendum ainda sem resolução (MINURSO, 2022).

No relatório destacam-se as posições antagônicas de Marrocos e da Frente Polisário, uma vez que Marrocos reiterou a sua posição de que considera a autonomia como o único resultado viável de um processo político permanecendo a apelação pela integração do território e, em contraponto o povo saharaui, representado pela Frente Polisário, reafirmou que a autodeterminação continua a ser a única base de qualquer processo político (Security Council Report, 2023).

Nota-se que interesses políticos, econômicos e sociais não somente de Estados vizinhos, mas também de potências coloniais, fundamentaram e ainda moldam o andamento do referendo e o alcance do fim do conflito. Um exemplo é que o Conselho de Segurança, que tem a França e Estados Unidos como membros permanentes, possibilitaram que a ocupação não fosse tratada como um processo violento de expansão territorial, mas como exclusivamente um impasse relativo à autodeterminação (Barros, 2020).

Destaca-se ainda que o impasse quanto à soberania do território permaneça e o Saara Ocidental esteja na lista da ONU como Território Não-autogovernado, o Marrocos mantém relações comerciais beneficiando-se de recursos da região. Entre os Estados que mantém relações comerciais com o Marrocos, sobre produtos provenientes do território do Saara Ocidental, estão: Espanha, Croácia, Austrália, Japão, México, Nova Zelândia, Estados Unidos, Colômbia, Lituânia, Bulgária e Marrocos (Suzin; Daudén, 2011). Sendo assim, é possível perceber o impacto da atuação dos diversos atores internacionais envolvidos, desde a colonização e mediação até as relações comerciais existentes, ainda que contrárias ao Direito Internacional, para as relações de subsídio e de não concessão de reconhecimento à autonomia da RASD.

Em termos fronteiriços étnicos, a escala de inclusão e permanência destes povos aumenta ou diminui à medida que a distinção nós/eles é manipulada pelos atores externos. De forma geral, a fronteira que separa determinados grupos é constantemente redefinida pela interação de mecanismos internos e externos com base em uma percepção externa globalizante (Poutignat; Streiff-Fernart, 1997). Ou seja, para a realidade deste conflito tem sido constituída uma construção cultural contínua que possibilita a deslegitimação do movimento de independência do Saara Ocidental e o mantimento da legitimação marroquina (Estrada, 2014).

Ao analisar os fatores jurídicos que viabilizam a formação de um Estado, bem como sua capacidade de estabelecer relações e ser legitimado, é possível perceber a interface existente entre os fatores que os constituem e a controversa discussão acerca da natureza de reconhecimento deste ator. As estruturas que são construídas e mantidas pelos Estados dependem do quanto estes atores são capazes de atuar e influenciar essas normas, manifestando seus interesses e compartilhando-os em consenso com os demais atores.

À medida em que a RASD possui capacidade limitada de seu reconhecimento declaratório e elementos estruturantes que o construíram como estrutura Estatal são vedados a seu acesso, a manifestação de um impasse é constantemente reíficada. Sendo assim, é importante perceber que o mantimento de tais estruturas e práticas está diretamente vinculado aos atores envolvidos no conflito e em sua capacidade material de promover o mantimento de determinadas narrativas para a permanência da não resolução.

 

O processo de apagamento e a permanência de um impasse: uma perspectiva analítica sobre as dinâmicas de poder envolvidas no conflito

No que tange a análise relativa ao poder dos Estados, percebe-se que este fator perpassa o arrolar de situações que promoveram a repartição do que o estudo chama de “última colônia Africana”. Desde o processo de colonização, reconhecimento de soberania, formulação das organizações internacionais e a forma como as normas e regras em ambiente internacional são mantidas e/ou modificadas. É notório que a atuação de determinados atores tem sido crucial para a existência de um impasse, sendo assim, as diretrizes formuladas e aderidas pelos Estados para o Direito Internacional acabam conflitando e em alguma medida com a capacidade política de aplicação de tais resoluções e, portanto, as dinâmicas de poder somam-se, com certo peso, a todos os fatores que promoveram o conflito a este patamar.

 

O papel das narrativas para o não reconhecimento da autodeterminação e para o apagamento da etnicidade da população Saharaui

Segundo a perspectiva construtivista de Alexander Wendt, a construção da política internacional constitui-se como um fenômeno social. Em outros termos, a estrutura internacional é tida como uma “distribuição de conhecimento”, já que a base da sociabilidade é o conhecimento compartilhado. Sob tal ótica, pode-se considerar que o papel das ideias e normas assumem um caráter substancial, já que impactam e constituem a definição tanto da realidade, quanto das identidades e interesses dos agentes (Wendt, 2003). É possível afirmar que os grupos étnicos, neste cenário e considerando aquilo que é socialmente efetivo, são percebidos como uma organização social. Nesse sentido, “uma atribuição categórica é uma atribuição étnica quando classifica uma pessoa em termos de sua identidade básica mais geral, presumivelmente determinada por sua origem e seu meio ambiente” (Barth, 1997, p. 193-194).

São a partir destas categorias e com objetivo de interação que os grupos étnicos se formam no sentido organizacional e as características que os definem não se constituem, necessariamente, com diferenciações objetivas, mas sim naquilo que os atores consideram significantes. O conteúdo cultural que compõe tais dicotomias étnicas estão ancoradas essencialmente em duas ordens (1) traços que as pessoas exibem e buscam para demonstrar sua identidade – tais como língua, vestuário e estilo de vida; e (2) orientações de valores fundacionais – aquilo que determina a moralidade e a forma como as ações são julgadas (Barth, 1997).

Nesse sentido, a medida em que o espelhamento dos interesses dos atores está em desacordo à norma que determina pela soberania e autodeterminação da população Saharaui há a construção do que Wendt intitula como “Other”, ou seja, uma construção discursiva daquele que representa um inimigo. Neste contexto, o povo Saharaui, enquanto other, sofre os efeitos de uma construção social que reverbera no apagamento e não legitimação vinculado ao processo que Hall explica a partir das características étnicas de uma população, pois o autor afirma que a “etnicidade gera um discurso em que a diferença se funda sob as características culturais e religiosas” (Hall, 2009, p. 67).

A modificação para a construção social mencionada se dá devido ao fato de que “o contexto normativo também muda com o tempo, e como as normas e valores internacionais mudam, eles criam mudanças coordenadas nos interesses e comportamento do Estado em todo o sistema” (Finnemore, 1996, p. 2, tradução nossa)[13]. Importante retomar neste momento que, ainda que a CIJ tenha decidido e declarado a não soberania de Marrocos e Mauritânia sob o território, a definição de status de direito permanece em questão até o ano atual (2023).

As ideias, neste processo de construção, dão, em grande medida, sentido ao poder e ao conteúdo destes interesses. Sendo assim, a agência é construtora social de suas práticas e a estrutura é tanto meio quanto resultado da reprodução de práticas, além de moldar a conduta da agência (Wendt, 2003). É importante perceber que as normas consistem nas “[...] expectativas compartilhadas sobre o comportamento apropriado de uma comunidade de atores” (Finnemore, 1996, p. 22, tradução nossa)[14] e podem ser entendidas como ideias sobre o comportamento que são coletivamente mantidas (Finnemore, 1996). No entanto, “são as crenças dos atores que constituem o conhecimento compartilhado e suas práticas que confirmam ou falsificam esse conhecimento ao longo do tempo” (Wendt, 2003, p. 188, tradução nossa)[15].

A relação histórica entre o reino marroquino e a França assume um caráter de extrema relevância, já que a atuação francesa, através da CSNU tem empenhando-se na garantia de ineficiência da OI para a resolução do conflito. À exemplo disso, pode-se mencionar o veto da França em 2009 e 2010, quanto “a inclusão do monitoramento dos direitos humanos na MINURSO, que é a única missão de paz da ONU que não tem provisões sobre os direitos humanos, a despeito das constantes denúncias de violação contra o reino do Marrocos” (Estrada, 2014, p. 133). Cabe salientar que a CSNU se constitui como a instituição da ONU cujas resoluções têm capacidade vinculante de implementação e que para que a resolução seja aprovada é “necessário haver nove votos a favor e que nenhum dos cinco permanentes seja contra (também chamado de ‘unanimidade das grandes potências’)” (Alencar, 2015, p. 18).

Tratando-se de unanimidade de potências, a atuação dos Estados Unidos (EUA) também pode ser percebida como uma participação que restringe, de forma significativa, práticas que possibilitem o reconhecimento e a autodeterminação do povo Saharaui no S.I. Isso porque, para além de também ocupar a posição de membro permanente da CSNU e legitimar a soberania marroquina, possui uma participação no conflito que é historicamente ampla. A relação marroquina com os EUA advém desde que o reino reconheceu a independência estadunidense, sendo o primeiro ator internacional a fazê-lo. Além disso, pode-se pontuar a questão geoestratégica da região do Marrocos para a extensão de influência do governo estadunidense e o fato de o Marrocos ter sido um aliado significativo durante o período da Guerra Fria. No que tange a discussão sobre a construção cultural do other, a relação que rege os pronunciamentos dos Estados Unidos é mantida enquanto discurso de uma narrativa que coloca a RASD como uma ameaça (Estrada, 2014).

Cabe reforçar que, em 2021, os Estados Unidos, através do mandato de Biden, optaram por reconhecer a soberania do reino marroquino sobre o Saara Ocidental, contrariando o que foi determinado pela CIJ e este é membro permanente do CSNU que conduz as operações da MINURSO (RFI, 2021). No que diz respeito à França, também é importante ressaltar que como membro permanente, juntou-se abertamente a Carta Aberta ao Reino Marroquino emitida pela Espanha, Estados Unidos e Emirados Árabes Unidos, em que estes atores afirmam que a autonomia marroquina se dá como a única alternativa sólida e viável para a solução do conflito (Sanz, 2022).

 

As práticas das grandes potências e sua influência para a legitimação de que há um impasse em detrimento das decisões já estabelecidas sobre o conflito

O processo de acompanhamento relatado pela MINURSO, quanto às negociações e posicionamento dos atores internacionais têm explicitado a dificuldade de encontrar um caminho ao referendum e, acima disso, mantido o impasse por meio das narrativas que são validadas neste processo. Segundo o relatório da MINURSO em 2022, a manifestação da Frente Polisário vem reiterando que a necessidade do alcance da autodeterminação tem motivado o regresso às hostilidades como uma única saída, já que a comunidade internacional tem dado pouca atenção ao conflito. Ainda através do relatório, é possível perceber a veemência com que os vizinhos territoriais se manifestam em favor de uma discussão baseada na proposta marroquina de soberania nacional e integridade nacional (CSNU, 2022).

Entre as grandes potências envolvidas no conflito é importante mencionar que a Espanha formalizou seu posicionamento em 2022 em favor da solução proposta por Marrocos em 2007, pela soberania do Rei Mohammed VI na região, destacando-a como a única base para uma solução factível (CSNU, 2022). O posicionamento francês, por meio da representação de Catherine Colonna, também foi reforçado neste ano como “clara e firme” em favor do plano de autonomia marroquino. Seguido deste posicionamento, em março de 2023, a União Europeia se posicionou em favor de uma solução durável que seja suportada pela coordenação da MINURSO e os Estados Unidos reforçou que entende a autonomia do Marrocos como a única decisão séria, confiável e realista para atender às aspirações do Saara Ocidental (CSNU, 2023).

A influência marroquina tem ganhado expressivo fôlego se avaliado em termos de apoio recebido pelas potências versus o reforço pela necessidade do referendum e do cumprimento da decisão da CIJ. O movimento dos discursos associados ao conflito, vide menções supracitadas, tem se direcionado meramente à discussão de quais das propostas são mais factíveis. Isso pode demonstrar um enfraquecimento da decisão, em termos de direito internacional, da CIJ e da narrativa reiterada quanto à necessidade de uma votação para decisão de soberania.

Se por um lado nota-se uma escalada do conflito, desde a declaração da Frente Polisário, em 2020, pela desistência do seu compromisso com o cessar fogo, assinado em 1991, também é possível afirmar que há um movimento coordenado para estruturação de um arranjo que possibilite uma negociação mais assertiva do referendum. Entre os dias 13 e 17 de janeiro de 2023 a população saharaui, vinda dos diversos acampamentos de refugiados do território, estiveram reunidos para o 16º Congresso contra a invasão do Marrocos, com os objetivos de (1) definir o próximo secretário-geral da Frente Polisário e (2) elaborar as táticas e políticas para os próximos três anos que estes pretendem estar dedicados a luta pela reconquista do território. Além da presença da população e dos delegados da Frente Polisário, delegações de países aliados e associações solidárias ao reconhecimento e autodeterminação também estiveram neste congresso (De Mello, 2023).

O 16º Congresso marcou não somente a decisão pela reeleição de Brahim Ghali, mas o reforço da percepção de que a influência e intermediação de mais de 40 anos de negociação coordenada pela MINURSO não estão caminhando para uma resolução de fato. Desde o congresso, houve a retomada de ações armadas pelo Exército Popular de Libertação Saharaui voltados ao muro de extensão de 2,7 mil km, que divide o território do Saara e foi construído pelo governo marroquino.

Buscamos todo tipo de soluções. Lutamos, esperamos, negociamos. E para todo o povo saharaui, que quer conquistar a independência, a única maneira pela qual vemos que isso possa ser viável é voltar à guerra e mandar essa mensagem ao mundo: ninguém conquista o direito à sua terra sem lutar. [...] Qual seja a melhor forma do mundo ver a nossa causa, nós adotaremos, mas não abandonaremos nossos fuzis, contra um inimigo que nos expulsou do nosso território, nos tratou mal e está sendo apoiado por várias potências ocidentais contra um povo humilde e lutador. Paco Sidha, oficial do Exército Popular (De Mello, 2023).

 

A partir da articulação deste congresso, foi possível perceber uma mudança na estratégia da Frente, uma vez que para além do enfrentamento por via de lutas armadas contra a invasão marroquina existe um movimento pela organização política encontrar condições diplomáticas para o referendo (De Mello, 2023).

Em contraponto ao que as grandes potências que compõem o CSNU e que coordenam a intermediação da MINURSO vem estruturando em termos narrativos, é importante mencionar o papel da formação da Conferência Europeia de Apoio e Solidariedade com o Povo Saharaui (EUCOCO). Já que, em termos de validação de normas e de reconhecimento sobre a autodeterminação da população enquanto sujeito de direito na comunidade internacional, essa institucionalização do grupo Europeu a favor do reconhecimento tem papel fundamental para romper a reificação de práticas que invalidam a decisão da CIJ e em reforçar a garantia de um referendum pela autodeterminação (Gasteiz, 2023).

A EUCOCO realiza-se anualmente desde 1975, data que marcou a ocupação de Marrocos, e é recebida a cada ano por uma cidade europeia distinta. Entre os países que recebem a EUCOCO historicamente estão: Alemanha, Áustria, Bélgica, Espanha, França, Itália, Países Baixos, Reino Unido e Suíça. Destacando que uma das conferências ocorreu em territórios da RASD (acampamentos em Tindouf, Argélia). Em 2023, ocorreu a 47ª edição da conferência, durante a primeira semana de dezembro, na Espanha (Sahara Ocidental, 2023). O foco da conferência é especialmente interessante, do ponto de vista do estudo aqui apresentado, pois teve foco em estabelecer um plano de ação para o próximo ano que fomente e fortaleça as estruturas do Estado Saharaui, para que assim se possa avançar na agenda quanto ao reconhecimento. Nesse sentido, mais do que contar com a via de intermediação da MINURSO, o Estado está buscando constituir e redefinir tanto a realidade, quanto das identidades e interesses dos agentes através de um planejamento para evitar escaladas militares e reconquistar o respeito da comunidade internacional.

Ainda que sediado na Espanha, o evento também reforçou a pressão ao governo espanhol para reversão de seu apoio às atuais reivindicações marroquinas e o pedido de que haja um aumento da cooperação deste estado quanto a agenda humanitária com os refugiados saharauis em Tindouf. É possível perceber, através de organizações com esta, a tentativa da RASD de comunicar suas preferências e reivindicar seu espaço dentro de uma estrutura narrativa e de socialização. Este movimento visa essencialmente criar novos interesses e valores, modificações que impliquem na alteração da ação dos Estados e de suas preferências sob a estrutura e acompanhados de atores que já são reconhecidos pela comunidade internacional (SPS RASD, 2023).

Este movimento estruturado tem reverberado em ações coordenadas com delegações europeias, à exemplo das que estiveram no congresso pressionando os governos em âmbito institucional. Alguns grupos da sociedade civil também marcaram presença, a exemplo do Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra (MST), para discutir possíveis soluções quanto à produção de alimentos e contribuir com soluções relacionadas à formação de política (De Mello, 2023).

Como uma forma analítica quanto às questões de construção narrativa e legitimação, atreladas à discussão sobre natureza declaratória do Estado e elementos constitutivos dessa estrutura, cabe retomar que em documentos oficiais da organização MINURSO a RASD tanto não alcançou seu reconhecimento que sua representação é entendida como uma Frente Popular. De um lado estão aqueles que apoiam a ocupação marroquina, de outro os manifestos da Frente Polisário e aqueles atores que adotam o que chamam de “neutralidade positiva”, assim como, o reforço de tal neutralidade pelo posicionamento das principais potências que confere “manifestações de apoio de seus interlocutores aos esforços das Nações Unidas para facilitar uma solução política para a situação no Saara Ocidental” (CSNU, 2022, p. 6/18, tradução nossa)[16].

Nesse sentido, embora haja uma manifestação expressa da organização pela autodeterminação dos povos, o reconhecimento tem se mantido condicionado às manifestações dos diversos atores internacionais e por um impasse devido à baixa capacidade de agência daqueles que apoiam a autodeterminação.

 

Considerações finais

Compreendemos que a questão do Saara Ocidental é essencial para que as relações estabelecidas naquele território também sejam consideradas como parte da reivindicação Saharauí por autodeterminação. Isso porque, para além dos fatores atrelados aos conflitos que se iniciaram pela Conferência de Berlim, ou seja, pelo processo de colonização, as práticas dessa população desde suas origens étnicas e da forma como as regras e concessão de legitimidade ocorriam, foram e permanecem sendo proferidos, durante todas as reivindicações do Reino de Marrocos e da Mauritânia, como elementos para a construção de uma narrativa de soberania sobre o território.

Ao analisar o processo de divisão territorial pós Conferência de Berlim, sob a ótica das decisões de direito internacional versus a capacidade de agência dos Estados que propiciaram a invasão do Saara Ocidental, é possível perceber que existe uma lacuna entre aquilo que as normas e responsabilidades internacionais demandam dos Estados e os problemas que ainda permeiam o processo de autodeterminação daqueles que, entre os atores com maior poder, talvez não possuam capacidade de transformar as estruturas normativas reificadas e costumeiras que possibilitariam sua afirmação como um Estado. Os fatores jurídicos que viabilizam a formação de um Estado, bem como, sua capacidade de estabelecer relações e ser legitimado, é possível perceber a interface existente entre os fatores que os constituem e a controversa discussão acerca da natureza de reconhecimento deste ator. As estruturas que são construídas e mantidas pelos Estados dependem do quanto estes atores são capazes de atuar e influenciar essas normas, manifestando seus interesses e compartilhando-os em consenso com os demais atores.

A medida em que a RASD possui capacidade limitada de seu reconhecimento declaratório e elementos estruturantes que o construíram como estrutura Estatal são vedados a seu acesso, a manifestação de um impasse é constantemente reíficada. Sendo assim, é importante perceber que o mantimento de tais estruturas e práticas está diretamente vinculado aos atores envolvidos no conflito e em sua capacidade material de promover o mantimento de determinadas narrativas para a permanência da não resolução.

A importância das construções narrativas promovidas e mantidas por países envolvidos no conflito estão por trás das decisões que movimentam a fragmentação do território do Saara Ocidental assim como propiciaram a ocupação marroquina. Nesse sentido, ao longo do estudo percebemos que o entendimento sobre como essas estruturas sociais atuam como ferramentas que viabilizam a legitimação de determinadas ações e/ou neutralidade, interferindo no processo de possibilidade de cumprimento vinculante da decisão já proferida pela CIJ pelo referendum de autodeterminação. A partir das perspectivas de poder e posicionamento dos diversos atores internacionais, essencialmente compostos pelos países do Conselho de Segurança da ONU, fica claro que o impasse se dá devido à condicionalidade de um consenso sobre aquilo que se entende como o comportamento mais apropriado por essa comunidade de atores. As percepções dos membros que compõem essas estruturas de poder e coordenação do sistema são aquelas que, atualmente, permitiriam uma atuação no sentido de resolução.

Percebe-se, portanto que a atuação dos diversos atores internacionais envolvidos no conflito impactam de forma significativa a permanência de um impasse quanto a resolução do referendum. A interferência perpassa o processo de colonização, a definição e criação da MINURSO para a mediação e inclusive as relações comerciais existentes em que Marrocos, ainda que contrariando o direito internacional, extrai valor do território e comercializa para importantes potências o que fortalece as relações de subsídio e de não concessão de reconhecimento à autonomia da RASD.

A existência de um fortalecimento da narrativa que reforça uma distinção “nós/eles” pelos atores externos é impulsionada por uma estrutura cultural globalmente interessada por estes status. Para que haja uma real solução quanto ao impasse, as atividades e forma de atuação, assim como a capacidade de interferência dos estados que compõem o conselho de segurança precisam ser revistos, caso o contrário não há margem para que a decisão da CIJ tenha capacidade vinculante de fato.

 

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Recebido em 07/01/2024.

Aceito em 24/03/2024.



[1] Doutor em Ciência da Religião pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), docente do Departamento de filosofia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC MINAS). Brasil. E-mail: edmarsena.mg@gmail.com | https://orcid.org/0000-0002-0082-5091

[2] Bacharel em Relações Internacionais pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC MINAS). Brasil. E-mail: nicolehortaf@gmail.com | https://orcid.org/0000-0002-8781-8264

[3] “The term ethnicity became increasingly crucial in the social sciences in the 1960s, a period marked by the consolidation of the process of decolonization in Africa and Asia as numerous new nation states were created”.

[4] “[...] the positive feelings of belonging to a cultural group”.

[5] “[...]In more recent years, since the collapse of the Communist regimes, more negative aspects of ethnicity have come to the fore. The notion of ‘ethnic cleansing’ in the former Yugoslavia brought the very idea of ethnicity into political disrepute. However much a sense of shared ethnicity created positive feelings of belonging to an in-group, it seemed to imply total hostility and genocide towards neighboring out-groups. An additional reason for an increasing use of the term ethnicity was the coming to northern Europe of immigrants from post-colonial societies and from dependent economies. Their presence in the European Union was seen by many as constituting a political problem, a cultural problem and an identity problem”.

[6] “Chefe de uma tribo nômade que é encarregado de gerenciar os acordos da Yemmá. Não possui autoridade para tomar decisões sozinho”.

[7] “Protetorados: há uma relação de proteção entre os Estados. Por meio de um tratado, fixa-se a obrigação de um Estado proteger o outro como obrigação, sendo que como recompensa, tem a faculdade de gerir as relações internacionais do protegido na sua integralidade ou parcialmente, podendo até mesmo reger relações internas (Silva, 2008, 190). Ex. sultanato de Brunei e Reino Unido e protetorado da França e Espanha sobre o Marrocos.” Disponível em: https://www.inesul.edu.br/professor/arquivos_alunos/doc_1558818854.pdf

[8] O conceito e afirmação que passou a ser utilizado como “Grande Marrocos” está atrelado ao movimento expansionista fortalecido e subsidiado pelo nacionalismo marroquino (Migon, 2015). O Grande Marrocos, portanto, foi o projeto geopolítico que pretendeu redefinir as fronteiras políticas do país (Duque Estrada, 2016).

[9] Único; que não se parece com nenhum outro; único em seu gênero: expressão sui generis; inteligência sui generis. Disponível em: https://www.dicio.com.br/sui-generis/

[10] Exílio é a remoção permanente ou de longo prazo de seu local de origem, geralmente como uma punição imposta pelo governo ou outro poder superior. Disponível em: https://www.oxfordreference.com/display/10.1093/oi/authority.20110803095804470#:~:text=Exile%20(phyg%C4%93%2C%20lit.,government%20or%20other%20superior%20power.

[11] […] liga-se à ideia de que são em realidade tais fronteiras étnicas e não o conteúdo cultural interno que definem um grupo étnico e permitem que se dê conta de sua persistência (Poutgnat; Streiff-Fernart, 1997, p. 153).

[12] “The fact that in the absence of a willingness to use those capabilities these effects would not be activated does not change the fact that, when activated by human purpose, the distribution of capabilities has independent effects on outcomes”.

[13] “The normative context also changes over time, and as internationally held norms and values change, they create coordinated shifts in state interests and behavior across the system”.

[14] “shared expectations about appropriate behavior held by a community of actors”.

[15] “It is actors' beliefs that make up shared knowledge, and their practices which confirm or falsify that knowledge over time”.

[16] “[…] expressions of support by his interlocutors for the efforts by the United Nations to facilitate a political settlement of the situation in Western Sahara”.