Capitalização da natureza e políticas ambientais na Província do Paraná (1854-1865): um retrato dos sentidos de natureza na modernidade

Capitalization of nature and environmental policies in the Province of Paraná (1854-1865): a portrait of the senses of nature in modernity

                                                                                              

Luca Araujo de Oliveira Leite[1]

 

 

 


Resumo

Em fins do século XVIII e sobretudo no XIX, empreendeu-se no Brasil uma série de políticas, por parte do governo central, que visavam em linhas gerais coibir a depredação do meio natural. Nesse sentido, a partir de um olhar epistemológico da História Ambiental, buscamos verificar de que maneira as políticas ambientais do governo Imperial estavam presentes no Paraná Provincial. Esta pesquisa se deu por meio da análise de documentação referente à legislação oficial da época, presente em leis, decretos e decisões do Império, da Província e os relatórios destes presidentes. Dessa forma, o Brasil Imperial é um momento de definição das primeiras bases jurídico-administrativas do então nascente Estado brasileiro. Posto isto, pensar as ações de exploração dos recursos naturais neste momento torna-se relevante na medida em que podemos compreender perspectivas da formação histórica brasileira e da postura do nosso Estado e sociedade frente ao mundo natural. Portanto, dentro de nosso recorte temporal de 1854-1865, a presente pesquisa buscou preencher a lacuna do campo da História Ambiental em relação às análises do poder legislativo. Este artigo propõe a realização de uma análise comparada entre a agenda ambiental do governo central e do Paraná provincial.

Palavras-chave: História Ambiental; Província do Paraná; Políticas Ambientais.

Abstract

At the end of the 18th century and especially in the 19th, a series of policies was undertaken in Brazil, by the central government, which aimed, in general terms, to curb the depredation of the natural environment. In this sense, from an epistemological look at Environmental History, we seek to verify how the environmental policies of the Imperial government were present in Provincial Paraná. This research was carried out through the analysis of documentation referring to the official legislation of the time, present in laws, decrees and decisions of the Empire, the Province and the reports of these presidents. In this way, Imperial Brazil is a moment for defining the first legal-administrative bases of the then nascent Brazilian State. That said, thinking about the actions of exploitation of natural resources at this moment becomes relevant insofar as we can understand perspectives of the Brazilian historical formation and the posture of our State and society towards the natural world. Therefore, within our time frame from 1854-1865, this article seeks to fill the gap in the field of Environmental History in relation to the analyzes of the legislative power. This article proposes to carry out a comparative analysis between the environmental agenda of the central government and that of provincial Paraná.

Keywords: Environmental History; Province of Paraná; Environmental Policies.


 

 

Introdução

 

O interesse pelo meio natural e as preocupações com a relação entre os seres humanos e as outras espécies costumam ser vistos como fenômenos do tempo-presente. Uma simples consequência das grandes mudanças e crises ecológicas que passamos nos últimos anos. Entretanto, como procuramos demostrar neste artigo, existiu no Brasil do século XVIII e sobretudo no XIX uma expressiva tradição[2] intelectual, de uma elite letrada, preocupada com o ambiente natural.[3]

O naturalista inglês Eric Ashby destaca que a mudança de atitude do homem frente à natureza modificou-se imperceptivelmente através dos últimos 100 anos. Em outras palavras “a mais importante revolução na sensibilidade desde a Segunda Guerra Mundial” (apud THOMAS, 1983, p. 18). Dito isso, é interessante ressaltar a riqueza do terreno metodológico em que estamos trabalhando aqui. A Modernidade enquanto período histórico foi um momento marcado por mudanças.

Nesse sentido o meio natural passou por uma grande metamorfose de sentidos, em que grande parte dos antigos dogmas sobre o lugar do homem na natureza foram descartados e substituidos, e seu relacionamento com as outras espécies redefinido. Dessa forma, a modernidade em si é um fértil campo a ser explorado pela historiografia ambiental, sobretudo a discussão com as fontes oficiais, afim de verificar os posicionamentos dos Estados nascentes frente o meio natural.

Dessa forma, a politização do tema ambiental atingiu seu ápice no Segundo Reinado[4] (PÁDUA, 2004). Na segunda metade do século XIX uma nova mentalidade, impulsionada pelos ideiais de modernização e progresso econômico, formou-se sobre a natureza. Essa mentalidade se insere dentro de um contexto histórico mais amplo: a passagem do capitalismo para sua nova fase, o imperialismo. Esta nova percepção refletiu a concepção histórica da natureza como recurso e direcionou o olhar para formar uma paisagem composta de elementos com valor de troca.[5]

Baseado nisso, percebemos que a função atribuída à Natureza nesta pesquisa liga-se ao que Donald Worster (1994) identifica como “espírito” do pensamento ecológico capitalista. De que: i) a natureza é vista como capital; ii) os humanos têm direito e obrigação de utilizar deste capital para seu constante progresso; iii) a ordem social estimula e legitima esse progressivo crescimento de riqueza pessoal. É importante ressaltar que estas ideias foram gestadas num momento específico para capitalização da natureza, ou seja, sua transformação em bem de capital.

Em outras palavras, o avanço desta capitalização da Natureza, é o que Jason Moore (2015) chama de a ecologia mundial capitalista (capitalist world-ecology). Moore aponta que o capitalismo não se configura apenas como um sistema econômico utilizado por humanos, mas como uma verdadeira ecologia mundial de poder, capital e natureza que implica todas as espécies e processos físico-químicos. A ecologia mundial capitalista (capitalist world-ecology) é uma maneira de distribuição e funcionamento da teia da vida (web of life), ou seja, uma forma de organizar a vida e o planeta.

Vivemos hoje num mundo posterior à uma revolução na consciência provocada pelas forças explosivas do moderno capital, da tecnologia e do materialismo. Mesmo enfatizando a riqueza e fertilidade de pesquisas para História Ambiental neste período histórico, é relevante ressaltar que esta ânsia em estudar as mudanças e a desordem, é fruto da experiência de rápida mudança social que se acelerou nos últimos dois séculos. Nossa pesquisa, nestes moldes metodológicos é historicizada, e portanto, própria de nosso tempo (WORSTER, 2012, p. 376-377). Worster ressalta mais tarde que, ainda que nem sempre seja aparente para os observadores, a natureza muda. E sobretudo, o que queremos da natureza também muda (WORSTER, 2012, p. 368).

O filósofo francês Robert Lenoble (1969) traz uma rica contribuição para esta discussão em “História da Ideia de Natureza”. O autor elenca uma esmiuçada discussão a respeito do conceito de Natureza, e nesse sentido sua contribuição é extremamente rica e relevante para a História Ambiental. Lenoble chama atenção para o fato de que a natureza em si não passa de uma abstração. Para o francês: “não encontramos senão uma ideia de natureza, que toma sentidos radicalmente diferentes segundo as épocas e os homens” (LENOBLE, 1969, p. 17).

Para Lenoble (1969), este conceito está ligado aos significados que acompanharam o desenvolvimento humano e que mudam de acordo com os seus interesses. Reinhart Koselleck (2006) contribui para esta discussão chamando a atenção para o estudo dos conceitos e da variação de seus significados ao longo do tempo como condição básica para o conhecimento histórico. Para Koselleck (2006), só é passível de uma única definição aquilo que não tem história. A Natureza por sua vez, carrega em si o desenrolar de vários processos históricos, como descrito por Lenoble (1969).

A Natureza dessa forma, toma determinados contornos a partir das necessidades e desejos dos sapiens que a rodeiam. Portanto, “a Natureza está condenada a viver o drama humano” (LENOBLE, 1969, p. 41). Em suma, o que buscamos analisar neste artigo são as marcas que a Modernidade deixou na ideia de Natureza e como esse cenário foi absorvido pela administração Imperial e Provincial, por meio de sua documentação oficial.

Pensando a relação dos colonos portugueses com o meio natural, verificamos que já em 1600, de acordo com os relatos de missionários jesuítas, muito da paisagem natural já havia sido completamente alterada e algumas espécies de aves não eram mais vistas (DEAN, 1996).

Dessa forma, em 1786 foi o ano em que foi publicado o primeiro ensaio escrito por um brasileiro com reflexões políticas amplas sobre os problemas ambientais do país, dando início a tradição ambiental brasileira. Trata-se do Discurso histórico, político e econômico dos progressos e estado atual da filosofia natural portuguesa, acompanhado de algumas reflexões sobre o estado do Brasil, de Baltazar da Silva Lisboa (1786). Seguindo essa linha de pensamento, em 1790, o patriarca da independência José Bonifácio (1965), escreveu Memória sobre a pesca das baleias, e extração do seu azeite, com algumas reflexões a respeito das nossas pescarias.

Embora estes textos sejam interpretados por muitos como obras ambientalistas antes do tempo de emergência desta área, devemos ter cautela com o perigo do anacronismo. Esta não é uma obra de preservação ambiental tal como a conhecemos hoje, mas sim uma consultoria econômica sobre as maneiras de torná-las mais rentáveis em longo prazo.

Estes documentos chamam atenção e valem ser ressaltados, uma vez que é uma fonte datável, esse tipo de mentalidade é característico da Modernidade. Keith Thomas em O homem e mundo natural aborda essas mudanças de perspectiva em relação ao mundo natural, e afirma através de relatos setecentistas que:

A espantosa ignorância do XVII com a sabedoria do XVIII. O conhecimento sobre o mundo natural, cresceu com ‘rapidez inconcebível’. É ver que em um século lançou-se mais luz sobre esta ciência do que o que fora inferido no período precedente por cerca de 5700 anos. (THOMAS, 1988, p.124)

O fato de que no final do século XVIII estarem sendo discutidas no país ideias que se aproximam da reflexão ecológica contemporânea indica que estamos diante de um fenômeno intelectual instigante. A gênese desse grupo de críticos ambientais brasileiros tinha epicentros institucionais bem definidos.

Ao longo dos séculos XVIII e XIX um grande fluxo de jovens oriundos da elite social do Brasil destinou-se a universidades europeias como Coimbra e Lisboa para realizar seus estudos universitários. Foi dentro dessa camada da elite que surgiram os primeiros críticos ambientais brasileiros. Jovens que tiveram contato e beberam das concepções de filosofia natural, direito, economia e também o espírito pragmático e progressista que caracterizavam o Iluminismo europeu, podendo ser chamados de “geração ilustrada” luso-brasileira.

Na Europa esses jovens tiveram contato com figuras que hoje conhecemos como pais da ecologia moderna. Sujeitos como Domenico Vandelli, Lineu, Buffon, Charles Darwin e Humboldt. É interessante notar que, a ecologia nasce nessa época a partir da preocupação com o fato de que tudo o que buscamos na natureza é finito (KRENAK, 2020) e nossos desejos são infinitos.

Surge do interior dessa elite intelectual, constituindo uma minoria dentro da minoria, os fundadores da crítica ambiental brasileira. Essa tradição crítica por sua vez encontrou sua expressão mais profunda e sistemática na obra de José Bonifácio de Andrada e Silva. Suas reflexões e seu legado teóricos mais importantes, nesse sentido, foram o de estabelecer a existência de um nexo casual entre a produção escravista e a destruição do ambiente natural, enfatizando a reforma ambiental como instrumento de superação do passado colonial.

Essas iniciativas por sua vez, ilustram o pensamento político e a crítica ambiental da época, inspirados em influência iluminista e fisiocrata europeia (PÁDUA, 2004). Essas políticas, por parte do Governo Central, tinham o objetivo de conservar plantas potencialmente úteis para o Império, à exemplo das chamadas “madeiras de lei”[6] que serviam para construção de navios da marinha. 

A partir disso, este artigo pretende destacar algumas reflexões sobre as políticas ambientais empreendidas pelo Governo Central. Tomaremos, portanto, a Província do Paraná como espaço de nossas discussões, numa tentativa de compreender em que medida as decisões do Império ressoaram num contexto regional. Essa problemática levantada por Pádua (2004) tem um reflexo regional neste artigo.

Estando esta pesquisa inserida no campo de estudo da História Ambiental, é relevante ressaltar o mapeamento da historiografia ambiental brasileira realizada pelo professor Pádua e a professora Alessandra Izabel de Carvalho (2020). Este levantamento pontua que existem duas grandes lacunas no campo ambiental: os estudos relacionados a questão indígena, e a análise do poder legislativo. Nesse sentido, esta pesquisa tem grande potencial à acrescentar em vista de preencher esta lacuna, uma vez que propõe-se a análise justamente em cima deste rol documental.

A vista disso, o recorte do tema será dos anos de 1854-1865. Escolhemos, portanto, 1854 pelo nascimento da Província do Paraná, e 1865 devido ao marco da Decisão Imperial N°481 de 14 de Outubro, que inaugura a elaboração de uma feira agrícola anual em todas as Províncias do Império, onde seriam compartilhados e aprofundados conhecimentos, culturas e materiais voltados à agricultura. Este momento histórico marca uma ruptura com o jeito de se pensar e interpretar o meio natural, até então utilitarista e rudimentar. Esta feira nos mostra o comprometimento do Estado com a agenda ambiental e das suas influências fisiocratas[7] e mercantis.

Por fim, pretendemos demonstrar como, a recém-criada Província do Paraná esboça uma proposta ambiental entre os anos de 1854-1865, período que a noção que se esboçava sobre a Natureza, passava por grandes transformações alimentadas pelo imaginário do progresso que se apresentava como salvação para as chamadas mazelas da sociedade.  

 

Figura 1: Mapa do  Império do Brasil


Fonte: GUERRA, A. E.; SANTOS, M. M. D. O “Atlas Do Império Do Brazil”: uma proposta de definição dos limites do Brasil no século XIX. IV Simpósio Luso Brasileiro de Cartografia Histórica. Porto, 2011, p. 14.

 

Figura 2: Mapa da Província do Paraná


Fonte: GUERRA, A. E.; SANTOS, M. M. D. O “Atlas Do Império Do Brazil”: uma proposta de definição dos limites do Brasil no século XIX. IV Simpósio Luso Brasileiro de Cartografia Histórica. Porto, 2011, p. 16.

Durante a administração imperial, a organização política do país era dividida em províncias, que estavam vinculadas ao governo central monárquico. Até 1853, a Província do Paraná era vinculada à Província de São Paulo, um imenso bloco administrativo compreendendo hoje, os territórios de São Paulo, Paraná e parte de Santa Catarina. Em 1854, por conta de pressões visando a emancipação político administrativa das comarcas de Paranaguá e Curitiba, nosso objeto de estudo nasce do desmembramento de São Paulo.

É relevante ressaltar, entretanto, que esta pesquisa representa apenas um recorte do que foi a discussão ambiental no Brasil Império e no Paraná Provincial. Nossa própria escolha das fontes limita nossa discussão. Os documentos oficiais nas leis e decretos nos apresentam discussões prontas. Os debates por trás destas leis formam um outro arcabouço documental e que tem grande valor aos historiadores ambientais e merecem ser incentivados aos novos pesquisadores. Portanto, como foi destacado acima: este artigo é um breve pontapé acerca do fértil campo o qual esta problemática nos convida a debruçar-nos.

No Paraná, apesar de todas as leis e decretos a respeito da preservação do meio natural que foram analisadas no período Imperial, grande parte das matas e florestas do Paraná foram destruídas durante as primeiras décadas da República, durante o ciclo do café. Outros autores que trabalham com esta mesma proposta, afirmam que “apesar do viés utilitarista e da inserção política relativamente forte desse grupo, houve apenas avanços pontuais” (FRANCO; DRUMMOND, 2012). Os discursos sobre a beleza da paisagem, a importância e a necessidade de preservação das florestas não foram suficientes e pesaram muito pouco diante da devastação das matas.

No Brasil, mesmo quando a noção de desenvolvimento sustentável[8] fez parte da agenda política, não houve avanços na superação do modelo urbano-industrial-capitalista e as questões ambientais e sociais continuaram a ser tratadas como entraves ao desenvolvimento econômico.

 

Metodologia da pesquisa

As fontes utilizadas para a pesquisa tratam-se de documentos Primários, Escritos, Oficiais e Seriais. A forma de apresentação é digital e, portanto, de fácil acesso por meio dos sites do Arquivo Público do Paraná e na Câmara dos Deputados. Essas fontes consistem em um conjunto de normativas do Governo do Império do Brasil, que abrangem leis, decretos, decisões, cartas régias, alvarás e atos dos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, e dos Ministérios. Também compõe esse rol de fontes as Leis e Decretos do Governo da Província do Paraná e os Relatórios de Presidente de Província.

Esse conjunto de legislações e normas são fundamentais para compreender como foram entendidas as propostas ambientais do Governo Central nas percepções dos primeiros presidentes provinciais do Paraná. Documentos históricos que nos permitem verificar projetos políticos e agendas oficiais de um Estado.

Deste modo, sendo foco da proposta o domínio socioeconômico sobre a natureza, a análise deste conjunto de fontes consistiu no levantamento de assuntos relacionados à exploração e apropriação dos recursos naturais. Assim os temas de destaque que foram usados como filtro na catalogação das fontes podem ser elencados em seis grandes categorias: extrativismo, agricultura, pecuária, águas, pesca e terra.

Essa metodologia é proposta por Fabíola Sevilha de Souza (2011) em seu artigo “Temas e Métodos para uma História Ambiental do Brasil Império”. E tem por objetivo examinar as possibilidades analíticas e temáticas de trabalho dentro da História Ambiental no período Imperial brasileiro. Dessa forma, a autora expõe ao leitor, de que maneira o meio natural foi encontrado nos documentos analisados, e nos é revelado que os temas principais podem ser elencados em sete grandes categorias: abastecimento, terras, caminhos e transportes, administração, extrativismo, agricultura e pecuária. Foi a partir deste relato que montamos as bases do que viria a ser a planilha de catalogação.

Levantados os documentos e montada a problemática, a catalogação dos documentos foi feita através de três planilhas: uma destinada as leis imperiais, outra destinada as leis da província do Paraná e uma terceira destinada aos relatórios dos presidentes. As Leis e Decretos foram analisadas e catalogadas através das palavras-chave descritas acima e organizadas segundo as seguintes categorias: extrativismo, agricultura, pecuária, águas, terras e pesca. Nesse sentido, seguiremos para a análise, discussão e resultados do tema proposto, seguidas de nossas conclusões.

 

Resultados/Discussão

Em 1854 o Império discute em quatro decretos a situação das madeiras de lei.[9] Estas madeiras eram de longe, o mais valioso dos produtos extrativos da Mata Atlântica. Pranchas de madeira de lei eram vendidas a 280 mil réis a dúzia, quase o mesmo preço, por quilo, do café na época. Trezentos anos de corte de árvores empregadas na construção naval haviam tornado escassas muitas das melhores espécies, mesmo em matas que não haviam sido queimadas. Todas essas circunstâncias encareciam consideravelmente os custos e reduziam a viabilidade de encontrar e extrair as madeiras de lei (DEAN, 1996).

Posto isto, estas madeiras eram extremamente valiosas para o governo central e usufruíam de ampla fiscalização, guardas, e seu corte era passível de multa e prisão. Chama atenção também, observar que o governo estabelece gastos na receita, para plantar novos arvoredos e conservar as árvores existentes.[10]

Mais interessante ainda é notar o interesse do Estado em estudar e explorar o meio natural: “[...] medição dos terrenos particulares ou obsoletos, deverão-se tomar medidas de todos os recursos e meios naturais. Rios, lagos e navegabilidade, árvores, quantidade e qualidade, minas, salinas, disposição do terreno, solo, latitude, longitude e altura sob o mar.”[11]

Este relato chama atenção, uma vez que o governo imperial nunca realizou um inventário das terras públicas, e essa incapacidade de controlar e manejar os recursos naturais foi uma das maiores causas do rápido desmatamento (DEAN, 1996). Por exemplo a Lei de Terras, que garantia o domínio imperial sobre todas as terras públicas em território nacional, foi aprovada somente em 1850.

O Paraná, por sua vez, segue as diretrizes do governo central, sob caráter extremamente utilitarista. Ainda em 1854, as vilas de Guarapuava[12] e São José dos Pinhais[13] proíbem as queimadas, somente entre os meses de Setembro a Novembro, nos outros meses do ano aparentemente não há problema. Isso revela que as políticas de queimada estavam alinhadas com as políticas de cultivo do mate, uma vez que a planta era colhida na Província de Janeiro a Setembro.[14]

Ainda em 1855 o governo imperial orça os gastos para a construção e contrato da Estrada de Ferro Dom Pedro II. As ferrovias foram projetos de modernização muito comuns no XIX, com várias propostas de Companhias e particulares ao longo do recorte analisado. Entretanto, houve no Brasil uma forte oposição ao modo como a administração estava realizando esta empreitada.

Um dos intelectuais fisiocratas mais lúcidos de seu tempo, Guilherme Capanema, escreveu em 1858 um pequeno livro chamado Agricultura: Fragmentos do Relatório dos Comissórios Brasileiros à Exposição Universal de Paris em 1855. Capanema contrastou que a realização de modernizações parciais, sem o rompimento com padrões coloniais estava fadada ao fracasso. As ferrovias, ao invés de servirem como um instrumento necessário ao progresso agrícola, poderiam se tornar um “instrumento de devastação” (PÁDUA, 1998).

Se não procurarmos mudar o nosso sistema de agricultura, e se não o fizermos com toda energia, acreditamos que as nossas estradas de ferro, em vez de nos serem úteis, virão a ser prejudiciais. Em torno da nossa capital não vemos senão colinas cobertas de capoeiras. Os seus matos primitivos desapareceram, e também as lavouras que se lhes substituíram: hoje está o terreno exausto e improdutivo, e quem quer boas colheitas vai para longe procurar terrenos virgens. Os cafezais próximos a beira mar, que ainda há vinte anos eram rendosos, hoje estão desprezados e não crescem outros. Só serra cima é que produção é excelente, mas no fim de alguns anos também lá será preciso abandonar o solo cansado para buscar uma zona fértil afastada, o que fará com que as estradas tenham de atravessar muitas léguas de terras em descanso para só na sua extremidade encontrar carga e ligar centros de população, os quais ficarão por sua vez desertos quando uma estrada de ferro passar além e eles deixarem de ser os empórios de uma zona cultivada. Só com o melhoramento da lavoura podermos evitar que as estradas se tornem um instrumento de devastação. (apud PÁDUA, 1998, p. 143)

Cabe ressaltar nesta passagem que, não se tratava de uma crítica à modernidade e ao mundo moderno por si mesmos, mas sim de uma crítica ao universo moderno que, com base em relatos como este de Capanema citado acima, visavam combater o atraso colonial. Em suma, “não se trata de negar as ferrovias e outros elementos modernos, mas sim de questionar as consequências de superpô-las a uma realidade socioeconômica rudimentar e predatória.” (PÁDUA, 2004, p. 27)

Em 1856 é criado na capital do Império, um Conselho Naval, que tem por fim zelar pela conservação das matas para fins navais.[15] Assim como fica autorizado a nomear uma Comissão de Engenheiros e Naturalistas que explorem o interior de algumas Províncias, devendo fazer coleções de produtos naturais para o Museu Nacional e para o das Províncias.[16]

No Paraná processo semelhante acontece. O governo provincial autoriza a exploração e estudo das minas da Província,[17] o mesmo com é autorizado a explorar a navegação do Rio Yguassu até sua confluência com o Rio Paraná, compreendendo o exame de sua profundidade, largura e orçamento de despesas necessárias pra remover obstáculos que impeçam sua navegação.[18] Fica autorizado também mandar levantar uma planta topográfica da Província, na qual deve constar as atuais divisas, freguesias e estradas.[19]

O Presidente da Província do Paraná em 1856, Henrique Pedro Carlos de Beaurepaire Rohan traz em seu relatório uma discussão profunda e descritiva sobre as principais pautas ambientais do Paraná. Descreve de maneira individual os rios da Província e suas características e utilidades antrópicas, da mesma forma discorre sobre a composição geológica paranaense, seus principais minerais, onde encontrá-los no território e suas respetivas explorações.

Ao tratar sobre a agricultura faz uma farta análise da situação agrícola da Província, a problemática do trigo, as potencialidades do território e propõem novas culturas como a da amoreira, e a do bicho da seda. Discorre também sobre o enorme potencial de criação de uma indústria de pesca no litoral paranaense, devido a sua rica biodiversidade, a abundância de espécies animais tornaria a Província do Paraná uma referência nacional.

A questão das madeiras por sua vez:

Quanto a conservação das madeiras, ou antes quanto á falta absoluta de systema, [...] Neste littoral cortão-se enormes quantidades de madeiras de lei, sem autorização legal. Ha grandes engenhos de serraria; um ha, no segundo districto, que trabalha com 16 serras. Que horrivel devastação!!! [...] Em quanto de todas as nações illustradas da Europa, tem vindo, a expensas de seus governos, celebres botanicos, para visitar as nossas florestas, nada se tem feito, por nossa parte, para classificar convenientemente nossos vegetaes de reconhecida utilidade, ou indagar [...] as vantagens que se poderia colher, em qualquer ramo da industria [...].[20]

Registros de impressões sobre as florestas acabam mostrando, “tanto sobre seus autores quanto sobre suas florestas”. Representam, em certa medida, “a visão de mundo predominante na sua cultura, na sua época, além de serem filtradas pelas lentes dos significados criadas pelas experiências e crenças individuais de cada um” (PLACE, 2001, p. 1). Esse testemunho, portanto, serve de riquíssimo documento para percebermos a postura de Rohan. Em que condena fortemente a “destruição das belas matas do Paraná”, “a agricultura arcaica utilizada pelos lavradores”, a necessidade de importação de arados e moinhos, além de descrever detalhadamente sobre as espécies de árvores na Província.

Essa lamentação reforça onde repousava valor do mundo natural na modernidade: em sua importância econômica e política e não com base em um sentimento de simpatia pelo seu valor intrínseco, estético ou espiritual. Os recursos naturais constituíam o grande trunfo para o progresso do país, e seu uso devia ser utilizado de forma inteligente e cuidadosa.

Ainda no Paraná, em 1857, o governo autoriza a criação na capital da Província um Jardim Botânico:

[...] para fins de desenvolvimento e propagação de conhecimentos de indústria agrícola, e no empenho de dar movimento a esse primeiro elemento de riqueza da Província.  Garantindo ao Governo o estudo na natureza do clima e do terreno, bem como do uso de maquinários, afim de beneficiar o cultivo de erva-mate, nopal, amoreira, bicho da seda, caxouilla e promover a produção de mandioca em maior escala.[21]

Importante ressaltar que, os jardins botânicos instalados nos trópicos, ou seja, nas colônias, tinham um caráter diferente dos jardins europeus, que tinham o estudo das plantas medicinais sua principal função. Já os jardins botânicos que se estabeleceram nos trópicos tinham como objetivo principal a introdução de novas plantas para o cultivo, estritamente de valor comercial e de interesse econômico, e foram considerados como ferramentas de expansão colonial.

Esses jardins eram aliás, parte central da agenda econômica no final do século XVIII. A introdução de espécies exóticas vindas de uma região do globo para outra, necessita de lugares que servissem de aclimatação, garantindo sua sobrevivência (CROSBY, 2011). Outra função destes jardins era que auxiliava na urgência a qual era estudar melhor a natureza brasileira, investigando a utilidade econômica das diferentes espécies nativas, ainda desconhecidas. Uma vez que a economia colonial no Brasil optou pela usurpação da biota nativa, favorecendo a implantação de uma monocultura exótica e predatória. Foi a partir deste cenário, que vários intelectuais como José Bonifácio, começaram a perceber que os recursos naturais nativos estavam sendo destruídos antes mesmo de serem estudados ou aproveitados de forma mais apropriada (PÁDUA, 2004).

Em 1858 o Paraná segue com a linha conservacionista, e proíbe o corte de árvores nas proximidades das nascentes dos rios,[22] assim como declara multa àquele que cortar, arrancar ou prejudicar de qualquer maneira o crescimento das árvores plantadas pela câmara de Paranaguá.[23] Guaratuba também proíbe, sob pena de multa e prisão, pescar utilizando-se de timbó,[24] uma leguminosa venenosa conhecida dos indígenas que serve para envenenar a água dos rios e matar os peixes por asfixia, facilitando a pesca. Nesse sentido, a câmara de Paranaguá também proíbe a venda de peixes mortos com peçonha, que cause danos à saúde pública[25].

O Império volta a orçar gastos com o descobrimento de minas de carvão de pedra e também com melhoramentos na agricultura, nos cultivos de cana, trigo e outros cereais em 1859 e 1860. E neste último proíbe o corte de árvores nos arredores da Fábrica de Polvóra Estrella, “em vista da conservação das matas e das águas”[26]. Fica autorizado também o governo a despender mais gastos com exploração e estudos topográficos e geográficos sobre limites e navegação fluvial.

Em 1862 o governo do Paraná também orça a receita para explorar os rios mais convenientes para benefício da Província, afim de melhorar a comunicação das regiões[27].O Império faz o mesmo em 1864 ao instalar uma Companhia de navios a vapor Progressista na baía de Paranaguá, em prol de ligar os rios da Província[28], aliás reforçando a necessidade destas instalações trazerem informações das obras e dos rios das Províncias. Nesse sentido, mais uma vez, conhecer e estudar o meio natural brasileiro era análogo a exploração comercial.

A crença de que o desmatamento das bacias e dos manguezais provocava o secamento das nascentes, motivou a primeira tentativa governamental de conservação. Empreendida em 1862, o governo imperial investiu um modesto nível de recursos em um programa de reflorestamento. Nesse sentido, o reflorestamento das florestas da Tijuca, na capital do Império foi alvo de ricas pesquisas para a História Ambiental (DRUMMOND, 1988). Em 1861 o governo central promove um projeto de plantio regular de árvores do país na Tijuca e em Paineira, sendo proibido o corte destas matas, vigiada sob tutela de guardas.

Em 1860 o então Presidente da Província do Paraná José Francisco Cardoso traz uma riquíssima discussão em seu relatório, digno de um fisiocrata:

A terra se prepara ao dobrar constante e desapiedado da foice e do machado sobre as ricas mattas, que cortamos; o fogo é o grande elemento que concorre para o amanho do terreno, que tem de ser cultivado. A devastação sem fim, quotidianamente se emprega na pequena lavoura [...]. E d’est’arte se estragam as melhores de nossas terras agricolas, tornando-as por muitos annos estereis e sem valor. Tão rudes processos, de destruição completa, admira que guiem a mór parte dos nossos lavradores, com grave prejuizo do futuro agricola da provincia! [...] a fatalidade de pesadas consequencias, que mais tarde, se hão de fazer sentir. [...] pelo estrago e derrubada das mattas, a aridez do terreno, a secca e finalmente a ruina total. [...] A devastação das florestas nacionais opera-se nesses lugares, em tão grande escala, que, se o governo não tomar providências energicas e promptas, para reprimir esses abusos, d’aqui a pouco tempo estarão completamente estragadas todas as mattas publicas d’este littoral [...] Essa questão das madeiras tem sido de ha 4 annos o objeto de minha constante solicitude; ou, para melhor dizer, o meu pesadelo! [...] O governo imperial, solicito em promover o desenvolvimento d’esta rica industria nacional, enviou-me em Novembro [...] um caixote com sementes de tecka a qual produz perfeitamente á margens de rios ou lagôas. A lecka dá ótima madeira de construção naval, sendo por isso de grande vantagem o seu plantio.[29]

Podemos dizer com certa segurança que esta lamentação de Francisco Cardoso, assim como dos demais que atuavam dentro dessa tradição fisiocrata, não tinha um sentido preservacionista, mas sim uma razão mercantil. Dentro da “Era do Capital” proposta por Hobsbawm (1979), estes capitalistas enxergam na natureza, apenas matéria prima e lucro. O presidente da Província vê no meio natural do Paraná somente valor de troca, ou seja, no lugar de matérias naturais vê recursos que interessam ao Capital. Nas montanhas vê ferro e manganês, nas matas vê “madeiras de lei” e nas cachoeiras vê potencial hidrelétrico.

Chegando ao final de nosso recorte, em 1861 o governo central propõe a realização de uma exposição de produtos naturais e industriais nas Províncias da Bahia, Minas Gerais, Pernambuco, São Pedro e Pará. As demais que quisessem participar deveriam enviar suas apresentações ao governo central. A Província do Paraná não participou. Por isso, apesar de presente o interesse em novas abordagens a respeito do meio natural, nosso objeto de estudo não fez parte.

Só em 1865 quando o Império “aprova as Instruções para a elaboração de uma exposição de produtos agrícolas, a ser elaborada em todas as capitais das províncias do país. [...]” é que nosso objeto de estudo se faz presente nesse festival. Devendo:

[...] expor para a comunidade os avanços agrícolas do império. A comissão organizadora deverá organizar um catálogo com informações a respeito dos produtos, ferramentas, área de produção, produtividade ao ano, qualidade do produto, custo da produção, etc. O mesmo se fará com os recursos minerais e as madeiras: se mencionarão os nomes vulgares e científicos, suas propriedades medicinais e aplicação industrial, épocas de derrubada, local das jazidas, distância dos principais meios de navegação e transporte, etc. [30]

"É na agricultura que está o futuro da Província”, foi o que disse o presidente da Província André Augusto de Pádua Fleury na abertura da Assembleia Legislativa Provincial em 4 de Junho de 1865.[31] A Província era “[...] dotada de vastos campos de criar e cortada de inúmeros rios.”

 

Conclusões/Considerações finais

O conjunto desse corpo de Leis, associados as falas governamentais provenientes dos Relatórios de presidente de Província, coloca em destaque a noção utilitária que a natureza adquiriu na época. Seu significado, naquele contexto, teve intima relação com um estilo de sociedade moderna nascida do advento do capitalismo. A palavra, natureza, passou a ser entendida como fonte de recurso, e por consequência, fonte inesgotável de lucro. A representação de natureza como um benefício a ser explorado, herdeira dos ideais iluminista e fisiocrata estiveram presentes no país no século XIX e, portanto, presentes na formação do pensamento ambiental brasileiro. Dito isso, cabe destacar que, essa reflexão, indicou importantes sinais de como tais ideários podem ser acessados na Província do Paraná por meio da documentação histórica, trazendo com isso uma contribuição para o campo da História e sobretudo para a História Ambiental.

Por fim, foi possível demonstrar que questões ambientais estiveram presentes naqueles momentos de constituição do Estado brasileiro e, portanto, foram colocadas na arena política, lugar simbólico onde se encontravam em jogo determinadas condições para a apropriação material da natureza. Por sua vez, o conjunto de Leis e falas oficiais trataram de elevar os usos da natureza a níveis de legitimidade.

Para os modernos, a natureza é recurso que pode promover a riqueza dos particulares e do Estado. Nas últimas décadas do século XIX, a era do Imperialismo chega ao seu auge, penetrando o interior de todos os continentes: a corrida armamentista, o poder do aço, a revolução da eletricidade, a extensão das ferrovias e as novas indústrias. Tudo isso proporciona um novo debate de políticas ambientais. A discussão acerca da necessidade da preservação das matas, as discussões sobre os prejuízos econômicos da construção naval e civil causados pelo corte desproporcional de árvores, além das discussões sobre o clima e as secas, tomariam novos rumos das décadas finais do XIX e novos formatos da República.

As análises das políticas ambientais a partir da formação da Província do Paraná aqui propostas não se encerram por si mesmas e nem se pretendeu esgotá-la nesse texto. Ao contrário, o objetivo último é o de abrir o leque de novas questões que suscitam futuras possibilidades de pesquisa sobre a História dos mudos (CABRAL, 2014). Existem diversas lacunas a serem detectadas e preenchidas e entende-se que as pesquisas em História Ambiental terão muito a revelar sobre a ação colonizadora dos últimos cinco séculos e seus efeitos contínuos e predatórios sobre a natureza da região. Certamente, entendemos que todas as pesquisas científicas sobre os usos da natureza devem contribuir para a permanência e sustentabilidade da mesma. Existe uma história por traz dos usos econômicos da natureza e o texto desafia a pensar historicamente o ambiente. O campo da História Ambiental é mais uma parte relevante dessa tarefa.

 

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Recebido em 23/11/2021.

Aceito em 22/12/2021.

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[1] Graduado em História pela Universidade Estadual do Paraná (UNESPAR) e Mestrando pelo Programa de Pós Graduação em História Social (PPGHIS) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Brasil. E-mail: luca.leite.o.018@gmail.com | https://orcid.org/0000-0002-8176-4699

[2] “Não se trata, por certo, de uma tradição no sentido estrito do termo: uma doutrina básica transmitida ao longo do tempo. Utilizo o conceito de forma bastante ampla, indicando em primeiro lugar, a existência de um conjunto de preocupações, temas e ideias que foram retomados ao longo do tempo de forma recorrente e, em grade parte, acumulativa. Esse processo envolveu o estabelecimento de uma linguagem de pensadores onde, em muitas ocasiões, os autores mais recentes citaram os mais antigos, promovendo uma dinâmica coletiva de produção intelectual. Em segundo lugar, de modo ainda mais significativo, por ter sido possível encontrar, apesar das diferenças de forma e de conteúdo presentes em cada texto, um certo denominador teórico comum por trás de todos eles. Esse denominador comum entre eles, essencialmente político, cientificista, antropocêntrico e economicamente progressista. Em suma, profundamente enraizado no ideário iluminista herdado do século XVIII.” (PÁDUA, 2004, p.12-13).

[3] O que significava estar preocupado com o meio ambiente no século XIX? Neste momento, é necessário chamar atenção ao mais imperdoável dos pecados em uma ciência do tempo: o anacronismo, isto é, atribuir valores contemporâneos às figuras e narrativas do passado. Marc Bloch (2001) se queixava desta situação, dizendo que "para grande desespero dos historiadores, os homens não mudam seu vocabulário cada vez que mudam seus costumes”. O resultado deste problema é uma grave ambiguidade semântica, em que duas palavras têm significados completamente distintos e presos em seu tempo. Esta ambiguidade semântica é muita cara aos historiadores e merece atenção para evitarmos estes anacronismos. Esta situação é cara aos historiadores, e sobretudo aos historiadores ambientais. Este bolorento debate, parafraseando Drummond (1991), aponta que temos que ter cautela ao nos apropriarmos de alguns conceitos contemporâneos para vestir nos modernos. É essencial esclarecermos que: o que chamamos de agenda ambiental para os sujeitos do XIX, é completamente diferente à nossa noção de ambientalismo. Em outras palavras, Natureza é um conceito historicizado pelo seu momento e contexto histórico.

[4] O Segundo reinado ou Segundo Império é um período da história brasileira em que o país foi governado por D. Pedro II. Oficialmente se estende de 1840, ano que D. Pedro II foi coroado imperador após o Golpe da Maioridade, e se encerra em 1889, quando o golpe Republicano colocou fim à monarquia no Brasil.

[5] Vale destacar ainda que tal concepção se cristaliza no amplo contexto histórico da passagem do capitalismo para sua nova fase, o imperialismo. Este cenário de capitalização da natureza se insere, nesse sentido, na cronologia proposta por Hobsbawn (1979), de que o final do XIX marca a Era do Capital. Sobre isto, Haruf (2016) pontua que três narrativas sobre a natureza, entre o XIX e início do XX, são características dessa episteme: “um mundo de transformações na produção (segunda revolução industrial), dinâmica capitalista (imperialismo), e a estrutura social (urbanização crescente).” (ESPINDOLA, 2016, p. 202-203)

[6] Chama-se de madeiras de lei, aquelas espécies vegetais reservadas à apropriação pela Coroa para fins de construção naval.

[7] Fisiocracia é uma linha de pensamento difundida amplamente na Europa no século XVIII, em especial na França, e que atribuía à agricultura a maior geração de riquezas de uma nação.

[8] Para Raynaut (2004, p. 30), a noção de desenvolvimento sustentável é ambígua, já que para “alguns, ‘desenvolvimento sustentável’ significa achar os meios técnicos para continuar produzir ao mesmo ritmo, mas reduzindo os danos ambientais. Outros, quando utilizam a mesma noção, colocam como prioridade a proteção ambiental e a sustentabilidade da ‘natureza’ a curto e longo prazo. Outros, por fim, privilegiam a ‘sustentabilidade social’, buscando reduzir a pobreza, considerada como principal fonte de desequilíbrio nos sistemas sociais e causa de danos aos meios ‘naturais’.”

[9] BRASIL. Coleção das Leis do Império do Brasil. Decreto n.1318, de 30 de Janeiro de 1854, Art.81, 85, 87 e 88. Decisão n.223, de 30 de Janeiro de 1854, Art.87. Decisão n.98, de 8 de Maio de 1854, Art.52. Aviso de 9 de Março de 1854.

[10] BRASIL. Coleção das Leis do Império do Brasil. Decreto n.1498, de 23 de Dezembro de 1854, Art.2 §12.

[11] BRASIL. Coleção das Leis do Império do Brasil. Decisão n.98, de 8 de Maio de 1854, Art.45.

[12] PARANÁ. Coleção das Leis da Província do Paraná, Posturas da Câmara Municipal de Guarapuava. Decreto n.16, Art. 24,25 de 5 de Setembro de 1854.

[13] PARANÁ. Coleção das Leis da Província do Paraná, Posturas da Câmara Municipal da Villa de São José dos Pinhaes. Decreto n.13, Art. 16,26 de 4 de Setembro de 1854.

PARANÁ. Coleção das Leis da Província do Paraná, Posturas da Câmara Municipal da Villa de São José dos Pinhaes. Decreto n.16, Art.28,32,33,34 e 35 de 4 de Setembro de 1854.

[14] PARANÁ. Coleção das Leis da Província do Paraná, REGULAMENTO de 6 de Dezembro de 1854.

[15] BRASIL. Coleção das Leis do Império do Brasil. Lei n.874, de 23 de Agosto de 1856.

[16] BRASIL. Coleção das Leis do Império do Brasil. Lei n.884, de 1 de Outubro de 1856, Art.17 §1.

[17] PARANÁ. Coleção das Leis da Província do Paraná. Lei n.12, Art. 35 de 30 de Abril de 1856.

[18] PARANÁ. Coleção das Leis da Província do Paraná. Lei n.12, Art. 23 de 30 de Abril de 1856.

[19] PARANÁ. Coleção das Leis da Província do Paraná. Lei n.12, Art. 38 de 30 de Abril de 1856.

[20] PARANÁ. Governador (1855 -1856: Beaurepaire Rohan). Relatório do presidente da província do Paraná Henrique Pedro Carlos de Beaurepaire Rohan na abertura da Assembleia Legislativa Provincial em 1 de Março de 1856. Curityba: Typ. Lopes, 1856.

[21] PARANÁ. Coleção das Leis da Província do Paraná. Lei n.22, de 3 de Março de 1857.

[22] PARANÁ. Coleção das Leis da Província do Paraná, Postura da Câmara Municipal de Paranaguá. Decreto n.44, Art. 56 de 18 de Março de 1858.

[23] PARANÁ. Coleção das Leis da Província do Paraná, Postura da Câmara Municipal de Paranaguá. Decreto n.44, Art. 57 de 18 de Março de 1858.

[24] PARANÁ. Coleção das Leis da Província do Paraná, Postura da Câmara Municipal de São Luiz de Guaratuba. Decreto n.40, Art.6 de 17 de Março de 1858.

[25] PARANÁ. Coleção das Leis da Província do Paraná, Postura da Câmara Municipal de Paranaguá. Decreto n.44, Art. 13 de 18 de Março de 1858.

[26] BRASIL. Coleção das Leis do Império do Brasil. Decreto n.2555, de 17 de Março de 1860, Art. 49.

[27] PARANÁ. Coleção das Leis da Província do Paraná. Lei n.97, Art.1 §21 de 14 de Abril de 1862.

[28] BRASIL. Coleção das Leis do Império do Brasil. Decreto n.3250, de 18 de Abril de 1864.

[29] PARANÁ. Governador (1859 -1861: Francisco Cardoso). Relatório do presidente da província do Paraná José Francisco Cardoso na abertura da Assembleia Legislativa Provincial em 1 de Março de 1860. Curityba: Typ. Lopes, 1860.

[30] BRASIL. Coleção das Leis do Império do Brasil. Decisão n.481, de 14 de Outubro de 1865.

[31] PARANÁ. Governador (1864-1865: Pádua Fleury). Relatório do presidente da província do Paraná André Augusto de Pádua Fleury na abertura da Assembleia Legislativa Provincial em 4 de Junho de 1865. Curityba: Typ. Lopes, 1865.