Fronteiras: Revista Catarinense de História. Dossiê Direitos humanos, sensibilidades e resistências. N 36, 2020/02 – ISSN 2238-9717
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DOI: https://doi.org/10.36661/2238-9717.2020n36.11796
cerimônia de entrega do relatório, da narrativa construída pelos membros da CNV e das
conclusões e recomendações contidas no documento a autora diz que seu objetivo seria
[...] compreender o relatório como um artefato de memória e produto de determinada
cultura histórica e de memória, e, portanto, como uma questão política que suscita
debates no espaço público ao estabelecer um conjunto de ideias e valores através de um
relato que funciona como um mecanismo de legitimação e coesão sociais.
A primeira parte do capítulo explica a estrutura do relatório e a forma como tenta-se
construir uma narrativa por meio dele. Em seguida, é abordada a cerimônia de entrega do
relatório – classificada pela autora como “tímida e melancólica” – os discursos ali proferidos e
as suas repercussões.
Na última parte do último capítulo, Caroline Bauer retorna a questão provocativa que
dá título ao livro: como será o passado? É a questão central, o fio condutor da obra como um
todo: qual memória sobre a ditadura civil-militar foi escrita pela Comissão Nacional da
Verdade? O que se fala e o que se cala nesta memória? Qual a relação entre esta narrativa e
outras existentes na sociedade brasileira? Estas perguntas se fazem presentes ao longo da
leitura, algumas com respostas mais simples, outras nem tanto. Antes de terminar o livro, no
entanto, a autora lança mais uma provocação:
Afirmou-se que a CNV possibilitou um espaço de escuta que permitiu que muitos ex-
presos e perseguidos e familiares de mortos e desaparecidos políticos narrassem pela
primeira vez suas experiências; da mesma forma, foi conferida especial atenção aos
mecanismos de transmissão da memória e de representações do passado; por fim, foi
apresentada uma pergunta que permanece sem resposta até o momento: há memórias
mais legítimas que outras?
Bauer, em seus parágrafos finais, assim como faz em tantos momentos ao longo da obra,
instiga o debate de uma questão importantíssima: a necessidade de problematizar os relatos de
ex-agentes da repressão. Da mesma forma que se fizeram públicos os relatos das vítimas, pela
primeira vez foram ouvidos oficialmente aqueles que agiam em defesa da ditadura. A obra
termina, mais do que concluindo, perguntando, fomentando o debate e inserindo-se no presente.
Demonstrando-se essencial em momentos onde o debate público sobre a ditadura brasileira
volta a ser evidente, assim como os usos da memória do período por figuras políticas
importantes.
A obra constituí importantíssima contribuição para o debate acerca dos usos do passado
e da memória, a partir do momento em que problematiza e contextualiza a atuação e as
produções da Comissão Nacional da Verdade; e questiona, a partir do título, quais as
colaborações que o passado (e o campo da História) pode dar para o presente e para o futuro. O
livro suscita ainda a discussão sobre a efetividade dos trabalhos da CNV, assim como as