Fronteiras: Revista Catarinense de História. Dossiê Direitos humanos, sensibilidades e resistências. N 36, 2020/02 – ISSN 2238-9717
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DOI: https://doi.org/10.36661/2238-9717.2020n36.11731
Não
Tem fatos a alegar ou provas que justifiquem a sua, diga, ou mostrem a sua inocência?
Disse que tem, e é que nunca deu chicotada no negro que trata a denúncia, e muito
menos o assassinou, pois não tinha motivo para assim proceder, tanto mais que nem
conheceu senão de vista, o dito negro.
Sabe ler e escrever?
Não. (PJ, s/p).
Em seu depoimento Carlos se inocenta de toda culpa, alegando não ter agredido
Jeronymo, embora as testemunhas afirmarem que na noite do ocorrido Jeronymo esteve na casa
de Carlos e foi expulso a chicotadas de lá. Porém, nenhumas das pessoas que depuseram
afirmaram ter visto o acusado agredir a vítima, apenas ouviram falar que ele havia agredido.
Mas afinal o que levou o “russo” a agredir Jeronymo e depois desaparecer com seu corpo? Qual
era a importância do Jeronymo para a sociedade de Palmas, que levou seu desaparecimento a
se tornar um inquérito e processo crime?
São muitas lacunas e perguntas não respondidas ao longo dos procedimentos realizados
pela justiça, e é nítido que o depoimento de Carlos Romback e pró-forma. Como Jeronymo com
suas limitações físicas conseguiria andar durante a noite sem que ninguém percebesse, e como
ele iria seguir após a violência sofrida e cego. De acordo com o depoimento de Ana Lima o
corpo de Jeronymo foi encontrado no mato, o que deduzimos ser um local de difícil acesso,
pois não foi percebido o mau cheiro da decomposição do corpo.
No processo não há a afirmativa que o réu Carlos Romback tenha agredido Jeronymo.
Contudo, se o mesmo não havia cometido nenhuma violência contra Jeronymo, porque na
manhã seguinte percorreu as casas da sua vizinhança discorrendo que não havia agredido
nenhum negro em sua casa na noite anterior, ou que havia agredido um jovem homem negro!
Um ato que demonstra preocupação em se defender, antes que alguém o acusasse.
No inquérito e no processo crime não houve nenhuma referência ao núcleo familiar ou
de parentesco de Jeronymo, talvez a sua família fosse a do extinto cativeiro, que poderá ter sido
fragmentada no pós-abolição. E ainda, o fato de ser “velho” e cego, que certamente para a
sociedade “não serviria para mais nada”. Este caso não é isolado no contexto do pós-abolição,
visto que o abandono e a exclusão da população negra estavam associados às políticas de
branqueamento e imigracionistas da Primeira República (RIOS; MATTOS, 2004, p. 170).
Em 1906, mais de três anos do desaparecimento de Jeronymo, foi proferida a sentença:
Vistos e examinado estes autos e considerando que deles não consta que havia procedido
o corpo de delito na pessoa do preto Jeronymo, no qual se aconteceu de causas naturais
de convicção, da existência de quaisquer dos crises a que se refez a denúncia [...];
Considerando, que assim sendo, se deve concluir pela inexistência de crime tentáveis
que da prova colhida não se defendeu indícios, se quer relatos de que tenha sido o
criminoso, e ainda que ao denunciado Carlos Romback caiba qualquer parcela de