Fronteiras: Revista Catarinense de História. Dossiê Direitos humanos, sensibilidades e resistências. N 36, 2020/02 – ISSN 2238-9717
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DOI: https://doi.org/10.36661/2238-9717.2020n36.11569
Por outro lado, em um curioso jogo político, o MDB lançava a responsabilidade por
isso no governo que, ao suprimir toda a oposição legal e democrática, favorecia a aparição de
um partido de subversão e conspiração. Tal afirmação atacava a ambos, governo e contrários
ao governo, isentando, assim, apenas o “imparcial MDB”.
Foi nesse cenário de participação restrita que o MDB tentava atuar como oposição ao
governo. É exatamente essa restrição que leva o partido a ater-se a um elemento da política
ditatorial como mote de sua oposição: a economia. A política econômica de controle da inflação
do então ministro Delfim Neto estava favorecendo grandemente o capital estrangeiro e foi esse
o ponto de apoio da oposição oficial, o MDB divulgada pelo Le Monde.
Segundo o MDB e mesmo alguns membros da ARENA, a cota de alerta já foi atingida,
senão, há muito tempo ultrapassada. Em certos setores, a economia brasileira foi
“desnacionalizada” em três quartas partes. Essa evolução já surgia no final de um
inquérito dirigido, em 1968, por uma comissão parlamentar. Naquela época, um
deputado, Rubem Medina, comunicou que os investimentos estrangeiros envolviam
72,61% dos bens de produção, 34,61% dos bens intermediários e 78,32% dos bens de
consumo durável (sic). Mais ou menos dois anos mais tarde, um estudo publicado em
número especial do hebdomadário VISÃO confirmava essa tendência. Enfim, há
algumas semanas, o senador Franco Montoro, do MDB de São Paulo, arvorou-se em
defensor dos interesses nacionais, desta vez usando os números dados pelo Banco
Central do Brasil. Por essa informação, os grupos estrangeiros detêm 70,2% dos capitais
investidos na indústria, 58,3%no comércio, 67,8%nos transportes, 89,9 na publicidade
e 69,2 na imprensa (Le Monde, nº 8273 de 20 de agosto de 1971).
Isso poderia sugerir uma preocupação do MDB com a economia do Brasil, mas para o
jornal seria, na verdade, uma preocupação política e o discurso econômico apenas
buscava angariar simpatia da classe média e da pequena burguesia, vítimas da
especulação provocada pela concentração de capital que se acelerou desde 1960. O
partido também tenta seduzir as classes populares, que pagaram caro a luta contra a
inflação (bloqueio de salário, alta de preços e desemprego) apresentada como prêmio
da recuperação econômica (jornal Le Monde, nº 8273 de 20 de agosto de 1971).
Outro deputado do MDB do Rio de Janeiro, Danton Jobim, pedia ao presidente da
República a revogação da lei de censura aos veículos de informação. Porém, o governo
construiu uma narrativa para o período de ditadura militar que o classificava como “fase de
transição que deveria conduzir ao pleno restabelecimento da democracia”, mesmo que essa
suposta fase já durasse vários anos e não existisse perspectiva de encerramento. Nesse cenário
idealizado, o governo militar entendia que a sociedade e a imprensa não poderiam suportar tal
liberdade, não teriam sabedoria para tal.