Fronteiras: Revista Catarinense de História. Dossiê Fronteiras, migrações e identidades nos mundos pré-modernos. N 35, 2020/01
ISSN 2238-9717
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DOI: https://doi.org/10.36661/2238-9717.2020n35.11416
De estrangeiro a cidadão: o processo de naturalização instaurado em 1832 e seus limites
From foreigners to citizens: the naturalization process established in 1832 and its
limitations
Cássila Cavaler Pessoa de Mello
1
Resumo
Neste artigo, discutiremos o processo de
naturalização instaurado no Império do Brasil a
partir da Lei de 23 de outubro de 1832.
Discorreremos, brevemente, sobre os motivos
que estimularam os estrangeiros a buscarem o
título de cidadão brasileiro e exporemos os
trâmites e as dificuldades enfrentadas por
aqueles que optavam por se tornar cidadãos.
Buscaremos explorar tanto a perspectiva estatal
quanto a dos indivíduos neste percurso.
Daremos ênfase à documentação produzida no
âmbito da Província de Santa Catarina embora
tratemos de um problema presente em todo o
Império. A análise e exposição dos termos de
declaração e das cartas de naturalização
registrados na Câmara Municipal de Desterro e
disponíveis no Arquivo Histórico do Município
de Florianópolis farão parte deste processo.
Palavras-chave: Império do Brasil;
naturalização; estrangeiros.
Abstract
This article discusses the naturalization process
established by the Brazilian Empire, beginning
with the law of October 23, 1832. It briefly
discusses some of the reasons that encouraged
foreigners to seek to become Brazilian citizens,
and considers the strategies, procedures and
difficulties faced by those who chose to become
citizens. It explores both the perspective of the
state and of individuals with relation to the
naturalization process. It emphasizes the
documentation produced within the Province of
Santa Catarina, although it addresses a problem
that was present throughout the Empire. The
analysis and presentation of the terms of
declaration and the naturalization letters
registered at the Desterro City Council, and
available in the Historical Archive of the
Municipality of Florianópolis, will be part of
this process.
Keywords: Brazilian Empire; naturalization;
foreigners.
No dia 18 de outubro de 1841, o espanhol Benedicto de Souza Menezes compareceu à
Câmara Municipal de Desterro, capital da Província de Santa Catarina. Ele assinou um termo
de declaração no qual informava pretender se tornar cidadão brasileiro e desejar fixar sua
residência no Brasil. No documento em questão
1
, ele declarou:
1º Que é súdito do Reino da Espanha, nascido de pais também espanhóis (...) no ano de
1809 (...)
2º Que veio de sua Pátria na companhia de seus pais na imigração que eles fizeram para
esta cidade no ano de 1810 forçados pela seca que ameaçava levar aquele país a um
estado calamitoso (...)
3º Que foi criado nesta cidade e na sua província tem sempre residido há 31 anos tendo
sido educado, e adotado a Religião Católica Romana, que era a mesma de seus pais (...)
Que vive honestamente com seu giro de negócio comerciando nesta cidade, na vila
de Laguna, e em outros lugares (...) por ser caixeiro de um negociante brasileiro.
1
Doutoranda em História na Universidade Federal Fluminense. E-mail: cassilamello@gmail.com.
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Que pretende fixar sua residência no Brasil, e fazer parte da sociedade brasileira e
ainda pretende tanto que casou na Vila da Laguna com uma brasileira. (...) e naquela
Vila tem negócio, é proprietário de bens de raiz, e tem servido de cargos públicos (...)
2
Esta é uma das poucas declarações encontradas que explicita o motivo da migração
familiar e, por isso foi selecionada para a abertura do artigo. Os pais de Benedicto teriam vindo
da Espanha fugindo da seca. Enquanto estes adotaram a migração como estratégia de
sobrevivência, seu filho adotou a naturalização como caminho para a estabilidade e ascensão
social.
Embora estejamos acostumados com brasileiros buscando o título de cidadão europeu
na atualidade, encontramos diversos exemplos da situação inversa ao estudarmos o século XIX.
Isto porque ser estrangeiro implicava na exclusão do corpo de cidadãos e afetava a vida
cotidiana dos migrantes instalados no Brasil de distintas maneiras.
Neste artigo, buscaremos explicitar, brevemente, os motivos que estimularam
estratégias como a de Benedicto, assim como, os trâmites e as dificuldades enfrentadas por
aqueles que optavam por se tornar cidadãos no Brasil Império. Exploraremos tanto a perspectiva
estatal quanto a perspectiva dos indivíduos em relação ao processo de naturalização. Daremos
ênfase à documentação produzida no âmbito da Província de Santa Catarina e ao processo de
naturalização instaurado pela Lei 23 de outubro de 1832 que permaneceu em vigência até o ano
de 1871. A análise e exposição dos termos de declaração e das cartas de naturalização
registrados na Câmara Municipal de Desterro e disponíveis no Arquivo Histórico do Município
de Florianópolis farão parte deste processo.
Ressaltamos que não pretendemos quantificar as naturalizações ocorridas em Desterro,
mas as utilizar para problematizar o processo de naturalização instaurado no Brasil em 1832.
Esperamos conseguir pontuar a vinculação entre a naturalização, a imigração e escravidão
apesar de não nos aprofundarmos na análise da discussão parlamentar. Além disso, temos como
objetivo mostrar a agência dos estrangeiros e suas diferenças ao explorarmos a questão da
naturalização.
3
Por que buscar a naturalização?
Ao longo da pesquisa desenvolvida no âmbito de mestrado, encontramos diversos
exemplos de limitações enfrentadas pelos estrangeiros. Identificamos um controle mais acirrado
sobre a sua circulação, a cobrança de impostos diferenciados sobre as suas atividades e sobre
os seus estabelecimentos e a sua exclusão de cargos públicos e da vida política do país
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(MELLO, 2018, p. 56-103; MELLO, 2019). Além disso, problemas relacionados à herança e
ao casamento misto (entre católicos e acatólicos) também eram vivenciados pelos mesmos
(NEDER, 2007, p. 9-41).
No caso, ser estrangeiro e não católico era um fator que dificultava ainda mais as vidas
dos estrangeiros e estrangeiras residentes no Brasil. Isto por lhes ser proibido, por exemplo, o
culto público de sua e por não haver registro civil do casamento e reconhecimento da validade
do casamento entre católicos e acatólicos.
4
Diante disto, destacamos que fatores como religião,
renda, ocupação e gênero poderiam implicar em uma maior ou menor dificuldade para os
estrangeiros se estabelecerem.
Benedicto, cujo trecho da declaração foi exposto acima, afirmava ser Católico
Apostólico Romano como seus pais. Provavelmente, este fator lhe facilitara bastante o
cotidiano em relação a outros estrangeiros. O casamento dele com sua mulher brasileira não
teria sido reconhecido se ele fosse acatólico e ela católica por exemplo. Isto poderia ter
dificultado sua estabilização e ascensão social. Entretanto, sua atuação nos cargos públicos e
como comerciante poderia estar sendo prejudicada em função da sua condição de estrangeiro.
Estas limitações podem ter motivado sua busca pelo título de cidadão brasileiro.
A limitação da atuação dos estrangeiros fez parte de um esforço do Estado brasileiro
após a independência (MELLO, 2018, p. 78) como o Aviso abaixo demonstra:
Tendo chegado ao conhecimento da Regência que por muitas províncias do Império se
encontrão alguns estrangeiros de diferentes nações empregados em diversos lugares
públicos, com escandalosa violação da Constituição do Império, e quebra dos interesses,
e regalias dos cidadãos brasileiros, que lhe cumpre zelar: A mesma Regência em Nome
do Imperador Ordena que V.Ex
a
., examinando escrupulosamente a naturalidade de
semelhantes empregados nessa província, haja de os despedir, preenchendo os lugares
assim vagos, com cidadãos brasileiros natos, adotivos ou naturalizados; sem contudo
entrarem neste número aqueles oficiais estrangeiros do Exército e Marinha, que segundo
a lei da fixação das forças de 25 de novembro de 1830, devem fixar no serviço.
D
s
. G
e
. a V. Ex
a
.
Palácio do Rio de Janeiro em [?] de Agosto de 1831.
Jose Lino Coutinho/ Feliciano Nunes Pires
5
O Aviso demonstra tanto o esforço do governo estatal para preservar os cargos públicos
quanto o descumprimento de suas determinações em diversas províncias. No entanto, apesar de
haver brechas para descumprimentos, elas implicavam em uma instabilidade para os indivíduos
que ocupassem tais cargos.
Entre as autoridades, observa-se a preocupação de se proteger o território nacional, de
se dar espaço para os cidadãos brasileiros e o uso político da diferenciação entre cidadãos e não
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cidadãos. Entre a população, havia, sobretudo, a preocupação de se garantir empregos,
especialmente, em períodos de crise e de escassez de gêneros. Tal anseio popular expressou-se
frequentemente por meio do antilusitanismo em função de ser grande o número de portugueses
atuando como caixeiros e no comércio de maneira geral (RIBEIRO, 2008, p. 37-63; CÂMARA,
2005, p 93-117).
Em alguns Estados, como em Pernambuco, movimentos populares chegaram a requerer
a expulsão dos portugueses e que o comércio a retalho e a pequena indústria fossem privativos
dos filhos do país ou dos cidadãos naturalizados no gozo dos
seus direitos políticos. A nacionalização do mercado de trabalho foi uma preocupação presente
no século XIX (CÂMARA, 2005, p. 117-161).
Além dessas questões, podemos pensar no quanto a restrição eventual à circulação
afetava a vida dos indivíduos. Havia diversas normas e exigências, como a cobrança de
passaporte para deslocamento entre as províncias e do título de residência para estrangeiros,
que poderiam ser acirradas e colocadas em prática em períodos de conflito e prejudicar os
negócios dos não cidadãos (RIBEIRO, 1997, p. 71-96; BRASIL. Regulamento nº 120, de 31 de
janeiro de 1842). A declaração de Benedicto, por exemplo, foi feita em um momento no qual a
Revolução Farroupilha estava em curso em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul. Em 1839,
os rebeldes proclamaram a República Juliana em Laguna e começaram a avançar sobre Desterro
(COSTA, 2006, p. 82-90). Isto pode ter gerado um aumento na rigidez do controle sobre o
deslocamento nesse período e contribuído para sua decisão de se naturalizar.
Os fatores elencados o alguns dos motivos pelos quais os indivíduos buscavam o
acesso ao título de cidadão por meio do processo de naturalização. Cabe agora,
compreendermos como esse processo foi instaurado e os trâmites burocráticos enfrentados
pelos estrangeiros para o alcançar.
A Lei 23 de outubro de 1832
A primeira lei de naturalização brasileira foi instaurada em 23 de outubro de 1832.
Entretanto, a discussão sobre se facultar ou não acesso ao título de cidadão aos estrangeiros e a
quais estrangeiros já havia se iniciado na Constituinte de 1832.
Na ocasião, a concessão do título de cidadão e de direitos aos portugueses foi um dos
temas que repercutiram dentro e fora da Assembleia. Esta era uma questão delicada pois muitos
portugueses residiam no Brasil e ocupavam cargos públicos (VIEIRA, 2006, p. 87-99). Após
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muitas discussões, ficou definido que seriam considerados cidadãos todos os portugueses que
houvessem continuado a residir no Brasil após a independência e que não houvessem se
posicionado contra a causa brasileira.
6
Portanto, definiu-se que esses portugueses passariam a
ser considerados cidadãos e não precisariam passar pelo processo de naturalização, assim como
os escravos que se tornassem libertos independentemente de serem africanos ou nascidos no
Brasil (MAMIGONIAN, 2015, p. 181-205).
Em relação aos demais estrangeiros, definiu-se que lhes seria facultado o direito à
naturalização. Para isso, deveriam ser maiores de idade, domiciliados no Império com capitais
ou exercer algum ramo de comércio ou indústria ou terem prestado algum serviço importante à
Nação.
7
Tais critérios demonstram que havia o interesse em se ter como cidadãos os
estrangeiros que tivessem recursos e estivessem bem estabelecidos independentemente de sua
religião.
Após a dissolução da Constituinte, algumas dessas disposições foram alteradas na
Constituição outorgada em 1824. Os libertos africanos não seriam mais considerados cidadãos
e não foram inclusos no texto constitucional os critérios para que o título de cidadão fosse
concedido. Definiu-se que os estrangeiros poderiam se naturalizar para obterem o tulo de
cidadão, mas que as condições e os trâmites seriam regulamentados posteriormente.
8
A discussão sobre a regulamentação da naturalização foi iniciada em 1826 no Senado.
As divergências entre a Câmara e o Senado motivaram o adiamento da questão. Os deputados
tenderam a ser mais rigorosos no estabelecimento de critérios para naturalização. Estipularam,
por exemplo, que poderiam obter carta de naturalização apenas os estrangeiros: maiores de
idade que não houvessem se oposto à Independência do Império ou ao seu governo monárquico
constitucional representativo; que tivessem declarado na Câmara Municipal sua vontade de
fixar domicílio; que estivessem residindo no Brasil por 10 anos ou 7 quando casados com
brasileira e que tivessem bom procedimento. Tais exigências foram consideradas excessivas
entre os senadores (VIEIRA, 2006, p. 87-99; RIBEIRO, 2002, p. 27-143).
Enquanto alguns parlamentares consideravam importante regulamentar e facilitar a
naturalização para se atrair imigrantes, outros consideravam que a atração estava desvinculada
da naturalização. Havia ainda aqueles que achavam prudente esperar para que as instituições
imperiais se consolidassem antes de se facilitar a entrada de estrangeiros e seu estabelecimento
na vida pública. Ressaltamos que os parlamentares que defendiam a facilitação da naturalização
não estavam defendendo necessariamente o acesso dos naturalizados a direitos políticos plenos
(MELLO, 2018. p. 150-156).
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Na ausência de um consenso e de um regimento que regulamentasse a discussão coletiva
do projeto, a criação de uma lei foi postergada. Consideramos que o contexto conturbado, a
existência de diferentes tipos de estrangeiros e a dificuldade de se considerar todas essas
diferenças na lei foi fundamental para o desacordo entre os parlamentares (Ibidem).
Em relação ao contexto, lembramos que o Império vivia a crise de sucessão de D. João
VI (POZO, 2010. p. 53-65) e sofria pressão da Inglaterra para elaboração de um tratado no qual
se delimitaria uma data para o fim do tráfico.
9
A instituição da Lei de naturalização em 1832 esteve vinculada à necessidade de se
estabelecer critérios claros e padronizados para o acesso ao título de cidadão (RIBEIRO, 2002,
p. 27-143; VIEIRA, 2006, p. 87-99). As resoluções colocadas em vigor, assim como seu
cancelamento posterior acabaram por possibilitar interpretações equivocadas acerca do acesso
ao título de cidadão e por simplificá-lo em demasia.
10
Além disso, sua aprovação ocorreu após
a entrada em vigor da primeira lei antitráfico em 7 de novembro 1831 em um período no qual
a discussão sobre oferta de mão de obra alternativa à escrava constituía uma preocupação
(Ibidem).
A lei de naturalização aprovada em 1832 estipulou os seguintes critérios e passos para
a naturalização:
Art. 1º O Governo fica autorizado a conceder carta de naturalização, sendo requerida, a
todo o estrangeiro, que provar:
§ 1º Ser maior de vinte e um anos.
§2º Que se acha no gozo dos direitos civis, como cidadão do país a que pertence, salvo
se os houver perdido por motivos absolutamente políticos.
§ Que tem declarado na Câmara do município de sua residência seus princípios
religiosos, sua pátria, e que pretende fixar seu domicílio no Brasil.
§ 4º Que tem residido do Brasil por espaço de quatro anos consecutivos, depois de feita
a declaração mencionada no parágrafo antecedente; exceto se, domiciliados por mais de
quatro anos no Império ao tempo da promulgação desta Lei, requererem dentro de um
ano carta de naturalização.
§ 5º Que ou é possuidor de bens de raiz no Brasil, ou nele tem parte em fundos de algum
estabelecimento industrial, ou exerce alguma profissão útil, ou enfim vive honestamente
do seu trabalho.
11
O artigo dois especificava que alguns estrangeiros poderiam ter sua naturalização
facilitada.
Art. 2º São sujeitos unicamente à prova do parágrafo terceiro.
§ 1º Os casados com Brasileira.
§ 2º Os que domiciliados no Brasil forem inventores, ou introdutores de um gênero de
indústria qualquer.
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§ 3º Os que tiverem adotado um Brasileiro, ou Brasileira.
§ Os que houverem feito uma ou mais campanhas em serviço do Brasil, ou em sua
defesa tiverem sido gravemente feridos.
§ 5º Os que por seus talentos, e literária reputação tiverem sido admitidos ao Magistério
das Universidades, Liceus, Academias, ou Cursos Jurídicos do Império.
§ Os que por seus relevantes feitos a favor do Brasil, e sobre proposta do Poder
Executivo, forem declarados beneméritos pelo Corpo Legislativo.
12
A análise dos artigos nos mostra que a naturalização seria facilitada para alguns e
dificultada para outros e aponta para a existência de estrangeiros desejados e indesejados. Eram
desejados aqueles que tivessem bens ou empregos e ocupações consideradas úteis e honestas.
A posse de bens e recursos, portanto, era um fator de seleção entre os que poderiam fazer parte
do corpo de cidadãos e os que seriam excluídos do mesmo. O parágrafo segundo acabava por
dificultar o acesso à naturalização dos africanos pelo fato de os ex-escravos terem tidos seus
vínculos quebrados no processo de escravização e tráfico para o Brasil e pelo fato de a África
não estar enquadrada nos moldes modernos de nação vigentes naquele contexto
(MAMIGONIAN, 2015, p. 181-205; MELLO, 2018, p. 149-200).
No segundo artigo, o elencados fatores que diminuíam a suspeição sobre os
estrangeiros e, consequentemente, diminuíam as exigências e os trâmites burocráticos atrelados
à naturalização. O estabelecimento de vínculo com brasileiros e brasileiras por matrimônio e
pela adoção, uma reputação destacada e feitos importantes são fatores que demonstrariam a
utilidade e importância dos estrangeiros e sua predisposição em se estabelecer no Brasil. Nesse
caso, os estrangeiros o precisariam comprovar serem maiores de 21 anos e gozarem de
direitos civis nos seus países de origem. Isso poderia facilitar bastante o processo de
naturalização em função da dificuldade de obtenção de documentos comprobatórios conforme
veremos.
O processo de naturalização
A realização de uma declaração na qual o indivíduo informava pretender fixar residência
no Brasil e se tornar cidadão correspondia à primeira etapa do processo de naturalização. O
presente artigo foi iniciado com a transcrição de parte da declaração prestada por Benedicto de
Souza Menezes na Câmara de Desterro. As declarações realizadas na referida Câmara (60 no
total) continham, em geral, o nome, a idade, a procedência, o tempo de residência no Brasil, a
religião professada, o estado civil, a nacionalidade da esposa e o número, assim como a
nacionalidade dos filhos dos estrangeiros. Algumas eram mais detalhadas, contendo
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informações como a ocupação e a trajetória do indivíduo até chegarem nos locais de sua
residência (MELLO, 2018. p. 170-180).
A avaliação do preenchimento ou não das condições necessárias para se obter o tulo
de cidadão era feita pelo juiz de paz. Caso a sentença fosse positiva, o estrangeiro poderia
solicitar a carta de naturalização diretamente ao Ministério do Império ou por intermédio do
presidente da província. Obtida a carta de naturalização, que deveria passar pela análise do
legislativo imperial, o indivíduo deveria registrá-la na Câmara Municipal e prestar juramento
na mesma. O processo, portanto, passava pelo escrutínio de diversas autoridades e instâncias
do Império.
13
As autoridades situadas no âmbito imperial tendiam a ser mais rigorosas com a cobrança
das condições estabelecidas na lei. A omissão de algumas disposições da Lei de naturalização
era recorrente na documentação enviada ao Ministério do Império. Em função disso, o seguinte
Aviso foi emitido em 1849:
Ilm
o
. Exm
o
. Sñr
Vendo-se pelos requerimentos que por esta Secretaria de Estado sobem à Augusta
Presença de Sua Majestade O Imperador para a obtenção de Carta de Naturalização de
cidadão Brasileiro, que se não observam algumas das disposições da Lei de 23 de
Outubro de 1832, cuja omissão, além de não dever ser tolerada, pelo respeito que é
devido às leis do estado, tende a enfraquecer a garantia que a mesma Lei procurou
estabelecer com a prescrição das formalidades a observar, e dos deveres a cumprir pelos
estrangeiros que pretendessem formar parte da Família Brasileira: o Mesmo Augusto
Senhor por bem que V. Ex
a
. expeça as necessárias ordens, 1˚. para que nenhum
estrangeiro, à exceção dos mencionados no Art. 2. da citada Lei, seja admitido a fazer
perante a respectiva Câmara municipal a declaração exigida pelo §3. do art. 1., nem para
tal fim se conceda despacho, sem que o pretendente prove previamente por documento
legal, ou por justificação no Juízo de Paz, os requisitos §§1. e 2. do dito Art. 1 (...),
sejam os Juízes de Paz escrupulosos no exame dos requisitos que a Lei exige (...).
Deus Guarde a V. Ex
a
/ Visconde de Montalegre
14
No Aviso acima, o Ministério do Império ressaltava a necessidade de o estrangeiro
comprovar ter mais de 21 anos e gozar dos direitos civis no seu país de origem para poder fazer
sua declaração na Câmara e dar início ao processo de naturalização. Lembramos que alguns
estrangeiros (mencionados no artigo 2 da Lei de 23 de outubro de 1832), como os casados com
brasileira, não precisariam fazer tais comprovações. O Aviso chama atenção tanto das Câmaras
quanto dos Juízes de Paz ao solicitar que fossem mais escrupulosos no exame dos documentos
apresentados.
O caso do sardo João Baptista Sacarello exemplifica a situação citada. Ele fez a sua
declaração na Câmara de Desterro em oito de agosto de 1843. Seis anos depois, seu pedido de
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naturalização foi enviado ao Ministério dos Negócios do Império por intermédio do presidente
da província Antonio Pereira Pinto. Este o encaminhou mesmo sabendo da falta da
comprovação dos §§1˚ e do Artigo 1˚da lei de 23 de outubro de 1832. Na ocasião, o
presidente da província ressaltou o cumprimento dos demais requisitos da lei. Apesar disso, a
carta de naturalização não foi concedida.
15
Alguns meses depois, em 22 de abril, seu pedido foi reencaminhado ao Ministério
através do novo presidente da Província de Santa Catarina João José Coutinho. Este ressaltou
que o solicitante conseguiu aquela documentação em função de sua pobreza e da distância
de seu país natal e que aparentava ter mais de sessenta anos.
16
Não encontramos outros avisos
reclamando de sua documentação nem registro de sua naturalização na Câmara de Desterro. Ele
pode ter obtido a sua carta e a registrado em outro local ou ter desistido do processo (MELLO,
2018, p. 170-180).
Este exemplo mostra o quão difícil era para alguns indivíduos iniciarem e prosseguirem
com a naturalização. A produção de provas e o processo de naturalização tinham um custo que
poderia torná-lo inviável para aqueles privados de recursos. Para Sacarelli, não era simples
solicitar documentação no seu país de origem ou as produzir no Brasil e arcar com os custos
dessa produção. O presidente da província tentou dar testemunho da idade do requerente em
sua solicitação, mas não sabemos se tal testemunho foi considerado válido.
Além disso, Sacarelli não poderia nem ter feito o registro da sua declaração na Câmara
Municipal por não poder comprovar todos os requisitos exigidos pela lei. Podemos imaginar
que muitos tentaram iniciar seu processo eo conseguiram ou ainda que muitos nem tentaram
por saber das dificuldades atreladas ao mesmo. Este é um exemplo que ilustra o quanto ser
casado com brasileira e ter filhos brasileiros poderia fazer diferença no processo de
naturalização. Neste caso, os estrangeiros seriam dispensados de apresentar as provas citadas.
Os Avisos enviados pelo Ministério do Império aos presidentes da Província de Santa
Catarina permitiram que identificássemos problemas que ocorreram ao longo do processo
naturalização de sete indivíduos e que impediram a concessão das cartas requeridas. Esses
problemas podem ser agrupados em três categorias principais: falta de documentos
comprobatórios; documentos inadequados que não seguiam o formato prescrito na lei e a falta
de pagamento de direitos e impostos.
17
Dentre os indivíduos envolvidos nesses casos, sabemos que os portugueses Antonio
Ferreira Cardozo Guimaraes e José da Costa Leite Guimarães e o francês Pedro Crousey
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insistiram no processo de naturalização após as negativas iniciais e conseguiram registrar suas
cartas de naturalização na Câmara de Desterro.
18
Antonio Ferreira Cardozo Guimaraes fez sua declaração na Câmara de Desterro em
janeiro de 1849, teve seu pedido de concessão de carta de naturalização negado em 1851 por
falta de pagamento de direitos e despesas inclusas na nota, mas conseguiu se readequar e
registrou sua carta ainda em 1851. José da Costa Leite Guimarães teve seu pedido negado em
1851 por problemas com a sua declaração e falta de pagamento, mas registrou sua carta no
mesmo ano. Pedro Crousey teve seu pedido negado em 1852 por falta de comprovação do
pagamento do imposto de folha corrida e conseguiu registrar sua carta apenas em 1857. Ele
levou, ao menos, cinco anos para conseguir se tornar cidadão brasileiro.
Vemos que a readequação era mais simples para alguns do que para outros. Isso pode
estar associado à situação financeira dos indivíduos. É possível que o registro de Pedro Crousey
tenha demorado para ser feito em função da dificuldade de o mesmo obter a quantia necessária
para pagar as despesas associadas aos trâmites burocráticos da naturalização.
Destacamos que alguns indivíduos podem ter remetido as suas solicitações diretamente
ao Ministério do Império e terem recebido suas negativas por outras vias. Conseguimos
identificar os problemas citados a partir da correspondência trocada entre os presidentes da
Província de Santa Catarina e o Ministério do Império que tratam das solicitações de cartas
feitas por intermédio dos presidentes da Província de Santa Catarina.
Declarações e cartas de naturalização registradas em Desterro
As 60 declarações presentes na Câmara de Desterro foram realizadas entre 1834 e 1871.
Dentre os 60 indivíduos que declararam querer se fixar no Império do Brasil e obter o título de
cidadão brasileiro, 13 registraram suas cartas de naturalização na mesma Câmara
posteriormente. Ou seja, sabemos que 13 pessoas, ao menos, conseguiram concluir o processo.
Os demais podem tanto terem desistido de dar continuidade ao seu pedido em função das
dificuldades quanto terem obtido suas cartas e as registrado em outras Câmaras.
19
No total, foram encontrados 30 registros de cartas de naturalização na Câmara de
Desterro realizados entre 1846 e 1868. Conforme mencionado, 13 eram de indivíduos que
haviam feito a sua declaração nesta Câmara e 17 de indivíduos que haviam iniciado seu
processo de naturalização em outro local.
20
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A declaração era o primeiro passo na busca pela naturalização. O registro da carta de
naturalização obtida em uma Câmara Municipal e o juramento prestado perante a mesma
Câmara, por sua vez, correspondiam à última etapa do processo de naturalização de acordo com
a Lei 23 de outubro de 1832.
Cabe destacar que nem todas as declarações realizadas e nem todas as cartas registradas
na Câmara de Desterro seguiram a Lei de 1832. Entre 1832 e 1871, mudanças em relação à
naturalização foram implantadas sem que a Lei de 1832 deixasse de vigorar. O Decreto de 30
de agosto de 1843, por exemplo, reduziu de 4 para 2 anos o tempo que os estrangeiros deveriam
residir no Brasil após a realização de sua declaração para poderem obter sua carta de
naturalização.
21
A partir de 1846, os estrangeiros estabelecidos na Colônia de São Leopoldo e de São
Pedro de Alcântara no Rio Grande do Sul seriam reconhecidos como cidadãos brasileiros
naturalizados logo que assinassem na Câmara Municipal um termo declarando ser essa sua
vontade. Diante disso, o presidente da respectiva província lhes daria a carta de naturalização
gratuitamente. Em 1850, a medida foi estendida aos estrangeiros das colônias de São Pedro de
Alcântara em Santa Catarina e aos de Petrópolis no Rio de Janeiro.
22
As novas leis e decretos emitidos ao longo da década de 1840 e 1850 tenderam a
simplificar o processo de naturalização, especialmente, para os indivíduos classificados como
colonos. Além disso, novas instâncias foram envolvidas no processo de naturalização. As
Câmaras Municipais foram perdendo gradativamente sua centralidade no processo. A partir de
1871, elas já não fariam mais parte do mesmo (MELLO, 2018, p. 149-200).
Abaixo, elencamos as legislações que orientaram as declarações (Tabela 1) e os
registros das cartas de naturalização (Tabela 2).
Tabela 1 - Legislação que orientou as declarações
Lei
N
N%
Lei de 23 de outubro de 1832
51
85
Decreto 808 de 23 de junho de 1855
7
11,66
Lei 1.096 de 10 de setembro de 1860
1
1,67
Não informado
1
1,67
TOTAL
60
100
Fonte: AHMF. Registro dos termos de declaração das pessoas que solicitaram
sua naturalização (1834-1871), caixa 28, n. 73
Tabela 2 - Legislação que orientou os registros das cartas de naturalização
Legislação
N
N%
Lei de 23 de outubro de 1832
25
83
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Decreto 712 de 16 de setembro de 1853
1
3
Decreto 808 de 23 de junho de 1855
4
14
TOTAL
30
100
Fonte: AHMF. Registros de naturalização (1846-1868), caixa 45
O Decreto 712 de 16 de setembro de 1853 remetia à Lei de Terras de 1850. Ele reforçava
que o artigo 17 desta Lei era válido para os colonos que fizessem parte de qualquer colônia
fundada no Império. Este artigo determinava que os estrangeiros que comprassem terras e nelas
se estabelecessem ou desenvolvessem alguma indústria no país poderiam se naturalizar depois
de dois anos de residência no país e ficariam isentos do serviço militar, mas sujeitos à Guarda
Nacional.
23
A menção à questão da naturalização nesta Lei aponta para o atrelamento entre a
imigração, a naturalização e a política de terras no Brasil.
O Decreto 808-A, de 23 de junho de 1855 padronizou e detalhou o processo de
naturalização dos chamados colonos. Ele manteve a isenção do serviço militar e possibilitou
aos colonos assinarem o termo de declaração tanto na Câmara Municipal quanto frente ao juiz
de paz. Com base nesse documento, o título de cidadão seria dado pelo presidente da respectiva
província gratuitamente mediante juramento à Constituição e às demais leis do Império por
parte do beneficiado. O tempo de residência necessário para obtenção do título era de dois anos
conforme estabelecido nas determinações previamente citadas. Mas o decreto autorizava a
concessão do título em menor tempo desde que o estrangeiro fosse considerado digno dessa
medida.
24
Isso significa que naturalizações dos chamados colonos podem ter ocorrido e terem sido
registradas em outras instâncias, fora do âmbito da Câmara. Além disso, aponta para a
existência de dois processos de naturalização paralelos no Império. Um voltado para os
chamados colonos regulamentado pelo Decreto 808 de 23 de junho de 1855 e outro voltado
para os demais estrangeiros e regulamentado pela Lei de 23 de outubro de 1832. Neste artigo,
estamos interessados, sobretudo, em avaliarmos e compreendermos o processo instaurado a
partir da Lei de outubro de 1832.
A Lei em questão permaneceu em vigor até a entrada em vigência do Decreto nº 1.950,
de 12 de julho de 1871. Este decreto simplificou a naturalização dos não colonos e retirou da
Câmara o controle sobre a naturalização, motivo pelo qual não encontramos mais declarações
e registros a partir desta data nesta instituição. Destacamos que a naturalização dos colonos
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continuou sendo regida pelo Decreto 808 de 23 de junho de 1855 mesmo após a entrada em
vigor do Decreto nº 1.950, de 12 de julho de 1871.
25
A Lei 1.096 de 10 de setembro de 1860 citada na Tabela 1, por sua vez, tratava da
condição da mulher e dos filhos dos estrangeiros. Ela foi citada na declaração efetuada por D.
Felicidade Cândida Izetto, viúva do italiano André Izetto, que informava ter sempre residido na
província e desejar recobrar sua condição de brasileira. Parte da lei especificava que:
Art. A estrangeira, que casar com Brasileiro, seguirá a condição do marido; e
semelhantemente a Brasileira que casar com estrangeiro, seguirá a condição deste. Se a
Brasileira enviuvar, recobrará sua condição brasileira, uma vez que declare que quer
fixar domicilio no Império.
26
Ou seja, a mulher acompanharia a nacionalidade do seu marido e deixaria de ser
considerada brasileira caso seu marido não o fosse. Destacamos que a lei não menciona a
condição de cidadã da mulher, mas sim de brasileira. Isto também foi observado na declaração
efetuada pela polonesa Christina Ottilia Apolonia. Esta se instalou na Colônia Dona Francisca
em 1858 com sua mãe e deu início ao processo de naturalização em 16 de março de 1861.
27
Elas foram as únicas mulheres encontradas na documentação analisada. Nela, predominam
declarações de homens católicos.
Mariana Armond Dias Paes observou que as mulheres se tornavam juridicamente
incapazes ao se casarem. O marido se tornava seu representante e tanto a mulher quanto os seus
bens ficavam sujeitos ao poder marital (PAES, 2014. p. 86-99). Destacamos que as duas únicas
mulheres encontradas que tiveram a iniciativa de solicitar a condição de brasileira eram
justamente mulheres que não estavam sujeitas ao poder marital. Felicidade Cândida Izetto era
viúva e Christina Ottilia Apolonia era solteira. Ressaltamos que Felicidade Cândida Izetto não
precisaria registrar uma carta para ser considerada brasileira. A realização da declaração era
suficiente para recobrar sua condição anterior.
Em relação à naturalidade/nacionalidade/proveniência, apresentamos a Tabela 3 que
informa a proveniência especificada nos registros das cartas de naturalização. Optamos por
registrar nas tabelas as identidades e descrições informadas na documentação. Por isso
escrevemos ora natural de Portugal e ora súdito português. Consideramos importante nos
atermos aos termos presentes nas fontes em um contexto no qual as nacionalidades, nações e
noções de pertencimento estavam em delineamento. Os termos utilizados acabam por ser
também uma expressão desta construção.
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Tabela 3 - Nacionalidades/Naturalidades informadas
Proveniência registrada
N
Súdito português
14
Natural de Portugal
2
Súdito da República do Uruguai
Uruguai
2
Natural da Alemanha
2
Súdito de Toscana
1
Súdito do Rei da Sardenha
1
Súdito italiano
1
Súdito espanhol
1
Súdito inglês
1
Súdito francês
1
Natural da Polônia
1
Natural da Prússia
1
Natural da Suíça
1
Natural da Turquia
1
TOTAL
30
Fonte: AHMF. Registros de naturalização (1846-1868), caixa 45.
Ressaltamos a proveniência diferenciada dos indivíduos e a predominância de
indivíduos oriundos de Portugal no período analisado entre os solicitantes (16 ou 53%).
28
Os
portugueses, cuja presença no Brasil se destaca no período analisado, estavam em número bem
maior de solicitantes em relação a alemães e italianos na documentação analisada.
Todas as solicitações de naturalização realizadas pelos portugueses, com a exceção de
um caso no qual não houve especificação da legislação utilizada, foram baseadas na Lei de 23
de outubro de 1832. Isso explica em parte o receio dos parlamentares em facilitar o processo de
naturalização para os estrangeiros de maneira geral. Tal medida beneficiaria, sobretudo, os
portugueses em um contexto no qual havia disputas políticas travadas em torno do ser brasileiro
e do ser português e receio de que os portugueses acabassem por ocupar posições estratégicas
na administração pública e na vida política (RIBEIRO, 2008. p. 37-63; VIEIRA, 2006 p. 87-
99).
A predominância dos portugueses entre os cidadãos brasileiros naturalizados também
foi observada em outras pesquisas. Ribeiro observou uma série de decretos pelos quais o
governo autorizava a concessão de cartas de naturalização nas atas do legislativo no ano de
1831. Os solicitantes eram predominantemente portugueses do Porto; espanhóis; italianos e
alemães. Vieira destacou a predominância dos portugueses entre os naturalizados durante o
Primeiro Reinado e após a aprovação da Lei de 1832 (RIBEIRO, 2002, p. 27 a 143; VIEIRA,
2006, p. 87-99).
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As datas das declarações e registros estão presentes nas Tabelas 4 e 5.
Tabela 4 Número das declarações de naturalização em Desterro por ano
Número de declarações
N%
1834
2
3,33
1835
0
0
1836
0
0
1837
0
0
1838
1
1,67
1839
2
3,33
1840
0
0
1841
1
1,67
1842
1
1,67
1843
2
3,33
1844
1
1,67
1845
12
20
1846
0
0
1847
0
0
1848
1
1,67
1849
3
5
1850
0
0
1851
1
1,67
1852
0
0
1853
0
0
1854
2
3,33
1855
0
0
1856
4
6,67
1857
1
1,67
1858
4
6,67
1859
0
0
1860
2
3,33
1861
6
10
1862
0
0
1863
2
3,33
1864
0
0
1865
0
0
1866
0
0
1867
1
1,67
1868
3
5
1869
2
3,33
1870
4
6,67
1871
1
1,67
Ilegível
1
1,67
TOTAL
60
100%
Fonte: AHMF. Registro dos termos de declaração das pessoas que solicitaram
sua naturalização (1834-1871), caixa 28, n. 73.
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Tabela 5 - Número de emissões das cartas de naturalização por ano
Ano
Número de declarações
N%
1846
3
10
1847
2
6,67
1848
3
10
1849
2
6,67
1850
0
0
1851
2
6,67
1852
1
3,33
1853
1
6,67
1854
1
3,33
1855
0
0
1856
0
0
1857
2
6,67
1858
2
6,67
1859
2
6,67
1860
1
3,33
1861
0
0
1862
0
0
1863
1
3,33
1864
1
3,33
1865
3
10
1866
1
3,33
1867
1
3,33
1868
1
3,33
TOTAL
30
100%
Fonte: AHMF. Registros de naturalização (1846-1868), caixa 45.
O maior número de declarações realizadas no ano de 1845 pode estar associado ao
Decreto de 30 de agosto de 1843. Este estipulou que os estrangeiros precisariam residir dois
anos no país após a realização da declaração para poderem se naturalizar e não mais quatro
como previsto anteriormente.
29
Cabe destacar ainda que a concessão de direitos aos naturalizados foi limitada pela
legislação. Ou seja, por mais que o Estado tenha aberto esta possibilidade aos estrangeiros, ele
buscou também delimitar os espaços que estes poderiam ocupar. Os estrangeiros que se
naturalizavam tornavam-se cidadãos brasileiros naturalizados. Essa era uma marca de distinção
entre eles e os demais cidadãos. Com a aquisição da cidadania, várias limitações poderiam ser
superadas, mas algumas permaneciam.
Eles não poderiam, por exemplo, ser Ministro de Estado e deputado, assim como, os
acatólicos.
30
Durante boa parte do período imperial, portanto, os naturalizados e acatólicos
tiveram possibilidades de participação institucional na esfera municipal de poder, podendo
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votar e serem eleitos para atuarem como vereadores e juízes de paz, mas enfrentaram limitações
nas esferas superiores em função das restrições legais impostas. Essa situação foi parcialmente
revertida apenas com a lei eleitoral Saraiva de 1881 que os considerou elegíveis para o cargo
de deputado na Assembleia Geral desde que tivessem seis anos de residência no Império após
a naturalização (WITT, 2001; PIASSINI, 2016; PESAVENTO, 2014. p. 47; MELLO, 2018. p.
180-187).
31
Os trabalhos de Carlos Eduardo Piassini e Marcos Antonio Witt exemplificam a
ocupação das funções municipais por estrangeiros naturalizados durante o Império e apontam
para os esforços realizados por alguns deles para chegarem a instâncias superiores. Os autores
mostram que ocupação dos primeiros cargos de deputação provincial por estrangeiros
naturalizados no Rio Grande do Sul ocorreu apenas após a aprovação da Lei Saraiva de 1881.
Esta lei deixou clara a possibilidade de atuação dos mesmos como vereadores, juízes de paz,
deputados provinciais e na Assembleia Geral e como senadores (WITT, 2001; PIASSINI,
2016).
Considerações finais
Os estrangeiros eram necessários como mão de obra e na ocupação e defesa do território
(RIBEIRO, 2011, p. 251-271). Neste sentido, a naturalização era vista como uma forma de
atrair imigrantes para solucionar tal problema. Além disso, sua regulamentação, como vimos,
era importante para barrar uma concessão indevida de naturalizações que estava ocorrendo em
função de interpretações divergentes acerca desse processo.
Ao mesmo tempo em que o Estado precisava dos estrangeiros, os parlamentares e
autoridades preocupavam-se em qualificar o acesso ao tulo de cidadão e com a criação de
entraves que garantissem a manutenção da independência e da segurança interna
(MAMIGONIAN, 2015, p. 181-205). Esse dilema enfrentado pelo Estado brasileiro que se
formava postergou a regulamentação da naturalização.
A preocupação com o acesso restrito ao título de cidadão e aos direitos políticos
atrelados a ele esteve presente nos diferentes Estados modernos. Marcar a existência de
diferentes categorias de cidadãos nas Constituições, criar uma legislação paralela restringindo
direitos a alguns indivíduos e dificultar o acesso ao título de cidadão foram estratégias adotadas
pelos diferentes governos nesse sentido (SLEMIAN, 2006; SILVA, 2009).
Independentemente desses fatores, a busca pela naturalização pode ser vista como uma
estratégia adotada pelos indivíduos para melhorarem sua vida cotidiana (SCOTT &
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HÉBRARD, 2014). Iniciar o processo e seguir com o mesmo não era algo simples. Alguns,
como vimos, o iniciaram mesmo sem condições de arcarem com os custos das comprovações
necessárias recorrendo a estratégias como a intermediação do presidente da província.
Apesar das dificuldades e limites, estrangeiros de diferentes nacionalidades, gênero,
ocupações, religiões, credos e condições financeiras aproveitaram as oportunidades vigentes e
tentaram alcançar o título de cidadão embora presumamos que muitos tenham tido esse anseio
barrado por não serem considerados dignos e aptos de formarem parte da nação brasileira. O
processo de naturalização era uma forma de incluir determinados estrangeiros ao corpo da
nação e de barrar a inclusão daqueles considerados indesejados.
Ao analisarmos a questão da naturalização, percebemos que africanos, mulheres e
pessoas com poucos recursos tiveram o acesso ao tulo de cidadão ou a condição de
brasileiro/brasileira restringido pelo Estado. Cabe ressaltar que alguns africanos conseguiram
obter tal título e que nem todos os estrangeiros ansiavam pelo mesmo. A pesquisa efetuada no
âmbito do mestrado também nos mostrou que questões como o recrutamento militar poderiam
tornar o acesso ao título de cidadão indesejado (MELLO, 2018). Por isso, são importantes as
isenções militares presentes na legislação que trata da naturalização dos chamados colonos.
Além disso, destacamos que as facilidades dispensadas aos colonos no processo de
naturalização não significavam, de maneira alguma, que eles recebessem um tratamento
diferenciado/superior no seu cotidiano em relação aos demais estrangeiros ou que o
enfrentavam dificuldades ao longo do processo de naturalização. Eles também sofriam as
restrições vivenciadas pelos demais estrangeiros e citadas no início deste artigo. Ademais, a
relação entre os habitantes das colônias e seus administradores poderia ter um impacto sobre o
processo de naturalização que não foi averiguado nesta pesquisa, mas que foi identificado em
outras em relação à legislação implantada na década de 1840 (FAUTH, 2005, p. 63-74). Outra
questão a ser problematizada é a classificação de colono/colona e o possível manejo desta
categoria pelos sujeitos interessados na obtenção de sua naturalização.
Agradecimento
Agradeço a CAPES e ao CNPq pela bolsa ofertada durante parte do mestrado na
Universidade Federal de Santa Catarina e ao longo do doutorado que está sendo cursado na
Universidade Federal Fluminense.
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Universidade do Vale do Rio dos Sinos. São Leopoldo, 2001.
Recebido em 31/03/2020.
Aceito em 29/04/2020.
1
Os documentos transcritos neste artigo passaram por uma atualização ortográfica para facilitar a sua leitura e
compreensão.
2
Termo de declaração feito por Benedicto de Sz
a
Mez
s
, folha 39v. AHMF. Registro dos termos de declaração das
pessoas que solicitaram sua naturalização (1834-1871), caixa. 28, n. 73.
3
Ver KLUG, 2009. p. 201-229; LIMA, 2015; MACHADO, 1999.
4
BRASIL. Constituição Política do Império do Brasil (1824). Coleção de Leis do Império do Brasil. Disponível
em <http://www2.camara.leg.br/>. Acessado em 2020.
5
Aviso emitido por Jose Lino Coutinho e dirigido a Feliciano Nunes Pires em 25 de agosto de 1831. APESC.
Avisos do Ministério dos Negócios do Império para os presidentes da Província de Santa Catarina, 1830-1832, n.
69.
6
Anais do Parlamento Brasileiro. Assembleia Constituinte de 1823. Sessões de 22 de maio de 1823, 14 de junho
de 1823, 19 de junho de 1823, 20 de junho de 1823, 25 de junho de 1823, 16 e 26 de setembro de 1823.
7
Anais do Parlamento Brasileiro. Assembleia Constituinte de 1823. Sessões de 01 de outubro e 02 de outubro de
1823.
8
BRASIL. Constituição Política do Império do Brasil (1824). Artigo 6; MAMIGONIAN, 2015, p. 181-205.
9
O reconhecimento da independência do Brasil pelos países europeus em 1825 envolveu a promessa de extinção
do tráfico de escravos cujo cumprimento foi cobrado pelos ingleses e referendado pelo Tratado de 1826 que previa
a extinção do tráfico três anos após a sua ratificação. O prazo se encerraria em 13 de março de 1830 em função da
ratificação pelo governo inglês ter ocorrido em 1827. Ver RODRIGUES, 2009. p. 324-327.
Fronteiras: Revista Catarinense de História. Dossiê Fronteiras, migrações e identidades nos mundos pré-modernos. N 35, 2020/01
ISSN 2238-9717
183
DOI: https://doi.org/10.36661/2238-9717.2020n35.11416
10
Após a independência do Brasil, algumas normas foram baixadas para se regular o acesso e estabelecimento dos
estrangeiros, em especial dos portugueses, no Brasil. O decreto de 14 de janeiro de 1823 tratava das condições sob
as quais os súditos de Portugal poderiam ser admitidos no Brasil. A partir de então, todo estrangeiro que quisesse
residir temporariamente no país deveria prestar fiança idônea de seu comportamento perante o juiz territorial. Isso
o tornaria súdito do Império durante sua residência, mas não lhe daria os foros de cidadão brasileiro. aqueles
que desejassem se estabelecer pacificamente no país, deveriam se apresentar em uma Câmara Municipal assim
que chegassem para prestar juramento de fidelidade à causa do Brasil e ao seu Imperador. Isso era indispensável
para que pudessem residir e gozar dos foros de cidadão. Esse juramento era acompanhado pelo preenchimento de
um termo de adesão na Câmara. Esta determinação foi suspensa por meio do decreto de 20 de novembro de 1823.
Este esclarecia que as determinações anteriores eram incompatíveis com a segurança interna e que, portanto, sua
execução ficava suspensa até que a Assembleia estabelecesse as condições indispensáveis para os portugueses
“merecerem o honroso título de cidadãos brasileiros”. O controle sobre a naturalização saiu da instância municipal
e subiu para esferas superiores em um contexto no qual considerava-se necessário dificultar o acesso ao título de
cidadão. Ribeiro observou que não ficou claro para as autoridades locais o que fazer com os que desembarcassem
após 20 de novembro de 1823. A Câmara do Rio de Janeiro continuou aceitando o juramento dos portugueses.
Paralelamente, pedidos de cidadania eram encaminhados ao governo Imperial e chegavam ao Ministério do
Império. Ver RIBEIRO, 2002, p. 27 -86; BRASIL. Decreto 14 de janeiro de 1823. Índice dos Decretos, Cartas e
Alvarás de 1823, pt. II, p. 6. Disponível em <http://www2.camara.leg.br/>. Acessado em 2018.
11
BRASIL. Lei 23 de outubro de 1832. Artigo 1.
12
BRASIL. Lei 23 de outubro de 1832. Artigo 2.
13
BRASIL. Lei 23 de outubro de 1832. Artigo 6, 7 e 10.
14
Aviso emitido por Visconde de Montalegre e dirigido ao presidente da Província de Santa Catarina em 01 de
setembro de 1849. APESC. Avisos do Ministério dos Negócios do Império para os presidentes da província de
Santa Catarina 1848 -1849, n. 69.
15
Requisição a favor de João Baptista Sacarello feita por Antonio Pereira em 17 de setembro de 1849. APESC.
Registros das correspondências da Presidência da Província para o Ministério dos Negócios do Império, 1846-
1851, n. 69; Aviso emitido pelo Visconde de Montealegre e dirigido ao presidente da Província de Santa Catarina
em 14 de fevereiro de 1850. APESC. Avisos do Ministério dos Negócios do Império para os presidentes da
Província de Santa Catarina, 1850-52, n. 69.
16
Requisição a favor de João Baptista Sacarello feita por João José Coutinho em 22 de abril de 1850. APESC.
Registros das correspondências da Presidência da Província para o Ministério dos Negócios do Império, 1846-
1851, n. 69.
17
APESC. Avisos do Ministério do Império para os presidentes da Província de Santa Catarina 1848-1849/1850-
52, n. 69.
18
Registro das Cartas de Naturalização de José da Costa Leite Guimarães, Antonio Ferreira Cardozo Guimaraes e
Pedro Crousey. AHMF. Registros de naturalização (1846-1868), caixa 45.
19
AHMF. Registros de Naturalização (1846-1868), caixa 45.
20
Ibidem.
21
BRASIL. Decreto de 30 de agosto de 1843.
22
BRASIL. Decreto nº 397 de 3 de setembro de 1846; BRASIL. Decreto nº 518, de 31 de janeiro de 1850.
23
BRASIL. Decreto nº 712 de 16 de setembro de 1853.
24
BRASIL. Decreto nº 808-A, de 23 de junho de 1855.
25
Este Decreto estipulou que todo o estrangeiro maior de 21 anos, que, tendo residido no Brasil ou fora dele em
seu serviço por mais de dois anos poderia se tornar cidadão declarando a intenção de continuar a residir no Brasil
ou a servi-lo depois de naturalizado. Seriam dispensados deste tempo de residência: os casados com brasileira; que
possuíssem bens de raiz no Brasil ou parte em algum estabelecimento industrial; os inventores ou introdutores de
um gênero de indústria qualquer; os que fossem recomendados por seus talentos e letras ou por sua aptidão
profissional em qualquer ramo de indústria; os filhos dos estrangeiro naturalizados nascido fora do Império antes
da naturalização de seu pai. Ver BRASIL. Decreto nº 1.950, de 12 de julho de 1871.
26
BRASIL. Decreto nº 1.096, de 10 de setembro de 1860. Artigo 1.
27
Termo de declaração de Christine Ottilia Apolonia feito em 16 de março de 1861, folha 25. AHMF. Registro
dos termos de declaração das pessoas que solicitaram sua naturalização (1834-1871), caixa. 28, n. 73.
28
As declarações de naturalização continham mais detalhes sobre a proveniência dos indivíduos em relação aos
registros das cartas de naturalização. A cidade de origem, por exemplo, foi citada diversas vezes nos termos de
declaração enquanto os registros das cartas de naturalização continham apenas a Nação ou Reino de proveniência.
A seguir elencamos as localidades citadas nas declarações. Optamos por citar a cidade/vila ao invés da Nação ou
Reino quando especificada. Os indivíduos que fizeram suas declarações eram provenientes de: Braga (1), Coimbra
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(1); Ilha de Madeira (2), Ilha de São Miguel (2), Ilha Terceira do domínio português (1); Lisboa (7); Penafiel (1);
Peso da Régua (1); Porto (8); São Pedro do Sul (1); Vila de Amarante (1); Vila de Guimarães (1); Vila de Valença
do Minho (1); Brunswick Prússia (1); Prússia (6); Grã-Canária (1); Cádiz (1); Ilha de Lacarote (2); Reino da
Espanha (2); Sardenha (1); Toscana (1); Gênova (1); Pádula (1); Itália (2); Ducado de Schwarzburg (1);
Oldemburgo (1); Saxônia (1); Montevidéo (2); Gilbratar (1); Londres (1); Baixos Pirienus (1); Brasil (1); Buenos
Aires (1); Dinamarca (1); Nova York (1); Polônia (1). Ressaltamos que os portugueses também correspondem à
maioria dos declarantes (28 ou 47%).
29
BRASIL. Decreto nº 808-A, de 23 de junho de 1855. Artigos 1; MELLO, 2018. p. 171
30
BRASIL. Constituição Política do Império do Brasil (1824). Artigo 95 e 136.
31
BRASIL. Decreto 3.029, de 9 de janeiro de 1881. Art. 10; BRASIL. Decreto 58-A, de 14 de dezembro de
1889. Artigos 2 e 3.