Fronteiras: Revista Catarinense de História. Dossiê Direitos humanos, sensibilidades e resistências. N 36, 2020/02 – ISSN 2238-9717
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DOI: https://doi.org/10.36661/2238-9717.2020n36.11277
“una espécie endógena”. Nisso muita gente concorda, pois o Peronismo é original em grande
medida. Ele muda de cor, de roupa, de direção, se divide e se multiplica em formas diferentes
e por vezes distintas, fala línguas diferentes, mas, ainda assim, sobrevive aos tempos, coisa
que não aconteceu com outros governantes e movimentos semelhantes da América Latina, dos
quais Tromben faz uso comparativo, especialmente seu compatriota, Carlos Ibáñez Del
Campo, esse “un militar austero, un orador deplorable, soporífero, que más bien actuaba
detrás de bombalinas, en los pasillos”. E mais ainda, ao contrário do que ocorreu com Juan
Perón, Ibáñez não pode contar com uma figura como Evita, fundamental para o movimento
Peronista, como uma ferramenta de ligação entre Juan Perón e as massas de trabalhadores,
contribuindo assim para a sua popularização e perpetuação na Argentina.
No próximo texto surgem Rafael Bielsa e Federico Mirré, colocando o Peronismo
como um “objeto político não identificável” ou como eles chamam: OPNI. Ambos, com
ligações diretas no direito, na diplomacia e na política nacional, fazem uso de uma série de
memórias para defenderem o Peronismo e a história argentina diante das diversas
considerações estrangeiras, muitas vezes eivadas de incompreensões e mesmo de
preconceitos. Por exemplo, uma referência a um artigo londrino do conservador Sunday
Telegraph, em que um futuro prêmio Nobel nos anos 1970 se referiu à Argentina como “la
ciudad entre los cementerios y los prostíbulos”. Ou ainda fazem referência a um encontro de
um ilustre diplomata argentino com Stalin em 1953, quando esse último, procurando resumir
as impressões que tinha sobre o Peronismo, no poder naquele momento, disse que “si lo
entiendo bien, ustedes serían capitalistas, pero no tanto; pero también socialistas, aunque casi
nada. Llegan al poder por elecciones, pero no creen em la democracia burguesa”. Mas, Bielsa
e Mirré defendem especialmente o governo de Néstor Kirchner, do qual o primeiro foi parte
como ministro de Estado. Isso ocorre com considerações a respeito da crise que se instalou na
economia nacional na época e das tentativas dos EUA de “participar” das soluções e
“aconselhar” as autoridades argentinas nos rumos que deveriam seguir. Baseando-se em
artigos de jornais norte-americanos, que defendiam uma virada “libertária” para a economia
argentina, os autores criticam as sugestões dadas, especialmente a proposta de dolarização e
os caminhos para a liberalização.
Mas sigamos como os demais textos, devendo ter em conta serem complementares
aos que já comentamos até aqui, por isso apontaremos suas considerações de forma mais
breve. Assim, não podemos esquecer sempre de nos perguntar, como fazem a politóloga
Lucrecia Teixidó e o periodista Sergio Bufano, de “qual Peronismo” estamos falando? Esses
dois argentinos procuram fazer um histórico do Peronismo, em poucas páginas, desde sua